O ineditismo dos recursos tecnológicos atualmente disponíveis ou em fase de desenvolvimento leva ao surgimento de uma nova terminologia que dê conta desses novos equipamentos, sistemas ou ambientes. Assim, tem sido recorrente o uso de termos e expressões como domótica, edifício inteligente, automação residencial, entre outras.
Forjado na França dos anos 1980, o conceito de domótica tem sido usado em referência à integração de tecnologias diversas no ambiente doméstico mediante o uso simultâneo de eletricidade, eletrônica, informática e telecomunicações, buscando como resultado melhorar aspectos como segurança, conforto, flexibilidade de uso dos espaços, comunicações intra e extra-grupo e gerenciamento de recursos econômicos. CAMARGO (2002) reúne algumas definições de edifícios inteligentes; extraídas de suas reflexões, podem-se aplicar com mais propriedade ao caso dos edifícios residenciais as definições abaixo:
Edifício
inteligente é aquele que incorpora dispositivos de controle automático
aos seus sistemas técnicos e administrativos ;
Edifício inteligente é aquele que conjuga, de forma racional
e econômica , os recursos técnicos e tecnológicos disponíveis
de forma a proporcionar um meio ideal ao desenvolvimento da atividade humana.
A expressão automação residencial tem sido utilizada para denominar diversos recursos disponibilizados para controle de equipamentos em uso no espaço privado da habitação. Historicamente, o termo automação pode se referir à utilização de equipamentos e sistemas automáticos, particularmente os sistemas de fabricação ou sistemas de processamento de dados, que exigem pouca ou nenhuma intervenção humana em suas operações normais. Nesse sentido o termo automação teria sido utilizado pela primeira vez em 1946, mas a origem desse conceito pode remontar aos anos 1880, segundo a mesma fonte.
Se, no passado, a automação possibilitou a uniformidade e a padronização da produção industrial, pode-se dizer que no contexto atual esse recurso está voltado justamente para a flexibilização dessa produção, criando a possibilidade de personalização em massa. Numa outra vertente, pode-se dizer que a automação residencial, como se propõe hoje, é resultado da migração de conceitos adotados na área industrial para a área residencial.
Dentre algumas das conclusões do estudo sobre o tema, verificou-se que a automação residencial no Brasil resume-se em resolver problemas de cunho meramente funcional, como abrir e fechar janelas e portas, controlar intensidade de luzes e utilizar sensores de presença para acionar dispositivos, limitando-se ao funcionamento e ao desenvolvimento da tecnologia, e sem uma maior análise do seu real impacto no espaço doméstico. Ela é pensada quase que exclusivamente por profissionais de perfil técnico, que não consideram os modos de vida do morador.
Percebe-se que é predominantemente entre os engenheiros que se desenvolve a indústria da automação, e que na maior parte das vezes, não questionam a qualidade espacial em função dos modos de vida dos usuários e habitantes desse lar "conectado". Com a formação de equipes trans-disciplinares, haveria muitos ganhos para a área, com análises técnicas e conceituais de psicólogos, arquitetos, engenheiros, antropólogos e outros profissionais. Desta forma, tais dispositivos poderiam, talvez, agregar melhorias reais à qualidade de vida dos moradores dessa habitação automatizada.
Os equipamentos para a automação residencial disponibilizados no mercado brasileiro hoje estão envolvidos por uma embalagem de forte apelo mercadológico trazidos juntos à euforia advinda da influência das novas mídias e da sua larga disseminação. São as mais variadas promessas para a "Casa do futuro", ou para a "Casa Inteligente. Até onde o cinema de Hollywood poderia ter influenciado o imaginário dos propositores de automação? Essa pergunta se faz presente em decorrência de características observadas no discurso dos produtores, assim como, em alguns casos, no design do objeto - sempre reverenciando tal imaginário futurístico.
É comum, por exemplo, encontrar referências explícitas ao famoso desenho, "A família Jetsons", como comparação a um modo de vida metropolitano do futuro. Neste caso, vale notar que a família Jetsons apresenta um núcleo tipicamente convencional e característico de todo o século XX, composto por pai, mãe e filhos, ou seja, a mesma composição da família pré-histórica ilustrada por outro desenho bastante famoso, os "Flintstones". Nos dois desenhos é importante validar a tentativa de disseminar o "american way of life", que determinava a formação de famílias nucleares, capitaneadas pelo homem e regulando o trabalho doméstico pela mãe, dona do lar. Bem, se a família nuclear clássica representa hoje, segundo dados do IBGE de 2004, cerca de 55% dos grupos familiares no Brasil, é interessante notar que os outros 45% se constituem por diversos outros grupos, como singles, membros sem grau de parentesco, homossexuais, uniões livres etc. Estes dados são de fundamental importância para a reflexão da necessidade de uma nova configuração espacial da habitação contemporânea, que deveria responder mais qualitativamente a esses novos modos de viver.
Segundo dados da Associação Brasileira de Automação Residencial - AURESIDE, o Brasil já seria hoje um dos maiores consumidores de automação residencial no mundo. Esse dado se justificaria considerando-se a falta de segurança pessoal atualmente. Sabe-se que a "Indústria do Medo" é uma das grandes geradoras de riquezas no país, sendo uma "corporação" extremamente rentável para alguns. É de fundamental importância apreender o ambiente político-cultural gerado a partir da divulgação do medo através das mídias, para justificar a larga disseminação dos mais diversos produtos de segurança, criando um ambiente urbano panóptico, supostamente mais seguro, e que recentemente migra para o espaço doméstico, através de câmeras de vigilância, controladores de acesso via leitura digital, sensores de presença, alarmes, entre muitos outros dispositivos.
Após uma análise cuidadosa dos equipamentos para automação, verifica-se que grandes centros internacionais de pesquisa, como o MIT - Massachutes Institute of Technology, por exemplo, já vinham prevendo, uma tendência à hibridização entre esses equipamentos. Sabe-se que o celular integra-se com a Internet e mais recentemente com as câmeras digitais, os palm tops mesclam-se com celulares e assumem tarefas de um computador, a televisão migra para o híbrido digital integrando-se também com a Internet. Atualmente já é possível se controlar a intensidade das luzes, a temperatura da banheira e a música ambiente diretamente do palm top, por exemplo, de qualquer local do planeta, via Internet, integrando os diversos equipamentos dentro da habitação. Bem, cabe agora descobrir os reais usos e necessidades para tais equipamentos. Percebe-se que muitos desses dispositivos são apenas gadgets (bugigangas) contemporâneos que passarão por um processo natural de seleção de seus usos, lembrando-nos uma situação típica do pós-segunda guerra mundial, onde inúmeros gadgets surgiram nos lares norte americanos, numa tentativa de recolocar as donas de casa no ambiente doméstico, retomando o "american way of life" das famílias que haviam enviado seus homens para lutar na guerra. Aparatos como descascadores elétricos, abridores e utensílios das mais variadas naturezas buscavam modernizar o espaço doméstico e atrair as donas de casa novamente para o lar, uma vez que as mulheres tiveram de assumir postos de trabalho até então comandados pelos homens.
Nota-se que pesquisadores de todo o mundo prevêem que as novas tecnologias estarão cada vez mais presentes no cotidiano da habitação contemporânea, de forma ubíqua, diluídas e pulverizadas no espaço. Novas interfaces de acesso ao ciberespaço estão sendo desenvolvidas, uma vez que a atual interface de acesso encontra-se num estágio pobre e limitada basicamente ao clique do mouse e ao monitor bidimensional. Os estudiosos na área da nanotecnologia vêm desenvolvendo novas possibilidades ao acesso a espaços virtuais, com o uso de wearable computers, por exemplo: Echarpes comunicantes, brincos, relógios e óculos com Internet, implantes subcutâneos etc. As pesquisas revelam possibilidades inovadoras que constituirão novas realidades cognitivas ao homem.
Pode-se concluir que esse superequipamento do ambiente doméstico, da forma como vem sendo pensado pelos produtores de automação residencial, não traz mudanças significativas ao espaço da habitação, conservando o modelo tradicional burguês parisiense tripartite e compartimentado. Daí a necessidade de propositores de espaços, arquitetos, designers, etc, voltarem-se com mais atenção para estas questões, trabalhando interdisciplinarmente com engenheiros e profissionais da área, ajudando no desenvolvimento de pesquisas relacionadas à questão da inserção de mídias digitais interativas no cotidiano e nos modos de vida da verdadeira família contemporânea, incluindo seu espaço de habitar e as novas relações entre os seus membros, desenvolvendo reais usos dos equipamentos e dispositivos de automação. Além disso, deveria fazer parte da formação do arquiteto, um olhar mais cuidadoso voltado para temas que engendram as questões da virtualidade, verificando a intensidade dessas influências e do uso do computador como composição e concepção espacial.
Links
úteis:
www.portaldaautomacao.com.br
www.aureside.org.br/
www.remotehome.org