LE CORBUSIER ENCONTRA A MARRETA: CORPO, ESPAÇO E MODERNIDADE NO FILME O HOMEM AO LADO

Denise Vieira, Ana Elisabete Medeiros

Denise Sales Vieira é pesquisadora no Programa de Pós-graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasilia, UnB. Estuda as relações entre corpo feminino, cidade e representação no cinema.

Ana Elisabete de Almeida Medeiros é Doutora em Sociologia e Professora Adjunta da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, UnB, onde coordena o Laboratório de Estudos da Urbe (LabEUrbe). Estuda patrimônio cultural, projeto urbano, identidade, memória, desenvolvimento local, espaço e habitação.


Como citar esse texto: VIEIRA, D.S; MEDEIROS, A.E.A. Le Corbusier encontra a marreta: corpo, espaço e modernidade no filme O Homem ao lado. V!RUS, São Carlos, n. 12, 2016. Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus12/?sec=4&item=9&lang=pt>. Acesso em: 19 Abr. 2024.


Resumo:

A elaboração deste artigo parte de uma leitura do filme argentino O Homem ao lado (2009), cuja narrativa se desenrola em um espaço icônico da arquitetura modernista: a Casa Curutchet, único projeto residencial de Le Corbusier construído na América Latina. O enredo do filme gira em torno de um conflito muito comum entre vizinhos: a abertura de uma janela no muro que divide as duas casas. A partir dessa querela, desenrola-se uma trama onde Leonardo, o morador da casa de Le Corbusier, tenta de todas as formas impedir que o vizinho Victor – um homem de hábitos e personalidade opostos aos seus – abra a dita janela; Victor, por sua vez, vai fazer o possível para conseguir um pouco da luz que Leonardo tem sobrando. A partir desse duelo, que toma os contornos caricaturais da comédia dramática, assim como da análise do processo projetual para a concepção da casa, pretende-se explorar as relações entre a obra do moderno radical Le Corbusier, sua concepção de máquina de habitar e o corpo que a ocupa.

Palavras-chave:: Modernos radicais; Arquitetura Modernista; Corpo; Cinema.


INTRODUÇÃO

Com este artigo, propomos tecer algumas reflexões acerca da relação entre corpo e espaço no projeto moderno de arquitetura, tendo como recorte a Casa Curutchet de Le Corbusier, vista a partir de duas evidências produzidas sobre ela: o projeto e o filme. A partir dessa observação, pretendo problematizar um conflito inerente ao projeto radical de transformação a que a arquitetura modernista se propõe: uma perspectiva de transformação profunda dos modos de morar e o consequente embate entre o que se imagina e o que se materializa no espaço. A narrativa de um cotidiano imaginado, construída no filme a partir da articulação entre corpo, espaço e tempo, apresenta um olhar sobre o espaço construído capaz de contrapor a lógica de sua concepção e construção, à relação dinâmica de invenção e ocupação entre corpo e espaço.

A atividade do projeto em arquitetura surge historicamente a partir da separação moderna entre corpo e espaço. Até a renascença, o arquiteto era o construtor, e o desenho era utilizado apenas para realização de croquis durante a obra. A partir do renascimento, a arquitetura passa a ser conceituada e entendida como disciplina intelectualmente elaborada, e o projeto passa a ser instância essencial na concepção arquitetônica – pensar, calcular e desenhar antes de construir.

Conceber conceitualmente o espaço implicaria em conhecer profundamente as relações entre indivíduos, natureza e sociedade. Segundo Argan, é parte da conceituação da renascença a crença de que os antigos teriam estabelecido de forma mais pura sua relação com a natureza, e isso estaria refletido na forma como representavam suas edificações: “[...] os antigos eram os maiores conhecedores da natureza, pois eram aqueles que na natureza e da natureza deveriam extrair todos os elementos de sua vida espiritual” (ARGAN, 1973, p. 15, tradução nossa1). Como essa relação não era mais possível ao indivíduo moderno devido à evolução da ciência e da religião, era preciso resgatar esse modelo de construir e racionalizá-lo à luz da modernidade. A renascença vai buscar, portanto, na arquitetura da Grécia Clássica, a relação entre corpo e espaço a ser tomada como ideal e a ser reproduzida como modelo válido. Essa concepção foi fundamental para toda a literatura moderna produzida acerca da arquitetura: a racionalidade existente nas teorias de composição e aplicação dos elementos clássicos, já é moderna. Mas é somente a partir da Revolução Industrial – a Primeira Era da Máquina, segundo Banham – que os novos meios de produção e a possibilidade de aplicação de novos materiais vão constituir um campo para o que veio a se chamar de Arquitetura Modernista.

Fundamental para a compreensão da racionalidade moderna, e os seus rebatimentos no pensamento arquitetônico, são os escritos de Rene Descartes. Em seu Discurso do Método (1637), Descartes considera uma radical dualidade: a mente, ou a ‘alma’, é inteiramente distinta do corpo. A alma seria a representação do ‘eu’ e sua essência ou natureza consiste apenas no pensar, não dependendo de qualquer coisa material para existir. Essa dualidade mente/corpo já havia sido antecipada no pensamento filosófico desde Platão. No entanto, Descartes vem reforçar a separação entre alma e natureza, numa oposição de superioridade da primeira em relação à segunda. E essa natureza inclui a natureza do corpo. A concepção moderna de arquitetura vai se fundamentar nessa tentativa de dominação do corpo pela razão; da natureza pela ação racional humana.

Tendo em mente essas questões introdutórias, pretendo trazer para a discussão o longa-metragem de ficção O Homem ao Lado (2009), de Gastón Duprat e Mariano Cohn. O filme trata de um conflito entre dois vizinhos na cidade de La Plata: Leonardo, um designer famoso, morador da única casa construída por Le Corbusier na América Latina – a Casa Curutchet; e Victor, um bon vivant, dono de um furgão exótico, autor de esculturas feitas com peças de ferro aproveitadas do lixo. Victor decide abrir uma janela na empena que divide os dois terrenos, apontando de frente para outra janela na casa de Leonardo. O conflito em torno da abertura da janela vai desencadear os acontecimentos ao longo do filme.

A casa projetada por Le Corbusier é praticamente o único cenário do filme, e decidimos então por voltar à gênese de sua criação: o projeto. Procurei investigar, em linhas gerais, como foi concebida a casa, a partir de que intenções de arquiteto e cliente, como se deu a sua inserção no tecido urbano de La Plata, e quais as representações que ela figura nas leituras arquitetônicas. Num segundo momento, buscando uma caracterização simbólica dos corpos que habitam o filme, apresento uma dicotomia entre representações do corpo moderno e do corpo grotesco, em um paralelo com as personagens de Leonardo e Victor. E, finalmente, num terceiro momento, trago a descrição de algumas situações do filme que acredito serem importantes para a reflexão, que, ao evidenciar a relação dinâmica entre corpo e espaço, problematizam não somente o projeto de Le Corbusier para a casa modernista, mas também a atividade projetual em si mesma.

A CASA DE LE CORBUSIER EM LA PLATA

Fig. 1: Le Corbusier e Maquete elaborada para o projeto da Casa Curutchet.

Fonte: http://tecnne.com/casa-curutchet/

A Casa Curutchet é fruto de um projeto encomendado a Le Corbusier, em 1948, pelo médico cirurgião argentino Pedro Curutchet: um típico homem moderno. Estudioso de ergonomia, criava seus próprios objetos cirúrgicos. Como médico, admirava as preocupações corbusianas com insolação e higiene, e essas foram provavelmente as características que o levaram a contratar o arquiteto franco-suíço (LEÃO, 2007, p. 04).

Le Corbusier responde ao convite de Curutchet em carta:

Seu programa – a casa de um médico – é extremamente sedutor (a partir do ponto de vista social). Seu terreno está bem situado e em boas condições. Por fim, tendo trabalhado no Plano para Buenos Aires entre 1938-1939, que está atualmente sendo considerado pelo governo, estou interessado na ideia de realizar em sua casa uma pequena construção doméstica, na qual gostaria de realizar uma pequena obra prima de simplicidade, de conveniência e de harmonia, sempre dentro dos limites de uma construção extremamente simples e sem luxos, perfeitamente de acordo, por outro lado, com os meus hábitos (Correspondência de Le Corbusier ao Dr. Pedro Curutchet em 1948, apud GARDINETTI, 2012, s.p., tradução nossa).

A partir de então, o projeto passa a ser elaborado à distância por Le Corbusier, que trabalhava concomitantemente no projeto das Unidades de Habitação de Marselha. Le Corbusier nunca chegou a conhecer pessoalmente o Dr. Curutchet, e nem visitou o terreno onde foi construída a casa. Sua única passagem por La Plata se deu em 1929, quando da sua viagem pela América Latina.

Todo o processo de elaboração do projeto e de execução da casa encontra-se registrado na troca de correspondências entre arquiteto e cliente. Na primeira carta a Le Corbusier, Dr. Curutchet envia fotos da área, as plantas cadastrais e um programa de necessidades. Casado e com duas filhas, faz duas exigências programáticas: queria um consultório em casa, mas com acesso independente da residência, e os ambientes principais da casa deveriam estar voltados para o parque em frente à casa. Le Corbusier demonstra, em uma outra correspondência, preocupação com os limites para a construção:

De que maneira estão construídas as casas vizinhas à sua, à direita e à esquerda? Chegam até ao limite da calçada? Estou obrigado a construir até o limite da linha municipal, ou posso afastar-me desse limite? Posso tirar partido da linha municipal se for obrigado a isso. É possível construir balcões que avancem a fachada, como parece indicado em uma das fotografias que você me enviou? Seria muito útil que você desenhasse em croquis a ocupação do terreno por seus vizinhos (Correspondência de Le Corbusier ao Dr. Pedro Curutchet em 1949, apud GARDINETTI, 2012, tradução nossa).

O projeto é concluído e Le Corbusier envia as pranchas ao Dr. Curutchet, acompanhadas de um memorial descritivo, em 24/05/1949. No memorial, descreve o projeto de maneira sintética e objetiva, destacando alguns pontos importantes de sua concepção. Recorto e grifo aqui alguns trechos que considero pertinentes:

Foi ocupado todo o terreno com pilotis de maneira a elevar a casa ao piso aberto sobre o jardim suspenso, beneficiando as vistas do parque, protegida da circulação e dos curiosos.

A construção é extremamente clara e não perturbará o lugar, permitindo tirar toda a vantagem possível do terreno. [...] A construção de Curutchet é independente dos muros laterais, a fim de assegurar a solidez da obra e evitar as perturbações às casas vizinhas e as ameaças à segurança de sua construção.

Que fique bem claro que estou a sua disposição para efetuar todas as modificações que você deseje. Porém, lhe digo que as mesmas não deveriam ser nada além de modificações em detalhes, (grifo nosso) pois tenho o sentimento preciso de ter ocupado seu terreno o mais utilmente possível para responder ao seu programa e aos seus recursos, como também aos defeitos do terreno.

Todo o projeto se estabelece por meio do Modulor [...]. Trata-se de um sistema de medida harmônica que criamos aqui há mais de 7 anos e que aplicamos em nossas construções [...]. É a partir do Modulor que temos conseguido, por um lado, realizar uma economia considerável de volume e, por outro, alcançar uma harmonia que teria sido impossível sem o mesmo (Le Corbusier citado por GARDINETTI, 2012, grifos nossos, tradução nossa).

Fig. 2: Projeto de Le Corbusier para a Casa Curutchet, pranchas enviadas ao Dr. Curutchet em maio de 1949.

Fonte: http://tecnne.com/casa-curutchet/

Em linhas gerais, o projeto de Le Corbusier consistia em uma solução engenhosa para as necessidades do Dr. Curutchet: dois volumes entremeados por um vão interno – onde deveria ser plantada, e de fato foi, uma árvore de grande porte – sendo o volume da frente composto pelo consultório e uma dependência de serviços, e o outro, recuado, onde está a residência propriamente dita. Os dois são interligados por uma rampa que permite o acesso, a partir do nível térreo, tanto ao vestíbulo que dá acesso à residência, como, no nível seguinte, ao consultório. A residência se desenrola em mais dois pavimentos: o primeiro corresponde à área de estar e cozinha, cuja cota de piso corresponde à cota de cobertura do consultório, por sobre o qual se desenvolve um terraço que dá vistas ao parque; e o segundo corresponde aos quartos da casa. O trânsito entre os pavimentos da casa se dá por uma escada localizada ao fundo de toda a construção.

Le Corbusier respondeu às principais demandas do Dr. Curutchet: casa e consultórios separados, e cômodos da casa com vista para o parque. Ademais, o que temos é uma casa de Le Corbusier, como o próprio Dr. Curutchet vai escrever ao arquiteto em 1957, quatro anos após mudar-se para a casa:

A obra é visitada por estudantes e profissionais... O público em geral tem compreendido cada vez mais essa obra que a muitos lhes pareceu tão estranha a princípio. Esta é “a casa de Le Corbusier”; me honra ser o proprietário. Assim lhe digo e quero que se repita, você pode fazer qualquer indicação que será cumprida e agradecida. É e seguirá sendo a sua casa (Correspondência de Dr. Curutchet a Le Corbusier em 1957, apud GARDINETTI, 2012, grifos nossos, tradução nossa).

Fig. 3: Fotos da Casa Curutchet em 2008.

Fonte: http://tecnne.com/casa-curutchet/ Olivier Martin-Gambier 2008 © FLC/ADAGP

A Casa Curutchet legitima-se enquanto marco na arquitetura modernista por diversos aspectos: primeiro, por se tratar de uma obra de Le Corbusier, e a única na América Latina; segundo, por reunir os principais pressupostos da arquitetura corbusiana dos anos 20: pilotis, janela em fita, terraço-jardim, estrutura independente, fachada-livre, assim como o conceito de promenade architecturale; e em terceiro, por reunir também características de uma transição na obra de Le Corbusier, que se inicia nos anos 1930, e vai até o pós-guerra, onde uma preocupação com o espírito da época (zeitgeist) cede aos poucos um certo espaço ao espírito do lugar (genius loci). Dessa forma, a Casa Curutchet costuma ser considerada como uma obra contextualista, respeitosa aos alinhamentos, condições e geometrias de uma cidade tradicional como La Plata, diferenciando-se da edificação isolada no lote, aspecto característico da modernidade arquitetônica dos anos 20-30 (LEÃO, 2007, p. 16-7).

No trecho da carta transcrito acima, Dr. Curutchet parecia tomado por um sentimento transcendente de que, para além de resolver suas questões de organização familiar, a casa construída para ele teria uma contribuição maior ao pensamento da arte. A família Curutchet mudou-se para a casa em 1953 e o assédio por parte de curiosos, ávidos por conhecer a casa de Le Corbusier, intensificou-se e invadiu a rotina da família. Além disso, Curutchet alegava excesso de luminosidade e problemas de privacidade, que não eram contornados com uma simples cortina pelo receio do proprietário de descaracterizar a obra. Em 1965, oito anos após a mudança, os Curutchet deixaram a casa (LEÃO, 2007, p. 12).

É um pouco a tirania da arquitetura, as ideias dos arquitetos as vezes tiranizam a vida do proprietário, o obrigam a viver conceitos, às vezes teóricos; a vida não requer abstração, ver a luz somente pela luz, ou os planos, ou os volumes, isso depende da psicologia do habitante (Entrevista de Pedro Curutchet a Daniel Casoy em 1983, apud JOHNSTON, 2012, s.p., tradução nossa).

CORPO MODERNO E CORPO GROTESCO: REPRESENTAÇÕES DE UM DUELO DA MODERNIDADE

O que podemos dizer acerca da estranheza na relação entre o Dr. Curutchet e a casa de Le Corbusier? Há aqui uma questão a ser levantada que está na gênese do pensamento na arquitetura moderna, que é fundamental para a concepção dos seus projetos, e que vão impactar, principalmente os projetos residenciais: a relação que o pensamento racional moderno estabeleceu com o corpo.

O séc. XVII marca o advento da filosofia mecanicista na Europa Ocidental, e as reflexões acerca da natureza passam a evitar as causas transcendentes para aproximá-las à razão do homem. A astronomia e a física de Galileu vão introduzir uma fratura epistemológica definitiva, onde as fórmulas abstratas da matemática vão refutar os dados sensoriais e o sentimento de orientação do homem no espaço. A natureza, portanto, esvazia-se dos seus mistérios para tornar-se um artefato mecânico nas mãos dos homens. O conhecimento deve ser útil, racional, despido de sentimento e capaz de produzir eficácia social.

Na filosofia, o pensamento de Descartes é fundamental para a constituição da racionalidade moderna. Descartes vai escrever: “O universo é uma máquina em que não há absolutamente coisa alguma a considerar a não ser as figuras e os movimentos de suas partes” (DESCARTES apud LE BRETON, 2013, p. 102). A metáfora mecânica cartesiana atribuída ao universo também é verdade em sua atribuição ao corpo. Descartes vai estabelecer um estatuto de subordinação do corpo à mente, opondo-os em uma radical dualidade: o indivíduo encontra-se dividido em duas partes, o corpo e a mente, soldados pela glândula pineal. Em seu Discurso do Método (1637) a alma (a mente) seria a representação do eu e sua essência ou natureza consiste apenas no pensar, não dependendo de qualquer coisa material (o corpo) para existir. O homem cartesiano é composto por uma colagem entre uma alma que só encontra sentido no pensar, e um corpo, ou melhor, uma máquina corporal, reduzida a uma simples extensão.

[...] e verdadeiramente pode-se muito bem comparar os nervos da máquina que eu vos descrevo às tubulações das máquinas dessas fontes; seus músculos e seus tendões às diversas engrenagens e recursos que servem para movimentá-las; seus espíritos animais à água que os move, cujo coração é a fonte e as concavidades do cérebro são os olhares. Além disso, a respiração e outras tais ações, que lhe são naturais e ordinárias e que dependem do curso dos espíritos, são como os movimentos do relógio ou de um moinho que o curso ordinário da água pode tornar contínuo (DESCARTES apud LE BRETON, 2013, p. 120).

Conceitualmente, é essa máquina corporal, como uma simples extensão, que Le Corbusier tem em mente ao elaborar o seu projeto, e se manifesta principalmente a partir da adoção do sistema de medidas por ele elaborado: o Modulor. Esse sistema, elaborado a partir de um corpo humano padrão, deve aplicar-se ao projeto como um todo, desde as medidas de mobiliário até alturas de pé-direito e proporções de fachada. A palavra Modulor é composta a partir de module, ou seja, unidade de medida, e section d’or (seção áurea), proporção clássica reproduzida por toda a renascença e assumida aqui por Le Corbusier. A publicação Modulor 1, em 1948, tem como subtítulo Ensaio sobre uma medida harmônica à escala humana e aplicável universalmente à Arquitetura e à Mecânica Moderna. Ao iniciar seus estudos acerca do Modulor, por volta de 1942, Le Corbusier era contratado da Associação Nacional Francesa para Estandardização (AFNOR), órgão que tinha como função auxiliar na reconstrução do país no pós-guerra, e estabelecer uma padronização de medidas na construção civil. Em um primeiro estudo, Le Corbusier solicita a um de seus assistentes:

Tome um homem com o braço levantado com 2,20m de altura, inscreva-o em dois quadrados superpostos de 1,10m, coloque-o a cavalo sobre os dois quadrados e um terceiro quadrado resultante lhe dará uma solução. O lugar do ângulo reto deve poder ajudá-lo a colocar o terceiro quadrado. Com este enredado, regido por um homem instalado no seu interior, estou seguro que chegará a uma série de medidas que poderão colocar de acordo com a estatura humana (o braço levantado) e a Matemática. (LE CORBUSIER, 1954, p.35)

Esse era apenas um primeiro estudo e, passando por uma primeira definição, que considerava um homem com 1,75m de altura, Le Corbusier chega a um padrão definido a partir de um homem com 6 pés de altura, ou 1,829m, proporcionado de acordo com a seção áurea e a sequência de Fibonacci. Após a publicação do Modulor 1, seguem-se uma série de adaptações sugeridas por matemáticos, engenheiros, etc. que são incorporadas a um novo sistema, aperfeiçoado no Modulor 2, publicado em 1950.

Fig. 4: Desenhos de Le Corbusier representando o sistema de medidas Modulor.

Fonte: LE CORBUSIER, 1954.

O conceito do Modulor é uma reprodução literal do pensamento de Le Corbusier acerca da relação entre corpo e espaço, que é puramente matemática, operando em termos de concepção arquitetônica aquele mesmo pensamento mecanicista relacionado ao corpo cartesiano. Considera-se um tipo para o corpo na tentativa de se encontrar proporções arquitetônicas ideais, e que só poderiam derivar de um corpo com proporções ideais – um homem com 1,829m de altura.

Segundo Le Breton (2013, p. 9), a constituição do corpo moderno, que passa por essa concepção mecanicista, implica também no “isolamento do sujeito em relação aos outros (uma estrutura social do tipo individualista), em relação ao cosmo (as matérias-primas que compõem o corpo não tem qualquer correspondência em outra parte), e em relação a ele mesmo (ter um corpo, mais do que ser o seu corpo)”.

Cabe ressaltar que essa concepção passa de antemão por uma negação ao corpo grotesco, aquele corpo presente nas festas populares medievais, nos carnavais de rua, que estão no cerne da sociabilidade principalmente no século XV. Nessas festas, os corpos se misturavam indistintamente em ruas e praças públicas, num tipo de sociabilidade distinta da noção atual de espetáculo relacionada ao carnaval, e constituída de uma efusão coletiva, mediada pelo contato físico direto.

Segundo Alain Corbin, os odores da Paris na primeira metade do século XVIII, fruto tanto da aglomeração dos corpos no espaço público, como dos humores provenientes de latrinas, mercados, etc. vão despertar a vigilância dos higienistas. O confinamento e a aglomeração passam a ser vistos como sinônimo de doença, fetidão, e “a percepção dos perigos das emanações sociais leva à desconfiança para com a multidão pútrida, o povo e os animais misturados” (CORBIN, 1987, p. 66). Uma nova sensibilidade em relação aos odores passa a se instalar a medida em que a necessidade de individuação é também crescente. A intolerância para com o odor do outro faz parte também da constituição de uma sensibilidade moderna em relação ao corpo.

O corpo grotesco é formado de relevos, de protuberâncias, ele transborda de vitalidade, está mesclado à multidão, indiscernível, aberto, em contato com o cosmo, insatisfeito com os limites que ele não cessa de transgredir. É uma espécie de “grande corpo popular da espécie” (BAKHTIN), um corpo eternamente renascente: grávido de uma vida a nascer ou de uma vida a perder, para renascer ainda (LE BRETON, 2013, p. 47, grifo nosso).

Cabe ressaltar que, apesar de o corpo moderno e o corpo grotesco terem sido colocados aqui em oposição histórica, esse corpo grotesco não ficou para trás, não se trata de uma transição onde o pensamento individualista e racional é fundador de um novo corpo. Estudar o corpo significa estudar aquilo que toma forma, enquanto construção simbólica, na fronteira entre o indivíduo e a relação com o que é exterior a ele. É o limite manifesto do que é individual com o que é coletivo. Portanto, o corpo não pode ser encarado como uma realidade em si, mas sim como uma representação no tecido social.

Ao longo da história ocidental, esse conflito, ou melhor, essa dualidade entre corpo moderno e corpo grotesco esteve sempre presente, e pode-se dizer que somos constituídos justamente pelo embate simbólico entre os dois. E é esse embate simbólico que o filme O Homem ao lado vai trazer para discussão.

O HOMEM AO LADO – LE CORBUSIER ENCONTRA A MARRETA

Fig. 5: Quadros do filme O Homem ao Lado.

A partir das questões acerca do processo projetual da Casa Curutchet e das conceituações acerca do corpo, pretendo me utilizar do filme O Homem ao Lado como meio para problematizar a relação entre espaço projetado e os corpos que nele habitam. De maneira geral, vamos ver adiante que há vários aspectos da narrativa que conectam Leonardo com a acepção de corpo moderno, que vai ser confrontado diretamente com o seu opositor: Victor, o vizinho, o corpo grotesco. A estrutura narrativa do filme, que estabelece um duelo claro entre dois, com comportamentos caricaturalmente opostos, contribuem para que possamos enxergar, simbolicamente, as características dessa dualidade representada nos dois personagens.

O filme se inicia ao som de pancadas fortes, sobre a imagem de um quadro dividido em dois, um lado mais escuro que o outro. Enquanto passam os letreiros iniciais do filme, as marteladas começam, a partir do lado mais escuro do quadro, que, já entendemos, tratam-se de dois lados da mesma parede, o dentro e o fora.

Leonardo acorda ao som das marretadas, percorre a casa a procura da fonte do barulho que o acordou. Vai até a rua, quando descobre que o barulho vem de dentro da sua própria casa. Avista o buraco que está sendo iniciado na parede vizinha, no andar de cima, e corre de volta, subindo pelas rampas. A essa altura, ao percorrer a casa com Leonardo, já percebemos se tratar de uma casa grande, ampla, moderna, com grandes janelas de vidro e uma longa rampa de acesso. Já se pode perceber a casa de Le Corbusier, mas basta a informação de que se trata de uma casa modernista.

Eis que o buraco está sendo feito pelo vizinho justamente em frente a uma das janelas da casa de Leonardo. Ao constatar o fato, Leonardo tenta argumentar com o operário que executa o serviço, em tom autoritário, pede-o que interrompa o serviço, pergunta pelo dono da casa, seu Victor, que não está, volta meio-dia, diz o operário. Leonardo diz que é para ele procura-lo quando chegar. Após fechar a janela, já com a mulher e a filha ao lado, finaliza com a frase – Que país terrível, porra!

Fig. 6: Quadros do filme O Homem ao Lado.

O conflito entre os vizinhos em torno da abertura da janela ajuda a colocar em questão vários aspectos ao longo do filme: a necessidade de privacidade e individualidade, versus a relação de proximidade entre vizinhos; a transparência e permeabilidade presente em todo o projeto de Le Corbusier quando voltado para o parque, versus a necessidade de se proteger do olhar do vizinho; e principalmente, coloca frente a frente o corpo moderno de Leonardo, versus o corpo grotesco de Victor.

Victor tenta ao longo de todo o filme estabelecer um contato próximo com Leonardo, que se esquiva sistematicamente. Victor oferece presentes, tenta agradar Leonardo e a esposa, apela para a proximidade tradicional entre vizinhos em cidades pequenas. Mas tudo aquilo é grotesco para Leonardo – a van com um globo de espelhos, uma xícara feita em uma pata de boi, a conserva do javali que Victor mesmo caçou, as flores vermelhas acompanhadas de um poema, a escultura de ferro – Victor é a representação do grotesco, seus hábitos, seu modo de falar confrontam Leonardo.

O duelo entre Leonardo e Victor é o duelo entre o corpo moderno e o corpo grotesco, mediado pelo desejo da transparência ou da resistência a ela. Victor deseja apenas um pouco de sol que Leonardo tem sobrando: – Preciso de um pouco do sol que você não usa, diz Victor. O sujeito que habita a casa moderna, envidraçada, contraditoriamente deseja proteger-se do exterior: finge estar trabalhando, sempre ocupado, sempre dando desculpas para evitar o contato direto com Victor. Em uma cena, Victor grita Leonardo da rua, chama-o para conversarem sobre a reforma. Para Leonardo, poderiam conversar dali mesmo, Victor não aceita, eles devem ir a um bar, como amigos. Leonardo alega estar ocupado, trabalhando, e Victor: – Você esteve cochilando no computador durante meia hora! Ele o observava no escritório a partir da rua.

Para Victor, a lógica é simples: por que uma pessoa que vive em uma casa tão aberta, tão visível a partir da rua, se importaria com a sua pequena janela? Aí está o conflito: o homem ao lado não quer ser visto e não quer se dar de frente com aquele que o ameaça. Apesar do desejo por privacidade, Leonardo mostra-se vaidoso ao ver sua casa sendo observada a partir da rua por grupos de estudantes, mas mostra-se incomodado quando são turistas; procura instalar um alarme na casa, prefere não colocar grades para não interferir na arquitetura. Nota-se que está aí presente o mesmo sentimento transcendente que o Dr. Curutchet demonstrava nas cartas a Le Corbusier.

Fig. 7: Quadros do filme O Homem ao Lado.

Esse corpo grotesco, que aqui atribuo a Victor, é o corpo das paixões imediatas, daquele que se expressa por extensões de sua pele, que não tem vergonha de estar sem camisa e ser visto, que dança, que transa, que é o seu corpo, e o filme constrói enfaticamente essa imagem. Em contraponto, o corpo de Leonardo é construído de maneira fria, sistemática, ele está sempre bem vestido, mesmo dentro de casa, os objetos que o cercam são milimetricamente pensados, objetos de design arrojado, a relação física com a sua mulher se dá por sistemáticos biquitos que ela lhe solicita, a música é experienciada de maneira intelectual. E essas oposições são enfatizadas no filme a fim de ressaltar as diferenças entre os dois, entre o moderno e o grotesco, entre o mecânico e o orgânico, entre a razão e a paixão, entre o claro e o escuro, entre o projetado e o improvisado, entre a casa de Le Corbusier e a vizinhança.

Ao permitir que seu vizinho morra ao final do filme, Leonardo está deixando morrer aquilo que o incomoda, aquilo que Victor representa: as paixões, o improviso, aquilo que o tira do prumo de sua racionalidade, o que ele considera rude, tosco, repugnante. Leonardo é a representação alegórica do homem moderno, aquele corpo despregado do mundo que o cerca, o corpo-máquina, que encara suas paixões como fraquezas, e que deve manter, por meio de sua racionalidade o controle de todas as situações.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O filme O Homem ao lado, ao banalizar a concepção arquitetônica da máquina de morar em um contexto cotidiano, e ao pôr em cheque a transparência do edifício, tão cara à concepção da arquitetura modernista, coloca em questão também a relação entre modernismo e modernização, conforme problematizada por Marshall Berman:

Nossa visão da vida moderna tende a se bifurcar em dois níveis, o material e o espiritual: algumas pessoas se dedicam ao “modernismo”, encarado como uma espécie de puro espírito, que se desenvolve em função de imperativos artísticos e intelectuais autônomos; outras se situam na órbita da “modernização”, um complexo de estruturas e processos materiais – políticos, econômicos, sociais – que, em princípio, uma vez encetados, se desenvolvem por conta própria, com pouca ou nenhuma interferência dos espíritos e da alma humana (BERMAN, 1986, p. 128).

A radicalidade da arquitetura modernista evidencia-se principalmente por meio de seus “imperativos artísticos e intelectuais autônomos” na esfera do que Berman chama de “modernismo”, e materializa nos edifícios preceitos de transformação radical dos modos de morar, que mais tarde vão entrar em conflito com o mesmo “complexo de estruturas e processos materiais” que compõe a dita “modernização”, inclusive pela própria resistência a ela. Isso nos aproxima da visão de modernidade enquanto uma complexa rede de contradições internas, próprias do sistema que a caracteriza – o capitalismo. Não se trata aqui de simplesmente fazer uma crítica anacrônica à arquitetura modernista desenvolvida no século XX, mas de inseri-la no complexo processo que é a modernidade, que nega a si mesma o tempo todo pois “não se pode pisar duas vezes na mesma modernidade” (BERMAN, 1986, p. 138).

A cena de abertura de O Homem ao lado foi inspirada em uma vídeo instalação denominada Productos Caseros, do artista e arquiteto argentino Gaspar Libedinsky. Por meio desse vídeo, ele documenta a transformação do Cárcel de Caseros, uma prisão de Buenos Aires que operou entre 1979 e 2000, que foi criada para abrigar temporariamente acusados de crimes enquanto aguardam os julgamentos, mas acabou por se tornar uma prisão de fato. O projeto concebido nos anos 60 previa uma série de conveniências aos detidos, prometendo “uma prisão que não se usará para castigar” e “conforto atrás das grades”, o que de fato nunca aconteceu. Em uma rebelião, ocorrida em 1984, os detentos derrubaram as grades das celas, as divisórias das salas de visita, e fizeram buracos na fachada do edifício, por onde se comunicavam com os de fora. Gostaria de finalizar com um trecho da narração do vídeo:

Essas janelas serviram como sistema de comunicação durante 30 anos. Através delas os presos acessavam as fachadas e pulavam, como um homem-aranha, de buraco em buraco. A arquitetura passou assim de seu principal meio de controle a seu principal inimigo: a antítese do panóptico. Enquanto sistema carcerário, que busca transformar a conduta humana através da arquitetura, Caseros representa a inversão da equação: a transformação da arquitetura através da conduta humana (PRODUCTOS CASEROS, 2008, tradução nossa).

Fig. 8: Quadros do vídeo Productos Caseros.

REFERÊNCIAS

ARGAN, G. C. El Concepto del Espacio Arquitetonico desde el Barroco a Nuestros Dias. Buenos Aires: Nueva Vision, 1973.

BERMAN, M. Tudo que é Sólido Desmancha no Ar: a Aventura da Modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1986.

COHEN, J. L. Le Corbusier: Lirismo da Arquitectura da Era da Máquina. Lisboa: Paisagem, 2007.

COMOLLI, J. L. Ver e Poder, a Inocência Perdida: Cinema, Televisão, Ficção, Documentário. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2008.

CORBIN, A. Saberes e Odores: o Olfato e o Imaginário Social nos séc. XVII e XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.

DESCARTES, R. Discurso do Método. In: DESCARTES, R. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p. 33-78. 1a ed. em 1637.

GARDINETTI, M. Casa Curutchet. Revista Tecnne, Buenos Aires, 2012. Disponível em: <http://tecnne.com/casa-curutchet/> Acesso em: 19 nov. 2015.

JOHNSTON, D. M. La razón del cliente: Curutchet y Le Corbusier. Diagonal, n. 31, 2012. Disponível em: <http://www.revistadiagonal.com/articles/analisi-critica/larazondelclientecurutchet-lecorbusier/> Acesso em: 28 jun. 2016.

LEÃO, S. C. A modernidade figurativa da Casa Curutchet. In: DOCOMOMO BRASIL, 7., Porto Alegre, 2007. Anais... Porto Alegre, 2007. Disponível em: <http://www.docomomo.org.br/seminario%207%20pdfs/051.pdf> Acesso em: 18 nov. 2015.

LE BRETON, D. Antropologia do Corpo e Modernidade. Petrópolis: Vozes, 2013.

LE CORBUSIER. The Modulor. Nova Iorque: Faber and Faber, 1954.

O HOMEM ao Lado. Direção de Mariano Cohn, Gastón Duprat. Roteiro de Andrés Duprat. Buenos Aires: Alpha Media; Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales (INCAA), 2009. 1 DVD (103 min).Título original: El Hombre de al lado.

PRODUCTOS CASEROS: Operaciones Urbanas, Boquete. Direção de Gaspar Libedinsk. Buenos Aires: [s.n.], 2008 (23 min). Disponível em:

1 Do original em espanhol: “[...] los antigos eran los más grandes conocedores de la naturaleza, puesto que eran los que em la naturaleza y de la naturaleza debían extraer todos los elementos de su vida espiritual” (ARGAN, 1973, p. 15).

LE CORBUSIER FINDS THE SLEDGEHAMMER: BODY, SPACE AND MODERNITY IN THE FILM THE MAN NEXT DOOR

Denise Vieira, Ana Elisabete Medeiros

Denise Sales Vieira is a researcher at the Post-Graduation Program of the Faculty of Architecture and Urbanism at the University of Brasilia. She studies relationships among female body, city and representation in cinema.

Ana Elisabete de Almeida Medeiros is Doctor in Sociology and Adjunct Professor at the Faculty of Architecture and Urbanism at the University of Brasilia. She is coordinates the Urbe Studies Lab, LabEUrbe. She studies cultural heritage, urban design, identity, memory, local development, space and housing..


How to quote this text: Vieira, D.S. and Medeiros, A.E.A., 2016. Le Corbusier finds the sledgehamme: body, space and modernity in the film The man next door. V!RUS, [e-journal] 12. [online] Available at: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus12/?sec=4&item=9&lang=en>. [Accessed: 19 April 2024].


Abstract:

This article is the result of the analysis of the argentinian film The Man Next Door (2009), which unfolds itself in an iconic space of modernist architecture: the House Curutchet, the only residential project built by Le Corbusier in Latin America. The film's plot shows a very common conflict between neighbors: a window built in a wall that divides their two houses. From this quarrel, a plot starts, in which Leonardo, a resident of Le Corbusier’s house, will try in every way to prevent his neighbor Victor – a man of opposite habits and personality – from opening that window. Victor, on the other hand, will do everything that he can to get a bit of the light that Leonardo has to spare. From this duel, which takes the caricatured contours of this dramatic comedy, as well as the analysis of the design process of the house, this article intends to explore the relationship between the work of the radical modernist Le Corbusier, his conception of living machine and the body that occupies it.

Keywords:: Radical modernists, modernist architecture, body, cinema.


INTRODUCTION

This article proposes to make some reflections on the relationship between body and space in modern architecture design, under the cut of Le Corbusier’s Curutchet House, viwed from two evidences produced by it: design and movie. From this observation, I intend to discuss the inherent conflict in radical transformation of the project that modernist architecture is proposed: a profound change of perspective in ways of living and the resulting clash between what is imagined and what materializes in space. The story of an imagined way of living, built in the movie from the relationship between body, space and time. It provides a glimpse into the constructed space able to counter the logic of its design and construction, the dynamic relationship of invention and occupation between body and space.

Design in architecture comes historically from the modern separation between body and space. Until Renaissance, the architect was the builder, and the design was only used to perform sketches along the process. From Renaissance, architecture becomes conceptualized and understood as an intellectually elaborated discipline, and the project becomes an essential instance for architectural design – to think, calculate and design before building.

To conceive a space conceptually would imply deep understanding on the relationship between people, nature and society. According to Argan, it is part of Renaissance concept the belief that ancients would have established, in the purest way, their relationship with nature, and this would be reflected in how their buildings were represented: '[...] the ancients were the best knowledgeable of nature, were those in nature and of nature should extract all the elements of his spiritual life' (Argan, 1973, p.15, our translation1). As this relationship was no longer possible for the modern individual due to the evolution of science and religion, it was necessary to rescue this model to build and rationalize it in the light of modernity. Therefore, the Renaissance will seek its elements on Classical Greece’s architecture, the rescue of the relationship between body and space to be taken as ideal and to play as the only valid model. This view was critical to all modern architecture literature: the rationality in composition theories and the use of classical elements are already modern characteristics. Although, only since Industrial Revolution – the First Machine Age, according to Banham – new resources and a range of new materials application possibilities started to be the field for what came to be called Modernist Architecture.

For a more accurate understanding of modern rationality and its reverberations in architectural thinking, the writings of Rene Descartes are essential. In his Discourse on the Method (1637), Descartes conceptualizes a radical duality: the mind, or 'soul', is entirely distinct from the body. The soul would be the representation of the self, and its essence or nature consists only in thinking and do not depending on anything material to exist. This duality mind/body had already been anticipated in philosophical thought since Plato. However, Descartes reinforces the separation of soul and nature, imposing the superiority of the first in opposition to the other. This Cartesian nature includes the nature of the body. The modern conception of architecture will be precisely based in the attempt to dominate the body by reason; it is the domination of nature by human rational action.

Bearing in mind these introductory questions, let’s discuss the fiction feature film The Man Next Door (2009) of Gastón Duprat and Mariano Cohn. The film shows the conflict between two neighbors in La Plata city: Leonardo, a famous designer, resident of the only house built by Le Corbusier in Latin America – Casa Curutchet; and Victor, a bon vivant, owner of an exotic van that makes sculptures from pieces of waste iron. Victor decides to open a window in the gable that divides the two sites, facing to Leonardo's house. The conflict around the opening of the window will trigger the events throughout the film.

The house designed by Le Corbusier is practically the only set on the film, so let’s get back to its creation genesis: the project. This article will investigate then, in general, how it was designed, from which architect's and client’s intentions, how was its integration into the urban fabric centre of La Plata, and what representations it figures in architectural readings. Secondly, seeking a symbolic characterization of bodies that inhabit the film, it will present the dichotomy between representations of the modern body and the grotesque body in parallel with the characters of Leonardo and Victor. And finally, it will bring the description of some situations of the film that, by showing the dynamic relationship between body and space, problematize not only Le Corbusier design on modernist house, but also the design activity itself.

LE CORBUSIER’S HOUSE IN LA PLATA

Fig. 1: Le Corbusier and the model of Casa Curutchet.

Available at: <http://tecnne.com/casa-curutchet/>.

The Curutchet House is the result of a project commissioned for Le Corbusier in 1948 by the argentine surgeon Pedro Curutchet: a typical modern man. Ergonomics scholar, he created his own surgical objects. As a doctor, he admired corbusian concerns about insolation and hygiene, and these were probably the characteristics that led him to hire the franco-swiss architect (Leão, 2007, p.4).

Le Corbusier answers Curutchet’s invitation in a letter:

‘This program – the home of a doctor – is extremely seductive (from a social point of view). Your land is well located and in good conditions. Finally, having worked on the urban plan for Buenos Aires between 1938-1939, which is currently being considered by the government, I am interested in the idea of ​​holding a small home construction, which would be a small masterpiece of simplicity, convenience and harmony, always within the limits of an extremely simple construction with no frills, perfectly in line, on the other hand, with my habits’ (Le Corbusier and Dr. Peter Curutchet correspondence in 1948, cited in Gardinetti, 2012, n.p., our translation).

Since then, the project begins to be developed by distance by Le Corbusier, who was working concurrently in the Marseille Housing Units design. Le Corbusier had never personally met Dr. Curutchet, and not even visited the land where the house was built. His only passing through La Plata took place years before, in 1929, on his only trip through Latin America.

The whole design process and the home run are recorded in exchange of correspondence between architect and client. In the first letter to Le Corbusier, Dr. Curutchet sends photos of the area, the cadastre plan and program needs. Married with two daughters, he makes two programmatic requirements: that he wanted an office at home, but with independent access, and that the main rooms should be facing the park in front of the house. Le Corbusier shows, in response, concerns with the limits for the construction:

‘How are built the neighboring houses to yours, right and left? Do they reach the sidewalk limit? Do I have to build up to the limit of the municipal line, or can I get away from this limit? I can take advantage of the municipal line if forced to do so. Can we build counters that advance the facade, as seems indicated in one of the photos you sent me? It would be very helpful if you draw sketches in the occupation of the land by its neighbors’ (Le Corbusier and Dr. Peter Curutchet correspondence in 1948, cited in Gardinetti, 2012, n.p., our translation).

The project is completed and Le Corbusier sends the boards to Dr. Curutchet, accompanied by a descriptive memorandum on May 24, 1949. At the memorial, the architect describes the project synthetic and objectively, highlighting some important aspects of its design. Following are some excerpts that are relevant for the present discussion, with some marks added on porpouse:

‘It occupies all the ground with stilts in order to raise the house to an open floor under the roof garden, benefiting the views of the park, protected from traffic and the curious.

The construction is extremely bright and will not disturb the place , allowing you to take all possible advantages of the land. [...] The Curutchet build is independent of the side walls in order to ensure the soundness for work and to avoid disturbances of neighboring homes and threats to the security of its construction.

Let me be clear that I am at your disposal to make all the changes you want. However, I say that this should not be anything but changes in detail, because I have the precise feeling of having held its ground as effectively as possible to respond to your program and its resources, as well as to the ground’s imperfections.

The entire project is established through the Modulor [...]. That is an harmonic measurement system that we have created for over 7 years and apply to our buildings [...]. It is from the Modulor that we have achieved, on one hand, considerable savings in volume, and on the other, a harmony that would have been impossible without it’ (Le Corbusier cited in Gardinetti, 2012, n.p., our emphasis, our translation).

Fig. 2: Le Corbusier’s project for the Casa Curutchet, boards sent to Dr. Curutchet in May,1949.

Available at: <http://tecnne.com/casa-curutchet/>.

In general, Le Corbusier’s project consisted of an ingenious solution to Dr. Curutchet needs: two volumes interspersed by a compartment inside – where it should be planted, and in fact was, a large tree – being the front composed by the office and dependency services, and the other retreated, where is the residence itself. The two are connected by a ramp that allows access from the ground level, both to the hall which gives access to the residence, as to next level, the office. The residence unfolds on two floors: the first corresponds to the living area and kitchen, whose floor quota is the same of the office coverage quota, over which develops a terrace giving view to the park; and the second corresponds to house rooms. The traffic between floors is given by a ladder located at the bottom of the whole construction.

Le Corbusier responds to the key demands of Dr. Curutchet: house and office separated, and rooms overlooking the park. Moreover, what he owns is a Le Corbusier house, as Dr. Curutchet himself will write the architect in 1957, four years after moving:

‘The piece is visited by students and professionals... The general public has increasingly understood what seemed strange to them at first. This is 'the house of Le Corbusier'; I am proud to be the owner. So I tell you and I want to repeat, you can make any statement that will be fulfilled and grateful. It is and will remain your home’ (Le Corbusier and Dr. Peter Curutchet correspondence in 1948, cited in Gardinetti, 2012, n.p., our emphasis, our translation).

Fig 3: Casa Curutchet house in 2008. Source: Olivier Martin-Gambier 2008 © FLC/ADAGP.

Available at: <http://tecnne.com/casa-curutchet/>.

The Curutchet House is legitimized as a milestone in modern architecture by several aspects: first, because it is a Le Corbusier work and the only one in Latin America; second, by bringing together the key assumptions of Le Corbusier's architecture of the 20s: pilotis, tape window, patio with garden, independent structure, free facade, as well as the concept of an architectural promenade; and third by also gather characteristics of a transition in the work of Le Corbusier, beginning in the 1930s to the post-war, where a concern with the spirit of the age (Zeitgeist) gives gradually a certain space to the spirit of the place (genius loci). Thus, House Curutchet is usually considered as a conceptualist work, respectful with the alignments, conditions and geometry of a traditional city like La Plata, differentiating itself from an isolated building on the lot, characteristic feature of architectural modernity of years 20-30 (Leão, 2007, pp.16-17).

In the passage of the letter transcribed above, Dr. Curutchet seemed taken by a transcendent feeling that, in addition to resolve their family organization issues, the house built for him would have a greater contribution to art. However, the Curutchet family moved into the house in 1953, and the harassment of onlookers eagered to see Le Corbusier’s house, intensified and broke into the family routine. Moreover, Curutchet claimed excess of light and privacy issues that were not solved with a simple curtain because of the owner’s fear of disfiguring the work. In 1965, eight years after moving, the Curutchet’s left the house (Leão, 2007, p.12).

‘It is rather the tyranny of architecture, the idea of the architects that sometimes tyrannize the life of the owner, requires them to live under concepts, sometimes theoretical; life does not require abstraction, see the light only by light, or plans, or volumes, it depends on the dweler psychology’ (Interview of Peter Curutchet Daniel Casoy in 1983, cited in Johnston, 2012, our translation).

MODERN BODY AND GROTESQUE BODY: REPRESENTATIONS OF A MODERN DUEL

What can we say about Dr. Curutchet and Le Corbusier house strangeness relationship? There is a question to be raised, that is in modern architecture thought genesis, which is fundamental to their projects design, and that will impact mainly residential projects: the relationship that modern rational thought establishes with the body.

The seventeenth century marks the advent of the mechanistic philosophy in Western Europe, and reflections about nature started to avoid transcendent causes to bring them to man’s reason. Astronomy and Galilean physics will then introduce a definite epistemological fracture, where mathematics abstract formulas will refute sensory data and men’s orientation sense in space. Nature, therefore, empties its mysteries to become a mechanical device at men’s hands. Knowledge must be useful, rational, devoid of feeling and capable of producing social effectiveness.

In philosophy, Descartes' thinking is fundamental to modern rationality rise. Descartes will write: 'The universe is a machine in which there is absolutely nothing to consider except the figures and movements of its parts' (Descartes cited in Le Breton, 2013, p.102). The Cartesian mechanical metaphor attributed to universe is also truth in its assignment to body. Descartes will establish a body subordinate to the mind, opposing them in a radical duality: individual is divided into two parts, the body and the mind, connected by pineal gland. In his Discourse on the Method (1637) the soul (mind) would be the representation of the self, and its essence or nature consists only in thinking, not depending on any material thing (the body) to exist. The Cartesian man is composed of a bond between a soul that finds meaning only in thinking, and a body, or rather a body machine, reduced to a simple extension of the soul.

‘[…] and truly one can very well compare the machine nerves that I will describe to the pipes of this fountain machines; your muscles and tendons to the various gears and features that serves to move them; its animal spirits to the water that moves them, whose heart is the fountain and the hollows of the brain are the looks. Furthermore, respiration and other such actions, which are natural and common and depend on the course of the spirits are as movements of the clock or the mill that makes the ordinary course of water continuous’ (Descartes cited in Le Breton, 2013, p.120, our translation2).

Conceptually, this body machine is like a simple extension of what Le Corbusier had in mind when he designed his project. It can mainly be noted from a measure system adoption that he, himself, elaborated: the Modulor.

This system, developed from a standard human body, should apply to the project as a whole, from measures of furniture to ceilings heights and facade proportions. The word Modulor is composed from module, or unit of measure, and section d'or (golden section), the classical proportion played throughout the renaissance and assumed here by Le Corbusier. The article Modulor 1, from 1948, brings the subtitle: Essay on a harmonious measure to the human scale, universally applicable to architecture and Modern Mechanics. When starting this studies around 1942, Le Corbusier was commissioned by the French National Association for Standardization (AFNOR), that had the task of assisting country's reconstruction after war and to establish standardization measures in national construction. In a first study, Le Corbusier asks one of his assistants:

‘Take a man with his arm raised to 2.20m tall, register it in two overlapping squares of 1.10m, put him astride on the two squares and a resulting third square will give you a solution. The place of the right angle should be able to help you to put the third square. With this tangled, ruled by a man installed inside, I'm sure you'll come to a series of measures that may place according to human height (arm raised) and mathematics’. (Le Corbusier, 1954, p. 35)

This was just a first study and, through a first definition, which considered a man 1.75m tall, Le Corbusier comes to a set pattern from a man 6 feet tall, or 1,829m, provided accordingly to golden section and Fibonacci sequence. The publication of Modulor 1 was followed by numerous changes suggested by mathematicians, engineers, etc. which were incorporated into a new system, perfected in Modulor 2, published in 1950.

Fig 4: Drawings of Le Corbusier representing the mesure system of Modulor. Source: Le Corbusier, 1954.

The concept of the Modulor is a literal reproduction of Le Corbusier’s thoughts on the relationship between body and space, which is purely mathematical, operating in terms of architectural design that same mechanistic thinking related to Cartesian body. It is considered a prototype for body in an attempt to find optimal architectural proportions that could only be derived from a body with ideal proportions - a man with 1.829m height.

According to Le Breton, the constitution of modern body, which passes through this mechanistic conception also implies the 'subject's isolation from others (a social structure that is individualist) in relation to cosmos (raw materials that make up the body has no match elsewhere), and in relation to himself (having a body, more than being a body)' (Le Breton, 2013, p.9).

It is noted that this view goes beforehand by a denial of grotesque body, that body presented in medieval festivals in street carnivals, which are at the heart of sociability, mainly in the fifteenth century. At these parties, bodies mingled indiscriminately in public streets and squares, in a kind of distinct sociability of carnival show current notion, consisted of a collective outpouring mediated by direct physical contact.

According to Alain Corbin, the smells of Paris in the first half of the eighteenth century, result of both bodies agglomeration in public space as moods from latrines, markets, etc. will awaken the supervision of hygienists. Confinement and overcrowding are seen as synonymous of disease and bad smell, and 'the perception of social fumes dangers leads to crowd putrid – people and animal mix - distrust' (Corbin, 1987, p.66). A new odor sensitivity starts to be installed since the need for individualization is growing. The intolerance of other’s people odor is also part of a modern body sensibility establishment.

‘The grotesque body (emphasis added) is formed of reliefs, bulges, it brims with vitality, it is mixed with the crowd, indiscernible, open, in contact to the cosmos, dissatisfied with the limits that it continues to transgress. It is a kind of 'great popular body of the species' (Bakhtin), a body eternally renascent: pregnant of a lifetime to be born or a life to lose, to be reborn yet’ (Le Breton, 2013, p. 47, our emphasis, our translation3).

It is worth noting that despite the modern body and the grotesque body have been placed here in historic opposition, this grotesque body was not holded back, this is not a transition where the individualistic and rational thinking is the founder of a new body. Studying the body means studying what takes shape as a symbolic construction, on the border between individual and relationship with what is external to it. It is the manifested limits of what is individual to what is collective. Therefore, the body can not be seen as a reality itself, but as one of the representations in the social system.

Throughout Western history, this conflict, or rather, this duality between modern body and grotesque body was always present, and one can say that we are just made ​​up the symbolic struggle between the two. And it is this symbolic clash that the film The Man Next Door will bring to discussion.

THE MAN NEXT DOOR – LE CORBUSIER FINDS THE SLEDGEHAMMER

Fig. 5: Frames from The Man Next Door.

From the questions about Curutchet House design process and conceptualizations about the body, we want to use the movie The Man Next Door as a way to problematize the relationship between designed space and the bodies that inhabit it. In general, we will see below that there are several aspects of the narrative that connects Leonardo with the meaning of modern body, which will be confronted directly with your opponent: Victor, the neighbor, the grotesque body. The film’s narrative structure, which sets a clear contest between the two, with opposite behaviors, contributes so that we can see, symbolically, the characteristics of this duality represented by these two characters.

The film begins with a sound of a hammer, and the image of a frame divided in two, one side darker than the other. As the initial credits are shown, the hammering starts from the darker side. The picture, as we see, is the two sides of the same wall, inside and out.

Leonardo wakes up with the hammering sounds, runs through the house looking for the source of the noise. He goes to the street, and discovers that the noise comes from inside his own home. Then, he sees the hole being started on the nearby wall, upstairs, and runs back up to the ramps. At this point, as Leonardo moves through the house, the viewer realizes it is a big house, spacious, modern, with large glass windows and a long ramp. We can already see Le Corbusier’s house, with the modernist elements presented by this first scene.

As it is shown, the hole is being done by the neighbor just in front of one of Leonardo's windows. Noting the fact, he tries to reason with the operator in charge with an authoritative tone, asking him to stop, then calls for the house’s owner, Victor, who is not around till noon, as said by the worker. Leonardo orders the worker to inform the owner that he is looking for him when he arrives. After closing the window, now with his wife and daughter besides him, he sentences – What a terrible country, dammit!.

Fig. 6: Frames from O Homem ao Lado.

The conflict between the neighbors around the window opening help us to put into question various aspects throughout the film: the need for privacy and individuality versus the closeness between neighbors; the transparency and permeability throughout Le Corbusier’s project when facing the park, versus the need to protect the house of neighbor’s look; and mainly puts face to face the modern body of Leonardo, versus the grotesque body of Victor.

As we see along the film, Victor is always trying to establish contact with Leonardo, which evades systematically. He tries to please Leonardo and his wife with gifts, calling to the traditional closeness between neighbors in small towns. But all that is grotesque to Leonardo – Victor’s van with a mirror globe, a cup made of a cattle paw, the preserved boar Victor hunted himself, red flowers with a poem, an iron sculpture – Victor is the grotesque representation and their habits, their way of talking that confronts Leonardo.

The duel between Leonardo and Victor is the duel between modern and grotesque body, mediated by the desire for transparency or resistance to it. Victor just wants a little of the sun that Leonardo has to spare: – I need some sun you do not use, says Victor. The guy who lives in the modern house, all in glass, contradictorily wants to protect himself from abroad: pretends to be working, always busy, always making excuses to avoid straight contact with Victor. In one scene, Victor shouts to Leonardo in the street, calling him to talk about the window. For Leonardo, they could have talked there, but Victor didn’t accept, they should have gone to a bar, as friends. Leonardo claims to be busy, working, and Victor: – You’ve been dozing on the computer for half an hour! He was looking at the office from the street.

For Victor, the logic is simple: a person who lives in a house so open, so visible from the street, would mind with a small window? There's the conflict: the man next door do not want to be seen and do not want to be confronted by the man that threatens him. Despite the desire for privacy, Leonardo appears to be conceited to have his home seen from the street by groups of students, but proves to be bothered when they are tourists; he seeks to install an alarm in the house, but would not put bars avoiding interference on architecture design. It is noted that he shares the same transcendent feeling that Dr. Curutchet showed in his letters to Le Corbusier.

Fig. 7: Frames from The Man Next Door.

This grotesque body, here attributed to Victor, is the body of immediate passions, of that one that expresses it by extensions of his skin, which is not ashamed to be seen shirtless, that dances and have sex, which is his body, and the film strongly builds that image. In contrast, Leonardo's body is coldly built, systematic, it is always well dressed, even indoors, the object that surrounds it are meticulous, bold design objects, the physical relationship with his wife is given by systematic little kisses (biquitos) that she asks him, music is experienced in an intellectual way. And these oppositions are emphasized in order to highlight the differences between the two, between modern and grotesque, between mechanical and organic, reason and passion, light and dark, the projected and the improvised, between the house of Le Corbusier and its neighborhood.

By allowing his neighbor to die at the end of the film, Leonardo is letting what bothers him dies too, which is what Victor represents: passion, improvisation, a threat to his rationality, which he considers rude, crude, disgusting. Leonardo is the allegorical representation of a modern man, a body that deploys the world that surrounds it, the body-machine, which sees his passions as weaknesses, and that should maintain, through its rationality, control of all situations.

FINAL CONSIDERATIONS

As the film The Man Next Door trivializes the architectural design of the machine of living in an everyday context and puts building transparency, a dear element to modernist architecture design, into question it also puts into question the relationship between modernism and modernization, as problematized by Marshall Berman:

‘Our vision of modern life tends to bifurcate into two levels, the material and the spiritual: some people devote themselves to the 'modernism', seen as a kind of pure spirit, which develops due to artistic and intellectual autonomous requirements; others are in the orbit of 'modernization', a complex of structures and materials processes – political, economical, social – that, in principle, once initiated, develop on their own, with little or no interference of spirits and the human soul’ (Berman, 1986, p.128, our translation4).

The radicality of modernist architecture is evidenced mainly through their 'artistic and intellectual imperatives autonomous' in the sphere of what Berman calls 'modernism' and materializes in buildings precepts of ways of living radical transformation, which later will come into conflict with the same 'complex structures and material processes' that makes up the so-called 'modernization', also by the resistance to it. This brings us closer to the notion of modernity as a complex network of internal contradictions, own by the system that characterizes it – the capitalism. This is not simply making an anachronistic criticism of modernist architecture developed in the twentieth century, but inserting it in the complex process that is modernity, which denies itself all the time because ‘you cannot step twice in the same modernity’ (Berman, 1986, p.138).

The opening scene of The Man Next Door was inspired by a video installation called Productos Caseros, by the Argentinian artist and architect Gaspar Libedinsky. The vídeo documents the transformation of Cárcel de Caseros, a Buenos Aires prison that operated between 1979 and 2000, created to temporarily house men accused of crimes while waiting for trial, but lastly it came to be a proper prison. The project conceived in the 60s provided a number of conveniences to detainees, promising 'a prison that will not be used to punish' and 'comfort behind bars,' which actually never happened. In a rebellion that took place in 1984, detainees brought cells bars down and also the dividers of the visitor’s area, they made holes in building facade, so they could communicate with people outside. I would like to end this article with an excerpt of video’s narrative.

‘These windows served as communication system for 30 years. Through them prisoners accessed the facades and jumped like spiderman, from hole to hole. Thus, architecture, once the primary means of control, is now the main enemy: the panopticon antithesis. While prison system, which seeks to transform human behavior through architecture, Caseros is the equation inversion: a transformation of architecture through human conduct’ (Productos Caseros, 2008, our translation).

Fig. 8: Frames of Productos Caseros.

REFERENCES

Argan, G. C., 1973. El Concepto del Espacio Arquitetonico desde el Barroco a Nuestros Dias. Buenos Aires: Nueva Vision.

Berman, M., 1986. Tudo que é Sólido Desmancha no Ar: a Aventura da Modernidade. São Paulo: Companhia das Letras.

Cohen, J. L., 2007. Le Corbusier: Lirismo da Arquitectura da Era da Máquina. Lisbon: Paisagem.

Comolli, J. L., 2008. Ver e Poder, a Inocência Perdida: Cinema, Televisão, Ficção, Documentário. Belo Horizonte: Ed. UFMG.

Corbin, A., 1987. Saberes e Odores: o Olfato e o Imaginário Social nos séc. XVII e XIX. São Paulo: Companhia das Letras.

Descartes, R., 1637. Discurso do Método. In: R. Descartes, 1973. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, pp. 33-78.

Gardinetti, M., 2012. Casa Curutchet. Revista Tecnne. Available at:<http://tecnne.com/casa-curutchet/> Acesso em: 19 nov. 2015.

JOHNSTON, D. M. 2012. La razón del cliente: Curutchet y Le Corbusier. Diagonal, n. 31. [online] Available at: <http://www.revistadiagonal.com/articles/analisi-critica/larazondelclientecurutchet-lecorbusier/>. [Acessed 28 Jun. 2016]

Leão, S. C., 2007. A modernidade figurativa da Casa Curutchet. In: 7th DOCOMOMO Brasil, Porto Alegre. Available at: <http://www.docomomo.org.br/seminario%207%20pdfs/051.pdf> [Accessed 18 November 2015].

Le Breton, D., 2013. Antropologia do Corpo e Modernidade. Petrópolis: Vozes.

Le Corbusier, 1954. The Modulor. New York: Faber and Faber.

O homem ao lado. 2009. [video] Buenos Aires: Alpha Media; Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales (INCAA). Directors: Mariano Cohn, Gastón Duprat. Original Title: El Hombre de al lado.

Productos Caseros: Operaciones Urbanas, Boquete. 2008. Buenos Aires: [n.n.]. Director: Gaspar Libedinsk. Available at:

1 From the original in Spanish: ‘[...] los antigos eran los más grandes conocedores de la naturaleza, puesto que eran los que en la naturaleza y de la naturaleza debían extraer todos los elementos de su vida espiritual' (ARGAN, 1973, p.15).

2 From the original in Portuguese: ‘[...] e verdadeiramente pode-se muito bem comparar os nervos da máquina que eu vos descrevo às tubulações das máquinas dessas fontes; seus músculos e seus tendões às diversas engrenagens e recursos que servem para movimentá-las; seus espíritos animais à água que os move, cujo coração é a fonte e as concavidades do cérebro são os olhares. Além disso, a respiração e outras tais ações, que lhe são naturais e ordinárias e que dependem do curso dos espíritos, são como os movimentos do relógio ou de um moinho que o curso ordinário da água pode tornar contínuo’ (Descartes cited in Le Breton, 2013, p.120).

3 From the original in Portuguese: ‘O corpo grotesco é formado de relevos, de protuberâncias, ele transborda de vitalidade, está mesclado à multidão, indiscernível, aberto, em contato com o cosmo, insatisfeito com os limites que ele não cessa de transgredir. É uma espécie de 'grande corpo popular da espécie' (Bakhtin), um corpo eternamente renascente: grávido de uma vida a nascer ou de uma vida a perder, para renascer ainda’ (Le Breton, 2013, p. 47, our emphasis).

4 From the original in Portuguese: ‘Nossa visão da vida moderna tende a se bifurcar em dois níveis, o material e o espiritual: algumas pessoas se dedicam ao 'modernismo', encarado como uma espécie de puro espírito, que se desenvolve em função de imperativos artísticos e intelectuais autônomos; outras se situam na órbita da 'modernização', um complexo de estruturas e processos materiais – políticos, econômicos, sociais – que, em princípio, uma vez encetados, se desenvolvem por conta própria, com pouca ou nenhuma interferência dos espíritos e da alma humana’ (Berman, 1986, p.128).