Design ecossistêmico: uma abordagem para descolonizar subjetividades

Coral Michelin, Caio Adorno Vassão, Priscila Arantes

Coral Michelin Basso é graduada em Gestão Ambiental e Mestre em Design. É professora no Istituto Europeo di Design - São Paulo e pesquisadora doutoral no Programa de Pós-Graduação em Design da Universidade Anhembi-Morumbi. Estuda o Pensamento Sistêmico e Complexidade, Design e futuros regenerativos, Ecologia e ecossistemas, Design Ecossistêmico, Descolonização e Feminismo Decolonial. coralbasso@gmail.com http://lattes.cnpq.br/9759090200602830

Caio Adorno Vassão é arquiteto e urbanista, Doutor em Design e Arquitetura, professor no Istituto Europeo di Design - São Paulo e pesquisador associado ao grupo Representações Imaginário e Tecnologia (RITe), vinculado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase nos seguintes temas: Teoria do Projeto, Metadesign, Complexidade, Ecologia Ecossistêmica, Urbanismo, Cidades Inteligentes, Cidade Distribuída, Processos Colaborativos, Teoria da Arte, Epistemologia. caioav@gmail.com http://lattes.cnpq.br/5857678399360729

Priscila Almeida Cunha Arantes é filósofa, Doutora em Comunicação e Semiótica e Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Design da Universidade Anhembi Morumbi. Coordena e leciona o curso Arte: História, Crítica e Curadoria da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e desenvolve pesquisa em colaboração com o Museu de Arte Contemporanea da Universidade de São Paulo. É autora de diversos livros sobre arte e técnica. priscila.a.c.arantes@gmail.com http://lattes.cnpq.br/9220155250600700


Como citar esse texto: MICHELIN, C.; VASSÃO, C. A.; ARANTES, P. A. C. Design Ecossistêmico: uma abordagem para descolonizar subjetividades. V!RUS n. 23, 2021. [online]. Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus23/?sec=4&item=5&lang=pt>. Acesso em: 18 Abr. 2024.

ARTIGO SUBMETIDO EM 15 DE AGOSTO DE 2021


Resumo

A partir do entendimento daquilo que nos constitui como sujeitos — a subjetividade —, o ensaio crítico apresenta um breve panorama da subjetividade euro-antropocêntrica, dada como uma origem da crise planetária vivida atualmente. Contrapõe ao pensamento hegemônico colonizador características das subjetividades indo-americanas, como forma de estimular processos de descolonização da nossa dupla consciência colonizada-colonizadora. Esse feito, de cunho teórico, usou como metodologia de pesquisa a revisão bibliográfica em campos transversais ao design. Nosso objetivo está em explorar referências do Sul, sobretudo dos povos originários do Brasil, de modo a: 1) propor uma subjetividade renovada a partir da descolonização; para então 2) contribuir na formulação de uma prática projetual decolonial. O estudo é usado na elaboração do Design Ecossistêmico, abordagem teórico-prática para projetos regenerativos, sistêmicos e voltados para a criação de futuros plurais. Ao fim, são apresentados dois caminhos formulados para um design decolonial, o da regeneração e o dos futuros plurais.

Palavras-chave Design Ecossistêmico, Subjetividade, Descolonização



1 Introdução

Desde 2019 e dentro do âmbito do Programa de Pós-Graduação em Design da Universidade Anhembi-Morumbi, está sendo formulada uma abordagem teórico-prática para o campo do Design. Chamada de Design Ecossistêmico (D’Eco), a proposta visa apresentar e articular um corpo teórico de base epistemológica complexa, transdisciplinar e anticolonial, com a finalidade de estimular práticas projetuais regenerativas e sistêmicas. A novidade nisto está menos naquilo que inaugura de verdadeiramente inédito e mais na transversalidade das costuras que propõe fazer a fim de efetivamente provocar um design decolonial.

Assim como Guattari (2012a) buscou interconectar três ecologias — da mente, do socius e do meio ambiente — para explicar sua Ecosofia, também o Design Ecossistêmico se baseia na lógica tríplice. A abordagem em formulação estimula a articulação de três dimensões interdependentes de existência para qualquer ação projetual: a subjetiva ou pessoal; a coletiva ou social; e a ecossistêmica ou ambiental (Figura 1). Segundo essa formulação, qualquer projeto que se pretenda “ecossistêmico” — um projeto do âmbito do D’Eco — deve necessariamente engendrar as três esferas. A partir de confluências e sinergias com autores de matriz eurocêntrica, o D’Eco segue seu próprio percurso, buscando raízes em territórios do Sul global.

Fig. 1:As três Dimensões Ecossistêmicas. Fonte: Michelin (2021).

A primeira transversal proposta pelo D’Eco para fundamentar sua dimensão tríplice tem origem na filosofia oriental. O Budismo Vajrayana explica que existem três níveis de geração de carma: o pensamento, a fala e o gesto. Cada ação iniciada em um desses níveis gera uma reação, e isto é carma: nada além de ação e reação, sempre encadeadas, porém nunca previsíveis, uma vez que a realidade é uma miríade de conexões complexamente interdependentes. Nessa perspectiva, vamos da ação mais abstrata — o pensamento — para a mais concreta — o gesto —, sempre partindo de um ser senciente. O encadeamento de eventos que forma a realidade, destarte, costuma partir de sujeitos. A primeira dimensão ecossistêmica é a subjetiva, na qual se manifestam o pensamento, a intenção e o gesto primeiro do sujeito. Esse gesto, chamado primeiro por desencadear eventos, tanto conecta quanto restringe o sujeito a uma coletividade (segunda dimensão ecossistêmica): sua ação reverbera na interconexão e está circunscrita a um contexto social. A ação individual ecoa na dimensão social. Nela, estão os grupos de trabalho, as instituições sociais, as narrativas e os discurso. As dimensões subjetiva e coletiva, de acordo com o D’Eco, estarão territorializadas na ambiental, locus da terra, da matéria, dos seres além-humanos que negociam conosco a existência. Vemos, assim, que as três dimensões do Design Ecossistêmico, como na filosofia budista, também se apresentam segundo uma trajetória que vai de um nível mais abstrato até um mais concreto: do pensamento à matéria da existência terrena.

O propósito deste ensaio é duplo: primeiramente, está em fazer uma breve discussão sobre a primeira dimensão ecossistêmica, para então propor uma subjetividade renovada a partir da descolonização do pensamento euro-antropocêntrico. Subjetividades alternativas são necessárias neste momento em que passamos por uma transição planetária sem precedentes, a qual atingimos estando alimentados pelos agenciamentos colonizadores. Sujeitos renovados precisam conceber novas realidades e novos futuros se quisermos dar continuidade à vida em Gaia1. Destarte, o segundo objetivo está em propor caminhos decoloniais para a prática projetual. Para dar conta desse objetivo, a metodologia usada foi a pesquisa bibliográfica, com revisão sistemática da literatura levantada em periódicos e livros nacionais e internacionais, cujos temas pertencem ao âmbito da pesquisa. O ensaio se beneficia do percurso investigativo mais abrangente empreendido no doutorado mencionado, caracterizado por ser uma pesquisa qualitativa de cunho teórico. Alguns temas que pertencem a essa investigação são, entre outros: descolonização, decolonialidade, design decolonial, design regenerativo, pensamento complexo, pensamento ameríndio, antropocentrismo e antropoceno. Servem para a formulação do quadro de referências as próprias bibliografias dos livros e artigos lidos, que sinalizam o que o campo decolonial tem estudado e usado como aporte. Sendo uma decorrência da pesquisa em curso, este ensaio também se baseia na análise desse quadro de referências teóricas, de modo a extrair as costuras e pontes propostas e que buscam atender os objetivos citados. Para o texto aqui apresentado, a revisão bibliográfica se deu majoritariamente em campos além do design, uma vez que o tema “design decolonial” é recente e encontra poucas referências embasadas nas epistemologias originárias do Brasil pré-colonial. Também dessa forma esperamos chegar a formulações mais autênticas e quiçá ainda não exploradas. Por exemplo, a perspectiva ameríndia dos escritores indígenas trouxe valiosas contribuições para que fossem sugeridas, ao final do texto, possibilidades para o design que se dispuser regenerativo.

2 Sujeitos e subjetividades

Podemos entender um sujeito como aquele que expressa, em pensamento e gesto, a sua subjetividade, única e pessoal. Sujeito é aquele que age a partir dos princípios, valores, regras de conduta e das milhares de influências que carrega dentro de si. Movimenta-se em ação política, no sentido de estar em negociação com um complexo tecido social que entrecruza bilhões de outros seres. Sob um aspecto mais primordial, sujeito é qualidade de todo ser que “computa/atua de modo egoautocêntrico e autoegorreferente” (MORIN, 2015, p. 185). O primeiro ato de circunscrição do sujeito é o imunológico: o que diferencia o organismo, o “si”, do “outro”, para defender sua integridade perante o que não é “si”. Esse ato de distinção ontológica separa a existência em duas esferas, segundo Morin (2015, p. 181): “[...] uma central, da autoafirmação de si como Unidade, Totalidade, Finalidade; outra potencialmente negativa, [...] exterior e periférica, do incerto, do perigo, do ‘ruído’”. Essa origem tão basal de diferenciação e contraposição si/não-si é a raiz profunda da dicotomia que, até hoje, faz nosso pensamento ser turvo e disjuntivo, torna-nos egoístas em construção e funcionamento.

A partir dessa base, o sujeito se complexifica e adquire características psicológicas, humanísticas, computantes, entre outras, tornando o conceito ao mesmo tempo lógico, organizacional, ontológico e existencial (MORIN, 2015). De acordo com Deleuze (2012, p. 99), “O sujeito se define por e como um movimento, movimento de desenvolver-se a si mesmo”. Sendo a subjetividade uma transcendência, uma mediação. Tal movimento se dá na relação dialógica entre desenvolver-se a si mesmo e devir outro; na relação de distinção si/eu ↹ não-si/outro2, de Morin . O sujeito, organismo computante que apreende o mundo ao seu redor com movimentos dialógicos entre ser e distinguir-se, age de acordo com a interpretação que faz dessa vivência. É, portanto, um ser de artifícios, um ser criativo (DELEUZE, 2012). Ao movimentar-se entre a afirmação de si — sua autoegorreferenciação — e seus possíveis devires, o sujeito inventa a si e ao mundo ao seu redor. O sujeito, ao existir, concebe as condições da própria existência e a modifica conforme o que vê, absorve, computa, presume ou compreende: para distinguir-se, cria a distinção. E o que apreende do mundo esse sujeito nesse fluxo empírico de experiências e distinções? Do que está feita sua subjetividade?

Traçamos outra transversal Norte-Sul, aproximando a resposta de Nicolelis (2020), para quem o cérebro é O verdadeiro criador de tudo. Nessa obra, o autor explica como, por meio de suas funções neurais, o cérebro absorve, interpreta e armazena informações em uma Cosmologia Cerebrocêntrica que organiza e cria todo o universo conhecido. Nicolelis (2020) organiza essa Cosmologia em sete níveis de construções mentais, das menos às mais abstratas; das memórias ao culto às máquinas, por exemplo, passando por mitos, ideologias e religiões, entre outras abstrações que criamos e usamos para dar sentido ao universo ao nosso redor (NICOLELIS, 2020). Nossa subjetividade, vista sob esse ângulo, é uma colcha de retalhos de criações cerebrais altamente complexas, desenvolvidas ao longo de toda história humana. Tal mosaico, ademais, também está suscetível à concorrência de agenciadores: componentes que competem para a produção de subjetividades, como os elementos fabricados pelas indústrias de comunicação e mídia e aqueles que se manifestam através da educação e da família, exemplifica Guattari (2012b) ao explicar a heterogênese da subjetividade à luz da psicanálise.

À essas perspectivas, podemos acrescentar aquela do pensamento selvagem, isto é, dos povos que foram vistos como “primitivos” pelos colonizadores, que vê subjetividade em toda forma de vida, não apenas nos humanos (TARNAS, 2007). Por tudo isso, entendemos que sujeitos são um continuum de movimentos dialógicos que se dão ao longo de períodos temporais que extrapolam a dimensão de uma vida individual e do Homo. Para além do que herdamos desse contínuo espaço-tempo, em termos de crenças, culturas, mitos, valores e etc., também somos aquilo que emerge de todos os componentes em disputa para a construção das subjetividades. Um dos principais agenciadores da subjetividade moderna — que resiste presentemente — é o processo colonial. Acreditamos ser essa subjetividade moderna e euro-antropocêntrica, uma das principais origens do colapso climático em curso. Vemos como urgente sua desconstrução. Destarte, apresentamos a seguir um panorama dessa construção mental para então propor o resgate das subjetividades indo-americanas como forma de descolonizar-nos rumo a Pluriversos (ESCOBAR, 2018).

3 Visões de mundo criam mundos

As ossadas mais antigas encontradas em Abya Yala3 datam de aproximadamente 12.000 anos atrás (LOPES, 2017). Quando Américos, Colombos e Cabrais aqui desembarcaram, 10.500 anos depois, havia história, sobretudo de cultura oral, de centenas de civilizações, entre pequenos povos tribais e grandes impérios — tão complexos e avançados quanto os impérios orientais da Pérsia e da Babilônia, por exemplo. Mesmo assim, até hoje, a História que nos é ensinada e que conhecemos como nossa é a daqueles que aqui desembarcaram com o fim de conquistar e usurpar em nome de um projeto civilizatório que se pretendia superior ao resto do mundo. Esse projeto foi, e continua sendo, o maior agenciador das subjetividades do planeta: o agenciamento colonizador. Para entendê-lo, precisamos remontar às suas origens.

Como pontua Tarnas (2007, p. 16, tradução nossa), na frase que usamos como título deste capítulo e como enfatiza Haraway (2016, p. 35, tradução nossa), “Importa que pensamentos pensam pensamentos. Importa que conhecimentos conhecem conhecimentos”. Importa saber de onde vem aquilo que constitui nossa subjetividade. É no território que deu origem ao que hoje é a Europa que as primeiras construções mentais antropocêntricas podem ser identificadas. O mediterrâneo, desde a saída dos primeiros hominídeos da África, foi palco de fluxos migratórios, de assentamentos, de rotas comerciais e de encontros entre os incontáveis povos que na região foram evoluindo e dialogando. Tal intensidade de relações serviu para dar vida a grandes abstrações da Cosmologia Cerebrocêntrica: desde a noção de tempo e espaço como conhecemos hoje, até os sólidos mitos religiosos que determinam nosso modus vivendi contemporâneo. Identificamos as primeiras raízes de nosso pensamento euro-antropocêntrico na Antiguidade greco-romana, período em que os atomistas gregos “[...] estabeleceram uma linha demarcatória bastante nítida entre espírito e matéria, retratando esta última como sendo formada de inúmeros blocos básicos de construção” (CAPRA, 2013, p. 34). Além da distinção ontológica feita por Morin, essa pode ser uma das origens culturais da subjetividade dualística que nos caracteriza. É também nessa época que surgem as primeiras histórias de protagonismo humano (NICOLELIS, 2020), como n’A Odisséia de Homero; o princípio da narrativa antropocêntrica cujo ápice pode ser visto na jornada do herói moderno mencionada por Tarnas (2007).

Após a queda do Império Romano, a parte ocidental da região entrou em declínio econômico e intelectual, sendo dominada por uma abstração mental que projetou “[...] tanto uma visão de mundo quanto uma cosmologia diametralmente oposta à dos gregos” (NICOLELIS, 2020, p. 231). Os fenômenos da vida não eram mais explicados por meio da razão e da observação, mas pelo mito e pela crença. A Idade Média viu o crescimento da Igreja Católica, de tal forma influente que muitas de suas abstrações organizam nossa vida até hoje. Goody (2015, p. 26) esclarece que “Categorias espaciais e temporais, originadas de narrativas religiosas, são de tal forma fundamentais e disseminadas como determinantes para nossa interação com o mundo, que nós tendemos a esquecer sua natureza convencional”. São exemplos dessas categorias o calendário que usamos, a semana de sete dias, as horas “úteis” do dia (fruto das horas canônicas decretadas pelo Papa no século VII) e os feriados católicos anuais (NICOLELIS, 2020). Organizadores do nosso modus operandi há mais de mil anos. Enquanto o Ocidente vivia uma estagnação científica e o domínio teológico, o Oriente via o florescimento do seu pensamento criativo, sendo palco para avanços na matemática, na medicina e na astrologia, entre outros campos (GOODY, 2015). Inclusive, muito do renascimento ocidental deve ao desenvolvimento oriental, argumenta Goody (2015).

O Renascimento, período histórico posterior, é visto por muitos como um contraponto ao suposto obscurantismo da Idade Média. A transformação do pensamento foi impulsionada pela Revolução Científica, que impôs uma visão mecanicista, humanista, racionalista e antropocêntrica do mundo, que gradativamente substituiu o geocentrismo e o teologismo então dominantes (CAPRA; LUISI, 2014). Nessa concepção, a humanidade é tipicamente personificada como um homem, “[...] um herói masculino que se levanta acima das constrições da natureza e da tradição, explorando o cosmos, dominando seu ambiente e determinando seu próprio destino” (TARNAS, 2007, p. 12, tradução nossa). O período é tido como o berço da Ciência, desenvolvida através do pensamento de homens que são, até hoje, referência em nossas universidades. Tal evolução, encarada como uma jornada do obscurantismo ao progresso (TARNAS, 2007), se deu em uma sequência de pensadores.

Esse percurso começa com Copérnico que, ao deslocar a Terra e colocar o Sol no centro do Universo, termina com o domínio teológico nas explicações científicas (CAPRA; LUISI, 2014; NICOLELIS, 2020; TARNAS, 2007). Essa talvez tenha sido a revolução mais importante do período, uma vez que sedimentou a centralidade de toda criação no Homem racional: o Sol, a Luz, a Razão, não mais o mito da criação divina, no centro do Universo. Tarnas (2007) aponta que não à toa o nascimento do cosmos moderno e do sujeito (self) moderno têm origem no mesmo momento histórico. O próximo pensador de interesse aqui é Bacon, cujas ideias despiram a Terra de seu caráter vivo de mãe nutridora para adquirir as feições mecanicistas que justificariam a sua exploração em nome do capital (SHIVA, 2016; CAPRA, 2013). Diz Shiva (2016, p. 17, tradução nossa) que, em seu método “[...] existia uma dicotomização entre os princípios feminino e masculino, mente e matéria, objetivo e subjetivo, racional e emocional” de tal forma que o “masculino e científico” dominam “a natureza, a mulher e o não-ocidente”. Já Descartes foi o sujeito responsável por dicotomizar de vez nosso pensamento, dando absoluta primazia pela razão em detrimento do espírito e da emoção. Apenas a razão lógica poderia explicar os fenômenos e o funcionamento do cosmos, visto como uma máquina. (CAPRA; LUISI, 2014). Por mais de três séculos, o reducionismo de Descartes foi o único método científico aceito no mundo ocidental, tornando-se um agente de dominação política e econômica, dicotomizando a relação Homem/Natureza (SHIVA, 2016).

Com esse panorama, vemos que a Ciência, globalmente aceita como um sistema de conhecimento objetivo, não é senão subjetiva: ela é um projeto criado em um território específico, dentro de um contexto patriarcal, colonizador, embranquecido e patrocinado por instituições de dominação (SHIVA, 2016). Foi justamente esse o pensamento a desembarcar em Abya Yala, a partir de 1.500 A.C.

4 Uma outra subjetividade

Os colonizadores, quando aqui desembarcaram, enxergaram os povos de Abya Yala como primitivos a serem conquistados pela consciência superior. Entendemos que tal condição de primitividade foi imposta, ao longo da trajetória humana, aos mais diversos povos de Gaia, frequentemente como forma de justificar guerras e saques, além de forjar distinções étnicas e míticas. O movimento hegemônico de conquista e massificação é uma constante ao longo da migração e da evolução humana na Terra. O chamado para essa abstração civilizatória “[...] sempre foi justificado pela noção de que existe um jeito se estar aqui na Terra”, uma maneira embasada em concepções de verdades “[...] que guiou as escolhas feitas em diferentes períodos da história” (KRENAK, 2019, p. 11). Nosso recorte, contudo, diz respeito à hegemonização levada a cabo pelas grandes navegações que deram início ao processo de colonização das terras do Sul Global. Uma vez que o D’Eco ocupa-se, na sua terceira dimensão ecossistêmica, do próprio território, do seu locus de articulação projetual, nosso interesse, já que estamos no Brasil, é o conflito resultante do encontro entre a subjetividade colonizadora e as subjetividades indo-americanas de Abya Yala e, mais especificamente, dos povos originários de Pindorama4. Isto sempre a partir da compreensão de que subjetividades são muitas, são plurais, como são as formas da existência, como é próprio da metamorfose de Coccia (2020) e como ocorre nos tentáculos de infinitas conexões da “humunidade” de Haraway (2016).

Poderíamos questionar a primitividade com a qual nos estigmatizaram remontando alguns desenvolvimentos científicos das civilizações que aqui habitavam, como o sistema contábil dos povos andinos, desenvolvido antes do século XI (LOPES, 2017). Ou apontar para a diversidade das centenas de povos que, ao longo de todo caminho de Peabiru — estrada de 3.000 quilômetros que ligava o litoral paulista às montanhas andinas —, trocavam ritos, costumes, práticas e produtos (JECUPÉ, 2016). Haveria muito para embasar a defesa de que os povos que aqui viviam não tinham nada de anima nullius — receptáculo vazio —, conceito com o qual o Papa Paulo III justificou a violenta invasão, saque e ocupação dos territórios indígenas pelos conquistadores europeus (SANTOS; MENEZES, 2010). Os sujeitos originários de Pindorama nada tinham de vazios. Eram preenchidos da mesma subjetividade que enxergam em toda forma de vida, pois, para a mente dita primitiva, o mundo natural é permeado de significado cósmico e humano; o mundo, e tudo nele, é anima mundi (TARNAS, 2007).

Na mitologia tupi, Tupã é um desdobramento do Absoluto Incomensurável, Poromonham, algo que podemos aproximar da noção budista da Natureza da Mente (ou a Mente Iluminada de Buda), traçando um paralelo entre filosofias milenares do Sul Global. A partir de Tupã, vibra Nhamandú, o Inominável, aquele que cria mundos cantando. Seus cantos expressam dez princípios norteadores para a humanidade. Um deles fala sobre os ciclos de renovação que regem a existência como um todo: dos pequenos ciclos diários do dia e da noite aos grandes movimentos celestes que influenciam desde estações até grandes revoluções (JECUPÉ, 2016; TARNAS, 2007). É uma visão contrária ao pensamento linear e dual euro-antropocêntrico que prega o desenvolvimento infinito, e contrária à arbitrariedade das mensurações temporais católico-medievais. A sabedoria guarani também diz que cada sujeito tem seu modo único de manifestar sua existência, mas, em essência, as mesmas forças e energias sustentam a todos, o que reforça outro preceito, aquele que “canta” que somos “[...] verdadeiramente uma só grande Vida, desdobrada em muitos indivíduos, assim como os raios de um único sol” (JECUPÉ, 2016, p. 59), “[...] um mesmo corpo, uma mesma vida e um mesmo eu que continua passando de forma em forma, de sujeito em sujeito, de existência em existência” (COCCIA, 2020, p. 27). Coccia (2020) chama esse fluxo contínuo de metamorfose, o que significa dar a todas formas de vida o mesmo valor, a mesma importância: “[...] a metamorfose é o princípio da equivalência entre todas as naturezas e o processo que produz essa equivalência” (COCCIA, 2020, p. 19), contrapondo-o à ideia de progresso e evolução antropocêntrica. Fica assim evidente a natureza não-dualística e não-antropocêntrica das subjetividades indo-americanas.

Outra diferença radical entre o pensamento euro-antropocêntrico e ameríndio refere-se à relação Sujeito-Natureza. A primeira distinção, já mencionada, mostra que o “primitivo” vê como sujeito toda forma de vida, não apenas humana. Contudo, tal relação dialógica e não-dicotômica se traduz em um modus vivendi quase que diametralmente oposto daquele imposto pelo colonizador. Krenak (2019, p. 17) não percebe onde existe “alguma coisa que não seja natureza” — “tudo é natureza”, ele diz. Segundo o autor, o projeto levado a cabo pela colonização é de exaustão da natureza, de sua utilização como recurso e não como parente e fonte de vida. Para muitos povos descendentes das subjetividades ancestrais, ele pontua, a Terra é vista como esse organismo vivo, como “nossa mãe e provedora” em uma perspectiva que vai da necessidade básica à transcendência e “que dá sentido à nossa existência” (KRENAK, 2019, p. 43). Kambeba (2020, p. 25) destaca que: “No contexto da educação indígena, seguir as pegadas dos animais, andar na mata sem estalar as folhas, conhecer as armadilhas na natureza, suas ervas medicinais, [...] são formas de manter uma relação de dependência com a natureza”; como manter um diálogo de igual para igual, de vida para vida. O pensamento ameríndio vê a metamorfose do corpo de Gaia em toda existência terrena: toda vida tem o mesmo valor. Conforme explica Mundukuru (2012, p. 47): “Para nossa gente, a realidade é una, indivisível, e não regida por um desejo individualista ou preocupada com os anseios pessoais”. A relação Sujeito-Natureza não é, portanto, de dominação, e sim de interdependência plural e não-dicotômica. É a mesma conexão que permeia as três dimensões ecossistêmicas do D’Eco. Para a perspectiva ecossistêmica do D’Eco, o pensamento primitivo é um pensamento sistêmico. Assim o sendo, o sujeito ecossistêmico encontra eco no sujeito ancestral.

Enquanto na Europa renascentista a única origem válida do conhecimento vinha da razão, os povos originários praticavam outras formas de acessar o saber que sabiam estar presentes em todos os seres. Desde a introspecção dos pajés em retiro de silêncio até o uso de técnicas xamânicas, passando pela observação cuidadosa do ambiente ao redor, tais modos de acessar e produzir conhecimento geraram explicações de oralidade e visualidade fantásticas — e tão prontas para explicar o funcionamento do mundo quanto aquelas representadas pelas fórmulas matemáticas dos homens da Ciência. Narby (2018, p. 121), em seu livro que aborda a sabedoria xamânica amazônica, explica que “Os mitos dessas culturas estão plenos de imagética biológica e as explicações metafóricas dos xamãs correspondem bem precisamente às descrições que a ciência ocidental começa a dar”. A serpente que dá nome à publicação é, como apontam seus estudos, a fita do nosso DNA; é a linguagem da vida presente em todo organismo vivo, acessível a quem quiser escutá-la, pelos meios que lhe forem convenientes. O acesso xamânico é, segundo os argumentos de Narby e em vista da correspondência das explicações que produz sobre a existência, tão válido quanto aquele possibilitado pelos métodos racionais do colonizador.

5 A dupla subjetividade e a necessidade da descolonização do Design

A gente resistiu expandindo a nossa subjetividade, não aceitando essa ideia de que nós somos todos iguais (KRENAK, 2019, p. 31).

O violento desembarque da subjetividade colonizadora em Abya Yala provocou o aparecimento de uma dupla consciência nos povos que, aqui e a partir de então, negociaram suas existências, segundo Gonçalves (2019). Diz o autor que o que nos une, enquanto descendentes desse embate, é “[...] essa dupla consciência: a colonialidade de um lado e a descolonização do outro. É no confronto entre a condição de expropriação colonial e seu oposto, a subversão descolonial, que podemos reinventar nossa heterogênea unidade” (GONÇALVES, 2019, p. 39). Em nosso entendimento, é justamente — e este é o motivo principal deste ensaio — a partir da identificação de nossas raízes coloniais que começa o processo de desconstrução das mesmas, o processo de descolonização da nossa subjetividade. Narby (2018, p. 144) confirma que “[...] vemos aquilo em que acreditamos, mas não o seu contrário. Para mudar o que vemos, às vezes é preciso alterar nossas crenças”. Precisamos imaginar a vida para qual nos metamorfosear.

O convite de lançar luz a nossas próprias abstrações mentais, nossas crenças, nossos mitos e tudo que compõe a Cosmologia de nossas mentes deveria ser destinado sobretudo àqueles que desconhecem a condição da sua dupla consciência. Não necessitamos fazê-lo aos povos que, há mais de quinhentos anos, reivindicam seu direito à existência conforme suas visões plurais de mundo. Nutrimos a esperança de colaborar para este chamado com o texto aqui apresentado. Cabe agora, apontarmos dois caminhos possíveis que enxergamos para práticas projetuais dentro do âmbito do Design Ecossistêmico, visando à descolonização das subjetividades. O primeiro versa sobre a regeneração, cuja ideia extrapola a dimensão da sustentabilidade, tão difundida atualmente no mundo que clama pelo tal “desenvolvimento sustentável”. Regenerar, em sua etimologia latina, que remonta ao Século XVI, significa “reproduzir”, “revivificar” (CUNHA, 2010). Contudo, cabe aqui propor uma acepção talvez mais complexa para essa palavra, de modo que possamos aproximá-la de subjetividades decoloniais. Propomos a regeneração como uma relação com um tempo que não aquele do calendário gregoriano — abstração mental para domínio das mentes, segundo Nicolelis (2020). Como a capacidade de observar os ciclos naturais para buscar respostas para as decisões a tomar. Regenerar, segundo Wahl (2019), é saber fazer as perguntas certas: como influenciam as fases da lua nas criaturas de Gaia? Como alinhar as decisões de projeto com os ciclos naturais? Como aproximar a lógica projetual daquela da Natureza, vista novamente como provedora, como a teia da vida de Capra?

Um modo de “revivificar” outro tempo é por meio de rituais. As culturas primitivas e os povos originários ainda remanescentes estão cheios deles. O ritual da dança e dos cantos sagrados (JECUPÉ, 2016); o de suspender o céu, alargando as nossas subjetividades para além daquela que nos querem impor (KRENAK, 2019); ou os rituais xamânicos que fazem uso do conhecimento presente em animais e plantas para acessar informações de outras dimensões da existência (NARBY, 2018). Quais cerimônias podem compor uma prática projetual ecossistêmica? Como pode um rito intencionar propósito a um projeto que se queira regenerativo? Como podemos nos conectar a outra frequência temporal, usando o ritual como ferramenta? Por fim, regenerar é um processo que permeia as três dimensões ecossistêmicas, concomitantemente: o sujeito nesse decurso regenerativo, como em toda complexa interdependência, está sempre em relação dialógica com o coletivo social e o ecossistema ambiental, recursivamente criando, transformando e metamorfoseando a existência que vai se desdobrando nesse caminhar. Destarte, regenerar é uma mirada interna-externa do ser; é perceber-se, ao mesmo tempo, único e plural, divino e terreno, um e todos.

O segundo caminho diz respeito aos Pluriversos e futuros plurais, que em muito está relacionado com o primeiro, como dificilmente deixaria de sê-lo. Por muitos anos, o projeto da civilização moderna esteve calcado em uma visão de futuro povoada por máquinas e pela ilusão do progresso e crescimento infinitos. Tal cenário foi espalhado por todo o mundo, a partir das invasões coloniais e ganhou força com a globalização, que é, para Santos (2015), o auge do curso de internacionalização do mundo, por força do capitalismo. Durante centenas de anos, temos vivido de modo a criar futuros dedicados às monoculturas; ao acúmulo de posses materiais; ao dinheiro; à descartabilidade da natureza, vista apenas como recurso; à negação veemente de outras formas de ver, apreender e viver a vida. Estivemos negando outras visões de futuro. O caminho, dessa forma, é não apenas deixarmos de negar a pluralidade de visões que (ainda) existem e propõem formas alternativas de sermos, de nos movimentarmos dialogicamente, como é também a via da imaginação e do sonho. Para os Yanomamis, etnia amazônica cujo líder espiritual e político atual é Davi Kopenawa Yanomami, não há distinção entre a realidade do sonho e da vigília. Tudo é realidade e vida. O sonho é tão real quanto aquilo que se vive desperto. No Budismo, o sonho é apenas uma de seis dimensões da existência da mesma mente que é, ela própria, manifestação da Natureza da Mente — de Poromonham. Tudo é manifestação e criação. No entanto, quando realizamos exercícios metodológicos para experimentar as formulações e as hipóteses do D’Eco — como o jogo-ferramenta de criação de cenários futuros, em teste e atualizações desde 2020 —, percebemos uma dificuldade expressiva dos participantes da ação em conseguirem se “descolar” da realidade atual e da visão euro-antropocêntrica.

Há uma aproximação muito benéfica, nesse sentido, entre o D’Eco, o Design Especulativo, as artes e a ficção científica. Ou seja, o D’Eco se aproxima das maneiras de brincarmos com a nossa capacidade de imaginar novas realidades. Temos observado, nos últimos anos, uma crescente produção de conteúdos que abordam temas como Afrofuturismo, Amazofuturismo e Cyberagreste, entre outras propostas que criam visões de futuro a partir do resgate de ancestralidades e de culturas e modos de ser locais (não hegemônicos). Escobar (2018), com quem nosso estudo encontra grande afinidade, recomenda que o Design pense na direção de um feminismo ecológico, de uma política ecológica, de uma transição, em suma, na linha de um design para um Pluriverso, isto é, o universo da heterogeneidade e da pluralidade. Assim sendo, podemos exercitar nossa imaginação com arte; com a exploração do desconhecido que vive além das paredes de subjetividades viciadas; com a curiosidade das crianças; com um caderno para anotar os sonhos pela manhã, no ritual do despertar. Como podemos sonhar mais?

6 Considerações finais

Fizemos, neste ensaio, um brevíssimo panorama de componentes da subjetividade euro-antropocêntrica com o intuito de buscar insumos para sua desconstrução. Entendemos que visões de mundo criam mundos, como explicam Tarnas (2007) e Haraway (2016), e que, por esse motivo, se quisermos criar um mundo diferente deste que está hoje colapsando, precisamos de perspectivas outras. O tema da descolonização — ou decolonialidade — tem crescido em relevância nos últimos tempos, por apresentar-se como uma alternativa viável a essa mentalidade que prega a dominação da natureza (da mulher e do “primitivo”) pelo homem. Sem, de modo algum, exaurirmos as possibilidades de estudos decoloniais, conseguimos já encontrar alguns indicativos importantes que servem para pensarmos em um Design Ecossistêmico. Isto é, em uma prática projetual voltada para a regeneração e criação de futuros plurais, diversos, inclusivos e sistêmicos.

Os principais achados da pesquisa bibliográfica podem ser vistos em termos comparativos, entre o que chamamos de subjetividade euro-antropocêntrica e subjetividade indo-americana. À dicotomia Homem-Natureza, contrapomos a perspectiva não dualista e interdependente ameríndia, que enxerga subjetividade em toda vida. À supremacia da razão e da lógica para apreender, explicar e criar o mundo, identificamos as muitas formas de acessar o conhecimento — quer seja por técnicas xamânicas, pela observação cuidadosa da natureza-sujeito ou pelo sonho — pertencentes à cultura dos povos originários do Sul Global. A partir disso, propomos a regeneração como um processo que, primeiro, enfrenta a violência que nos constituiu como sujeitos de dupla consciência, ou seja, que rejeita o apagamento de nosso passado pela assimilação colonizadora. E que, em segundo lugar, busca na perspectiva “primitiva”, na visão ancestral, formas “revivificadas” de estarmos em Gaia, de projetarmos para nós e para os demais seres que dividem conosco a existência, rumo a futuros plurais.

Agradecimentos

Ao Programa PROSUP da CAPES, pela bolsa de pesquisa da MSc. Coral Michelin, sob orientação da Dra. Priscila A. Arantes e coorientação do Dr. Caio A. Vassão.

Referências

CAPRA, F. O tao da física: uma análise dos paralelos entre a Física Moderna e o Misticismo Oriental. 2ª Ed. São Paulo: Cultrix, 2013.

CAPRA, F; LUISI, P. L. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. São Paulo: Editora Cultrix, 2014.

COCCIA, E. Metamorfoses. Rio de Janeiro: Dantes Editora, 2020.

CUNHA, A G. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010.

DELEUZE, G. Empirismo e subjetividade: ensaio sobre a natureza humana segundo Hume. 2ª Ed. São Paulo: Editora 34, 2012.

ESCOBAR, A. Designs for the Pluriverse: Radical Interdependence, Autonomy, and the Making of Worlds. Durham and London: Duke University Press, 2018.

GONÇALVES, B S. Nos caminhos da dupla consciência: América Latina, Psicologia e Descolonização. São Paulo/SP: Ed. do Autor, 2019.

GOODY, J. O roubo da história: como os europeus se apropriaram das ideias e invenções do Oriente. 2ª Ed. São Paulo: Contexto, 2015.

GUATTARI, F. Caosmose: um novo paradigma estético. 2ª Ed. São Paulo: Editora 34, 2012a.

GUATTARI, F. As três ecologias. 21ª Ed. Campinas, SP: Papirus, 2012b.

HARAWAY, D. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. USA: Duke University Press, 2016.

JECUPÉ, K. W. O trovão e o vento: um caminho de evolução pelo xamanismo tupi-guarani. São Paulo: Polar Editorial, Instituto Arapoty, 2016.

KAMBEBA, M. W. Saberes da Floresta. São Paulo: Jandaíra, 2020.

KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

LOPES, R. J. 1499: o Brasil antes de Cabral. Rio de Janeiro: Harper Collins, 2017.

LOVELOCK, J. Gaia: um novo olhar sobre a vida na Terra. Tradução Pedro Bernardo. Lisboa: Edições 70, 1995.

MORIN, E. O método II: a vida da vida. 5ª Ed. Porto Alegre: Sulina, 2015.

MUNDURUKU, D. O caráter educativo do movimento indígena brasileiro (1970-1990). São Paulo: Paulinas, 2012.

NARBY, J. A serpente cósmica: o DNA e a origem do saber. Rio de Janeiro: Dantes, 2018

NICOLELIS, M. O verdadeiro criador de tudo: como o cérebro humano esculpiu o universo como nós o conhecemos. São Paulo: Planeta, 2020.

SANTOS, B. S.; MENEZES, M.P. (Orgs.). Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010.

SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 24ª Ed. Rio de Janeiro: Record, 2015.

SHIVA, V. Staying Alive: women, ecology and development. USA: North Atlantic Books, 2016.

TARNAS, R. Cosmos and Psyche: Intimations of a New World View. United States of America: Plume, 2007.

WAHL, D. C. Design de culturas regenerativas. Rio de Janeiro: Bambual Editora, 2019.

1 O termo “Gaia” aqui é usado em referência à Teoria de Gaia de Lovelock (1995), que postula pelo organismo planetário autorregulador responsável pelas condições de vida do planeta.

2 A simbologia (setas para direita e para esquerda em sentido anti-horário) é utilizada para representar a recursividade n’O Método de Morin.

3 Significa “Terra madura”, “Terra viva” ou “Terra em florescimento” na língua nativa do povo indo-americano Kuna e é, para eles, sinônimo de América, em um esforço de identificar sua terra sem o nome de seu usurpador (GONÇALVES, 2019, p. 39).

4 “Terra das palmeiras”, em tupi-guarani. Nome do Brasil antes da colonização — antes de ser nomeado por algo que os conquistadores roubaram dessas terras e transformaram em mercadoria, o Pau-Brasil.

Ecosystemic Design: An Approach to Decolonize Subjectivities

Coral Michelin, Caio Adorno Vassão, Priscila Arantes

Coral Michelin Basso holds a Bachelor's degree in Environmental Management and a Master's degree in Design. She teaches at the Istituto Europeo di Design - Sao Paulo and is a doctoral candidate in the Postgraduate Program in Design at the Anhembi-Morumbi University, Brazil. She studies Systems Thinking and Complexity, Design and Regenerative futures, Ecology and Ecosystems, Ecosystemic design, Decolonization, and Decolonial feminism. coralbasso@gmail.com http://lattes.cnpq.br/9759090200602830

Caio Adorno Vassão is an Architect and Urbanist, Doctor in Design and Architecture and a researcher at the Representations Imaginary and Technology group (RITe) at the Architecture and Urbanism School of the University of Sao Paulo, Brazil. He teaches at the Istituto Europeo di Design - Sao Paulo, and studies Design theory, Metadesign, Complexity, Ecosystemic Ecology, Urbanism, Smart cities, Distributed city, Collaborative processes, Art theory, and Epistemology. caioav@gmail.com http://lattes.cnpq.br/5857678399360729

Priscila Almeida Cunha Arantes is a Philosopher, Doctor in Communication and Semiotics, and a Full Professor in the Postgraduate Program in Design at the Anhembi-Morumbi University, Brazil. She coordinates and teaches at the Graduate Program in Art: History, Criticism and Curatorship of the Catholic University of Sao Paulo, Brazil, and conducts joint research with the Contemporary Art Museum of the University of Sao Paulo, Brazil. She is the author of several books on art and technics. priscila.a.c.arantes@gmail.com http://lattes.cnpq.br/9220155250600700


How to quote this text: Michelin, C.; Vassão, C. A.; Arantes, P. A. C., 2021. Ecosystemic Design: An Approach to Decolonize Subjectivities.Translated from Portuguese by Alex Berta dos Santos. V!RUS, 23, December. [online] Available at: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus23/?sec=4&item=5&lang=en>. [Accessed: 18 April 2024].

ARTICLE SUBMITTED ON AUGUST, 15, 2021/p>


Abstract

From the understanding of what constitutes us as subjects — subjectivity —, this critical essay presents a brief overview of Euro-anthropocentric subjectivity, given as an origin of the planetary crisis currently experienced. We oppose the colonizing hegemonic thought characteristics of Indo-American subjectivities as a way of stimulating processes of decolonization of our colonized-colonizing double consciousness. This feat, of a theoretical nature, used the literature review in fields transversal to design as a research methodology. Our goal is to explore references from the South, especially from the original peoples of Brazil, to 1) propose a renewed subjectivity from decolonization and 2) to contribute to the formulation of decolonial design practice. We use this study to elaborate on Ecosystemic Design, a theoretical-practical approach for regenerative, systemic projects that aims at creating plural futures. In the end, we present two paths formulated for a decolonial design, that of regeneration and that of future plurals.

Keywords: Ecosystemic design, Subjectivity, Decolonization



1 Introduction

Within the scope of the Graduate Program in Design of the University Anhembi-Morumbi in Brazil, we have been formulating a theoretical-practical approach for the field of Design since 2019. Called Ecosystemic Design (D'Eco), the proposal aims to present and articulate a theoretical body with a complex, transdisciplinary, and anti-colonial epistemological basis, to encourage regenerative and systemic design practices. Its novelty lies less in what is truly unprecedented in this inauguration and more in the transversality of the seams it proposes to make to effectively provoke a decolonial design.

Just as Guattari (2012a) sought to interconnect three ecologies — of the mind, of the socius, and the environment — to explain its Ecosophy, Ecosystemic Design is also based on the triple logic. The formulated approach encourages the articulating of three interdependent dimensions of existence for any project action: the subjective or personal, the collective or social, and the ecosystemic or environmental (Figure 1). According to this formulation, any project that intends to be “ecosystemic” — i.e., within the scope of D'Eco — must necessarily engender all three spheres. From confluences and synergies with authors from a Eurocentric matrix, D'Eco follows its path, seeking roots in territories of the Global South.

Fig. 1:The Three Ecosystemic Dimensions. Source: Michelin, 2021.

The first transversal proposed by D'Eco to base its triple dimension has its origins in Eastern philosophy. Vajrayana Buddhism explains that there are three levels of karma generation: thought, speech, and gesture. Every action initiated on one of these levels generates a reaction, and that is karma: nothing but action and reaction, always linked but never predictable, since reality is a myriad of complexly interdependent connections. From this perspective, we go from the most abstract action — thought — to the most concrete — gesture — always starting from a sentient being. The chain of events that form reality, therefore, usually starts with subjects. The first ecosystemic dimension is the subjective one, in which the subject's thought, intention and first gesture are manifested. This gesture, called first for triggering events, both connects and restricts the subject to a collectivity (second ecosystemic dimension): its action reverberates in the interconnection and is limited to a social context. Individual action echoes in the social dimension. It includes work groups, social institutions, narratives, and discourse. The subjective and collective dimensions, according to D'Eco, will be territorialized in the environmental, locus of the earth, of matter, of beings beyond human beings who negotiate existence with us. Thus, we see that the three dimensions of Ecosystemic Design, as in Buddhist philosophy, also present themselves according to a trajectory that goes from a more abstract level to a more concrete one: from thought to the matter of earthly existence.

The purpose of this essay is twofold: first, it is to make a brief discussion about the first ecosystemic dimension, and then to propose a renewed subjectivity from the decolonization of Euro-anthropocentric thought. Alternative subjectivities are necessary at this moment when we are going through an unprecedented planetary transition, which we reached being fed by the colonizing agencies. Renewed subjects need to conceive of new realities and new futures if we are to continue life on Gaia1. Thus, the second objective is to propose decolonial paths for design practice. In order to accomplish this objective, the methodology used was bibliographic research, with a systematic review of the literature collected in national and international journals and books, whose themes belong to the scope of the research. The essay benefits from the broader investigative path undertaken in the aforementioned doctorate, characterized by being a qualitative research of a theoretical nature. Some themes that belong to this investigation are, among others: decolonization, decoloniality, decolonial design, regenerative design, complex thinking, Amerindian thought, anthropocentrism and anthropocene. The bibliographies of the books and articles read serve for the formulation of the frame of reference, which indicate what the decolonial field has studied and used as a contribution. As a result of ongoing research, this essay is also based on the analysis of this framework of theoretical references, in order to extract the proposed seams and bridges that seek to meet the aforementioned objectives. For the text presented here, the bibliographical review took place mainly in fields beyond design, since the theme “decolonial design” is recent and finds few references based on epistemologies originating in pre-colonial Brazil. Also in this way, we hope to arrive at more authentic formulations, and perhaps not yet explored. For example, the Amerindian perspective of indigenous writers brought valuable contributions to suggest, at the end of the text, possibilities for design that might be regenerative.

2 Subjects and subjectivities

We can understand a subject as one who expresses, in thought and gesture, his unique and personal subjectivity. Subject is one who acts based on principles, values, rules of conduct and the thousands of influences that he carries within himself. He moves in political action, in the sense of being in negotiation with a complex social fabric that intersects billions of other beings. From a more primordial aspect, subject is the quality of every being that “computes/acts in an ego-autocentric and self-referential way” (Morin, 2015, p. 185, our translation). The subject's first act of circumscription is the immunological: what differentiates the organism, the “self” from the “other,” to defend its integrity against what is not “self”. This act of ontological distinction separates existence into two spheres, according to Morin (2015, p. 181, our translation): “[...] a central one, of self-assertion as Unity, Totality, Purpose; another potentially negative, [...] external and peripheral, of the uncertain, the danger, the 'noise'”. This very basic origin of differentiation and opposition between self/not-self is the deep root of the dichotomy that, to this day, makes our thinking cloudy and disjunctive, makes us selfish in construction and functioning.

From this base, the subject becomes more complex and acquires psychological, humanistic, computational characteristics, among others, making the concept at the same time logical, organizational, ontological, and existential (Morin, 2015). According to Deleuze (2012, p. 99, our translation), “The subject is defined by and as a movement, movement to develop itself”. Subjectivity being a transcendence, a mediation. Such movement takes place in the dialogical relationship between developing oneself and becoming another; in the self/I ↹ not-self/other2 distinction relation, by Morin. The subject, a computing organism that apprehends the world around him with dialogic movements between being and distinguishing himself, acts in accordance with the interpretation he makes of this experience. He is, therefore, a being of artifices, a creative being (Deleuze, 2012). When moving between self-assertion — his self-referentialization — and his possible becomings, the subject invents himself and the world around him. The subject, when existing, conceives the conditions of his own existence and modifies them according to what he sees, absorbs, computes, presumes or understands: in order to distinguish himself, he creates distinction. And what does this subject apprehend from the world in this empirical flow of experiences and distinctions? What is his subjectivity made of?

We draw another North-South transversal, approaching Nicolelis' answer (2020), for whom the brain is the true creator of everything. In this work, the author explains how, through its neural functions, the brain absorbs, interprets, and stores information in a Cerebrocentric Cosmology that organizes and creates the entire known universe. Nicolelis (2020) organizes this Cosmology into seven levels of mental constructions, from the least to the most abstract; from memories to the cult of machines, for example, passing through myths, ideologies, and religions, among other abstractions that we create and use to make sense of the universe around us (Nicolelis, 2020). Our subjectivity, seen from this angle, is a patchwork of highly complex brain creations, developed throughout human history. Such a mosaic, moreover, is also susceptible to competition from agents: components that compete for the production of subjectivities, such as the elements manufactured by the communication and media industries and those that manifest themselves through education and the family, exemplifies Guattari (2012b) to explain the heterogenesis of subjectivity in the light of psychoanalysis.

To these perspectives, we can add that of wild thinking, that is, of people who were seen as “primitive” by the colonizers, which sees subjectivity in every form of life, not just in humans (Tarnas, 2007). For all that, we understand that subjects are a continuum of dialogic movements that take place over time periods that go beyond the dimension of an individual life and the Homo’s. In addition to what we inherit from this space-time continuum, in terms of beliefs, cultures, myths, values, etc., we are also what emerges from all the components in dispute for the construction of subjectivities. One of the main agents of modern subjectivity – which is currently resisting – is the colonial process. We believe that this modern and Euro-anthropocentric subjectivity is one of the main sources of the ongoing climate collapse. We see its deconstruction as urgent. Thus, we present below an overview of this mental construction and then propose the rescue of Indo-American subjectivities as a way to decolonize us towards Pluriverses (Escobar, 2018).

3 World views create worlds

The oldest bones found in Abya Yala3 date from approximately 12,000 years ago (Lopes, 2017). When Amerigos, Columbuses and Cabrals landed here, in the Americas, 10,500 years later, there was history, mainly of oral culture, of hundreds of civilizations, from small tribal peoples to large empires – as complex and advanced as the eastern empires of Persia and Babylon, for example. Even so, to this day, the History that we are taught and that we know as ours is that of those who disembarked here in order to conquer and usurp in the name of a civilizing project that was intended to be superior to the rest of the world. This project was, and continues to be, the greatest agent of subjectivities on the planet: the colonizing agency. To understand it, we need to go back to its origins.

As Tarnas (2007, p. 16) points out, in the sentence we use as the title of this chapter and as Haraway (2016, p. 35) emphasizes, “It matters what thoughts think thoughts. It matters what knowledges know knowledges.” It is important to know where what constitutes our subjectivity comes from. It is in the territory that gave rise to what is now Europe that the first anthropocentric mental constructions can be identified. The Mediterranean, since the departure of the first hominids from Africa, was the stage for migratory flows, settlements, trade routes and meetings between the countless peoples that evolved and engaged in dialogue in the region. Such intensity of relationships served to give life to great abstractions of Cerebrocentric Cosmology: from the notion of time and space as we know it today, to the solid religious myths that determine our contemporary modus vivendi. We identify the first roots of our Euro-anthropocentric thought in Greco-Roman Antiquity, a period in which the Greek atomists “[...] drew a clear line between spirit and matter, picturing matter as being made of several ‘basic building blocks’” (Capra, 1983, p. 21, our translation). In addition to the ontological distinction made by Morin, this may be one of the cultural origins of the dualistic subjectivity that characterizes us. It is also at this time that the first stories of human protagonism appear (Nicolelis, 2020), as in Homer’s The Odyssey; the principle of anthropocentric narrative whose apex can be seen in the journey of the modern hero mentioned by Tarnas (2007).

After the fall of the Roman Empire, the western part of the region went into economic and intellectual decline, being dominated by a mental abstraction that projected “[...] both a worldview and a cosmology diametrically opposed to that of the Greeks” (Nicolelis, 2020, p. 231, our translation). The phenomena of life were no longer explained by reason and observation, but by myth and belief. The Middle Ages saw the growth of the Catholic Church in such an influential way that many of its abstractions organize our lives to this day. Goody (2006, p. 16) clarifies that “spatial and temporal categories, originating in religious narratives, are such fundamental and pervasive determinations of our interaction with the world that we are prone to forget their conventional nature”. Examples of these categories are the calendar we use, the seven-day week, the “working” hours of the day (fruit of the canonical hours decreed by the Pope in the 7th century) and the annual Catholic holidays (Nicolelis, 2020). Organizers of our modus operandi for over a thousand years. While the West lived a scientific stagnation and theological domain, the East saw the flowering of its creative thinking, being the stage for advances in mathematics, medicine, and astrology, among other fields (Goody, 2006). In fact, much of the Western renaissance owes to Eastern development, argues Goody (2006).

The Renaissance, a later historical period, is seen by many as a counterpoint to the supposed obscurantism of the Middle Ages. The transformation of thought was driven by the Scientific Revolution, which imposed a mechanistic, humanist, rationalist, and anthropocentric view of the world, which gradually replaced the then dominant geocentrism and theologism (Capra and Luisi, 2014). In this conception, humanity is typically personified as a man, “[...] a masculine hero, rising above the constraints of nature and tradition, exploring the great cosmos, mastering his environment, determining his own destiny” (Tarnas, 2007, p. 12). The period is considered the cradle of Science, developed through the thoughts of men who are, until today, a reference in our universities. Such evolution, seen as a journey from obscurantism to progress (Tarnas, 2007) took place in a sequence of thinkers.

This journey begins with Copernicus who, by displacing the Earth and placing the Sun at the center of the Universe, ends with the theological domain in scientific explanations (Capra and Luisi, 2014; Nicolelis, 2020; Tarnas, 2007). This was perhaps the most important revolution of the period, as it cemented the centrality of all creation in the rational Man: the Sun, the Light, the Reason, no longer the myth of divine creation, in the center of the Universe. Tarnas (2007) points out that it is not by chance that the birth of the modern cosmos and the modern subject (self) originate from the same historical moment. The next thinker of interest here is Bacon, whose ideas stripped the Earth of its living character of a nurturing mother to acquire the mechanistic features that would justify its exploitation in the name of capital (Shiva, 2016; Capra, 1983). Shiva (2016, p. 16) says that, in his method “[...] there was a dichotomising between male and female, mind and matter, objective and subjective, rational and emotional” in such a way that the “masculine and scientific” dominate “nature, woman and the non-west”. Descartes, on the other hand, was responsible for definitively dichotomizing our thinking, giving absolute primacy to reason over spirit and emotion. Only logical reason could explain the phenomena and functioning of the cosmos, seen as a machine (Capra and Luisi, 2014). For more than three centuries, Descartes' reductionism was the only scientific method accepted in the Western world, becoming an agent of political and economic domination, dichotomizing the Man/Nature relationship (Shiva, 2016).

With this panorama, we see that Science, globally accepted as an objective knowledge system, is nothing but subjective: it is a project created in a specific territory, within a patriarchal, colonizing context, whitened and sponsored by institutions of domination (Shiva, 2016). That was precisely the thought that landed at Abya Yala, as of 1500 B.C.

4 Another subjectivity

The settlers, when they landed here, saw the peoples of Abya Yala as primitives to be conquered by higher consciousness. We understand that this condition of primitivity was imposed, throughout human trajectory, on the most diverse peoples of Gaia, often as a way to justify wars and looting, in addition to forging ethnic and mythical distinctions. The hegemonic movement of conquest and massification is a constant throughout human migration and evolution on Earth. The call for this civilizational abstraction “[...] was always justified by the notion that there is a way to be here on Earth,” a way based on conceptions of truths “[...] that guided the choices made in different periods of history” (Krenak, 2019, p. 11, our translation). Our perspective, however, concerns the hegemonization conducted by the great navigations that started the process of colonization of the lands of the Global South. Since D'Eco is occupied, in its third ecosystemic dimension, with its own territory, with its locus of design articulation, our interest, since we are in Brazil, is the conflict resulting from the encounter between the colonizing subjectivity and the Indo-American subjectivities of Abya Yala and, more specifically, of the original peoples of Pindorama4. This is always based on the understanding that subjectivities are many, they are plural, as are the forms of existence, as is characteristic of Coccia's metamorphosis (2020) and as it occurs in the tentacles of infinite connections of “humunity” by Haraway (2016).

We could question the primitiveness with which they stigmatized us, retracing some scientific developments of the civilizations that inhabited here, such as the accounting system of the Andean peoples, developed before the 11th century (Lopes, 2017). Or point to the diversity of hundreds of peoples who, along the entire path of Peabiru — a 3,000-kilometer road that linked the São Paulo coast to the Andean mountains — exchanged rites, customs, practices, and products (Jecupé, 2016). There would be a lot to support the defense that the people who lived here had nothing of an anima nullius — empty receptacle — a concept with which Pope Paul III justified the violent invasion, looting and occupation of indigenous territories by European conquerors (Santos and Menezes, 2010). The original subjects of Pindorama were by no means empty. They were filled with the same subjectivity that they see in every form of life, because, for the so-called primitive mind, the natural world is permeated with cosmic and human meaning; the world, and everything in it, is anima mundi (Tarnas, 2007).

In Tupi mythology, Tupã is an offshoot of the Immeasurable Absolute, Poromonham, something that we can liken to the Buddhist notion of the Nature of Mind (or the Enlightened Mind of Buddha), drawing a parallel between millenary philosophies of the Global South. From Tupã, Nhamandu, the Unnamable, vibrates, the one who creates worlds by singing. His songs express ten guiding principles for humanity. One of them talks about the renewal cycles that govern existence as a whole: from the small daily cycles of day and night to the great celestial movements that influence from seasons to great revolutions (Jecupé, 2016; Tarnas, 2007). It is a vision contrary to linear and dual Euro-anthropocentric thinking that preaches infinite development, and contrary to the arbitrariness of medieval Catholic temporal measurements. The Guarani wisdom also says that each subject has its unique way of manifesting its existence, but, in essence, the same forces and energies sustain everyone, which reinforces another precept, the one that “sings” that we are “[...] truly one great Life, unfolded in many individuals, just like the rays of a single sun” (Jecupé, 2016, p. 59, our translation), “[...] the same body, the same life and the same me that continues to pass by from form to form, from subject to subject, from existence to existence” (Coccia, 2020, p. 27, our translation). Coccia (2020) calls this continuous flow metamorphosis, which means giving all forms of life the same value, the same importance: “[...] metamorphosis is the principle of equivalence between all natures and the process that produces this equivalence” (Coccia, 2020, p. 19, our translation), contrasting it with the idea of anthropocentric progress and evolution. The non-dualistic and non-anthropocentric nature of Indo-American subjectivities is thus evident.

Another radical difference between Euro-anthropocentric and Amerindian thought refers to the Subject-Nature relationship. The first distinction, already mentioned, shows that the “primitive” sees every form of life, not just human, as a subject. However, such a dialogical and non-dichotomous relationship translates into a modus vivendi almost diametrically opposite from that imposed by the colonizer. Krenak (2019, p. 17, our translation) does not see where there is “something other than nature” — “everything is nature,” he says. According to the author, the project carried out by colonization is the exhaustion of nature, its use as a resource and not as a relative and a source of life. For many peoples who descended from ancestral subjectivities, he points out, the Earth is seen as this living organism, as "our mother and provider" in a perspective that goes from basic need to transcendence and "which gives meaning to our existence" (Krenak, 2019, p. 43, our translation). Kambeba (2020, p. 25, our translation) highlights that: “In the context of indigenous education, following the footsteps of animals, walking in the forest without cracking the leaves, getting to know the traps in nature, its medicinal herbs, [...] are ways of maintaining a relationship of dependence with nature”; how to maintain a dialogue of equals, from life to life. Amerindian thought sees the metamorphosis of Gaia's body into all earthly existence: all life has the same value. As Mundukuru explains (2012, p. 47, our translation): "For our people, reality is one, indivisible, and not governed by an individualistic desire or preoccupied with personal desires." The Subject-Nature relationship is not, therefore, one of domination, but one of plural and non-dichotomous interdependence. It is the same connection that permeates D'Eco's three ecosystemic dimensions. For D'Eco's ecosystemic perspective, primitive thinking is systems thinking. Therefore, the ecosystemic subject finds an echo in the ancestral subject.

While in Renaissance Europe the only valid source of knowledge came from reason, the original peoples practiced other ways of accessing knowledge that they knew to be present in all beings. From the introspection of shamans in a silent retreat to the use of shamanic techniques, through the careful observation of the surrounding environment, such ways of accessing and producing knowledge generated explanations of a fantastic oral and visual quality – and as ready to explain the workings of the world as those represented by the mathematical formulas of the men of Science. Narby (2018, p. 121, our translation), in his book dealing with Amazonian shamanic wisdom, explains that "The myths of these cultures are full of biological imagery and the metaphorical explanations of the shamans correspond very precisely to the descriptions that Western science is beginning to provide". The snake that gives the publication its name is, as his studies point out, the strand of our DNA; it is the language of life present in every living organism, accessible to anyone who wants to hear it, by whatever means are convenient. Shamanic access is, according to Narby's arguments and in view of the correspondence of the explanations it produces about existence, as valid as that made possible by the rational methods of the colonizer.

5 The double subjectivity and the need for the decolonization of Design

We resisted expanding our subjectivity, not accepting the idea that we are all equal (Krenak, 2019, p. 31, our translation).

The violent disembarkation of colonizing subjectivity in Abya Yala provoked the appearance of a double consciousness in the peoples who, here and since then, negotiated their existence, according to Gonçalves (2019). The author says that what unites us, as descendants of this clash, is “[...] this double consciousness: coloniality on the one hand and decolonization on the other. It is in the confrontation between the condition of colonial expropriation and its opposite, decolonial subversion, that we can reinvent our heterogeneous unity” (Gonçalves, 2019, p. 39, our translation). In our understanding, it is precisely – and this is the main reason for this essay – from the identification of our colonial roots that the process of deconstructing them begins, the process of decolonization of our subjectivity. Narby (2018, p. 144, our translation) confirms that “[...] we see what we believe, but not the opposite. To change what we see, it is sometimes necessary to change our beliefs." We need to imagine the life to which to shapeshift.

The invitation to shed light on our own mental abstractions, our beliefs, our myths, and everything that makes up the cosmology of our minds should be aimed at those who are unaware of the condition of their double consciousness. We do not need to do this to peoples who, for more than five hundred years, have claimed their right to exist in accordance with their plural visions of the world. We hope to contribute to this call with the text presented here. It is now appropriate to point out two possible paths that we see for design practices within the scope of Ecosystemic Design, aiming at the decolonization of subjectivities. The first deals with regeneration, an idea that goes beyond the dimension of sustainability, which is currently so widespread in the world that calls for such “sustainable development.” Regenerate, in its Latin etymology, which dates back to the 16th century, means “to reproduce”, “to revive” (Cunha, 2010). However, it is here to propose a perhaps more complex meaning for this word, so that we can bring it closer to decolonial subjectivities. We propose regeneration as a relationship with a time other than that of the Gregorian calendar – mental abstraction for the control of minds, according to Nicolelis (2020). Such as the ability to observe natural cycles to seek answers to decisions to be made. Regenerating, according to Wahl (2019), is knowing how to ask the right questions: how do the phases of the moon influence the creatures of Gaia? How do we align design decisions with natural cycles? How do we approximate design logic to that of Nature, seen again as provider, as Capra's web of life?

One way of “reviving” another time is through rituals. Primitive cultures and native peoples still remaining are full of them. The ritual of dance and sacred songs (Jecupé, 2016); that of suspending the sky, extending our subjectivities beyond what they want to impose on us (Krenak, 2019); or shamanic rituals that make use of knowledge present in animals and plants to access information from other dimensions of existence (Narby, 2018). What ceremonies can make up an ecosystemic design practice? How can a rite intend a project that wants to be regenerative? How can we connect to another temporal frequency, using ritual as a tool? Finally, regenerating is a process that permeates the three ecosystemic dimensions, concomitantly: the subject in this regenerative process, as in any complex interdependence, is always in a dialogical relationship with the social collective and the environmental ecosystem, recursively creating, transforming, and metamorphosing existence that unfolds along this path. Thus, regenerating is an internal-external gaze of the being; it is perceiving oneself, at the same time, as unique and plural, divine and earthly, one and all.

The second path concerns the Pluriverses and plural futures, which is closely related to the first, as it would hardly be otherwise. For many years, the project of modern civilization was based on a vision of the future populated by machines and the illusion of infinite progress and growth. This scenario was spread all over the world, from the colonial invasions and gained strength with globalization, which is, for Santos (2015), the peak of the course of internationalization in the world, by force of capitalism. For hundreds of years, we have lived to create futures dedicated to monocultures; to the accumulation of material possessions; to money; to the disposability of nature, seen only as a resource; to the vehement denial of other ways of seeing, apprehending, and living life. We have been denying other visions of the future. The path, therefore, is not only to stop denying the plurality of visions that (still) exist and propose alternative ways of being, of moving dialogically, but also the path of imagination and dream. For the Yanomami, an Amazonian ethnic group whose current spiritual and political leader is Davi Kopenawa Yanomami, there is no distinction between the reality of dreams and vigils. Everything is reality and life. The dream is as real as what you live awake. In Buddhism, the dream is only one of six dimensions of the existence of the same mind which is itself a manifestation of the Nature of Mind — of Poromonham. Everything is manifestation and creation. However, when we conduct methodological exercises to try out D'Eco's formulations and hypotheses — such as the game-tool for creating future scenarios, being tested and updated since 2020 —, we noticed a significant difficulty for the participants of the action to be able to “take off” from the current reality and the Euro-anthropocentric vision.

There is a greatly beneficial approach, in this sense, between D'Eco, Speculative Design, the Arts and Science Fiction. In other words, D'Eco approaches the ways we play with our ability to imagine new realities. In recent years, we have observed a growing production of content that addresses topics such as Afrofuturism, Amazofuturism, and Cyberagreste, among other proposals that create visions of the future based on the rescue of local (non-hegemonic) ancestralities and cultures and ways of being. Escobar (2018), with which our study finds great affinity, recommends that Design think towards an ecological feminism, a political ecology, a transition, in short, along the lines of a design to a Pluriverse, that is, the universe of heterogeneity and plurality. Therefore, we can exercise our imagination with art; with the exploration of the unknown that lives beyond the walls of vitiated subjectivities; with children's curiosity; with a notebook to write down dreams in the morning, in the ritual of awakening. How can we dream more?

6 Final considerations

In this essay, we made a very brief overview of the components of Euro-anthropocentric subjectivity to seek inputs for its deconstruction. We understand that world views create worlds, as explained by Tarnas (2007) and Haraway (2016), and that, for this reason, if we want to create a different world from the one that is currently collapsing, we need other perspectives. The theme of decolonization – or decoloniality – has grown in relevance in recent times, as it presents itself as a viable alternative to this mentality that preaches the domination of nature (of women and the “primitive”) by men. Without, in any way, exhausting the possibilities of decolonial studies, we have already managed to find some important indicators that serve to think about an Ecosystemic Design. That is, in a design practice aimed at the regeneration and creation of plural, diverse, inclusive, and systemic futures.

The main findings of the bibliographic research can be seen in comparative terms, between what we call Euro-anthropocentric subjectivity and Indo-American subjectivity. With the Man-Nature dichotomy, we contrast the non-dualistic and interdependent Amerindian perspective, which sees subjectivity in all life. To the supremacy of reason and logic to apprehend, explain and create the world, we have identified the several ways of accessing knowledge – whether through shamanic techniques, by careful observation of the subject-nature, or by dreaming – belonging to the culture of the original peoples of the Global South. From this, we propose regeneration as a process that, first, faces the violence that constituted us as subjects of double conscience, that is, that rejects the erasure of our past by colonizing assimilation. And, secondly, it seeks in the “primitive” perspective, in the ancestral view, “revived” ways of being in Gaia, of projecting ourselves and other beings who share our existence with us, towards plural futures.

Acknowledgement

To the CAPES PROSUP Program, for the research grant to Coral Michelin (MSc.), under the supervision of Dr. Priscila A. Arantes, and co-supervision of Dr. Caio A. Vassão.

References

Capra, F., 1983. The Tao of Physics: An Exploration of the Parallels Between Modern Physics and Easter Mysticism. 2nd ed. USA: Shambala.

Capra, F. and Luisi, P. L., 2014. A visão sistêmica da vida: uma concepção unificada e suas implicações filosóficas, políticas, sociais e econômicas. São Paulo: Editora Cultrix.

Coccia, E., 2020. Metamorfoses. Rio de Janeiro: Dantes Editora.

Cunha, A G., 2010. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Lexikon.

Deleuze, G., 2012. Empirismo e subjetividade: ensaio sobre a natureza humana segundo Hume. 2ª Ed. São Paulo: Editora 34.

Escobar, A., 2018. Designs for the Pluriverse: Radical Interdependence, Autonomy, and the Making of Worlds. Durham and London: Duke University Press.

Gonçalves, B. S., 2019. Nos caminhos da dupla consciência: América Latina, Psicologia e Descolonização. São Paulo, SP: Author’s edition.

Goody, J., 2006. The Theft of History. UK: Cambridge University Press.

Guattari, F., 2012a. Caosmose: um novo paradigma estético. 2nd ed. São Paulo: Editora 34.

Guattari, F., 2012b. As três ecologias. 21st ed. Campinas, São Paulo: Papirus.

Haraway, D., 2016. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. USA: Duke University Press.

Jecupé, K. W., 2016. O trovão e o vento: um caminho de evolução pelo xamanismo tupi-guarani. São Paulo: Polar Editorial, Instituto Arapoty.

Kambeba, M. W., 2020. Saberes da Floresta. São Paulo: Jandaíra.

Krenak, A., 2019. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras.

Lopes, R. J., 2017. 1499: o Brasil antes de Cabral. Rio de Janeiro: Harper Collins.

Lovelock, J., 1995. Gaia: um novo olhar sobre a vida na Terra. Lisboa: Edições 70.

Morin, E., 2015. O método II: a vida da vida. 5th ed. Porto Alegre: Sulina.

Munduruku, D., 2012. O caráter educativo do movimento indígena brasileiro (1970-1990). São Paulo: Paulinas.

Narby, J. A., 2018. A serpente cósmica: o DNA e a origem do saber. Rio de Janeiro: Dantes.

Nicolelis, M., 2020. O verdadeiro criador de tudo: como o cérebro humano esculpiu o universo como nós o conhecemos. São Paulo: Planeta.

Santos, B. S. and Menezes, M.P. (Orgs.), 2010. Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez. Santos, M., 2015. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 24th ed. Rio de Janeiro: Record.

Shiva, V., 2016. Staying Alive: women, ecology and development. USA: North Atlantic Books.

Tarnas, R., 2007. Cosmos and Psyche: Intimations of a New World View. United States of America: Plume.

Wahl, D. C., 2019. Design de culturas regenerativas. Rio de Janeiro: Bambual.

1 The term “Gaia” is used here in reference to Lovelock's Theory of Gaia (1995), which posits the self-regulating planetary organism responsible for the planet's living conditions.

2 The symbology (counterclockwise left and right arrows) is used to represent the recursion in Morin's Method.

3 It means "Mature Earth", "Living Earth" or "Flowering Earth" in the native language of the Indo-American Kuna people and is, for them, synonymous with America, in an effort to identify their land without the name of its usurper (Gonçalves, 2019, p. 39, our translation).

4 “Land of palm trees,” in Tupi-Guarani, the name of Brazil before colonization — before being named for something that the conquerors stole from these lands and turned into merchandise, the Pau-Brasil (brazilwood).