três vertentes na pesquisa em design de objetos interativos
three sources in the research on design of interactive objects

lucia leão

Recebi o convite para escrever algumas considerações sobre fontes de pesquisa dos assuntos que permeiem o tema da presente edição da revista V!RUS, do Nomads.usp, com entusiasmo. Afinal, pesquiso design interativo desde 1992, leciono e oriento pesquisa na área, coleciono inúmeros favoritos sobre o tema, acompanho listas de discussão, festivais e congressos. A tarefa, contudo, revelou-se bem mais complicada do que eu previa. Refletir sobre design de objetos interativos implica navegar por diversos mares e, principalmente, não se esquivar de percorrer frestas e fronteiras por entre campos de saber instituídos.

Como se sabe, pesquisas de natureza inter e transdisciplinares oscilam entre o excessivo e o escasso. A rigor, uma pesquisa que se foque apenas em livros impressos pode estar fadada a omitir os traços ainda incipientes na área, a perder os movimentos “ainda por vir”. Por outro lado, a busca frenética pela constante atualidade de dados, lançamentos e novidades tecnológicas pode levar ao desenvolvimento de paisagens conceituais efêmeras, evanescentes. Assim, na arte da pesquisa em “Design de Objetos Interativos” a busca pelo equilíbrio entre essas duas forças exerce papel preponderante.

O processo de escolha de fontes se orientou a partir de três vertentes. No primeiro grupo estão blogs, fóruns e publicações de conteúdo multimídia online; em seguida, sugiro eventos, congressos, festivais e exposições; e, finalmente, a terceira vertente indica livros e artigos publicados em mídia impressa.

A esse respeito, um desafio precisava ser enfrentado: que tipo abordagem escolher na escolha de material impresso? Embora saiba da importância de sugerir leituras de caráter técnico e que discursem a respeito dos avanços tecnológicos, quis fugir desse tipo de inquirição. Consciente de que essas informações podem ser acessadas facilmente através de buscas online, optei por selecionar publicações de caráter conceitual e crítico, que estimulassem reflexões, questionamentos e devaneios poéticos.

Redes e espaços informacionais

Comecemos a comentar as escolhas realizadas sobre a vertente online, ou seja, a busca de informações sobre design de objetos interativos no ciberespaço. Nesse grupo, encontram-se sites de referências e informações, blogs e vídeos. A pesquisa pode começar por blogs de design, projetos que funcionam como uma espécie de portal no sentido em que abrigam diversas informações na área.

O Designophy (http://www.designophy.com), por exemplo, é um interessante exemplo de comunidade online que reúne notícias no campo, calendário com chamada de trabalhos para conferências e eventos, além de oportunidade de prêmios e exposições.

Muito mais ambicioso e bem estruturado, o Design Research Network (https://www.designresearchnetwork.org) tem por foco pesquisas científicas e acadêmicas em design e conta com um conselho consultivo formado por pesquisadores vinculados a instituições acadêmicas de várias partes do mundo. O projeto se propõe a ser uma plataforma de pesquisa aberta à participação da comunidade. Um interessante recurso do sistema permite que se iniciem discussões por temas, o que favorece a formação de redes de pesquisa e a emergência de múltiplos pontos de vista. Associado ao Instituto da Technical University de Berlin, a European Academy of Design (EAD) e a German Society for Design Theory and Research (DGTF), o projeto recebe apoio do Deutsche Telekom Laboratories.

Interaction-Design.org (http://www.interaction-design.org), por sua vez, é um projeto que aborda temas como design interativo; usabilidade; Human-Computer Interaction (HCI); arquitetura da informação; User Experience (UX), entre outros. O projeto é composto por quatro seções: uma enciclopédia peer-reviewed com conteúdo aberto; um calendário de eventos e conferências; uma bibliografia com publicações de destaque no campo; e uma seção com exemplos de designs, denominada "misDesigns". O projeto está todo em licença Creative Commons, o que indica uma política de compartilhamento de conteúdo.

Outra indicação de destaque, o design feast (http://www.designfeast.com) é um portal repleto de informações sobre festivais na área, além de um de blog de notícias.

A pesquisa no ciberespaço sobre design de objetos interativos conta também com vídeos de palestras. Além dos materiais postados em sites de compartilhamento e redes sociais como o YouTube (http://www.youtube.com) e o Vimeo (http://www.vimeo.com) , o projeto TED (http://www.ted.com) se destaca pela qualidade do conteúdo de suas gravações. Iniciado a partir de uma série de conferências sobre tecnologia, entretenimento e design, em 1984, o TED é uma organização sem fins lucrativos que tem por objetivo incentivar o compartilhamento de idéias. Lá é possível encontrar, por exemplo, entre outros arquivos, uma palestra com Yves Behar (Talks Yves Behar on designing objects that tell stories, http://www.ted.com/talks/yves_behar_on_designing_objects_that_tell_stories.html) sobre a respeito do design de objetos que contam histórias.

Eventos

Como fontes para a segunda vertente da pesquisa, aponto sites de laboratórios como o Ars Electronica (http://www.aec.at/index_en.php) e o MediaLab do MIT (http://www.media.mit.edu); , festivais como o ISEA (http://www.isea-web.org); e exposições como “design and the elastic mind” apresentada no MoMA (http://www.moma.org/visit/calendar/exhibitions/58).

De extrema importância são também os encontros e as conferências científicas internacionais. Entre as mais relevantes, destacam-se: ACM SIGGRAPH - International Conference on Computer Graphics and Interactive Techniques (http://www.siggraph.org); DIS - Designing Interactive Systems (http://dis2010.org) ; TEI - International Conference on Tangible and Embedded Interaction (http://www.tei-conf.org/10); UbiComp - International Conference on Ubiquitous Computing (http://www.ubicomp.org/ubicomp2009); Eurohaptics, conferências sobre interfaces hápticas (http://www.eurohaptics.org); NordiCHI - Nordic conference on human-computer interaction (http://www.yourhost.is/nordichi2010).

Textos impressos

A indicação de textos para pesquisa no campo do design em objetos interativos poderia abranger várias dezenas de títulos. Para não me estender demasiadamente, proponho uma seleção com três estilos de livros. No primeiro grupo, estão antologias com textos de fundamentação teórica e discussões sobre o campo de investigação em suas diferentes abordagens. No segundo, indico textos sobre diferentes modelos de pesquisa em design e, finalmente, no terceiro grupo, sugiro obras que abordam processos criativos, práticas em design e design crítico.

A natureza e a prática de design de produto e do design gráfico são alguns dos temas discutidos por diversos autores na clássica antologia The Idea of Design (1996) organizada por Victor Margolin (Professor de história do design na Universidade de Illinois em Chicago - UIC) e Richard Buchanan (Professor de Sistemas da Informação na Weatherhead School of Management, Case Western Reserve University) a partir de uma seleção de artigos previamente publicados no International Journal Design Issues. A coletânea agrega pérolas conceituais como, por exemplo, “Sketching and the Psychology of Design”, artigo de Rudolf Arnheim que retoma idéias que o autor havia defendido no livro de 1969, Visual Thinking. Entre os pensadores que enriquecem o debate estão presentes nomes como Mihaly Csikszentmihalyi, Yves Deforge, Clive Dilnot, Alain Findeli, Jorge Frascara e Tony Fry.

À medida que oferece um panorama amplo e bem estruturado, o livro Design Research Now, organizado por Michel Ralph, Professor da Universidade de Zurique, é excelente para uma pesquisa sobre o atual estado da arte da pesquisa em design. Uma grande multiplicidade de pontos de vistas e abordagens teóricas é apresentada por pesquisadores fundamentais no campo tais como Klaus Krippendorf, Pieter Jan Stappers, Wolfgang Jonas, e Beat Schneider. O livro é composto por três partes. Na primeira, cinco artigos discutem a história do design e apresentam uma série de diferentes perspectivas metodológicas. Gui Bonsiepe, por exemplo, autor de vasta obra de fundamentação no campo, apresenta um artigo que discute as “difíceis” relações entre design e pesquisa em design. Já o ensaio de Nigel Cross, Professor emérito do núcleo de Design da Open University, tem como interesse principal compreender como os designers pensam e trabalham. A segunda parte do volume se dedica a apresentar projetos de 14 designers renomados. Na parte final, a terceira, uma série de artigos discute as especificidades do “design como pesquisa”; pesquisa em design; pesquisa semântica em design e pesquisa em design de inovação social sustentável (“design research for Sustainable Social Innovation”, por Ezio Manzini).

Os diferentes modelos de pesquisa em design são analisados na coletânea Design Research: Methods and Perspectives, organizada por Brenda Laurel, Professora Titular do programa de Doutorado em Media Design em Pasadena, Califórnia. Com prefácio de Peter Lunenfeld, o volume se organiza em quatro seções (pessoas, forma, processo e ação) e reúne artigos de pesquisadores e designers de várias instituições tais como Christopher Ireland, Anne Burdick, Michael Naimark, e David Masten. Na seção Processo, artigos como “Pesquisa interdisciplinar em design” (Interdisciplinary Design Research) de Eric Zimmerman e “Estratégia, táticas e heurísticas para pesquisa” (Strategy, Tactics and Heuristics for Research) de Emma Westecott são referências importantes para compreender a natureza do campo de pesquisa.

Para uma discussão sobre processos criativos em design, sugiro o livro de John Maeda, The Laws of Simplicity. Com estilo de escrita simples e direta, o ex-professor de Media Arts & Sciences do MIT e atual Presidente da Rhode Island School of Design, Maeda apresenta em dez leis aquilo que considera fundamental em um projeto de design. Redução, organização e controle do tempo são algumas das leis sugeridas pelo autor. Utilizando o potencial de compartilhamento de idéias em rede e aplicando suas leis, Maeda mantém um intenso processo de criação online e discussão via blog (ver: http://www.lawsofsimplicity.com).

No campo das pesquisas em design interativo propriamente dito, o livro Where the Action Is: The Foundations of Embodied Interaction é uma referência preciosa. Seu autor, Paul Dourish (pesquisador associado da Xerox Palo Alto Research Center e Professor de Informação e Ciência da Computação da Universidade da Califórnia, em Irvine) propõe uma reflexão filosófica a respeito da interação homem-computador. Dourish apresenta o conceito de interação incorporada (Embodied Interaction) e aponta para desafios em projetos de sistemas interativos.

Finalmente, gostaria de indicar o já clássico Hertzian tales: electronic products, aesthetic experience and critical design de Anthony Dunne, Professor e chefe do departamento de Interaction Design do Royal College of Art de Londres, cuja primeira edição ocorreu em 1999. Além de ser sempre citado como um texto pioneiro no campo de crítica de design (critical design) gostaria de enfatizar outro ponto forte desse trabalho e que muitas vezes passa despercebido: a discussão a respeito da experiência estética. De várias maneiras e em vários pontos do livro, Dune aponta para a necessidade de se pensar a dimensão estética dos objetos eletrônicos presentes no cotidiano e o potencial de enriquecimento que esses objetos carregam. Para compreender a natureza das idéias de Dune, é fundamental conhecer alguns dos projetos estéticos que o designer realizou, tais como Hertzian Tales, 1994-97 e Technological Dreams Series: No.1, Robots, 2007 (ver: http://www.dunneandraby.co.uk/content/projects).

Concluindo, a pequena cartografia que procurei delinear para a pesquisa de design de objetos interativos propõe que se pense seguindo três vertentes (redes e espaços informacionais, eventos e textos impressos). Em resumo, minhas sugestões procuraram sublinhar um processo de pesquisa com ritmos e movimentos diversos. Nesse percurso, no desenrolar das navegações em rede, da colaboração, das conversas e discussões online, das trocas e compartilhamentos de arquivos, da participação em eventos e situações e da leitura de textos impressos, um olhar sobre a pesquisa em design se desvela.

Referências citadas

DOURISH, Paul. (2001). Where the action is: the foundations of embodied interaction. Cambridge, Massachusetts: MIT Press.

DUNNE, Anthony (2005). Hertzian tales: electronic products, aesthetic experience and critical design. Cambridge, Massachusetts: The MIT Press.

LAUREL, Brenda (ed.) (2003). Design Research: Methods and Perspectives. Cambridge, Massachusetts: The MIT Press.

MAEDA, John (2006). The Laws of Simplicity. Cambridge, MA, USA: MIT Press.

MARGOLIN, Victor and BUCHANAN, Richard (ed.) (1996). The Idea of Design. Cambridge, Massachusetts: The MIT Press.

RALPH, Michel (ed.) (2007). Design Research Now. Basel, Boston, Berlin: Birkhäuser Verlag.

 

Sites de referências e informações, blogs e vídeos

Designophy: http://www.designophy.com/

Interaction-Design.org: http://www.interaction-design.org/

design feast: Lista de blogs de design: http://www.designfeast.com/

Design Research Network: https://www.designresearchnetwork.org

TED: Talks Yves Behar on designing objects that tell stories:

http://www.ted.com/talks/yves_behar_on_designing_objects_that_tell_stories.html


Eventos, conferências, festivais e exposições

ACM SIGGRAPH - International Conference on Computer Graphics and Interactive Techniques

DIS - Designing Interactive Systems

TEI - International Conference on Tangible and Embedded Interaction

UbiComp - International Conference on Ubiquitous Computing

Eurohaptics

MoMA exhibition “design and the elastic mind” http://www.moma.org/visit/calendar/exhibitions/58

 

 

 

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Lúcia Leão, é artista, doutora em Comunicações e Semiótica e Professora Doutora na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Desenvolve pesquisa interdisciplinar sobre processos criativos, artes, estéticas tecnológicas, hipermídia e mídias digitais e é autora de livros sobre esses assuntos.

Lucia Leao is an artist, doctor in Communications and Semiotics and Doctor Professor at the Catholic University of San Paolo. She carries out interdsciplinary research about creative processes, art, technological aesthetics, hypermedia and digital media. She is the author of books on these subjects.

Lucia Leão presents here a short review on three different classes of sources for the research on interactive objects design. The text is three folded: Networks and informational space, Events, and Printed texts.

issn 2175-974x | sem 2-2009

 

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LEÃO, L. Três vertentes na pesquisa em design de objetos interativos
. V!RUS, São Carlos, n.2, 2 sem. 2009. Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus02/resenha/leao.php>. Acessado em
27/04/2024.