LIZIANE DE OLIVEIRA JORGE

Liziane De Oliveira Jorge é Arquiteta-urbanista, Doutora em Arquitetura pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, professora da Universidade Vila Velha e pesquisadora do Grupo ArqCidade, onde investiga a qualidade da arquitetura residencial contemporânea.


Como citar esse texto: Como citar esse texto: JORGE, L. D. O. MORADIA E CONSUMO – STATUS SOCIAL, DESEJO E SATISFAÇÃO. São Carlos, n. 9 [online], 2013. Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus09/?sec=4&item=4&lang=pt>. Acesso em: 13 Mai. 2025.


Resumo

O presente trabalho tem o objetivo de discutir significados da habitação na sociedade contemporânea. Apresenta os argumentos que consolidam o papel prioritário da moradia como um produto de mercado e consumo, submetido a uma lógica cultural, econômica e publicitária que, conscientemente, se beneficia de métodos sedutores para difundir novos estilos de vida. Transformada em símbolo cultural de prestigio e sucesso, a habitação contemporânea produzida pelo mercado imobiliário nacional, de forma geral, sugere um sistema de valores que permite ao indivíduo o reconhecimento e a integração ao grupo social almejado. Por fim, o texto avalia a dicotomia do arquiteto diante do exercício profissional de elaboração da habitação, que se decompõe entre o patamar técnico e a erudição, entre a prestação de um serviço e o idealismo artístico.

Palavras-chave: mercado imobiliário; estilo de vida; status social; habitação contemporânea; consumo.


Habitação e cidade

A habitação apresenta-se como uma exigência fundamental para o homem consubstanciar as suas condições sociais, fisiológicas, psicológicas e morais. Caracterizado como um bem imóvel e durável, a moradia assegura aos indivíduos a sensação de proteção, de estabilidade, e o reconhecimento dentro de uma estrutura social. A cidade contemporânea, local de gravitação de uma massa heterogênea de usuários com estilos de vida plurais, deve fomentar, através da habitação, a manifestação da diversidade, da indeterminação, e acolher as incertezas e as necessidades distintas que acompanharão o homem ao longo de sua vida, garantindo oportunidades de escolha. Complementarmente, o ato de habitar, que agora demanda uma maior integração de usos, funções e atividades, não se esgota no espaço doméstico, mas projeta no espaço urbano a interlocução com outros grupos de convivência, a participação comunitária e o usufruto de uma sofisticada rede de comunicação e equipamentos.

Essa sinergia entre a habitação e a cidade apresenta-se, hoje, cerceada pela idealização de um estilo de vida mitificado e pela imposição de preferências habitacionais manipuladas pela colossal indústria do marketing, instrumento de controle apropriado pelo mercado imobiliário, que impõe necessidades ilimitadas que ameaçam a essência do homem, a sua liberdade e a reciprocidade com os outros seres humanos.

Habitação e status social

A população das cidades contemporâneas cresce continuamente, subtraindo o solo urbano e multiplicando as densidades nos grandes centros. A solução ideal para abrigar essa população em expansão e evitar o consumo massivo do território corresponde à formação de habitações agrupadas, cidades densas e compactas (FALAGÁN; MONTANER; MUXÍ, 2011, p. 37). A habitação coletiva, representante absoluta da vida urbana, é o modelo tipológico que, ausente de um cliente exclusivo, adota um programa padrão, baseado em critérios biológicos, funcionais e normativos. Ao desconsiderar as necessidades divergentes dos moradores, manipular a consciência coletiva e consolidar o espaço em formas padronizadas, a moradia coletiva contribui para distanciar o usuário da experiência plena do espaço doméstico, o lugar dos desejos e afetos, da multiplicidade, da intimidade, da desordem, da indeterminação natural do ser.

As tipologias habitacionais coletivas, na interpretação de KOPP (1990), fundamentadas a partir de princípios científicos, higienistas, e econômicos, viabilizaram a proliferação de edifícios monótonos, idênticos e repetitivos. Características como funcionalidade, ergonomia, mecanização, simplificação programática e estética, legitimadas através da racionalização e da normalização, foram internacionalizadas a partir da primeira metade do século XX, entretanto, ainda hoje, são adotadas como parâmetros essenciais para formulações de habitações coletivas. Após inúmeros modelos baseados em convenções universais, as soluções habitacionais padronizadas, tipificadas e prescritas, continuam a ser um álibi para o desenvolvimento de edifícios residenciais multifamiliares, desta vez, adornados com atributos e amenidades coletivas supostamente inovadoras.

Ameaçada pela uniformização em larga escala e pelos clichês de felicidade explorados pela indústria do consumo, a moradia é reduzida em mercadoria, produto imobiliário, símbolo de status social e de uma cultura internacional unificada. Apesar da influência inevitável da lógica mercadológica capitalista, modelo de dominação econômica, o indivíduo almeja através da habitação um diferencial que confira sentido e significado ao cotidiano, ou mesmo a condição distinta de personalidade entre os cidadãos comuns.

A contribuição de autores distintos, como Henri Lefebvre, Zygmunt Bauman, Pierre Bourdieu e Bernard Tschumi, é oportuna para trazer à tona, sob um viés moderno e pós-moderno, a manipulação dos conceitos de individualismo, liberdade, estabilidade e cultura na vida cotidiana, pois, uma vez transformados em poderosos instrumentos ideológicos, camuflam as suas reais intenções tendenciosas, de beneficiar os proprietários dos meios de produção.

Um dos mais astuciosos instrumentos de coerção, o marketing imobiliário, artifício de troca poderoso, exerce uma notável influência perante a sociedade contemporânea que, influenciada por um estilo de vida próspero, sofisticado, obsolescente, efêmero e tecnológico, encontra no produto imobiliário, a forma ideal para a consolidação dos seus desejos. Como objetos de consumo, os edifícios residenciais e seus atributos dominam a esfera dos desejos, ditando modas, gostos e tendências, monopolizando o imaginário social e a opção por um bem imóvel que acompanhe as últimas exigências do mercado. Essa relação estabelece o reflexo de uma sociedade de consumo que anseia por prazer, prestígio e status social. Segundo Lefebvre (1991, p. 89), “o fim, o objetivo, a legitimação oficial dessa sociedade é a satisfação”, e a sua plenitude só é alcançada através do reconhecimento de um estatuto de superioridade perante os demais, amparado por códigos sociais disseminados que transportam as qualidades do nível prático para o imaginário.

A apropriação coletiva de objetos para o conjunto da vida social garante a satisfação da sociedade de consumo. Nesse sentido,

[...] um certo número de objetos transpõem o limiar que separa o nível prático do imaginário e se impregnam de afetividade e sonho, porque são ao mesmo tempo percebidos (socialmente) e falados. Alguns chegam ao estatuto “superior” e recebem uma sobrecarga ideológica. Dessa forma, a “casa de campo” é praticada como uma possibilidade de apropriação para o habitante, mas também sonhada, ideologizada. [...] O imaginário propriamente dito faz parte do cotidiano. Cada um pede a cada dia (ou a cada semana) sua ração de cotidiano. No entanto, o imaginário, com relação à cotidianidade prática (pressão e apropriação), tem um papel: mascarar a predominância das pressões, a fraca capacidade de apropriação, a acuidade dos conflitos e os problemas “reais”. A publicidade não fornece apenas uma ideologia do consumo; uma representação do “eu” consumidor, que se satisfaz como consumidor, que se realiza em um ato e coincide com sua imagem (o seu ideal) (LEFEBVRE, 1991, p. 100).

Os clichês de felicidade que a cultura de consumo insinua seduzem o cidadão, ávido por representar o seu papel na cidade modelo idealizada pelo marketing, onde são explorados conceitos de prestígio, como sustentabilidade, ecologia, segurança, estratégias para a multiplicação de espaços enclausurados, distantes da suposta promiscuidade urbana. Inconscientemente, a diversidade urbana e a multifuncionalidade, critérios eficazes na qualidade de vida e na socialização dos cidadãos, são facilmente substituídos por enclaves residenciais segregados, como condomínios fechados exclusivos, que reúnem usuários iguais, sem risco de uma contaminação urbana. Essa busca por uma nova ordem urbana, inscrita em um mundo perfeito, idealizado, sitiado, sem intrusos ou vizinhos diferentes e inesperados, reflete, como diria Bauman (1998, p. 22) uma purificação radical de classes, unidas para combater a desordem, a sujeira e a diversificação do mundo. Aos poucos, os indivíduos que permanecem fora desse sistema, sentem-se deslocados, desiludidos, incapazes de competir e ganhar o prestígio dos usuários consagrados. A vida, sem sentido, pela condição inatingível de absorver uma satisfação momentânea, é banalizada por uma excludente estratégia social, que converte o espaço físico como um mero objeto de satisfação.

Imbuídos de “desejo social”, de uma imagem pré-concebida de satisfação, os futuros moradores, ao adquirir uma habitação, buscam conquistar a felicidade através de um diferencial que lhes permita transitar no “território dos ilustres”, esquecendo-se que as necessidades ordinárias do cotidiano pressupõem, consecutivamente, a supressão tanto das necessidades básicas do indivíduo como a provisão de um espaço doméstico que lhes permita desenvolver as relações familiares e sociais com segurança, conforto e bem-estar. Isso significa que a especialização funcional, o determinismo e a padronização, estratégias ainda perpetuadas pela produção imobiliária coletiva, homogeneízam o comportamento e desfavorecem o uso diversificado da habitação, condição indispensável ao sujeito contemporâneo, ao estilo de vida plural das novas estruturas familiares. 

A partir dessa observação, pode-se afirmar que a classe média é a categoria social mais exposta às tentações da sedução publicitária, que transfere a importância de valores primordiais à habitação, como identidade pessoal, privacidade e segurança emocional, para um patamar inferior, sobrepujado por promessas imediatas de uma felicidade doméstica programada, manipulada a partir de necessidades efêmeras e de uma vaidade presunçosa dos indivíduos. As camadas médias, segundo Lefebrve (1991), por uma ausência de estilo, almejam tornarem-se personalidades olímpicas, sem vida cotidiana nem mesmo domicílio fixo, inspiradas por um desejo aventureiro, pela experiência de uma vida livre, excitante, sem compromissos.

O Olímpico, reconstitui na opulência, com os meios de poderio, a vagabundagem “livre”, o nomadismo, vive no seu iate, vai de palácio a palácio ou de um castelo a outro. Está acima do “habitante”. Para o comum dos mortais, o Olímpico, criatura de sonho, fornece as imagens sensíveis (vendidas muito caro) do imaginário. O possível, todo o possível, se encarna. É uma outra cotidianidade,  mal conhecida e, no entanto, reconhecida: piscina, telefone branco, mesa de estilo. Mas há uma transcendência: o Olímpico não habita mais. Quanto ao habitante, fixado no solo, a cotidianidade o sitia, o imerge, o engole. (LEFEBVRE, 1991, p. 103).

Marcas registradas da produção em série - padronização, funcionalidade e repetição - características legitimadas através da racionalização e da normalização, princípios difundidos a partir da primeira metade do século XX, são adotadas, ainda hoje, como álibis para justificar uma política habitacional obtusa, no sentido de impor ao usuário tipificado, cliente anônimo dos edifícios de habitação coletiva, limitações severas ao uso do espaço doméstico. Essa condição de subordinação do usuário pela utilidade e pela consequente prescrição de comportamentos e hábitos, aliado ao empobrecimento da vida urbana, apresenta-se, por sua vez, encoberta pelas artimanhas do mercado imobiliário, que vende a habitação como um produto a ser consumido, e não habitado em sua plenitude.

Para Bourdieu (2001, p. 83), a competição mercantil é um ingrediente de submissão e nivelamento social, uma vez que “a concorrência, longe de diversificar, homogeneíza”. O mito da diferenciação de produtos é um contraponto à uniformização da oferta, portanto, as possibilidades de escolha a que se submete a classe média são rigidamente controladas, camufladas pela dimensão imagética e cultural, pelo consumo de bens simbólicos, pelo status social e outros valores que reduzem os indivíduos a uma categoria vulgar e uniforme.

O estilo de vida almejado pelas sociedades contemporâneas atinge todas as categorias sociais. As elites, que gozam com maior intensidade dos avanços da era da informação, sofrem uma extraordinária influência dos fenômenos da cultura global, que se instaurou em todas as esferas da vida cotidiana. As novidades tecnológicas, o culto ao corpo, a moda, a arte, e o consumo, são ditados por uma linearidade alimentada pela publicidade e pela mídia, colossais meios de difusão de uma ideologia econômica de dominação. As consequências dessa horizontalidade ameaçam a especificidade histórica e cultural de cada local, uma vez que materializam formas espaciais e ambientes que se tornam símbolos dessa identidade global onde quer que ela se manifeste.

Para conquistar uma ideologia de dominação, “a cultura de consumo usa imagens, signos e bens simbólicos evocativos de sonhos, desejos e fantasias que sugerem autenticidade romântica e realização emocional em dar prazer a si mesmo” (FEATHERSTONE, 1995, p. 48). Os indivíduos, estimulados pelos apelos visuais, identificam-se com a mensagem dos anúncios, cujos objetos além de representarem a mercadoria em si, representam os símbolos admirados pela classe média pós-moderna, em busca do “mundo dos sonhos”, repleto de “pessoas fascinadas com a identidade, a apresentação, a aparência, o estilo de vida e a busca incessante de novas experiências” (FEATHERSTONE, 1995, p. 71). Cientes da necessidade da modelagem estética da vida cotidiana, os intermediários culturais propõem a renovação constante dos signos a que se submete a mercadoria, para que, dessa forma, exista uma reprodução ininterrupta de produtos, prontos a serem consumidos e descartados.

Para Featherstone (1995, p. 33), a publicidade é especialmente capaz de explorar possibilidades de associações e ilusões culturais, fixando imagens de romance, exotismo, desejo, beleza, realização, comunalidade, progresso científico e a vida boa nos bens de consumo mundanos, tais como sabões, máquinas de lavar, automóveis e bebidas alcoólicas. Essa fórmula infalível, que reposiciona o morador a uma condição de consumidor, transfere a habitação para uma posição obsolescente e ultrapassada, incapaz de responder às necessidades do ciclo familiar de uma geração. A desconsideração dos critérios subjetivos, como a afeição pelo imóvel, a construção de uma trajetória de vida, a identidade do bairro de origem e a familiaridade com a vizinhança, são apenas algumas das condições solapadas pela substituição do imóvel, sem falar da inconveniência dimensional dos novos apartamentos, dissimulados a partir da suposta eficácia dos ambientes conjugados e das vantagens das generosas varandas, programadas para serem incorporadas às salas e aos cômodos contíguos. Subtraem-se os metros quadrados, somam-se as amenidades tão desejadas pelos novos moradores.

O panorama habitacional encontra-se demasiadamente inserido na lógica mercadológica capitalista contemporânea, que produz imagens e locais de consumo, promete felicidade e realização, alçando o cidadão comum à categoria distinta de personalidade. Não raro, os anúncios exaltam a felicidade e os encantamentos da família nuclear, modelo tradicional que progressivamente vem sendo suplantado por novos arranjos familiares plurais, novas estruturas domésticas e formas de vida, menos paternalistas e ritualísticas.

Figura 1. A persistência da família nuclear como estereótipo de felicidade nos folhetos publicitários de empreendimentos habitacionais. Fonte: Folder publicitário. Empreendimento Vivienda Laranjeiras Condomínio Clube, Serra, ES.

Os anúncios da arquitetura são definidos por Bernard Tschumi como parte do processo imaginário da arquitetura, traduzida no papel ao “representar” o espaço virtual. Essa figura mascarada, a arquitetura - que se esconde por trás de desenhos, palavras, preceitos, hábitos e restrições técnicas – precisa ser constantemente desvelada. “A função usual dos anúncios reproduzidos incessantemente, ao contrário do objeto arquitetônico singular, é incitar o desejo por alguma coisa que está além da página em si” (TSCHUMI, 2008, p. 582). A simulação obrigatória dos empreendimentos, através de montagens e perspectivas atraentes, ultrapassa a dimensão arquitetônica, no sentido de esclarecer os aspectos técnicos e funcionais do espaço, para vangloriar atributos intangíveis e ideológicos: segurança; tranquilidade; atributos geográficos e naturais (viver próximo à praia ou ao parque); exclusividade condomínios fechados); denominações bucólicas e expoentes consagrados (nomes de artistas, cidades, personalidades renomadas); características estilísticas.

Figura 2. Promessa de tranquilidade em empreendimento habitacional à margem de via arterial metropolitana. A imagem reflete harmonia com a natureza, e simula a negação do entorno e da cidade. Fonte: Folder publicitário. Empreendimento Itaúna Aldeia Parque, Serra, ES.

Os anúncios publicitários relacionados ao mercado imobiliário exploram palavras que permitam associações simbólicas, naturalmente assimiladas, representativas de prestígio e status social: comodidade, sofisticação, luxo, elegância, conforto, requinte, nobreza, modernidade, tecnologia, exclusividade, inovação, harmonia e outros. Conforme Bourdieu (2001, p. 86), “a publicidade e a mídia exercem influencia extraordinária sobre o conjunto das sociedades contemporâneas”, ditando modismos e padrões culturais que seguem a lógica do lucro.

A valorização dos atributos imobiliários em detrimento da planta-baixa do empreendimento é um fato arriscado para o cliente.  Fascinado pela qualidade prenunciada em morar em um apartamento com “inúmeras opções de lazer”, o usuário minimiza a importância do espaço privativo que proporciona os verdadeiros referenciais de lar e aconchego e as condições para o desempenho das tarefas cotidianas indispensáveis a uma família. Numa coletividade que se individualiza a cada dia, a assimilação de conceitos relacionados à sociabilidade parece ser paradoxal, como ser compelido a compartilhar o tão desejado espaço gourmet com as outras centenas de moradores dos apartamentos vizinhos. A arquitetura residencial contemporânea, como produto das massas, oferece desse modo, alternativas de escolha veladas, conforme diretrizes estabelecidas pelo próprio mercado, que restringem escolhas e liberdades, estimadas pelas elites como projeto de vida.

O arquiteto e os desafios da profissão na concepção da habitacional contemporânea

Segundo Philip Bess (2008, p. 409), a arquitetura predominante nos dias de hoje é construída por incorporadores imobiliários, e a própria arquitetura passou a ser encarada e louvada pelos proprietários, como mercadoria de compra e venda e um recurso de marketing. As pessoas, identificadas pelo autor como impregnadas de um “individualismo Nietzschiano”, no sentido inevitável de discordar de um pacto social prévio e projetar os seus gostos individuais e discordâncias, estão preocupadas unicamente com os interesses de suas vidas privadas e com a realização de seus projetos particulares, se recusando em participar do contexto da vida comunitária plena, exceto por conveniência. “A cidade é, em essência um empreendimento econômico que propicia aos indivíduos os bens materiais e o anonimato necessário à realização de seus planos pessoais” (Philip Bess, 2008, p. 407).  Esse é o contexto vigente que substitui a pluralidade e a singularidade do meio urbano para multiplicar espaços que exterminam a diversidade, afloram a paixão consumista dos indivíduos e simulam uma vida cívica participativa, pela simples catalisação de pessoas seduzidas por espaços comerciais e de entretenimento, como shoppings, tempos de consumo, museus temáticos e condomínios fechados. Essa amálgama de espaços mitificados representa, essencialmente, a manipulação símbolos em prol de um vocabulário urbano universal, recriando a mesma paisagem independentemente do contexto e do lugar.

No cerne da profissão, o arquiteto é doutrinado para atuar valorizando a dimensão artística, cultural e social. Autônomo em sua expressão máxima de criação, o arquiteto almeja reconhecimento coletivo através do objeto materializado, fruto de sua concepção mental diferenciada, representativa de cada época. Conforme Durand (1974, p. 10), o caráter liberal da profissão do arquiteto admite a relação intrínseca de confiança e responsabilidade, excluindo a conduta da procura pela clientela ou de anúncios ou reclames de caráter comercial. Em tempos vigentes, a maioria dos arquitetos estaria condenada por ferir a ética profissional, por lutar por uma fatia do mercado, por aceitar a decadência da profissão e assumir a culpa compartilhada pela perpetuação de exemplares voltados primordialmente ao consumo – midiático e econômico.

A visão crítica a respeito do papel da arquitetura na sociedade é desenvolvida por Ghirardo (2008, p. 417) em seu texto “A arquitetura da fraude” que, dentre outras reflexões, considera que a prática da arquitetura contemporânea estabelece a cisão entre a profissão encarada como arte ou como serviço. Regularmente, a primeira opção embriaga o território das utopias e da ficção, contrariando os interesses econômicos. As justificativas a essa classificação, conforme observa a autora são definidas segundo os atributos formais da obra - a partir de critérios opacos, críticas de julgo pessoal, pouco objetiváveis e arbitrárias - ou mesmo através de discursos evasivos que enaltecem a arquitetura a uma coerência sentimental. A segunda opção é sustentada pela parcela da categoria que colabora com a indústria da construção civil e com as empresas imobiliárias, admitindo a arquitetura como um comércio ou como um negócio.

Ao desenvolver projetos para o mercado imobiliário, o arquiteto geralmente ultrapassa os idealismos constantes a que se submete a profissão. Sujeito a uma relação de subordinação completa aos incorporadores e construtores, o arquiteto é destituído de seu poder decisório, reduzido constantemente a um instrumento para viabilizar a aprovação, ou o projeto legal do empreendimento. Em determinados casos, o profissional não desenvolve nem a fachada, nem o layout interno que acompanha a divulgação do empreendimento, devendo compartilhar com demais profissionais os eventuais triunfos provenientes da criação.  Vale à pena observar a opinião de Cordeiro Filho (2008) e Mahfuz (2008) sobre essa questão. O primeiro afirma que um empreendimento está relacionado com a apresentação da fachada, que irá determinar se o comprador vai desejar saber mais detalhes do negócio:

Um arquiteto especializado em fachadas é o que deve rolar. Não é necessário contratar grandes figuras das pranchetas, sucessores de Niemeyer, Ruy Ohtake, Paulo Mendes da Rocha ou outros medalhões. O arquiteto deve ter história em empreendimentos imobiliários. É isso que vale.(CORDEIRO FILHO, 2008, p. 63)

Mahfuz (2003), por sua vez, destaca o reposicionamento da prática profissional e a subordinação do potencial criativo do arquiteto, ao afirmar que a arquitetura transforma-se de uma atividade cultural a uma prestação de serviços:

O aspecto visual da maioria dos edifícios não é mais consequência de um processo projetual baseado em suas próprias leis, mas é determinado de fora por pessoas preocupadas com o seu potencial de venda. Ou seja, os arquitetos passaram a fazer o que lhes indicam profissionais da área de comunicação e marketing (MAHFUZ, 2003, p. 174).

Para as construtoras, a grife do arquiteto contribui para o marketing do empreendimento através da captação do cliente, ao oferecer mais um diferencial no estilo “Casa Cor”, com assinaturas de profissionais renomados e soluções diferenciadas. Destituído de suas habilidades eruditas, muitos arquitetos transformam-se em decoradores, profissão sem nenhuma diferenciação perante o parecer do usuário.

A herança de uma tradição pedagógica baseada na excepcionalidade ainda predomina a pauta da história da arquitetura nas instituições universitárias, além da sua explícita correlação à produção ocidental, que detém o conjunto de condições materiais e culturais que se reflete de forma globalizada. As obras significativas, admiradas e memoráveis são, no contexto contemporâneo, aquelas produzidas pelo magnetismo dos arquitetos de peso ou por edificações paradigmáticas que abrigam programas multiculturais ou especializados, como instituições, centros financeiros e comerciais. Ao lado de séculos de tradição e simbolismo, a arquitetura culta, agora, se equipara ao clichê reincidente da arquitetura global. A produção cotidiana, de maior predomínio, é pouco retratada, muito criticada e, normalmente, acusada de promover as maiores atrocidades à paisagem da cidade. Doutrinados na excepcionalidade do repertório arquitetônico idiossincrático, os arquitetos precisam de coragem para elaborar uma arquitetura ordinária, uma vez que se render ao mercado significa obediência às regras do sistema e renúncia às possibilidades de concepção de uma obra prosaica.

Para Mahfuz (2001), o padrão dominante da arquitetura brasileira contemporânea corresponde à produção de obras de baixa qualidade, cujas razões são bastante complexas. O autor admite a perda da dimensão cultural a que se submete à arquitetura, associada à “crescente predominância da construção comercial, dominada pelas razões do mercado e pela obsessão generalizada com a criação de imagens” (MAHFUZ, 2001, p. 1). A lógica do mercado teria conferido à arquitetura um caráter obsolescente, seguindo modas ou tendências, reduzindo o edifício a um objeto de consumo.

A consciência da dificuldade em definir a verdadeira essência da obra arquitetônica desagrega em categorias distintas o “cliente/usuário” do “autor/arquiteto” em uma dimensão longínqua. O entendimento fiel da arquitetura é restrito ao campo do conhecimento e aos cidadãos eruditos, sujeitos em extinção. O alerta de Malard (2006) permite a lucidez sobre o sistema de valores a que se submete a profissão e seu julgo a partir de um público habitual, que segundo a autora é capaz de reconhecer exclusivamente a diferença dos edifícios “antigos” e “modernos”, porém, estaria em apuros ao tentar diferenciar os modernos em brutalistas, construtivistas, high-tech, ou os antigos em renascentistas, barrocos, neoclássicos. O caráter estético da arquitetura, expresso fundamentalmente pela sua aparência exterior, pela forma, pela plástica, pelos “aspectos visuais que marcam a presença do objeto arquitetônico no mundo e o tornam conhecido, apreciado, discutido e polêmico“ (MALARD, 2006, p. 55), passa por um momento de ruptura em suas dimensões artísticas, pelas manifestações contemporâneas que concebem a arquitetura como produto de um modo de produção.

A recusa em aceitar a responsabilidade pelos problemas concretos da arquitetura e do mundo que a inscreve, é objeto de análise de Ghirardo, que credita à própria categoria profissional o distanciamento da reflexão perante a política da construção e as estruturas de poder existentes. Os arquitetos escolhem o caminho mais seguro, através da facilidade em acobertar os problemas sérios da arquitetura segundo a confortável crítica formalista. “Em nenhuma de suas manifestações, a categoria dos arquitetos ousa questionar a política da construção: quem constrói, onde, para quem, e a que preço” (GUIRARDO, 2008, p. 422). Aos arquitetos, é necessário reavaliar o papel do ofício, assumir a produção arquitetônica ordinária, buscar alternativas para conciliar as solicitações do grande mercado com a vertente técnico-artística.

Considerações finais

A clonagem de arquiteturas idealizadas, tipificadas e unívocas é reflexo de uma crise expandida – dos significados, da cultura e das relações sociais. A apropriação dessa instabilidade pela publicidade e pela mídia é a ideologia que alimenta uma identidade genérica, estetizada, desejada equivocadamente pelos moradores.

A simplificação da habitação a um produto de comercialização é um equívoco, que deve ser substituído por um objetivo mais nobre: garantir ao indivíduo oportunidades de escolha, suporte às atividades distintas e desejos inesperados.

Aos usuários, é necessário ultrapassar o entendimento da habitação como um cenário para a representação da vida cotidiana e assumir a responsabilidade de compatibilizar valores individuais e comunitários, indispensáveis à qualidade de vida urbana. Aos arquitetos, é necessário assumir o compromisso em recuar diante das imposições banais do grande mercado, pois adotar uma postura passiva e ingênua é desprezar toda a sua sapiência, o melhor instrumento que permitiria a construção de uma revolução social, de hábitos e comportamentos humanos.

Referências

BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
BESS, Philip. Comunitarismo e Emotivismo: Duas visões antagônicas sobre ética e arquitetura. In: NESBITT, Kate. Uma nova agenda para a arquitetura: Antologia teórica (1965-1995). São Paulo: Cosac Naify, 2ª ed. rev., 2008.
BOURDIEU, Pierre. Contrafogos 2: Por um movimento social europeu. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
COELHO NETTO. J. Teixeira. A construção no sentido da arquitetura. São Paulo: Perspectiva, 1979.
CORDEIRO FILHO, Antonio. Empreendedorismo no mercado imobiliário habitacional. São Paulo: Atlas, 2008.
DURAND, José Carlos. A profissão de arquiteto: estudo sociológico. Rio de Janeiro: CREA 5a. Região, 1974.
FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e pós-modernismo. Tradução Julio Assis Simões. São Paulo: Studio Nobel, 1995.
GHIRARDO, Diane. A arquitetura da fraude. In: NESBITT, Kate. Uma nova agenda para a arquitetura: Antologia teórica (1965-1995). São Paulo: Cosac Naify, 2ª ed. rev., 2008.
KOPP, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. São Paulo: EDUSP, 1990.
LEFEBVRE, Henri. A vida cotidiana no mundo moderno. Tradução por Alcides João de Barros. São Paulo: Ática, 1991.
MAHFUZ, Edson da Cunha. A arquitetura consumida na fogueira das vaidades. Arquitextos (São Paulo. Online), São Paulo, v. 012, 2001.
MAHFUZ, Edson da Cunha. ISO 9000: o novo fetiche dos arquitetos.   Arquitextos (São Paulo. Online), v. 000, p. 174, 2003. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp174.asp>. Acesso em: jul. 2008.
MALARD, Maria Lucia. As aparências em arquitetura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2006.
TSCHUMI, Bernard. O prazer da arquitetura. In: NESBITT, Kate. Uma nova agenda para a arquitetura: Antologia teórica (1965-1995). São Paulo: Cosac Naify, 2ª ed. rev., 2008.
FALAGÁN, David, H.; MONTANER, Josep Maria; MUXÍ, Zaida. Herramientas para habitar el presente. La vivienda del siglo XXI. Tools for inhabiting the present. Housing in the 21st century. Barcelona: Máster Laboratorio de la Vivienda

LIZIANE DE OLIVEIRA JORGE

Liziane De Oliveira Jorge is an Architect-urbanist, PhD in Architecture from the Faculty of Architecture and Urbanism of the University of  Sao Paulo, professor at the University of Vila Velha, and researcher at the ArqCidade Group, which investigates the quality of contemporary residential architecture.


How to quote this text: How to quote this text: JORGE, L. D. O., 2013. HOUSING AND CONSUMPTION: SOCIAL STATUS, DESIRE, AND FULFILLMENT. V!RUS, São Carlos, n. 9 [online]. Translated from Portuguese by Luis R. C. Ribeiro. [online] Available at: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus09/?sec=4&item=4&lang=en>. [Accessed: 13 May 2025].


Abstract

The goal of this article is to discuss the meaning of housing in contemporary society. It presents arguments that enhance the primary role of housing as a commodity, subject to a cultural, economic, and marketing logic that deliberately benefits from seductive methods to disseminate new lifestyles. Turned into a cultural symbol of prestige and success, contemporary housing produced by the real estate industry in general, implies a value system that allows individuals to recognize and participate in their desired social group. Finally, this article addresses the architect’s dichotomy in the professional exercise of housing development, which breaks into technical skills and theoretical knowledge, service provision and artistic idealism.

Keywords: real estate market; lifestyle; social status; contemporary housing; consumption.


Housing and the city

Housing is a fundamental requirement for individuals to consubstantiate their social, physiological, psychological, and moral conditions. Depicted as durable property, housing provides individuals with a sense of protection, stability, and recognition within a social structure. The contemporary city, a place where a heterogeneous mass of users with plural lifestyles gravitate, should encourage, through housing, the display of diversity and indeterminacy, and embrace the uncertainties and distinct needs that accompany individuals throughout their lives, providing them with opportunities for choice. In addition, the act of living, which now demands greater integration of uses, functions, and activities, is not limited to the domestic sphere, but projects into urban space to dialogue with other groups of individuals, participating in the community and taking advantage of a sophisticated network of communication and facilities.

The synergy between housing and the city is nowadays constrained by the idealization of a mythologized lifestyle and the imposition of housing preferences manipulated by a colossal marketing industry, an appropriate instrument of control for the real estate industry, which pushes unlimited needs on customers, which threaten the essence of man, his freedom and reciprocity with other human beings.

Housing and social status

The population of contemporary cities grows continuously, thereby subtracting urban space and multiplying densities in large centers. The ideal solution to the problem of housing this expanding population is to avoid massive consumption of space, which results in the construction of collective dwellings, dense and compact cities (Falagan, Montaner, & Muxi, 2011, p. 37). An unquestionable paragon of urban life, the tenement is the typological model that, lacking an exclusive client, adopts a standard agenda, based on biological, functional, and normative criteria. By disregarding its residents’ differing needs, manipulating the collective imaginary, and consolidating space in standard shapes, the tenement contributes to distance users away from a fuller experience of domestic space, a place for desires and affections, multiplicity, intimacy, disarray, and the natural indeterminacy of being.

Collective housing typologies, according to Kopp (1990), based on scientific, hygienist, and economic principles has enabled the proliferation of monotonous, repetitive, and identical buildings. Features such as functionality, ergonomics, mechanization, and programmatic and aesthetic simplification, legitimized through rationalization and standardization, have been internationalized from the first half of the twentieth century and are still being adopted as essential design parameters for today’s tenements. After numerous models based on universal conventions, standardized, typified, and prescribed housing solutions still constitute an alibi for the development of multifamily residential buildings, now adorned with collective, allegedly innovative amenities and attributes.

Threatened by large-scale uniformity and clichés of happiness manipulated by consumer industry, housing has been reduced to a commodity, a real estate product, and a symbol of social status and of a unified international culture. Despite the inevitable influence of capitalist market logic, an economic domination model, people crave, through housing, for an advantage that will provide their everyday life with sense and meaning to or even a distinct personality condition among ordinary citizens.

Contributions of distinct authors such as Henri Lefebvre, Zygmunt Bauman, Pierre Bourdieu, and Bernard Tschumi, is opportune in that they enable, from a modern and postmodern perspective, the employment of concepts such as individualism, freedom, stability, and culture in everyday life because, once turned into powerful ideological tools, they camouflage their biased intentions to benefit owners of the means of production.

Real estate marketing — one of the most cunning tools of coercion and  a powerful exchange gimmick — has a remarkable impact on contemporary society, which, seduced by a prosperous, sophisticated, obsolescent, ephemeral, and technological lifestyle, sees the real estate product as the ideal way of fulfilling their desires. As objects of consumption, residential buildings and their attributes dominate the sphere of desires, dictating fashions, tastes, and trends, monopolizing social imagination and the option for a property that follows the latest market requirements. This relationship reflects a consumer society that craves for pleasure, prestige, and social status. According to Lefebvre (1991, p. 89), “satisfaction is the aim and the objective of this society and its official justification” and this fulfillment can only be achieved by acknowledging a status of superiority over the other, supported by disseminated social codes that take qualities from a practical level to that of imagination.

Collective appropriation of objects into social life ensures consumer society’s fulfillment. Along these lines,

[…] certain objects refuse to be restricted to the level of experience or of make-believe and become emotionally or imaginatively charged because they are both perceived (socially) and expressed, while others attain a 'superior' status and become ideologically overcharged; thus the 'detached' house is experienced by the inhabitant as something to which he has a chance of adapting, but also as dream and ideology.

[…] Make-believe as such is part of everyday life, everybody expects is daily (or weekly) ration; yet make-believe has a specific role in relation to everyday experience (compulsions and appropriation): it must disguise the predominance of compulsion and our limited capacity of appropriation, the bitterness of conflicts and the weight of ‘real’ problems. Publicity does not merely provide an ideology of consumption, a representation of the consumer ‘I,’ a satisfied consumer, who is fulfilled through a single act, and who coincides with the consumer’s actual (ideal) image (Lefebvre, 1991, p. 100).

Clichés of happiness alluded to in consumer culture seduce citizens, eager to play their part in the model city idealized by marketeers, where prestigious concepts, e.g., sustainability, ecology, safety, strategies for multiplication of enclosed spaces far from the so-called urban promiscuity, are explored. Unconsciously, urban diversity and multifunctionality, effective criteria for quality of life and socialization of citizens, are easily replaced with segregated residential enclaves such as exclusive gated communities that bring similar users together at no risk of urban contamination. This search for a new urban order, inscribed in a perfect, idealized, besieged world without dissimilar and unexpected neighbors or intruders, points, according to Bauman (1998, p. 22), to a radical purification of classes, united to fight disorder, dirt, and diversification of their surrounding world. Gradually, individuals that remain outside this system feel displaced, disillusioned, and unable to compete with these users and achieve their prestige. Life, rendered meaningless due to this unreachable condition of momentary fulfillment, is trivialized by an exclusionary social strategy, which reduces physical space to a mere object of satisfaction.

Imbued with “social desirability,” with a preconceived image of fulfillment, future residents, when buying a house, seek to achieve happiness through an advantage that will allow them to move into the “territory of the distinguished,” disregarding that ordinary everyday needs presuppose, consecutively, meeting people’s basic needs as well as providing them with a domestic space that will promote familial and social relationships with safety, comfort, and well-being. This means that functional specialization, standardization, and determinism, strategies still perpetuated by real estate production of housing complexes, homogenize behavior and discourage diversity in the use of housing, indispensable to contemporary citizens, to plural lifestyles of new family structures.

From this observation, it can be said that the middle classes constitute the social category most exposed to advertising seduction, which takes the importance of core values, e.g., personal identity, privacy, and emotional security, to housing, to a lower level, surmounted by immediate promises of a domestic bliss, programmed and engineered from individuals’ ephemeral needs and conceited vanities. The middle classes, according to Lefebvre (1991), due to their lack of style, aspire to become Olympian personalities, with no everyday lives or fixed abodes, and are inspired by an adventuresome desire, an exciting, uncompromised, and uninhibited lifestyle.

The Olympic reconstruct in opulence, by means of power, “free” vagabondage, nomadism; they live on yachts, moving from palace to palace or from a castle to another. They are above “locals.” like fairy-tale heroes they provide common mortals with a tangible image - sold at a high price - of make-believe; that which was possible and all that was possible have taken shape. It is another, poorly known, albeit recognizable, everydayness: swimming-pools, white lacquered telephones, antique furniture. Yet there remains the insuperable superiority: the Olympic do not live in the quotidian, whereas the common mortal, his feet glued to the ground, is overwhelmed by it, submerged and engulfed. (Lefebvre, 1991, p. 103).

Trademarks of mass production and features legitimized through rationalization and standardization and principles diffused from the first half of the twentieth century, standardization, functionality, and repetition are adopted, even today, as alibis to justify obtuse housing policies, in the sense of imposing severe limitations on the use of domestic space by typified users, anonymous clients of tenement buildings. This condition of users’ subordination to utility and its consequent prescription of behaviors and habits — along with the impoverishment of urban life — are in turn masked by trickeries of the real estate market, which sells houses as products to be consumed, not inhabited in their fullness.

For Bourdieu (2001, p. 83), market competition is an ingredient of submission and social leveling, since “competition, far from diversifying, homogenizes.” The myth of product differentiation is a counterpoint to supply uniformity, so the possibilities of choice to which the middle class surrenders are tightly controlled, camouflaged by the imaginary and cultural dimension, the consumption of symbolic goods, social status, and other values that reduce individuals to a vulgar and uniform category.

The lifestyle desired by contemporary societies permeates all social categories. Elites, who enjoy more intensely the advances of the information age, are extremely influenced by the global culture phenomenon, which is soundly established in all spheres of everyday life. Technological innovations, the cult of the body, fashion, art, and consumption are dictated by a linearity fostered by advertising and the media, colossal means of disseminating an economic ideology of domination. The consequences of this horizontality threaten historical and cultural specificities of each place, since they materialize spatial forms and ambiances that become symbols of this global identity wherever manifested.

In order to impose an ideology of domination, “consumer culture uses images, signs and symbolic goods which summon up dreams, desires and fantasies which suggest romantic authenticity and emotional fulfillment in narcissistically pleasing oneself” (Featherstone, 1995, p. 48). Individuals, stimulated by visual appeal, identify with ad messages, whose objects, besides representing the commodities themselves, stand for the symbols admired by postmodern middle classes, in search of a ‘dream world’ full of “people fascinated by identity, presentation, appearance, lifestyle, and the endless quest for new experiences” (Featherstone, 1995, p. 71). Aware of the need for aesthetic modeling of everyday life, cultural intermediaries propose a constant renewal of signs to which merchandises are subject so that ready-to-use products can be uninterruptedly reproduced, consumed, and discarded.

For Featherstone (1995, p. 33), advertising is especially capable of exploring possibilities of cultural illusions and associations, providing images of romance, exoticism, desire, beauty, achievement, communality, scientific progress, and the good life to mundane consumer goods such as soaps, washing machines, automobiles, and alcoholic drinks. This infallible formula, which turns residents into mere consumers, degrades housing to an obsolescent and outdated position, incapable of meeting the needs of a generation of families. The disregard for subjective criteria, e.g., affection towards the property, construction of a life story, identity with district of origin, and familiarity with neighborhood, is one of the conditions that have been imposed by the real estate market, not to mention the dimensional inconvenience of new apartments, based on the alleged effectiveness of combined ambiances and the advantages of lavish balconies, designed to be integrated to the living room or other adjoining rooms. Square meters are subtracted; amenities much desired by new residents are added.

The housing scene has assimilated the contemporary capitalist market logic so completely that it now produces images and places of consumption, promises happiness and fulfillment, and raises ordinary citizens to the category of distinguished personalities. Time and again, ads extoll the joy and charms of the nuclear family, a traditional model that has been gradually supplanted by plural familial contexts, new domestic structures, and less paternalistic and ritualistic lifestyles.

Figure 1. The persistence of the nuclear family as a stereotype of contentment in advertising folders of housing projects. Source: Advertising folder for the housing project Vivienda Laranjeiras Condomínio Clube, Serra, ES.

Architecture ads are defined by Bernard Tschumi as part of the architectural imaginary, translated onto paper to ‘represent’ virtual space. Architecture, this ‘masked figure’ that lurks behind drawings, words, judgments, habits, and technical constraints must be constantly unveiled. “The typical function of incessantly reproduced ads, unlike the singular architectural object, is to foster the desire for something that is beyond the page proper” (Tschumi, 2008, p. 582). By means of attractive collages and angles, the compulsory scale models and illustrations of housing projects,  go beyond the architectural dimension in order to clarify the technical and functional aspects of space, to show off intangible and ideological attributes: security, tranquility, and natural geographic attributes (living near the beach or park), exclusiveness (gated communities), and to boast their bucolic denominations and distinguished exponents (artist names, cities, renowned personalities) and stylistic features.

Advertisements of real estate projects explore words that promote symbolic associations, easily assimilated, representing prestige and social status: convenience, sophistication, luxury, elegance, comfort, refinement, nobility, modernity, technology, exclusivity, innovation, harmony, among others. According to Bourdieu (2001, p. 86), “advertising and the media exert extraordinary influence on the whole of contemporary societies,” dictating fashions and cultural patterns that follow the logic of profit.

The valuation of attributes of buildings over their floor plans is a risky factor for the client. Fascinated by the prospect of living in an apartment with “countless leisure options,” users underestimate the importance of private space, which provides true home and coziness standards and conditions for performing everyday tasks essential to a family. In a community that is being individualized on a daily basis, assimilation of sociability-related concepts seems paradoxical, such as to be compelled to share the much coveted gourmet space with hundreds of other residents of neighboring apartments. Thus, contemporary residential architecture, as a product for the masses, provides veiled alternatives, according to parameters established by the market itself, which restrict lifestyle choices and freedoms to those established by the economic elite.

Architects and their professional challenges in the design of contemporary housing

According to Philip Bess (2008, p. 409), today’s prevailing architecture is built by real estate developer, and architecture itself has begun to be seen and praised by proprietors as a commodity and a marketing resource. People — considered by the author as drenched in “Nietzschean individualism,” in the inescapable sense of disagreeing with a previous social contract and projecting their individual tastes and divergences — are solely concerned with their interests and their private lives and the accomplishment of their own household tasks, refusing to fully participate in community life, except when it is convenient to do so.

In essence, the city is an economic undertaking that provides individuals with the material goods and anonymity needed to achieve their personal goals” (Philip Bess, 2008, p. 407). This is the context that has replaced the plurality and singularity of urban landscape. It has multiplied spaces that eliminate diversity, encourage consumerism and feign a participatory civic life, by simply catalyzing people seduced by shopping and entertainment spaces like malls, consumption temples, thematic museums, and gated condominiums. This amalgam of mythologized spaces represents, essentially, the manipulation of symbols in favor of a universal urban vocabulary, recreating the same cityscape regardless of context and place.

At the heart of their profession, architects are indoctrinated to value artistic, cultural, and social dimensions. Autonomous in their creative expression, architects seek collective recognition through the materialized object resulting from their differing mental conceptions representative of their own era. As stated by Durand (1974, p. 10), the liberal nature of the architectural profession implies an intrinsic relationship between trust and responsibility, except that practiced in the hunt for clients or in ads of a commercial sort. In current times, most architects would be condemned for violating professional ethics, wrestling for market share, and accepting deterioration of the profession, and would take the blame for the perpetuation of specimens geared primarily to economic and media consumption.

Ghirardo (2008, p. 417) criticized the role of architecture in society  in his manuscript “The architecture of fraud,” which, among other things, considers that today’s architectural practice implies a schism between a profession seen as art or as service. As a rule, the former encompasses the territory of utopias and fiction, opposing economic interests. The reasons for that categorization, as the author observes, are defined according to formal attributes of architectural work — from opaque criteria and subjective, objectable, and arbitrary criticism — or even by means of evasive discourses that raise architecture to a sentimental consistency. The latter view is supported by a branch of architects who collaborate with the construction industry and real estate enterprises, thus acknowledging architecture as a trade or as a business.

When developing projects for the housing market, architects usually transcend the idealism that permeates their profession. Subject to a relationship of complete subordination to developers and builders, architects are stripped of their decision power, constantly reduced to an instrument to facilitate the approval of projects by government authorities. In certain cases, architects do not develop even the building façade or the internal layout that accompanies its launching, and, consequently, have to share with other professionals eventual creative triumphs. Cordeiro Filho’s (2008) and Mahfouz’s (2008) opinions on this issue are worthy of note. The former states that a tenement project is closely related to the presentation of its façade, which will determine whether the buyer will want to know more about the deal or not:

It’s mandatory to employ an architect specializing in façades. There’s no need to hire drawing board notables, successors of Niemeyer, Ruy Ohtake, Paulo Mendes da Rocha or other big shots. The chosen architect must have experience in real estate development. That’s what it takes (Cordeiro Filho, 2008, p. 63).

Mahfouz (2003), in turn, highlights the repositioning of architects’ professional practice and the subordination of their creative potential, stating that architecture has changed from a cultural activity to a service:

The visual appearance of most buildings is no longer the result of a design process based on its own rules, but it is decided by outsiders solely concerned about potential sales. That is, architects have begun to do what they are told by communication and marketing professionals (Mahfuz, 2003, p. 174).

For builders and developers, an architect’s signature design contributes to marketing the project by attracting more customers, who are offered a further “Casa Cor”-style advantage, with signatures of renowned professionals and exclusive solutions. Stripped of their scholarly abilities, many architects turn into interior designers, a featureless profession in the eyes of customers.

The legacy of a pedagogical tradition based on exceptionality still dominates the agenda of architectural history at universities, in addition to its explicit link to Western production, which possesses the set of material and cultural conditions that is reflected in a globalized way. The most significant, admired, and memorable architectural works are, in the contemporary context, those produced through the magnetism of celebrated architects or paradigmatic buildings that house multicultural or specialized events, such as institutions, financial, and commercial centers. Alongside this age-old tradition and symbolism, scholarly architecture is now equated to recurring clichés of global architecture. Its regular, more predominant production is seldom depicted, often criticized, and usually accused of causing the biggest atrocities to cityscapes. Schooled in the exceptionality of the idiosyncratic architectural repertoire, architects need audacity to design something ordinary, since surrendering to the market implies abidance by the rules of the system and giving up the possibility of designing prosaic buildings.

For Mahfuz (2001), the dominant pattern of contemporary Brazilian architecture corresponds to the production of low quality buildings, whose reasons are quite complex. The author acknowledges the loss of the cultural dimension that permeates architecture, associated with “the growing prevalence of commercial construction, dominated by market rationale and widespread obsession with creating images” (MAHFUZ, 2001, p. 1). Therefore, the logic of the market has imparted an obsolescent character to architecture, following fads or trends, reducing buildings to objects of consumption.

The awareness of the difficulty in defining the very essence of architectural work disaggregates ‘customer/server’ and ‘author/ architect’ into distinct categories in a distant dimension. The true understanding of architecture is restricted to its field of knowledge and scholarly citizens, vanishing species. Malard’s (2006) warning sheds light on the value system to which the architectural profession is subject and on its judgment on the part of ordinary people, which, according to the author, are only able to recognize the difference between ‘old’ and ‘modern’ buildings. Indeed, they would be in trouble if they were to classify modern buildings as brutalist, constructivist, and high-tech or old buildings as Renaissance, baroque, and neoclassical. The aesthetic character of architecture, expressed primarily through its outward appearance, shape, plastics, “visual aspects that mark the presence of the architectural object in the world and make it known, appreciated, discussed, and controversial” (Malard, 2006, p. 55), is going through a shift in its artistic dimensions, i.e., contemporary manifestations that conceive architecture as a product of a mode of production.

The refusal to accept responsibility for concrete problems of architecture and the world it belongs in is Ghirardo’s object of analysis. The author attributes detached reflection before construction policies and existing power structures to this very professional category. According to formalist criticism, architects choose the safest path because of their ability to cover up serious architectural problems. “In any of their manifestations, architects dare question construction policies: who builds, where, to whom, and at what price” (Ghirardo, 2008, p. 422). Architects need to reassess the role of their profession, embrace ordinary architectural production, and seek alternatives to reconcile technical and artistic aspects to market demands.

Final remarks

The cloning of idealized, typified, and unambiguous architectures reflects an expanded crisis of meaning, culture, and social relations. The appropriation of this instability by advertising and the media constitutes an ideology that promotes a generic, aestheticized identity, misguidedly desired by residents.

Marketing housing as a product is a mistake that should be replaced with a higher purpose: to provide individuals with choice opportunities and support for different activities and unexpected desires.

Users should be willing to go beyond the idea of housing as a backdrop for the representation of everyday life and take responsibility for reconciling individual values with community values, which are essential to the quality of urban life. On the other hand, architects should turn away from the banal requirements of the real estate market since adopting a passive and naïve attitude is to despise their own knowledge, the best tool for promoting a social revolution, of human habits and behaviors.

References

BAUMAN, Zygmunt, 1998. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
BESS, Philip, 2008. Comunitarismo e Emotivismo: Duas visões antagônicas sobre ética e arquitetura. In: NESBITT, Kate. Uma nova agenda para a arquitetura: Antologia teórica (1965-1995). São Paulo: Cosac Naify, 2ª ed. rev.
BOURDIEU, Pierre, 2001. Contrafogos 2: Por um movimento social europeu. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
COELHO NETTO, A. J. T., 1979. A construção no sentido da arquitetura. São Paulo: Perspectiva.
CORDEIRO FILHO, Antonio, 2008. Empreendedorismo no mercado imobiliário habitacional. São Paulo: Atlas.
DURAND, José Carlos, 1974. A profissão de arquiteto: estudo sociológico. Rio de Janeiro: CREA 5a. Região.
FEATHERSTONE, Mike, 1995. Cultura de consumo e pós-modernismo. Translation by Julio Assis Simões. São Paulo: Studio Nobel.
GHIRARDO, Diane, 2008. A arquitetura da fraude. In: NESBITT, Kate. Uma nova agenda para a arquitetura: Antologia teórica (1965-1995). São Paulo: Cosac Naify, 2ª ed. rev.
KOPP, Anatole, 1990. Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa. São Paulo: EDUSP.
LEFEBVRE, Henri, 1991. A vida cotidiana no mundo moderno. Translation by Alcides João de Barros. São Paulo: Ática.
MAHFUZ, Edson da Cunha, 2001. A arquitetura consumida na fogueira das vaidades. Arquitextos (São Paulo. Online), São Paulo, v. 012.
MAHFUZ, Edson da Cunha, 2003. ISO 9000: o novo fetiche dos arquitetos.                       Arquitextos (São Paulo. Online), v. 000, p. 174. Available at: <http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp174.asp> [accessed Julay 2008].
MALARD, Maria Lucia, 2006. As aparências em arquitetura. Belo Horizonte: Ed. UFMG.
TSCHUMI, Bernard, 2008. O prazer da arquitetura. In: NESBITT, Kate. Uma nova agenda para a arquitetura: Antologia teórica (1965-1995). São Paulo: Cosac Naify, 2ª ed. rev.
FALAGÁN, David, H.; MONTANER, Josep Maria; MUXÍ, Zaida, 2011. Herramientas para habitar el presente. La vivienda del siglo XXI. Tools for inhabiting the present. Housing in the 21st century. Barcelona: Máster Laboratorio de la Vivienda del Siglo XXI.