A concepção espacial e tecnológica da habitação brasileira, principalmente das habitações de baixo custo, ainda remonta ao modelo internacionalmente difundido da habitação burguesa européia do século XIX, resultando, em sua imensa maioria, em apartamentos divididos em cômodos monofuncionais - quarto, sala, cozinha e banheiro - organizados segundo zonas social, íntima e de serviços e executados, geralmente, em alvenaria de tijolos, com poucos exemplos de utilização de pré-fabricação. Poucas mudanças têm-se observado na produção arquitetônica para população de baixa renda nas últimas décadas. Os órgãos públicos atuam apenas na elaboração de projetos urbanísticos dos conjuntos habitacionais, implantando no terreno unidades-padrão pré-definidas. Suas propostas limitam-se ao uso de técnicas construtivas alternativas ou a reformulações nos desenhos das fachadas incorporando traços da moda, sem que, contudo, a função, o desenho e a articulação dos espaços de habitar sejam sequer questionados.
Entretanto, a vida atual tem-se caracterizado por mudanças cada vez mais rápidas: a inserção das novas mídias no espaço doméstico, o novo perfil demográfico da população, a diversidade de composição de seus grupos domésticos, seus modos de vida emergentes e suas novas demandas, vêm alterando o padrão social conhecido até então. Frente a essa nova situação, o desenho da habitação, como é oferecida hoje, parece-nos estagnado.
A popularização do acesso às mídias de comunicação no espaço privado da habitação contribui, em todas as classes sociais brasileiras, para o surgimento de novas formas de habitar, ao possibilitar a superposição de funções historicamente vinculadas a esferas distintas, alterando mesmo os conceitos de espaço público e privado. Esse e outros fatores têm gerado mudanças no cotidiano doméstico, ainda que o espaço onde ele se desenvolve continue, na grande maioria dos casos, seguindo o modelo da tripartição burguesa oitocentista parisiense. Estudos realizados no Nomads.usp apontam a recorrência desta tripartição na quase totalidade dos apartamentos oferecidos pelo mercado imobiliário paulistano e brasileiro.
As pesquisas do Nomads.usp – Núcleo de Estudos sobre Habitação e Modos de Vida – sobre o desenho da habitação contemporânea têm buscado primeiramente mapear as diversas modalidades, constituindo grandes bancos de dados capazes de alimentar pesquisas do Núcleo e de pesquisadores externos. Até aqui os esforços concentraram-se na gama de modalidades comercializadas a várias classes sociais, desde habitações econômicas até mais luxuosas – excluindo a habitação de interesse social por razões meramente metodológicas.
Interessa-nos agora debruçar-nos com atenção sobre a habitação social, e particularmente sobre os apartamentos destinados à população de 2 a 5 salários mínimos, contemplados por programas públicos, construídos na metrópole paulistana, sabendo que muitos destes exemplares foram reproduzidos em todo o estado e em outros estados brasileiros.
O trabalho dá continuidade à pesquisa sobre apartamentos na cidade de São Paulo, realizada pelo Nomads.usp – Núcleo de Estudos sobre Habitação e Novos Modos de Vida, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da EESC - USP, agora com enfoque em apartamentos destinados à habitação social. Através da coleta de peças gráficas e de informações diversas, classificamos e analisamos qualitativamente as plantas oferecidas à população de baixa renda.