V!RUS02:: nomads pesquisa

Esse segundo número da V!RUS está sendo lançado ao final de um ciclo de nove anos de trabalho de um grupo de pesquisadores consciente da necessidade de enfrentar seus limites, aceitando-os ou superando-os. De fato, o Nomads.usp, Núcleo de Estudos de Habitares Interativos, mais do que um espaço de construção de conhecimento, foi, desde o seu início, um lugar de encontro de pessoas cujos pontos de vista se unem em um processo de produção coletivo, que se molda no tempo e na experiência. Revisitar esse percurso significa reencontrar o esforço de um grande número de pessoas, vindas de muitas latitudes e formações, que contribuíram particularmente no desenho dessa história em comum.

Com o nome de Núcleo de Estudos sobre Habitação e Modos de Vida, o Nomads.usp estruturou-se como grupo de pesquisa independente a partir de julho de 2000. Resultou do rearranjo da equipe do GHab – Grupo de Pesquisa em Habitação [1] que, desde 1995, se dedicava ao estudo de questões relativas à habitação, em duas linhas de pesquisas: 1_Tecnologias de construção da habitação e 2_História e projeto da habitação.

A pesquisa "Habitação Social Contemporânea: concepção arquitetônica e produção de componentes em madeira e em terra crua” (1996-2000), desenvolvida no contexto do GHab, inaugurou a produção do Nomads.usp provendo-lhe com sua sede física, pois culminou na execução das Unidades Experimentais de Habitação 001 (1999) e 002 (1998).

Esse trabalho foi fundamental para a formulação de diversas posturas do Nomads.usp, por ter, como objetivo central, a aproximação entre a proposição de soluções espaciais e o tratamento de aspectos técnico-construtivos e ambientais. O projeto baseou-se na premissa de que é possível e necessário conceber espaços domésticos para habitação social referenciados nos modos de vida dos seus futuros ocupantes e, em última instância, naqueles do conjunto da sociedade da qual fazem parte. Tratou-se de um trabalho extenso e complexo, que envolveu muitas etapas do ciclo de vida das duas edificações (do planejamento à manutenção e contínua readequação dos edifícios em uso), e que avançou na busca por maneiras de avaliar as proposições exploradas, aproximando-se de procedimentos que pudessem trazer o parecer de usuários em potencial para o processo de criação.

Os estudos do núcleo sobre a história recente da habitação foram evidenciando implicações da introdução das chamadas mídias digitais na vida quotidiana e suas relações com os usos e o desenho dos espaços de morar. Essa compreensão deu-se através do desenvolvimento tanto dos projetos coletivos quanto dos individuais, que foram tornando evidente a importância de questões advindas do âmbito das tecnologias de informação e comunicação para a arquitetura e para o design.

Dessa forma, mantendo os modos de vida como pano de fundo de todas as pesquisas e as questões ambientais como premissa, o foco das preocupações do Núcleo deslocou-se da edificação 'habitação' para uma noção ampliada de habitar, disperso no território urbano e também nas redes telemáticas, freqüentemente mediado pelas tecnologias de informação e comunicação, que decidimos chamar de habitares interativos. Buscando espelhar esses interesses, o nome do núcleo passou a incorporar essa expressão.

Em um intenso processo coletivo de redefinição de objetivos, novas linhas de pesquisas foram formuladas, incluindo questões relacionadas às espacialidades híbridas e introduzindo meta-teoria nos estudos e experimentações de processos de design.

Atualmente, os trabalhos se pautam em cinco linhas de pesquisas não estanques [L1_espacialidades concretas. L2_espacialidades híbridas. L3_espacialidades virtuais L4_processos de design e L5_processos de comunicação], que, a partir de suas especificidades, permitem sombreamentos e interconexões em cinco escalas de aproximação: 1. virtual, no estudo e desenvolvimento de ambientes unicamente digitais; 2. corpo, no estudo e produção de peças de computação vestível; 3. objetos, no estudo e produção de peças de mobiliário com mídias integradas; 4. edificação, explorando a noção do próprio edifício como interface de comunicação; e 5. urbana, através da informatização de fragmentos urbanos e a consolidação de redes comunitárias.

Corrente nas atividades do grupo, a prática do projeto foi ampliada com as possibilidades de trabalho colaborativo em processos híbridos de criação (analógico + digital). A criação do Design_lab, que é um espaço destinado a explorações como essa, equipado com instrumentos que permitem a concepção, modelagem 3D e pequenas prototipagens de objetos interativos, objetiva testar possibilidades de pesquisa e aplicações da internet avançada no processo de criação da Arquitetura e do Design.

Esse realinhamento de interesses e uma familiaridade crescente com o design de objetos interativos híbridos, adquirida em sessões de capacitação em microeletrônica, modifica o perfil dos pesquisadores, abrindo vagas dentro do Núcleo para estudantes dos cursos de ciência da computação, mecatrônica, engenharia elétrica e eletrônica, imagem e som, engenharia ambiental, entre outros. Buscou-se, assim, aproximar essas áreas, a arquitetura e o design.

Como resultante desse percurso, somam-se, nos últimos 6 anos, onze grandes projetos de pesquisas, viabilizados e desenvolvidos através de parcerias e financiamentos de diferentes agências públicas de fomento. A esses grandes projetos, incorporam-se os projetos pessoais de pesquisa dos componentes do grupo, graduandos, pós-graduandos e pós-doutorandos, e seus desdobramentos naturais em projetos de extensão universitária, entre outros. Essa produção totaliza 86 iniciações científicas [74 terminadas e 12 em andamento], 22 dissertações de mestrados [18 defendidas, 4 em andamento] e 3 doutorados [1 defendido e 2 em andamento], além de 11 orientações acadêmicas de outra natureza.

A V!RUS, assim como outras iniciativas do Nomads.usp, consiste em uma resposta ao desejo sempre presente da troca, como mais uma oportunidade de enriquecer reflexões acerca das temáticas de interesse do núcleo, e também como um meio através do qual busca-se o compartilhamento de idéias. Sua primeira edição visava ampliar a discussão sobre possíveis relações entre mídias digitais, arquitetura, design e arte, de modo a diminuir distâncias e alinhar pontos de vista.

Esse segundo número aborda um assunto que atualmente inquieta o grupo, o dos objetos interativos, tema de seminários internos e de várias pesquisas em curso. A V!RUS espera auxiliar o Nomads.usp a trilhar esses caminhos, como um periódico acadêmico em meio virtual, construído colaborativamente, aberto a conteúdos e suportes plurais.

[1] Criado em 1994, o GHab foi um grupo ligado ao Departamento de Arquitetura e Urbanismo da EESC-USP e ao Departamento de Engenharia Civil da UFSCar, coordenado a partir de 1996 pelos Profs. Drs. Akemi Ino, Ioshiaqui Shimbo e Marcelo Tramontano, e que deu origem, em 2000, a dois novos grupos de pesquisa: o HABIS, que estuda e produz habitação sustentável através de pesquisa-ação junto a comunidades diversas, e o Nomads.usp. [voltar ao texto]