Comércio informal, identidade e direito: o caso das zungueiras de Luanda

Vera Santana Luz, Áurea Bianca Vasconcelos André

Vera Santana Luz tem graduação em Arquitetura e Urbanismo e é Doutora em Arquitetura e Urbanismo. É professora e pesquisadora do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, onde orienta pesquisas sobre os temas arquitetura, urbanismo, meio ambiente, sustentabilidade e soluções baseadas na natureza, e territórios com fragilidades socioespaciais e ambientais. veraluz@puc-campinas.edu.br http://lattes.cnpq.br/2708934593900531

Áurea Bianca Vasconcelos André é arquiteta e urbanista e pesquisadora do grupo EUCA - Estudos Urbanos Arquitetura, Cultura e Arquitetura, do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Tem como temas de pesquisa: direito à cidade, arquitetura vernacular africana e comércio informal. aureaandre16@gmail.com http://lattes.cnpq.br/3230440459801948


Como citar esse texto: LUZ, V. S.; ANDRÉ, A. B. V. Comércio informal, identidade e direito: o caso das zungueiras de Luanda. V!RUS n. 23, 2021. [online]. Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus23/?sec=4&item=7&lang=pt>. Acesso em: 25 Abr. 2024.

ARTIGO SUBMETIDO EM 15 DE AGOSTO DE 2021


Resumo

Zungueiras é o nome dado a mulheres vendedoras ambulantes do mercado informal angolano, que percorrem quilômetros buscando comercializar seus diversos produtos tais como: alimentos, acessórios e vestimentas. A palavra zungueira deriva do termo zunga, da língua nacional angolana kimbundu, que significa circular, andar à volta, girar. Trata-se de um linguajar utilizado pela população de Luanda para caracterizar os vendedores informais, particularmente os vendedores ambulantes. Esta prática de venda em movimento é produto de mudanças sociais, políticas e econômicas do país, infelizmente marginalizada pelos órgãos públicos. Muitas vezes os fiscais policiais as perseguem usando a força e a violência para expulsarem-nas de áreas de circulação, acabando em alguns casos em mortes destas mulheres. A partir de metodologia de investigação bibliográfica e documental, tem-se como objetivo analisar aspectos do comércio informal das zungueiras em Luanda, perante a postura do Estado, o direito à cidade destas mulheres e a identidade cultural que carregam, cujos resultados apontam para a necessidade de fortalecimento de relações horizontais menos hierarquizadas ou condicionadas pelos imperativos do capital hegemônico, o que é desdobrável a situações análogas no Sul Global. A apresentação deste estudo de caso, entendido no contexto de Sul Global, se dá pela sua compreensão como uma referência de menção válida. A dinâmica urbana de sobrevivência, com raízes socioculturais ancestrais e permeada de contradições entre precariedade e direitos, revela saberes locais e resistência aos desígnios de alinhamento hegemônico a padrões de globalização conduzidos pelo Estado.

Palavras-chave: Zungueiras, Comércio informal, Luanda, Angola, Espaço público



1 Introdução: considerações sobre Luanda

Neste estudo, o Sul Global é entendido, em sua diversidade, como um Sul geopolítico, “uma metáfora usada para identificar o conjunto de movimentos, de ações coletivas contra as formas de opressão, exploração e discriminação” (MENESES, 2016). O estudo de caso das zungueiras busca apresentar um fenômeno localizado, cuja discussão revela, porém, tensões recorrentes entre a luta por direitos, a precariedade de contingentes urbanos e a disputa entre hábitos e saberes vernaculares perante forças de modernização em moldes globalizados. O entendimento deste fenômeno particular, como circunstância desdobrável aos países do universo do Sul Global, se dá pelo seu potencial como referência, cuja validez de menção pode indicar especificidades ou analogias a outros territórios. Destaca-se sua condição como exemplo de contingentes sociais precarizados, na luta por sobrevivência e pelo direito de permanecer em cena pública, neste caso como minoria de gênero em extrema pobreza. Seus expedientes de urgência enlaçados em tensão a modos de vida ancestrais se tornam comprometidos por efeitos históricos coloniais, de guerras por independência nacional e de um certo afã dos extratos dominantes, no sentido de alinhamento ao receituário internacionalizado de globalização à luz do Norte Global.

A metodologia que conduz a investigação – cujo impulso nasce da experiência cotidiana vivida por uma das autoras –, se estrutura pela investigação bibliográfica e documental de aspectos entrelaçados do fenômeno das zungueiras, como circunstância particular a pressões de urbanização condicionadas por forças hegemônicas em Luanda, Angola – país submetido à colonização, escravidão, patriarcado, guerra civil e, mais recentemente, à condição de periferia do Capitalismo globalizado.

A cidade de Luanda, por si só, não representa as especificidades do país. Angola é composta por diversos territórios, em cujos espaços urbanos as zungueiras comparecem recorrentemente. Em seu cotidiano, carregam seu modo de vida como elemento constituidor da paisagem urbana, cujas atividades são consideradas pelo senso comum e pelo Estado como informais, embora possamos entendê-las como incluídas em um sistema de comércio que gera formas de renda e inter relações úteis com o corpo social como um todo. Após conquistar a sua independência dos colonos portugueses, Angola passou por uma longa e duradoura guerra civil que durou aproximadamente trinta anos, de 1975 a 2002. Esta guerra ocorreu no interior do país e contribuiu para um êxodo rural acelerado, fazendo das cidades mais desenvolvidas alvo de migração em busca de segurança e melhores condições de sobrevivência. Desse modo, Luanda acabou se tornando um dos destinos mais procurados por aqueles que buscavam reconstruir suas vidas, especialmente quanto ao aspecto econômico (BETTENCOURT, 2011).

O êxodo rural teve suas consequências; dentre elas, o aumento da densidade populacional em Luanda, a taxa de desemprego elevada e o déficit habitacional na cidade, o que resultou no crescimento de bairros informais. Muitos cidadãos deslocados viram no comércio informal um meio de subsistência, optando pelas vendas ambulantes, serviços de motoristas e de transporte de mercadorias, como os roboteiros, entre outros. Em 2014, a cidade de Luanda abrigava mais de um quarto de habitantes da população do país (GOVERNO DE ANGOLA, 2016). Um dos programas de reintegração da população foi o financiamento de antigos combatentes e ex-militares; contudo, as viúvas destes não se beneficiaram de auxílio financeiro algum do Estado. Segundo Orlando A. Santos (2010), muitas destas mulheres se encontram atualmente na venda ambulante, nas esquinas trocando dólares ou trabalhando como empregadas domésticas, com um salário equivalente a US$50. São, até hoje, discriminadas pelo trabalho que exercem. No entanto, sustentam as suas famílias custeando não só os estudos dos filhos como, muitas vezes, também os esposos (SANTOS, 2010, p. 16-17).

O informal em Luanda, apesar de ser cultural, é, por vezes, criminalizado e excluído do meio urbano, desde o comércio à habitação. O processo de reconstrução, na busca pelas características de uma cidade global, não abre espaço para o informal que, em Luanda, tem a peculiaridade não apenas de retratar a desigualdade ou uma dualidade da cidade, mas também representa cultura e tradição, embora não possamos ignorar as condições de precariedade socioespacial. A dualidade da cidade de Luanda espelha realidades distintas e complementares; se, por um lado, a cidade formal se estruturou ainda durante o período colonial, tendo uma malha viária planejada e infraestrutura correspondente, por outro lado encontra-se a cidade informal, denominada musseques, que se espraia nos limites periféricos em torno da cidade, com densidade populacional crescente e déficit de infraestruturas, como saneamento de esgotos, coleta e destinação de resíduos, provimento de água potável, vias de acesso, iluminação e equipamentos públicos. O escoamento de águas pluviais e as enchentes, o lixo a céu aberto e o transporte público precário agravam ainda mais a qualidade de vida desta população, vítima da desigualdade socioespacial (PRATES, 2016, p. 51).

O Estado angolano tem realizado esforços para alavancar uma cidade em moldes globais, mediante a industrialização e o crescimento econômico; contudo, os planos e projetos de requalificação urbana, especialmente em Luanda, resolvem em parte alguns problemas funcionais, e trazem um ar de renovação estética à cidade, como uma miragem que espelha a precariedade. Apesar de todo crescimento e recuperação após a guerra civil, o incremento econômico angolano tem sido incompatível com as reais necessidades do povo de modo geral. A inclusão socioespacial nestes projetos é questionável, porque a desigualdade em Luanda continua a ser enorme. O conceito e a ressignificação dos musseques têm se alterado ao longo do tempo, consoante as modificações da cidade e de sua população. Atualmente, o comércio informal e os musseques, especialmente para as camadas sociais superiores em termos de poder aquisitivo, e para parcelas do Estado, representam desorganização e marginalidade; para outras camadas sociais são resistência, sobrevivência e subsistência.

Os musseques albergam a maior parte da população luandense que exerce alguma espécie de comércio informal. Segundo Cain (2019), aproximadamente 70% da população reside em musseques ou habitações precárias. Segundo o Instituto Nacional de Estatística do Ministério do Planeamento do Governo de Angola (GOVERNO DE ANGOLA, 2016, p. 71-75), em dados de 2014, somente 31% dos agregados familiares em habitações da população de Angola dispunha de eletricidade e menos de 30% dos agregados familiares em habitações em Luanda tinha acesso a água apropriada para beber; 7% dos agregados familiares em habitações no país apresentava equipamentos sanitários urbanos conectados à rede pública de esgotos, sendo 91% ligados à fossa séptica. Os resíduos são depositados ao ar livre por 59% dos agregados familiares urbanos. Em Angola, 70% das mulheres trabalham na economia informal e 90% dos vendedores ambulantes residem fora do local onde trabalham, sendo que o circuito informal representou, em 2014, a proporção de 60% da economia (QUEIROZ, 2016). Propõe-se, neste artigo, uma abordagem do conceito do informal em Angola, acreditando que a informalidade faz parte do meio urbano das cidades africanas, sendo um modo de auto-organização e subsistência, que interfere no espaço urbano. Conforme Queiroz (2016):

A auto-organização como resposta popular aos obstáculos do cotidiano urbano tem despertado uma nova visão sobre as cidades africanas, como exposto pelo urbanista Abdou Maliq Simone sobre as cidades do Sul Global: Há algo acontecendo, esforços estão sendo feitos, trazendo novos meios de ganhar a vida, de ajudar outras pessoas e criar cidades interessantes (SIMONE, 2011). A informalidade faz parte do conjunto popular de auto-organização, é um meio de apropriação e de produção do espaço (QUEIROZ, 2016, p. 37).

A informalidade no meio urbano e a organização hegemônica representam uma relação paradoxal de interdependência. A característica de uma Luanda dualista já era evidente no período colonial. A diferença entre as classes sociais foi transmitida ao tecido urbano, onde a classe dominante residia no centro, com acesso aos serviços e infraestruturas, e as classes subalternas, em comunidades periféricas, sem infraestrutura e distante dos serviços. Esta dinâmica socioespacial é fruto de uma organização política do espaço que se reflete no estilo de vida, no modo de viver, habitar e se relacionar, o que, de certa forma, repercute nos dias atuais.

Os espaços de troca e venda, mercados e feiras, existem no cotidiano das civilizações desde milênios. Em Luanda, estas instituições foram caracterizadas pelas quitandas. Segundo Van-Dúnem (1987, apud SANTOS, 2011, p. 37) a palavra quitanda é oriunda do termo itânda, no dialeto kimbundo que, no plural kitanda, significa estrado de bordão que serve de banco, expositor de medida, sobretudo para regular a venda de tabaco de corda. Da versão aportuguesada da palavra, surge o termo quitandeira (mulher que exerce negócio em quitanda) da eliminação do “a” e o acréscimo do sufixo “eira”. Nessa versão de quitanda, encontram-se os seguintes significados: mercado, praça, posto de venda de géneros frescos, pequena loja ou barraca de negócios, quinta ou tabuleiro em que se vende pelas ruas (RIBAS, 1989, p. 174, apud SANTOS, 2011, p. 37).

Apesar do comércio informal ter ocorrido, em sua origem, com mais frequência nas zonas periféricas e periurbanas no período colonial, as quitandeiras passaram a circular no centro urbano com maior frequência devido à expansão urbana e modernização. As quitandeiras não eram bem quistas no meio urbano central tanto quanto o eram nas zonas periféricas da cidade. Pantoja (2000) faz menção aos regulamentos e restrições impostas às quitandeiras de Luanda e, posteriormente, ao fomento de conflitos entre as quitandeiras nativas e novos comerciantes europeus, por vagas nas feiras e nos mercados. Neste cenário, as quitandeiras e artesãos que não conseguiam pagar o aluguel, tiveram que se mudar do centro urbano e foram para os musseques, a fim de exercerem as suas atividades comerciais. Tal como aborda Pantoja (2000), em dado momento da modernização, no início do século XXI:

A cidade de Luanda toma nova configuração e as quitandeiras tendem a desaparecer do cenário luandense. Sem condições de habitação na cidade, as casas africanas foram se concentrando nos musseques. O mercado ficou para umas poucas que podiam pagar aluguer do espaço e competir com empresas que passaram a participar do abastecimento da cidade. Foi criado um outro mercado mas em tão precárias condições que teve vida curta (PANTOJA, 2000, p. 32).

A desapropriação dos mercados de Luanda para utilização das quitandeiras foi resultado de leis instituídas e ações realizadas pelo poder público, que procurou dominar os espaços de comércio, isto é, os mercados de Luanda, que foram apropriados pelos comerciantes portugueses e, paralelamente, as feiras livres predominam nos musseques, ocupadas pelas quitandeiras. Os mercados do centro passaram a ser frequentados pelas classes altas e os mercados dos musseques majoritariamente pelas classes baixas, ou seja, a diferença social marcou e reforçou, explicitamente, uma delimitação nos espaços urbanos. Segundo Orlando Santos (2011), o plano de construir mercados nas zonas periféricas tinha como intuito eliminar as feiras livres do centro urbano, buscando erradicar o comércio informal da “cidade branca” e submeter as feiras livres sob controle. Era importante para o Estado um plano urbanístico moderno e progressista nos moldes de dominação hegemônica, como instrumento de controle, incluindo o ato de disciplinar os locais e populações que resistiam ao status quo.

Nesse sentido, as feiras livres em espaços cujas regras sociais não seguiam a razão capitalista e que outrora estavam sob domínio popular, passaram a se subjugar à ação disciplinar dos mercados controlados pelo poder público municipal. Dessa transição decorre um conflito entre o poder público e os comerciantes. Os comerciantes não se limitaram a circular apenas nos bairros periféricos e não se constrangeram com as intimidações do poder político. A prática da zunga surge, no comércio informal em Luanda, como produto das práticas das quitandeiras no período pós-colonial. Apesar de ser exercida majoritariamente por mulheres, cujo presente trabalho salienta, menciona-se que atualmente existem homens zungueiros devido ao aumento da taxa de desemprego no país.

Orlando Santos (2010) revela que a zunga não é uma prática propriamente nova, mas sim uma adaptação, mas afirma que o fluxo de vendedores ambulantes aumentou em Luanda, readquirindo a prática de vender e “cantalorizar” os seus produtos (SANTOS, 2010, p. 91). O cotidiano das zungueiras consiste em circular pelos armazéns, mercados, ruas e bairros, desenvolvendo vendas de porta em porta, carregando os seus produtos geralmente na cabeça ou nos braços. Analisando a estrutura social dentro das atividades comerciais em Luanda, Orlando Santos (2011) descreve a zunga como uma das práticas com menor status socioeconômico dentro do comércio informal; contudo, no nosso entendimento, esta afirmação é relativa, considerando o rendimento diário de muitas zungueiras que, muitas das vezes, chega a ser superior ao dos demais trabalhadores do comércio informal.

Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, as zungueiras fazem parte dos mais de 50% da população angolana que vivem em condições de extrema pobreza, sobrevivendo com apenas US$1,20 por dia (PNUD, 2019). A maioria das zungueiras vive em zonas periféricas ou nos bairros informais, os musseques. Como expusemos, os musseques são bairros informais que correspondem aos caniços em Moçambique, slums na Índia e favelas no Brasil, caracterizados por habitações precárias, sem garantia fundiária ou proteção jurídica contra remoções forçadas e outras ações, que tendem a violar os direitos humanos. Muitos moradores são analfabetos e não possuem qualquer grau de instrução, tampouco dispõem de documento de identidade nacional, o que os torna extremamente vulneráveis (RIMLI, 2013). Os musseques sofrem demolições e desocupações e seus residentes têm sido realocados em regiões distantes das suas atividades cotidianas. Isto se deve aos interesses do mercado imobiliário, que detém alguns musseques localizados em áreas atrativas ao setor privado, como empreendimentos que geram lucros aos envolvidos.

Os discursos de reabilitação e reurbanização da cidade de Luanda se dão como uma busca contínua da concepção de cidades modernas; resultam em um urbanismo especulativo, que acaba por privilegiar uma determinada camada social e negligenciar a maior parte da população, em um processo de gentrificação e reestruturação urbana fundamentado na desigualdade socioespacial. O urbanismo atual implementado em Luanda é apresentado com uma roupagem inovadora, mas baseia-se, no entanto, em estruturas antigas. Com intuito de uma reengenharia do espaço urbano, acaba por descaracterizar a cidade perante as complexas especificidades africanas, voltando as costas para o problema da exclusão social. Essa reurbanização de impacto socioespacial, acompanhada de remoções forçadas, afeta diretamente a população que reside nos musseques e, consequentemente, muitos trabalhadores do setor informal.

2 Forma e fundo no quadro das zungueiras

É notável que a população das classes mais baixas esteja inserida na cidade urbanizada bem como nos musseques, à medida que nestes residem e, no entanto, trabalham também nos centros urbanos. O crescimento destes bairros informais é decorrência da desigualdade e se agrava pelo modo que, como vimos, se estabelece o processo de modernização da cidade. A desconsideração das necessidades locais, torna Luanda uma cidade que desqualifica atividades tradicionais como a zunga, privilegiando sua adaptação forçada e incompleta como uma cidade global. Segundo Harvey (2012), o direito à cidade atualmente tem sido apropriado pelo mercado imobiliário na busca de novos empreendimentos e rendimentos, em processos privatizantes de produção do espaço urbano. Segundo o autor, a crise urbana se desenvolve como um processo global, priorizando investidores e financistas na busca de acumulação. Este modo de colonização do espaço urbano pelos ricos, se dá perante a insuficiência de força de mobilização dos movimentos sociais de controle sobre a utilização dos excedentes e de suas próprias condições de produção (HARVEY, 2012, p. 88). Conforme Harvey (2014):

O direito à cidade, como hoje existe, como se constitui atualmente, encontra-se muito mais estreitamente confinado, na maior parte dos casos, nas mãos de uma pequena elite política e econômica com condições de moldar a cidade cada vez mais segundo suas necessidades particulares e seus mais profundos desejos (HARVEY, 2014, p. 63).

A informalidade, como face complementar deste quadro, surge como meio de sobrevivência e resistência da população que encontra meios de sobreviver em meio à extrema pobreza e em resistência às medidas governamentais impostas pelo Estado. Estas são, muitas vezes, executadas por grandes construtoras, tais como a Odebrecht, envolvidas na remoção forçada e demolição de muitos musseques, em Luanda. Desse modo, a informalidade no espaço urbano e econômico é um expediente da população de baixa renda para reivindicar o direito à cidade. Tal como afirma Harvey (2014):

Se os bens públicos oferecidos pelo Estado diminuem ou se transformam em um mero instrumento para a acumulação privada (como vem acontecendo com a educação), e se o Estado deixa de oferecê-los, então só há uma resposta possível, que é as populações se auto-organizarem para oferecerem-se seus próprios comuns (HARVEY, 2014, p. 167).

Conforme Milton Santos (2004), uma característica constante às atividades consideradas como do circuito superior, é que são “capital intensivas”, ou seja, têm na tecnologia, na organização burocrática e no acesso ao crédito bancário sua base comum. Simultaneamente, são determinantes a forte presença de oligopólios, a exemplo de algumas empresas multinacionais, e o seu favorecimento por parte do Estado, na oferta de infraestruturas, subsídios fiscais e reserva de mercados. Tais aspectos são definidores da relação entre as atividades dos dois circuitos — superior e inferior — e de cada um deles com o território (SANTOS, 2004, p. 33). Nesse sentido, Kauê Lopes dos Santos (2020, p. 17) salienta que, além da noção de formalidade, os níveis de organização e capitalização identificam a integração entre os diferentes circuitos.

O desdobramento do conceito de circuito inferior, no caso de Angola, pode ser considerado como um símbolo de refúgio, resistência e resiliência para a população de baixa renda que atinge, no país, 80% da população trabalhadora que, somente na informalidade, encontra oportunidade de sustento (REIS, CHAMBASSUCO, 2021). Admitindo ser possível observar a predominância do circuito inferior na economia urbana angolana, podemos considerar sua importância para a subsistência da maioria da população de poder aquisitivo baixo, como os diversos personagens do comércio informal — zungueiras, roboteiros, candongueiros. No que tange às práticas de venda e técnicas de convencimento, é possível identificar dinâmicas utilizadas pelas zungueiras para atrair o seu público-alvo. Algumas tendem a alterar o preço dos produtos consoante a raça, nacionalidade ou até mesmo classe social da clientela.

O sucesso de suas vendas depende muito da interação com os clientes. O uso de rimas, músicas nos anúncios dos produtos, torna-se uma das principais técnicas de atração realizada pelas zungueiras, prática anteriormente exercida pelas quitandeiras. Segundo Orlando Santos (2010, p. 95): “o grito da mulher zungueira constituiu um dos principais elos com o tradicional pregão das antigas quitandeiras”. Compreende-se que a formalidade e a informalidade passam a ser elementos pertinentes e determinantes nos circuitos estabelecidos por Milton Santos (2004). Em “Por uma outra globalização”, Milton Santos (2001) analisa dinâmicas organizacionais e identifica diversos níveis de capitalização dos empreendimentos relacionados aos diferentes circuitos, nas cidades de países que denomina como subdesenvolvidos, que atualmente podemos considerar como correspondentes ao Sul Global (SANTOS, 2018; MENESES, 2016), do qual Luanda faz parte.

É notória a relevância das zungueiras na cadeia produtiva à qual se integram. O comércio informal, para além de ser predominante em Luanda, gera empregabilidade e atende, em grande parte, ao consumo da população da cidade. A dinâmica que existe na economia urbana em Luanda tem características semelhantes às impostas pela pobreza em outras cidades do Sul Global, como produto da falta de empregos formais e oportunidades (SANTOS, 2004). A divisão social e sexual do trabalho é um fator evidente no contexto histórico e cultural angolano, onde a mulher se encontra em uma posição de subalternidade exercendo funções consideradas como da essência feminina, tais quais: ser mãe, cuidar da família e ser dona de casa. Entretanto, o cotidiano das zungueiras demonstra o oposto.

Orlando Santos (2010) afirma que as zungueiras têm baixo nível de escolaridade, oriundas de outras províncias além de Luanda devido à guerra civil, e muitas sustentam suas famílias sozinhas, apesar de estarem casadas. Vivem em lares chefiados pelos esposos, mas sustentados por elas. A conscientização sobre o cotidiano das zungueiras é um passo importante no reconhecimento da contribuição da mulher para o sustento da família e, no limite, de uma forma de exploração interfamiliar. Apesar da zunga ser enaltecida pela população e as zungueiras serem consideradas símbolo de empoderamento para as mulheres angolanas, a prática tem sido alvo de inúmeras notícias publicadas pelos órgãos de comunicação do país, ora sendo abordadas como mulheres fortes, ora repreendendo e estigmatizando a venda ambulante na cidade. As zungueiras têm sido marginalizadas e sofrido diariamente atos de violência e brutalidade por fiscais do Governo da Província de Luanda e agentes da Polícia Nacional.

O jornal angolano O País realizou uma reportagem intitulada “Quando se perde a vida fugindo dos fiscais” (GOMES, 2018), alertando a população sobre as consequências da violência policial contra as zungueiras em Luanda, conforme ilustra a Figura 1, abaixo. Segue um trecho da referida matéria:

Muitos vendedores ambulantes ficam deficientes, são gravemente feridos e outros até mesmo perdem a vida na sequência de fuga aos fiscais e/ou policiais. A Associação dos Vendedores Ambulantes de Luanda tem casos com um défice na estatística, mas afirma que os culpados não são responsabilizados criminalmente (GOMES, 2018, p. 1).

Na mesma reportagem, faz-se menção à morte de uma zungueira, que morreu, em 2016, atropelada em Viana, quando fugia dos agentes fiscais:

Em finais de Dezembro de 2016 morreu uma zungueira, em Viana, nas imediações da Fibrex, na sequência de uma perseguição de agentes da Polícia Nacional. Vestida de saia feita com pano de samakaka, a vendedora de bolachas perto da estrada, em busca do sustento para os seus filhos, não foi bem-sucedida naquela zunga e perdeu a vida a 28 de Dezembro de 2016, num atropelamento, quando fugia da agressão dos policiais. Sangue no asfalto e pessoas ao seu redor, a zungueira perdeu a vida no local, por traumatismo craniano. Apesar da Polícia Nacional ter desmentido que ela tenha perdido a vida na sequência da perseguição destes, as pessoas que presenciaram o acto disseram o contrário, bem como as vozes que se levantaram nas redes sociais (GOMES, 2018, p. 1).

Fig. 1: Zungueira morta por atropelamento em Viana, Angola, em 2016. Fonte: O País. GOMES, 2018. Disponível em: https://opais.co.ao/index.php/2018/04/15/quando-se-perde-a-vida-fugindo-dos-fiscais/. Acesso em: 12 Mai.2021.

Desde o período colonial, até os dias de hoje, o Estado angolano procura a erradicação da venda ambulante. O presidente João Lourenço, em seu atual governo, pretende dar fim à venda ambulante em Angola, com o lançamento da “Operação Resgate”. O presidente da Associação Nacional de Vendedores Ambulantes, José Kassoma, ao ser entrevistado pela DW, responsabiliza o Estado angolano pelas mortes das zungueiras. Afirmou que:

Em todas as operações que visam a organização da mulher zungueira e a venda ambulante, tem havido excessos. Por isso é que há mortes e cada vez mais vendedoras com ferimentos. Há vendedoras que têm sido empurradas de pontes aéreas para peões e acabam com deficiências físicas [...] Basta de mortes da mulher zungueira, como têm acontecido no nosso país (KASSOMA. J., apud LUAMBA, 2019, p. 1).

As zungueiras relatam estar cansadas das agressões físicas e acusam os policiais de maus tratos, corrupção e de destruição dos produtos por elas comercializados. “O polícia quando vem, não tem aquele amor, destruí o nosso negócio” [...] afirmam também que a polícia deve “conversar com as pessoas” e não “bater nas senhoras” (LUAMBA, 2019, p. 1). A Human Rights Watch (RIMLI, 2013) documentou diversos exemplos de brutalidades e violências sofridas pelas zungueiras e condenou a postura dos agentes da Polícia Nacional, denunciando o assédio e intimidação que refletem o ambiente repressivo crescente de Angola, e dá voz a uma zungueira:

Onde eu vendo, há muitas zungueiras [vendedoras ambulantes] com bebés às costas. Os policiais e os fiscais vêm de moto. Dão-nos pontapés e atiram as nossas coisas para o chão. Alguns levam as nossas coisas. Só não levam se pagarmos. Dizem: “Tira essas porcarias daqui. Aqui não é sítio para vender.” Nós perguntamos: “E para onde é que vamos? Não há mercados para nós. O que é que estão a fazer com as nossas coisas?” Outras ficam caladas. Têm medo (entrevista com zungueira, apud RIMLI, 2013, p. 1).

O exercício da zunga é uma atividade legalizada pelo Estado angolano, portanto livre, regulamentada na Lei n.°1/07 das Atividades Comerciais que normatiza o exercício do comércio informal (REPÚBLICA DE ANGOLA, 2007). Sua prática, portanto, precisa ser analisada como um fator estrutural e social, pois o motivo por detrás da zunga é a pobreza e a falta de oportunidades de emprego, sendo que muitos dos vendedores ambulantes angolanos se encontram em condição de pobreza extrema. Neste sentido, as zungueiras são agentes que contribuem contra a baixa taxa de empregabilidade do país. Esta mesma lei, que regulamenta as práticas comerciais e normatiza o comércio informal, define:

Para salvaguarda do urbanismo comercial, deve ser observado o seguinte: a) Zonas urbanas — estabelecem­-se em geral superfícies comerciais, nomeadamente hipermercados, centros comerciais, supermercados, minimercados, assim como mercados municipais urbanos, estabelecimentos de prestação de serviços mercantis de dimensão relevante e actividade comercial grossista na modalidade do comércio por grosso em livre serviço (cash and carry); b) Zonas suburbanas — além das superfícies comerciais estabelecem­-se em geral nestas zonas, comércio retalhista, comércio precário, comércio geral, comércio ambulante, comércio feirante, mercados municipais urbanos, mercados abastecedores, entrepostos comerciais e outras actividades previstas por lei; c) Zonas rurais — estabelecem­-se em geral comércio retalhista, comércio precário, comércio geral, comércio ambulante, comércio feirante, mercados municipais rurais, pequena actividade agropecuária e transportadora e outras actividades previstas por lei (REPÚBLICA DE ANGOLA, 2007, art. 27).

Estamos, portanto, diante de uma lei que define fronteiras entre os diferentes segmentos de comércio, exclui e limita a zunga às áreas periféricas ou rurais, uma postura nada distinta daquela do período colonial. Embora imersas na adversidade, paradoxalmente é necessário considerar a zunga, do ponto de vista da identidade, como uma prática que tem raízes na tradição angolana. Nesse sentido, fortalecer com dignidade hábitos e formas de vida, importa na luta contra hegemônica em países de tradição colonial e patriarcal. Perante pressões do Capitalismo global, em suas apostas por modernização incompleta ou desigual e combinada, em países do Sul Global cujas características se fundam recorrentemente na exportação de commodities – no caso de Angola, especialmente o petróleo – as apostas na urbanização de setores estratégicos conferem uma imagem enganosa de modernização. Perante a eleição de investimentos públicos e associação a interesses das classes dominantes internas, as contradições se revelam em setores desprovidos da cidade e contingentes excluídos da população, como face complementar.

Vivemos um período de transformações onde, no processo de luta social, política e econômica, encontramos um tipo de conhecimento a ser pregado como único, legítimo e padrão universal a alcançar, regido, em última instância, pela economia globalizada capitalista. Em países do Sul Global, a luta por constituir identidades como nações pós-coloniais passa pelas decisões em direção à equidade social ou sujeição ao neoliberalismo dominante, que se revelam, ao fim e ao cabo, na morfologia urbana mediante eleições realizadas pelo Estado. Consideramos que os expedientes mais elementares de sobrevivência em condições de desigualdade extrema e adversa produzem formas de vida que expressam conhecimentos vitais. Abordar esta discussão sob a ótica das epistemologias do Sul explicita modos de resistência contra essa opressão de conhecimento exclusivo — que abarca saberes, hábitos, práticas sociais e luta por direitos de existência — articuláveis ao entendimento do fenômeno das zungueiras. Segundo Boaventura de Sousa Santos (2018):

O Capitalismo experimenta hoje um dos momentos mais destrutivos da sua história recente, como testemunham as novas formas de acumulação primitiva por despossessão, a reedição da rapina colonial, que agora se estende por todo o Sul Global, da apropriação de terras ao roubo de salários e os resgates bancários, sujeitando-se à lei capitalista do valor de recursos e bens comuns, provocando o deslocamento de milhões de camponeses pobres e povos indígenas, a devastação ambiental e os desastres ecológicos; e a eterna renovação do colonialismo, que revela, em velhos e novos aspectos, o mesmo impulso genocida, a sociabilidade racista, a sede de apropriação e a violência exercida sobre os recursos considerados infinitos e sobre as pessoas consideradas inferiores e inclusive não humanas (SANTOS, 2018, p. 298-299).

3 Considerações finais

A ideia de que o conhecimento eurocêntrico seja o único legítimo em confirmar a ciência e, portanto, analisar o Sul Global sob lentes do Norte, cria uma opressão às demais fontes e tipos de conhecimentos. Perante os dilemas de países de raiz colonial em sua marcha em direção à consolidação de independência, o papel do Estado frequentemente pode reiterar novas formas de dominação, inclusive internas. Boaventura de Sousa Santos afirma que o objetivo de sistematizar o que ele define como epistemologias do Sul seria identificar e dar valor ao que frequentemente não é reconhecido como conhecimento, diante das epistemologias dominantes, e que esses conhecimentos, assim valorizados, surgem como resistência contra a repressão às epistemologias que legitimam essa mesma repressão. (SANTOS, 2018, p. 303).

Perante esta compreensão, parece-nos desejável, ao analisarmos o comércio informal em Angola, que nos afastemos relativamente do pensamento crítico eurocêntrico e o compreendamos sob aspectos da lógica africana, considerando o contexto social, político e econômico do país e a luta de classes atual que reserva, ao fim e ao cabo, persistências neocoloniais. O intuito não seria o de criar distanciamento estanque ao pensamento crítico e científico a fim de que pudéssemos anular ou desconsiderar a tradição eurocêntrica. Pelo contrário, busca-se aqui abrir espaços de análise para realidades pouco discutidas e muitas vezes ignoradas pela tradição dominante, que importam às ex-colônias, malgrado suas lutas por independência e autodeterminação. Consideramos o caso das zungueiras, aqui delineado, como um fenômeno relativamente particular que contempla a discussão mais ampla, inserida na conceituação do Sul Global em suas diversidades.

Referências

BETTENCOURT, A. C. A. Qualificação e reabilitação de áreas urbanas críticas: os musseques de Luanda. 2011. Dissertação (Mestrado Integrado em Arquitetura) — Faculdade de Arquitectura, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2011. Disponível em: http://hdl.handle.net/10400.5/3654. Acesso em: 20 Abr. 2021.

CAIN, A. Mapeamento da pobreza urbana em Luanda ao longo de quatro décadas. In: SEMINÁRIO ÁFRICA HABITAT, Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa, Lisboa, 7 maio 2019. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/333480590_Mapeamento_da_Pobreza_Urbana_em_Luanda_-_Africa_Habitat_-_Faculdade_de_Arquitetura_da_Universidade_de_Lisboa_-_7_de_maio_2019#fullTextFileContent. Acesso em: 4 Mar. 2020.

GOMES, A. Quando se perde a vida fugindo dos fiscais. O País, Angola, 15 abr. 2018. Destaque, Sociedade, p. 1. Disponível em: https://opais.co.ao/index.php/2018/04/15/quando-se-perde-a-vida-fugindo-dos-fiscais/. Acesso em 18 Ago. 2020.

GOVERNO DE ANGOLA. MINISTÉRIO DO PLANEAMENTO. INE. INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA. Resultados definitivos do recenseamento geral da população e da habitação de Angola 2014: Censo 2014. Disponível em: https://andine.ine.gov.ao/nada/index.php/catalog/3. Luanda, Angola, mar. 2016. Acesso em: 7 Abr. 2021.

HARVEY, D. O direito à cidade. Lutas Sociais, Dossiê Barricadas Urbanas, São Paulo, n. 29, p. 73-89, jul./dez. 2012.

HARVEY, D. Cidades rebeldes: do direito à cidade à revolução urbana. Tradução: Jeferson Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2014.

LUAMBA, M. Zungueiras em Angola: "Estamos cansadas" da violência da polícia. DW, Luanda, 21 mar. 2019. Notícias/ Angola, p. 1. Disponível em: https://p.dw.com/p/3FRH0. Acesso em: 31 Abr. 2021. Não paginado.

MENESES, M. P. A questão negra entre continentes: possibilidades de tradução intercultural a partir de práticas de luta? Sociologias, Porto Alegre, ano 18, n. 43, p. 176-206, set./dez. 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1590/15174522-018004307. Acesso em: 14 Abr. 2021.

PANTOJA, S. Quitandas e arimos: um negócio feminino no abastecimento de géneros alimentícios em Luanda nos séculos XVIII e XIX. In: PANTOJA, S. (org.). Entre Áfricas e Brasis. Brasília: Editora Paralelo 15, 2000.

PNUD. PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO. Relatório do Desenvolvimento Humano 2019. Além do rendimento, além das médias, além do presente: desigualdades no desenvolvimento humano no século XXI. New York: PNUD, 2019. Disponível em: http://hdr.undp.org/sites/default/files/hdr_2019_pt.pdf. Acesso em: 20 Jun. 2021. eISBN: 978-92-1-004502-5.

PRATES, T. J. M. Cidade informal: reflexões para um futuro sustentável nos musseques de Luanda. 2016. Dissertação (Mestrado em Integrado em Arquitetura) — Faculdade de Arquitetura, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2016. Disponível em: http://hdl.handle.net/10400.5/13639. Acesso em: 18 Mai. 2020.

QUEIROZ, L. H. C. R. Entre legados coloniais e agências: as zungueiras na produção do espaço urbano de Luanda. 2016. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação Internacional) — Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares, Universidade de Brasília, Brasília, 2016. Disponível em: https://repositorio.unb.br/bitstream/10482/23052/1/2016_La%C3%ADsHelenaCust%C3%B3dioRodriguesdeQueiroz.pdf. Acesso em: 4 Mar. 2020.

REIS, J. J.; CHAMBASSUCO, M. Quase 1,3 milhões de angolanos foram para a informalidade. Expansão, Angola, n. 609, 29 jan. 2021. Empresas & Mercados, p. 1. Disponível em: https://bit.ly/32mvCd1. Acesso em: 15 Mai. 2021.

REPÚBLICA DE ANGOLA. MINISTÉRIO DO COMÉRCIO. Lei das Actividades Comerciais, Lei n. 1/07 de 14 de maio, 2007. Diário da República: série I, Luanda, Angola, n. 58, p. 897-909, 14 maio 2007. Disponível em: https://bit.ly/3FdY6Ep. Acesso em: 12 Jun. 2021.

RIBAS, O. Sunguilando: contos tradicionais angolanos: prosa. Porto, Portugal: Edições ASA para a União dos Escritores Angolanos, 1989.

RIMLI, L. “Tira essas porcarias daqui”: violência policial contra vendedores ambulantes em Angola. Tradução: Diana Tarré. Estados Unidos da América: Human Rights Watch, 2013. ISBN: 978-1-62313-0596. Disponível em: https://www.hrw.org/sites/default/files/report_pdf/angola1013po.pdf. Acesso em: 18 Ago. 2020.

SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 6. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001.

SANTOS, M. O espaço dividido: os dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos. Tradução: Myrna T. Rego Viana. 2. ed. São Paulo: EDUSP, 2004. ISBN: 978-85-314-0833-5.

SANTOS, O. A. Do pregão da avó Ximinha ao grito da zungueira: trajetória femininas no comércio de rua em Luanda. 2010. Dissertação (Mestrado em Estudos Étnicos Africanos) — Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2010. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/23955. Acesso em: 22 Mar. 2020.

SANTOS, O. Mamãs quitandeiras, kínguilas e zungueiras: trajectórias femininas e quotidiano de comerciantes de rua em Luanda. Revista Angolana de Sociologia, Angola, n. 8, p. 35-61, 2011. Disponível em: https://journals.openedition.org/ras/510#text. Acesso em: 22 Mar. 2020.

SANTOS, B. S. Construindo as epistemologias do sul. Antologia essencial. Buenos Aires: CLACSO, 2018. v. 1.

SANTOS, K. L. Da informalidade ao circuito inferior: um estudo sobre a economia urbana em Gana no início do século XXI. Geografia, v. 23, n. 50, p. 1-17, 2020. Disponível em: https://periodicos.uff.br/geographia/article/view/38272/29154. Acesso em: 02 Jun. 2021.

Informal trading, identity, and the law: the case of Luanda’s zungueiras

Vera Santana Luz, Áurea Bianca Vasconcelos André

Vera Santana Luz has a degree in Architecture and Urbanism and a Ph.D. in Architecture and Urbanism. She is a professor and researcher at the Postgraduate Program in Architecture and Urbanism at the Catholic University of Campinas, where she conducts research on the themes of architecture, urbanism, the environment, sustainability and nature-based solutions, and territories with socio-spatial and environmental weaknesses. veraluz@puc-campinas.edu.br http://lattes.cnpq.br/2708934593900531

Áurea Bianca Vasconcelos André is an Architect and Urbanist and a researcher at the research group EUCA - Urban Studies, Culture, and Architecture, of the Graduate Program in Architecture and Urbanism at the Catholic University of Campinas, Brazil. Her work focuses on the right to the city, African vernacular architecture, and informal trade. aureaandre16@gmail.com http://lattes.cnpq.br/3230440459801948


How to quote this text: Luz, V. S.; André, A. B. V., 2021. Informal trading, identity, and the law: the case of Luanda’s zungueiras. Translated from Portuguese by Gustavo Caperutto da Mota. V!RUS, 23, December. [online] Available at: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus23/?sec=4&item=7&lang=en>. [Accessed: 25 April 2024].

ARTICLE SUBMITTED ON AUGUST, 15, 2021


Abstract

Zungueiras is the term given that designates street vendor women in the Angolan informal market, who travel for miles in hoping of selling various products such as food, accessories, and clothing. The word zungueira derives from the term zunga from the Angolan national language kimbundu. Zunga means to circle, walk around, rotate and in Luanda refers to informal vendors, particularly street hawkers. This practice of selling on the go is a product of social, political, and economic changes in the country, and it is unfortunately marginalized by public bodies. Police inspectors often pursue those people by force and violence to expel them from public areas, which often carries the death of those women. Based on bibliographic and documentary research methodology, we aim to analyse aspects of the zungueiras' informal trade in Luanda, given the State's position, the rights of these women to the city and the cultural identity they carry. The results point at the need of reinforcing horizontal relationships that are less hierarchical or conditioned by the imperatives of hegemonic capital, which can be seen in analogous situations in the Global South. In the context of Global South, we understand this case study as a valid reference. The urban dynamics of survival, with ancestral socio-cultural roots and permeated by contradictions between precariousness and rights reveal the local knowledge and a resistance to the intentions of hegemonic alignment to globalization patterns conducted by the State.

Keywords: Zungueiras, Informal trade, Luanda, Angola, Public space



1 Introduction: considerations on Luanda

In this study, we understand the Global South in its diversity, as a geopolitical South, “a metaphor used to identify the set of movements, collective actions against forms of oppression, exploitation and discrimination” (Meneses, 2016, p. 178, our translation). The zungueiras case study seeks to present a localized phenomenon, whose discussion reveals, however, recurrent tensions between the struggle for rights, the precariousness of urban contingents, and the dispute between habits and vernacular knowledge facing modernization forces as molded by globalization. We understand this particular phenomenon as a circumstance that can be deployed to the countries of the Global South. Its mention as a reference may indicate specificities or analogies to other territories. Its condition stands out as an example of precarious social contingents fighting for survival and the right to remain in the public scene as a gender minority in extreme poverty. Its urgent ruses, intertwined in tension to ancestral ways of life, become compromised by colonial historical effects, and national independence wars. In addition, there is a certain eagerness of the dominant social strata to align themselves with the internationalized prescription of globalization, in light of the Global North.

The methodology that conducts the investigation – whose impulse stems from the daily experience of one of the authors – has as its structure the bibliographical and documental investigation of the intertwined aspects of the zungueiras phenomenon. We consider such a phenomenon as a particular circumstance to urbanization pressures conditioned by hegemonic forces in Luanda, the capital of Angola – a country subjected to colonization, slavery, patriarchy, civil war, and, more recently, to the condition of the periphery of globalized capitalism.

The city of Luanda, by itself, does not reflect the country's specificities. Angola is made up of several territories, and the zungueiras often appear in those urban spaces. They carry their way of life as a constituent element of the urban landscape. The zungueira’s activities are considered as informal by the State, even though we can understand them as being included in a trading system that generates income and useful interrelationships with the society as a whole. After gaining its independence from Portuguese settlers, Angola went through a long civil war that lasted approximately thirty years, from 1975 to 2002. The war took place in the rural areas of the country and contributed to accelerated rural depopulation, turning the most developed cities into target of migration in a search for safety and better surviving conditions. Thus, Luanda ended up becoming one of the most sought-after destinations for people who seeked to rebuild their lives, especially economically (Bettencourt, 2011).

Consequences of the rural exodus were the increase of population density in Luanda, the high unemployment rates and the housing deficit in the city, which resulted in the expansion of informal neighbourhoods. Many displaced citizens perceived informal trading as a means of subsistence, opting to work as street vendors, drivers and transporting goods, such as the so called roboteiros, among others. In 2014, the city of Luanda was home to more than a quarter of the country's population (Governo de Angola, 2016). One of the programs for reintegrating the population was the offer of financing to former war combatants and ex-military staff. However, their widows would not benefit from any financial aid from the state. According to Orlando A. Santos (2010), many of these women currently work in street sales, at street corners exchanging dollars or as maids, with a salary that is equivalent to US$ 50. They are still discriminated for the work they perform. However, they support their families not only paying for their children's studies, but often also supporting their spouses (Santos, 2010, p. 16-17).

Even though informal workers are seen as part of Luanda’s culture, they are sometimes criminalized and excluded from the urban environment, from commerce to housing. The reconstruction process aiming to reach the characteristics of a global city does not have room for the informal, and in the case of Luanda, it has the peculiarity not only of portraying inequality or a duality of the city, but it also represents culture and tradition. The socio-spatial precariousness cannot be ignored. The duality of the city of Luanda mirrors distinct and complementary realities; if on the one hand the formal city was structured during the colonial period, having a planned road network and corresponding infrastructure, on the other hand there is the informal city, called musseques. It spreads out in the peripheral limits around the city, with growing population density and lack of infrastructure such as sewage sanitation, waste collection and disposal, provision of drinking water, access roads, lighting, and public equipment. The quality of life of this population, victim of socio-spatial inequality, is further aggravated by the draining of rainwater, floods, open-air garbage, and poor quality of public transport (Prates, 2016, p. 51).

The Angolan State has made several efforts to leverage the city in global standards through industrialization and economic growth; however, urban redevelopment plans and projects, especially in Luanda, only partially solve some functional problems and bring an air of aesthetic renewal to the city, much like a mirage that mirrors precariousness. Despite all the growth and recovery after the civil war, the Angolan economic improvement has been incompatible with the real needs of the people in general. The socio-spatial inclusion in these projects is questionable, as inequality in Luanda is an ever-widening gap. The concept and definition of musseques have changed over time, depending on the changes in the city and its population. Currently, informal commerce and musseques are seen as disarray and marginality by the upper social classes, as well as by portions of the State; for other social strata they mean resistance, survival, and subsistence.

The musseques host most of the population of Luanda who work in some kind of informal trade. According to Cain (2019), approximately 70% of the population lives in musseques or precarious housing. According to the National Institute of Statistics of the Ministry of Planning of the Government of Angola (Governo de Angola, 2016, p. 71-75), in 2014 data, only 31% of Angolan population housing had electricity and less than 30% had access to adequate drinking water; 7% had urban sanitary equipment connected to the public sewer system, with 91% connected to septic tanks. Waste was disposed of in the open by 59% of urban households. In Angola, 70% of women worked in the informal economy and 90% of street vendors lived far and away from the place where they worked, and informal jobs represented 60% of the economy in 2014 (Queiroz, 2016). In this article, we propose an approach to the concept of informality in Angola, believing that it is part of the urban environment of African cities as a form of self-organization and subsistence, and interferes in the urban space. According to Queiroz (2016):

Self-organization as a popular response to the obstacles of everyday urban life has awakened a new vision of African cities, as explained by urbanist Abdou Maliq Simone about cities in the Global South: There is something happening, efforts are being made, bringing about new ways to support life, to help other people and create interesting cities (Simone, 2011). Informality is part of the popular set of self-organization, a means of appropriation and production of space (Queiroz, 2016, p. 37, our translation).

Informality in the urban environment and hegemonic organization represent a paradoxical relationship of interdependence. The characteristic of a dualistic Luanda was already evident in the colonial period. The difference between social classes was transmitted to the urban fabric, the dominant class residing in the city canter, with access to services and infrastructure, and the subordinate classes in peripheral communities, without infrastructure and far from services. This socio-spatial dynamic comes as result of a political organization of space, that is reflected in the lifestyle, in the way of living, inhabiting, and relating, with repercussions up to present day.

Spaces for exchange and sale, markets and fairs have existed in the daily lives of civilizations for millennia. In Luanda, those institutions were characterized by quitandas(grocery markets). According to Van-Dúnem (1987, cited in Santos, 2011, p. 37) the word quitanda comes from the term itânda, in the Kimbundu dialect, and its plural, kitanda, means a wooden platform that may serve as a bench or a measurement display, especially to regulate the sale of rope tobacco. From the Portuguese version of the word, the term quitandeira (grocer, a woman who carries out business in a quitanda) comes from the elimination of the particle “a” and the addition of the suffix “eira”. In this version of a quitanda, the following meanings can be found: market, square, post for sale of fresh food, small shop or business stall, farm or tray to sell goods on the streets (Ribas, 1989, p. 174, cited in Santos, 2011, p. 37).

Although informal commerce originally occurred more frequently in peripheral and peri-urban areas in the colonial period, the quitandeiras began to wander more frequently in the urban center due to urban expansion and modernization. However, the quitandeiras were not as popular in the urban environment as they were in the periphery of the city. Pantoja (2000) mentions the regulations and restrictions imposed on the quitandeiras in Luanda and, later, the fomentation of conflicts between the native quitandeiras and new European traders for spots in fairs and markets. In this scenario, the grocers and artisans who could not pay the rent had to move from the urban center and go to the musseques to carry out their commercial activities. As Pantoja (2000) addresses, at a given moment of modernization at the beginning of the 21st century,

The city of Luanda takes on a new configuration and quitandeiras tend to disappear from the Luandan scene. With no housing conditions in the city, African houses began to be concentrated in musseques. The market was left to a few who could afford to rent the space and compete with companies that started to supply the city. Another market was created, but it had a short stay due to its precarious conditions (Pantoja, 2000, p. 32, our translation).

The expropriation of quitandeiras from Luanda’s markets was the result of both laws and actions enacted by the government, which sought to dominate commercial spaces of markets appropriated by Portuguese traders. In parallel, street fairs predominated in musseques occupied by the quitandeiras. Upper classes started to visit the markets in the center of the city while lower classes went mainly to the markets in the musseques. The explicity of the social difference stated and reinforced the borders within urban spaces. According to Orlando Santos (2011), the plan to build markets in peripheral areas aimed to eliminate open markets from the urban center, to eradicate informal trade from the “white city” and bring open markets under control. A modern and progressive urban plan in the frame of hegemonic domination was important for the State as an instrument of control, punishing places as well as populations that resisted the status quo.

In this sense, open markets in spaces with social rules that did not follow capitalist reason, and which were formerly under popular domination, became subject to the disciplinary action of markets controlled by the municipal government. Conflict between the government and the merchants were results from that transition. Merchants did not limit themselves to circulating only in peripheral neighbourhoods and were not intimidated by the political power. The practice of zunga in informal commerce came across as a product mostly done by quitandeiras in the post-colonial age. Nevertheless, now zungueiro men are also mentioned due to the increase in the unemployment rate in the country.

Orlando Santos (2010) reveals that zunga is not a new practice, but rather an adaptation. He claims that the flow of street vendors increased in Luanda, re-acquiring the practice of selling and valuing their products through chanting (Santos, 2010, p. 91). The zungueira's daily life consists of walking around warehouses, markets, streets and neighbourhoods, in door-to-door sales, carrying their products usually on their heads or arms. When analysing the social structure of the commercial activities in Luanda, Orlando Santos (2011) describes zunga as one of the practices with lower socioeconomic status within informal commerce; however, we understand that such statement is relative, considering that the daily income of many zungueiras may be even higher than that of other workers in the informal trade.

According to the United Nations Development Programme (UNDP), zungueiras are part of the more than 50% of the Angolan population who lives under conditions of extreme poverty, surviving on just US$1.20 a day (UNDP, 2019). Most zungueiras live in peripheral areas or in informal neighbourhoods, the musseques. The already quoted musseques are informal neighbourhoods that correspond to caniço in Mozambique, slums in India and favelas in Brazil, precarious housing without land guarantees or any legal protection against forced eviction and other actions which violate human rights. Many residents do not have any level of education, nor do they have a national identity document, which makes them extremely vulnerable (Rimli, 2013). The musseques suffer demolitions and evictions and their residents are relocated to regions far from their daily activities, according to interests of the real estate market, which owns some musseques located in areas that are attractive to the private sector, such as projects that generate profits for those involved.

Rehabilitation and re-urbanization of the city of Luanda are a continuous search for the conception of modern cities. They result in speculative urbanism, which ends up favouring a certain social layer and neglecting the majority of the population, in a process of gentrification and urban restructuring based on socio-spatial inequality. The current urbanism implemented in Luanda is presented in an innovative guise, but it is, nevertheless, based on old structures. To re-engineer the urban space, it results in a mischaracterized city in face of complex African specificities, turning its back to the problem of social exclusion. This reurbanization of socio-spatial impact, accompanied by forced evictions, affects the population residing in the musseques, mainly workers in the informal sector.

2 Frame and colours of the zungueiras’ scene

It is notable that the population of the lower classes and the musseques are inserted in the urbanized city, since that is where they live, and they also work in urban centers. The expansion of those informal neighbourhoods stems from inequality and the city's modernization process. The disregard for local needs makes Luanda a city that disqualifies traditional activities such as zunga, leading it to a forced and incomplete adaptation as a global city. According to Harvey (2012), the right to the city has currently been appropriated by the real estate market in search of new ventures and income privatizing processes of production of urban space. According to the author, the urban crisis is unrolled as a global process, prioritizing investors and financiers eager for accumulation. Such mode of colonization of urban space comes due to the insufficient power to mobilize social movements to control the use of surpluses and their own production conditions (Harvey, 2012, p. 88). According to Harvey (2014):

The right to the city, as it exists and is conceived today, is much more closely confined, in most cases, within the hands of a small political and economic elite capable of shaping the city more and more according to their particular needs and deepest desires (Harvey, 2014, p. 63, our translation).

Informality, as a complementary part of this whole scenario, arises as a means of survival and resistance for a population who is able to find ways to survive in the midst of extreme poverty and resisting to measures imposed by the State and often carried out by large construction companies such as Odebrecht, involved in the forced removal and demolition of many musseques in Luanda. Thus, informality in the urban and economic space is an expedient for the low-income population to claim the right to the city. As Harvey claims (2014):

If the public goods offered by the State decrease or become a mere instrument for private accumulation (as has been happening with education), and if the State stops offering them, then there is only one possible answer, which is the populations themselves self-organize to offer them their own commons (Harvey, 2014, p. 167, our translation).

According to Milton Santos (2004), a constant characteristic of activities considered as belonging to the upper circuit is that they are “capital intensive” - they have technology, bureaucratic organization, and access to bank credit as their common base. At the same time, the strong presence of oligopolies, such as some multinational companies, and their favouring by the State in the provision of infrastructure, tax subsidies and market reserve are decisive. Such aspects define the relationship between the activities of the two circuits — upper and lower — and of each of them with the territory (Santos, 2004, p. 33). In this sense, Kauê Lopes dos Santos (2020, p. 17) points out that in addition to the notion of formality, the levels of organization and capitalization identify the integration between the different circuits.

The unfolding of the lower circuit concept in Angola can be considered as a symbol of refuge, resistance and resilience for the low-income population that sums up to 80% of the working population in the country, who only find opportunity of financial support informally (Reis and Chamassuco, 2021). Observing the predominance of the lower circuit in the Angolan urban economy, we can measure its importance for the subsistence of most of the population with low purchasing power, such as the various characters in informal trade — zungueiras, roboteiros and candongueiros. With regard to sale practices and persuasion techniques, it is possible to identify dynamics used by zungueiras to attract their target audience. Some tend to change the price of products depending on the race, nationality, or even social class of the clientele.

Their sales success depends a lot on the interaction with their customers. Chants and songs become the zungueira's, main technique to attract customers, following what the quitandeiraspreviously did. According to Orlando Santos (2010, p. 95, our translation): “the cry of the zungueira woman was one of the main connections to the traditional proclamation of the quitandeirasof old”. Both formality and informality become relevant and determining elements in the circuits established by Milton Santos (2004). In “Towards an Other Globalization”, Milton Santos (2001) analyses organizational dynamics and identifies different levels of raising financial funds related to different circuits in the cities of underdeveloped countries, corresponding to the Global South (Santos, 2018; Meneses, 2016), of which Luanda is part.

The importance of zungueiras n their production chain is well-known. The predominantly informal commerce in Luanda generates employability and attends the consumption of the city's population. The dynamics that exist in Luanda’s urban economy are similar to those imposed by poverty in other cities in the Global South, as a result of the lack of formal jobs and opportunities (Santos, 2004). The social and sexual division of work is an evident factor in the Angolan historical and cultural context, with women subordinated to what is perceived as feminine nature activities, such as motherhood, caring for the family and house chores. However, the daily life of zungueiras shows the opposite.

Orlando Santos (2010) states that the zungueiras have low levels of education, come from provinces other than Luanda due to the civil war, and many support their families, despite being married. They live in homes which are led by their spouses, but truly supported by them. It is important to raise awareness about the daily lives of zungueiras so that their contribution to supporting the family and, ultimately, a form of interfamily exploitation, can be realized. Despite the zunga being praised by the population and the zungueiras being considered a symbol of empowerment for Angolan women, the practice has been the subject of numerous articles published by the country's media, sometimes labelling them as strong women, and other times berating and stigmatizing street sales in the city. The zungueiras have been marginalized and suffered daily acts of violence and brutality by inspectors from the Government of the Province of Luanda and agents of the National Police.

The Angolan newspaper O País once presented a report with the headline “When you lose your life running away from inspectors” (Gomes, 2018, our translation), alerting the population for the consequences of police violence against zungueiras in Luanda, as shown in Picture 1 below. Here is an excerpt from that article:

Many street vendors become disabled, seriously injured, and even lose their lives because of fleeing the inspectors and/or police. The Luanda Association of Street Vendors has a deficit in statistics but claims that the culprits are not held criminally responsible. (Gomes, 2018, p. 1, our translation).

The same article then mentions the death of a zungueira in 2016, run over by a car in Viana while fleeing from tax agents:

At the end of December 2016, a zungueira died in Viana, near Fibrex, after been persecuted by National Police agents. Dressed in a skirt made of samakaka cloth, the cookie seller in the search of support for her children was not successful in that zunga and lost her life on December 28, 2016, in a hit-and-run, while fleeing from police aggression. With her blood on the asphalt and people around her, the zungueira lost her life on the spot due to head trauma. Even with the National Police denying that she lost her life as a result of their persecution, people who witnessed the act, as well as the voices that were raised on social media, said the opposite. (Gomes, 2018, p. 1, our translation).

Fig. 1: Zungueira killed after being run over in Viana, Angola, in 2016. Source: O País. Gomes, 2018. Available at https://opais.co.ao/index.php/2018/04/15/quando-se-perde-a-vida-fugindo-dos-fiscais/. Accessed 12 May 2021.

From the colonial period to the present day, the Angolan State has sought to eradicate itinerant sales. President João Lourenço, in his current government, intends to put an end to street sales in Angola with his “Operação Resgate”. The president of the National Association of Street Vendors, José Kassoma, when interviewed by DW, holds the Angolan state responsible for the deaths of the zungueiras. He stated that:

There have been excesses in all operations which tried to organize the zungueiras and itinerant sales. That's why there are deaths and more and more saleswomen with injuries. There are sellers who have been pushed off footbridges and ended up with physical disabilities [...] Enough with the deaths of zungueiras as it has been happening in our country (Kassoma, J., cited in Luamba, 2019, p. 1, our translation).

The zungueiras report being tired of all the physical aggression and accuse the police of mistreatment, corruption, and destruction of the products they sell. “When the police come, they don't have any appreciation, they wreck our business” [...] they also claim the police should “talk to people” and not “beat ladies down” (Luamba, 2019, p. 1, our translation). Human Rights Watch (Rimli, 2013) documented several examples of police brutality and violence suffered by zungueiras and condemned the stance of National Police agents, exposing the harassment and intimidation that reflect Angola's growing repressive environment. The documents also give voice to a zungueira:

At the place where I sell there are many zungueiras [street vendors] carrying babies on their backs. The police and inspectors come by motorcycle. They kick us and throw our things to the ground. Some take our stuff away. They will only not take it if we pay up. They say, “Get this crap out of here. This is not a place to sell.” We ask: “And where are we going? There are no markets for us. What are you doing with our things?” Others are silent. They are afraid (interview with a zungueira, cited in Rimli, 2013, p. 1, our translation).

The practice of zunga is legalized by the Angolan State, and regulated by Law 1/07 on Commercial Activities, which standardises the exercise of informal commerce (República de Angola, 2007). Therefore, it needs to be analysed as a structural and social factor, as the reason behind the zunga is the extreme poverty and the lack of employment opportunities. In this sense, zungueiras are agents that contribute against the low rate of employability in the country. That same law, which regulates commercial practices and standardises informal trade, establishes that:

To safeguard commercial urbanism, the following must be observed: a) Urban areas - commercial surfaces in general, namely hypermarkets, shopping centers, supermarkets, mini-markets, as well as urban municipal markets, facilities which provide relevant commercial services and wholesale commercial activity in the form of cash and carry; b) Suburban areas — in addition to commercial areas, they also encompass retail and precarious trade, urban municipal, supply and street markets, street fairs, commercial warehouses and other activities provided for by law which are generally established in these areas; c) Rural areas — establish in general retail trade, precarious trade, general trade, itinerant trade, fair trade, rural municipal markets, small agricultural and transport activities, and other activities stated by law. (República de Angola, 2007, art. 27, our translation).

Therefore, we are faced with a law that defines borders between the different segments of commerce, excluding and limiting the zunga to peripheral or rural areas - a behaviour not different from that of the colonial period. Although immersed in adversity, it is paradoxically necessary to consider zunga as a practice that has roots in the Angolan tradition, from the point of view of identity. It is important to reinforce habits and ways of life to fight hegemony in countries with colonial and patriarchal tradition. Faced with pressure from global Capitalism in its bets on either incomplete or uneven and combined modernization, in countries of the Global South which mainly export commodities — in the case of Angola, especially oil — the stakes on the urbanization of strategic sectors provide a misleading image of modernization. Contradictions are revealed as a complementary component in the deprived sectors of the city before the choice of public investments in association with the interests of the internal dominant classes versus the excluded contingents of the population.

We live in a period of transformation. In the process of social, political, and economic struggle, we find a certain type of knowledge to be preached as the only, legitimate, and universal standard to aim for, ultimately ruled by the globalized capitalist economy. In countries of the Global South, the struggle to establish identities as postcolonial nations involves decisions towards social equity or submission to the dominant neoliberalism, which can be seen in the urban morphology through elections carried out by the State. The most elementary means of survival under harsh inequality bring up ways of life that express vital knowledge. When we approach this discussion from the perspective of Southern epistemologies it reveals ways of resistance against this oppression of exclusive knowledge — which encompasses knowledge, habits, social practices, and struggle for existence rights — articulated to the understanding of the zungueiras phenomenon. According to Boaventura de Sousa Santos (2018):

Capitalism is currently experiencing one of the most destructive moments in its recent history, as witnessed by new forms of primitive accumulation through dispossession, the re-edition of the colonial prey, which now extends throughout the Global South, from land grabbing to wage theft and bank bailouts, subjected to the capitalist law of the value of resources and common goods, causing the displacement of millions of poor peasants and indigenous peoples, environmental devastation and ecological disasters; and the never ending renewal of colonialism, which reveals, in both old and new aspects, the same genocidal impulse, racist sociability, the thirst for appropriation and violence exerted on considered endless resources and on people viewed as inferior and even non-human (Santos, 2018, p. 298-299, our translation).

3 Final thoughts

The idea that Eurocentric knowledge is the only legitimate one in confirming science and, therefore, in analysing the Global South under Northern lenses, creates an oppression of other sources and types of knowledge. Faced with the dilemmas of countries with colonial roots in their march towards the consolidation of independence, the role of the State can often reiterate new forms of domination, including internal ones. Boaventura de Sousa Santos states that systematizing what he defines as Southern epistemologies aim to identify and appreciate what is often not recognized as knowledge, given the dominant epistemologies, and that this knowledge arises as a resistance against the repression of epistemologies that legitimate this repression. (Santos, 2018, p. 303, our translation).

Given this understanding, it seems desirable that, when we analyse informal trading in Angola, we move away from critical Eurocentric thinking and understand it under aspects of African logic, considering the social, political and economic context of the country and the struggle of the classes which maintains, after all, the neo-colonial persistence. The intention would not be to create a stagnated distance from critical and scientific thinking to nullify or disregard the Eurocentric tradition. On the contrary, we aim here to open spaces for analysis of realities of former colonies that are little discussed and often ignored by the dominant tradition, despite their struggles for independence and self-determination. We consider the case of zungueiras outlined here as a relatively particular phenomenon that deliberates a broader discussion inserted in the conception of the Global South in its diversities.

References

Bettencourt, A. C. A., 2011. Qualificação e reabilitação de áreas urbanas críticas: os musseques de Luanda. Master. Universidade de Lisboa. Available at http://hdl.handle.net/10400.5/3654. Accessed 20 Apr. 2021.

Cain, A., 2019. Mapeamento da pobreza urbana em Luanda ao longo de quatro décadas. In: Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa, SEMINÁRIO ÁFRICA HABITAT. Lisbon, Portugal 7 May 2019. Available at https://www.researchgate.net/publication/333480590_Mapeamento_da_Pobreza_Urbana_em_Luanda_-_Africa_Habitat_-_Faculdade_de_Arquitetura_da_Universidade_de_Lisboa_-_7_de_maio_2019#fullTextFileContent. [Accessed 4 Mar. 2020].

Gomes, A., 2018. Quando se perde a vida fugindo dos fiscais. O País, [online] 15 April. Available at https://opais.co.ao/index.php/2018/04/15/quando-se-perde-a-vida-fugindo-dos-fiscais/. Accessed 18 Aug. 2020.

Governo de Angola. Ministério do Planeamento. INE. Instituto Nacional de Estatística, 2016. Resultados definitivos do recenseamento geral da população e da habitação de Angola 2014: Censo 2014. [pdf] Luanda: Governo de Angola. Available at https://andine.ine.gov.ao/nada/index.php/catalog/3. Accessed 7 Apr. 2021.

Harvey, D., 2012. O direito à cidade. Lutas Sociais, Dossiê Barricadas Urbanas, Jul./Dec., (29), p.73-89.

Harvey, D., 2014. Cidades rebeldes: do direito à cidade à revolução urbana. Translated by Jeferson Camargo. São Paulo: Martins Fontes.

Luamba, M., 2019. Zungueiras em Angola: "Estamos cansadas" da violência da polícia. DW, [online] 21 March. Available at https://p.dw.com/p/3FRH0. Accessed 31 Apr. 2021.

Meneses, M. P., 2016. A questão negra entre continentes: possibilidades de tradução intercultural a partir de práticas de luta? Sociologias, [online] 18 (43), Sep./Dec., p.176-206. Available at https://doi.org/10.1590/15174522-018004307. Accessed 14 Apr. 2021.

Pantoja, S., 2000. Quitandas e arimos: um negócio feminino no abastecimento de géneros alimentícios em Luanda nos séculos XVIII e XIX. In: S. Pantoja, ed. 2000. Entre Áfricas e Brasis. Brasília: Editora Paralelo 15.

UNDP. United Nations Development Programme, 2019. Relatório do Desenvolvimento Humano 2019. Além do rendimento, além das médias, além do presente: desigualdades no desenvolvimento humano no século XXI. [pdf] New York: UNDP. Available at http://hdr.undp.org/sites/default/files/hdr_2019_pt.pdf. Accessed 20 Jun. 2021. eISBN: 978-92-1-004502-5.

Prates, T. J. M., 2016. Cidade informal: reflexões para um futuro sustentável nos musseques de Luanda. Master. Universidade de Lisboa. Available at http://hdl.handle.net/10400.5/13639. Accessed 18 May 2020.

Queiroz, L. H. C. R., 2016. Entre legados coloniais e agências: as zungueiras na produção do espaço urbano de Luanda. Master. Universidade de Brasília. Available at https://repositorio.unb.br/bitstream/10482/23052/1/2016_La%C3%ADsHelenaCust%C3%B3dioRodriguesdeQueiroz.pdf. Accessed 4 Mar. 2020.

Reis, J. J., Chambassuco, M., 2021. Quase 1,3 milhões de angolanos foram para a informalidade. Expansão, [online] 29 Jan. Available at https://bit.ly/32mvCd1. Accessed 15 May 2021.

República de Angola. Ministério do Comércio, 2007. Lei das Actividades Comerciais, Lei n. 1/07 de 14 de maio, 2007. Diário da República I (58), p.897-909, 14 maio 2007. Available at https://bit.ly/3FdY6Ep. Accessed 12 Jun. 2021.

Ribas, O., 1989. Sunguilando: contos tradicionais angolanos: prosa. Porto, Portugal: ASA Editions to União dos Escritores Angolanos.

Rimli, L., 2013. “Tira essas porcarias daqui”: violência policial contra vendedores ambulantes em Angola. Translated from English by Diana Tarré. USA: Human Rights Watch, 2013. ISBN: 978-1-62313-0596. Available at https://www.hrw.org/sites/default/files/report_pdf/angola1013po.pdf. Accessed 18 Aug. 2021.

Santos, M., 2001. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 6th ed. Rio de Janeiro: Record.

Santos, M., 2004. O espaço dividido: os dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos. Translated by Myrna T. Rego Viana. 2nd ed. São Paulo: EDUSP.

Santos, O. A., 2010. Do pregão da avó Ximinha ao grito da zungueira: trajetória femininas no comércio de rua em Luanda. Master. Universidade Federal da Bahia. Available at https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/23955. Accessed 22 Mar. 2020.

Santos, O., 2011. Mamãs quitandeiras, kínguilas e zungueiras: trajectórias femininas e quotidiano de comerciantes de rua em Luanda. Revista Angolana de Sociologia [online] (8), p.35-61. Available at https://journals.openedition.org/ras/510#text. Accessed 22 Mar. 2020.

Santos, B. S., 2018. Construindo as epistemologias do sul. Antologia essencial, Volume 1. Buenos Aires: CLACSO.

Santos, K. L., 2020. Da informalidade ao circuito inferior: um estudo sobre a economia urbana em Gana no início do século XXI. Geografia, [online] 23 (50), p.1-17. Available at https://periodicos.uff.br/geographia/article/view/38272/29154. Accessed 02 Jun. 2021.