Memória e políticas urbanas do Rio de Janeiro (anos 1960 e 1970)

Flávia Brito do Nascimento

Flávia Brito do Nascimento é arquiteta e urbanista e Doutora em Arquitetura e Urbanismo. Professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto. Suas pesquisas tratam principalmente dos temas de patrimônio cultural, políticas de preservação, patrimônio urbano, habitação social, conjuntos residenciais e história do Rio de Janeiro.


Como citar esse texto: NASCIMENTO, F. B. Memória e políticas urbanas do Rio de Janeiro (anos 1960 e 1970). V!RUS, São Carlos, n. 15, 2017. [online] Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus15/?sec=4&item=5&lang=pt>. Acesso em: 26 Abr. 2024.


Resumo

A valorização da área central carioca como patrimônio ambiental urbano ganha força na década de 1970, motivada pela tensão das perdas sucessivas de exemplares de valor cultural significativo, pela mudança nos cânones conceituais de preservação e pela atuação dos órgãos de preservação nas instâncias federal e municipal. Tomando parte do debate proposto pelo Dossiê A Construção da Memória da Revista V!RUS, este artigo tem por objetivo compreender o percurso das mobilizações em favor da memória urbana na antiga capital do país após a mudança para Brasília. Nos interessa explorar como as preexistências urbanas do Rio Antigo serão transformadas de empecilho num primeiro momento após a mudança e depois em um fator de valorização identitário, levando a políticas inovadoras de valorização da memória. O artigo acompanha como os planos diretores e os projetos urbanos de transformação da cidade estiveram mesclados à sensação de perda e à construção social de uma identidade de passado na cidade após a mudança da capital para Brasília. Discute-se como em meados dos 1970, por meio do Plano Urbanístico Básico, o PUB-Rio, abre-se o caminho para o protagonismo das preexistências urbanas e da memória, viabilizando-se políticas de preservação urbana no Rio de Janeiro. Este artigo discute os usos do passado e da memória na cidade do Rio de Janeiro, circunscrevendo os projetos urbanos e as ações de patrimônio cultural nos anos 1960 e 1970.

Palavras-chave: Rio de Janeiro, Memória urbana, Patrimônio urbano, Preexistências


1 Introdução

A angústia de pensar o papel da cidade do Rio de Janeiro na nova configuração nacional após a mudança para Brasília foi explicitada desde o final da década de 1950. De acordo com Marly Motta (2000, p. 13), o momento político do recém-criado Estado da Guanabara até a fusão com Rio de Janeiro em 1974 foi muito denso. Tratamos aqui de como esta densidade política do período passa pela disputas em torno o lugar da memória urbana do Rio de Janeiro. A construção da memória, tema do Dossiê da Revista V!RUS, se deu lentamente no Rio de Janeiro pós-Brasília, com muitos embates simbólicos.

O Rio foi nos primeiros anos da década de 1960 tratado como a capital do futuro, cujas belezas naturais seriam valorizadas pelo vasto programa de modernização imposto por Lacerda, embora, de modo ambíguo, tenha feito várias ações de construção da memória da cidade, como a fundação do Museu da Imagem e do Som (com acervo imagético e sonoro sobre a cidade), a criação da Divisão de Patrimônio Histórico e Artístico da Guanabara e inúmeras celebrações do quarto centenário da cidade em 1964. Após a década de 1970, os incômodos com a discurso da modernização, mobilizado, entre outras coisas, diante das perdas de exemplares arquitetônicos, levou a políticas de preservação da cidade que terão como mote a memória urbana.

Trata-se neste artigo da memória como construção social, que é mobilizada pelos atores sociais em torno da idealização de Rio Antigo nos anos 1960 e depois, na década de 1970, como direito urbano à memória consubstanciado nas políticas do Corredor Cultural. Para entender a trajetória da preservação na sua face com a memória como tema de salvaguarda, percorremos as políticas urbanas do Rio na sua relação com as preexistências desde a gestão de Lacerda até o Plano Urbanístico Básico do Rio, de 1977, que abre caminho para as políticas de preservação.

O governo de Carlos Lacerda, primeiro eleito após acirrada disputa com o candidato Sérgio Magalhães, assumiu com o discurso de garantir o papel da cidade, agora tornada Estado, na vida política nacional. A estratégia política e administrativa do governador foi organizar o aparato herdado do Distrito Federal dando-lhe ares de Estado, no que se chamou de estadualização da Guanabara. O apelido de Belacap, para fazer o contraponto ao de Novacap dado a Brasília, fora cunhado para dar identidade e autoestima dos cidadãos.

Os atributos físicos da Belacap, para além daqueles dados pela natureza, seriam garantidos pelo extensivo plano de obras de Lacerda. A modernização da infraestrutura da cidade, dentre outras coisas, passava pela garantia de abastecimento de água (com a construção da Adutora do Guandu) até o muito questionado programa de habitação social, que substituiu aquele levado a termo por Carmen Portinho no Departamento de Habitação Popular (DHP) ao longo dos anos 1950. Capitaneado por Sandra Cavalcanti a partir de 1962, o programa realizou a remoção de diversas das favelas da Zona Sul para conjuntos habitacionais de casas unifamiliares em bairros distantes do centro. O programa de construção de escolas era também uma das vitrines do governo. Cerca de 200 escolas foram realizadas neste período, muitas com projetos do arquiteto Francisco Bolonha, ex-funcionário do DHP e importante arquiteto da segunda geração de modernistas da chamada Escola carioca (NASCIMENTO, 2008).

Chegava-se à década de 1960 com o discurso da renovação pelo governo estadual e a prática das substituições e demolições. Renovar a cidade fazia parte das estratégias de valorização da cidade. No começo dos anos 1960, os jornais anunciavam a demolição do Mercado da Praça XV, do Edifício Lloyd, dos remanescentes do Morro do Castelo, tachados de nódoa urbana. Iam embora também algumas das edificações da Avenida Central. Limpar a cidade era um tema social e urbano (TRIBUNA DA IMPRENSA, 14/01/1958, 14/03/1958).

O urbanismo era, com efeito, um dos grandes pontos de realização do governo de Lacerda. O diagnóstico de que o Rio de Janeiro tornara-se uma cidade ingovernável vinha desde o final da década de 1950, antes da mudança da capital. A sensação era de falência da cidade. Priorizados no contexto de criação da imagem positiva da Belacap, os projetos urbanísticos consumiram parte significativa da receita do Estado. Muitos deles, como o Parque do Flamengo e o túnel Rebouças eram projetos já elaborados ou em discussão na prefeitura nos anos 1950, que, com a nova gestão foram realizados com outros contornos. Organizar o trânsito, acabando com os bondes e instalando novas linhas de ônibus, abrir e alargar avenidas por toda cidade, construir novos túneis, criar áreas de lazer foram as muitas ações pontuais que se executaram pela cidade como paradigmas da imagem moderna e atualizada para o Rio (PEREZ, 2005, p. 72, 197-201).

De modo geral, a realização dos projetos de intervenção urbana nos primeiros anos do governo seguiu a forma corrente na cidade desde os anos 1910 de se elaborar projetos pontuais chamados Projetos de Alinhamento e Projetos de Loteamento. Estes eram feitos internamente na prefeitura, geralmente por técnicos do setor de Viação de Obras Públicas ou de Urbanismo, para a mudança urbana nos locais da cidade que se desejava alterar. Os projetos eram aprovados na prefeitura, recebendo uma numeração particular. As principais propostas de transformação urbana na área central como a Av. Rio Branco, a Avenida Diagonal Sul, o Elevado da Perimetral e a Av. Presidente Vargas, por exemplo, foram realizadas por meio de Projetos Aprovados de Alinhamento(PAA) e Projetos Aprovados de Loteamento (PAL).

Mas a noção da necessidade de planejamento urbano global veio já no final da gestão de Lacerda, quando se resolveu contratar um Plano Diretor para a cidade. O planejamento do Rio até os anos 2000 por meio de um plano global, seria um presente para a cidade e um legado da gestão e a projeção de futuro para a candidatura de Lacerda à presidência da República. Para tanto, em 1964 foi contratado o Escritório de Consultores Associados Doxiadis, sediado em Atenas, Grécia, para realizar o plano, que seria auxiliado pela Cedug - Comissão Executiva de Desenvolvimento Urbano da Guanabara, presidida pelo arquiteto e urbanista Hélio Modesto e formada por diversos técnicos do Rio de Janeiro que auxiliaram na coleta de dados.

O arquiteto grego Constantinos Doxiadis era consultor internacional de planejamento urbano desde os anos 1940, realizando planos em inúmeras cidades ao redor do mundo. Como explica Vera Rezende, sua teoria era organizada em torno do conceito da ekistics (ou equística em português), que era, simplificadamente, a ciência dos assentamentos humanos por meio de comunidades em redes. O homem deveria viver em equilíbrio com seu habitat por meio da observância da relação entre homem, natureza, sociedades, estruturas e redes. A cidade não se expandiria simplesmente, mas cresceria na paisagem de modo dinâmico, levando para os diversos lugares da expansão os elementos necessários à vida humana (REZENDE, 2015; MELLO, 2012).

Com relação à área central, nosso objeto de interesse aqui, o Plano Doxiadis, cujo nome oficial era "Plano de desenvolvimento urbano a longo prazo para o Estado da Guanabara", indicava a necessidade descentralização por meio da organização de comunidades em rede. Esta havia sido uma das tônicas da administração de Lacerda, criando-se as regiões administrativas, as zonas industriais na zona oeste e levando a população das favelas para morar em conjuntos habitacionais distantes do centro.

A meta era desafogar a concentração de moradias e de trabalho das áreas de população mais rica e levar novos serviços e funções para o que era ainda a zona rural da cidade, conforme o zoneamento de 1937 (PEREZ, 2005, p. 201-203). O Plano indicava que a cidade deveria se organizar em comunidades interdependentes, autossuficientes e equilibradas entre si, ligadas por via expressas perpassadas por áreas verdes. Mas, o centro continuava a estar na centralidade da região metropolitana, assumindo o papel de centro de gravidade de toda a região metropolitana, ou seja, a proposta não era arrefecer o lugar do centro, mas tornar o restante da cidade mais equilibrado em relação a ele (MELLO, 2012, p. 43-55).

O valor da terra no centro e o papel do comércio já haviam sido sentidos por Lacerda, quando no começo de sua gestão foi pressionado pelos comerciantes da área central que teriam seus negócios afetados pela passagem da Avenida Diagonal Norte-Sul. Organizados em torno a SAARA - Sociedade de Amigos das Adjacências da Rua da Alfândega conseguiram a revogação do plano urbano em 1963 e a permanência da região tradicional de comércio. A alegação de que a região era das mais rentáveis comercialmente na cidade acabou convencendo o governador de revogar o projeto e manter o comércio (MELLO, 2012, p. 43-55).

O episódio da SAARA garantindo, de certa forma, a manutenção de importantes remanescentes do Rio de Janeiro tradicional mostra como no começo dos anos 1960a pretensão de modernidade dada pelas obras e suas transformações urbanas de Lacerda, iam pari i passu à percepção de que algo se perdia. De fato, em fevereiro de 1961, a Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira foi campeã do carnaval carioca com o samba enredo "Recordações do Rio Antigo". A letra da música destacava o Rio como "cidade tradicional" exaltando seus aspectos já desaparecidos, como a Igreja do Castelo, os lampiões a gás, as serestas e também o seu esplendor. Assim se inicia a letra:

Rio cidade tradicional
Teu panorama é deslumbrante
É uma tela divinal
Rio de janeiro
Da Igreja do castelo
Das serestas ao luar
Que cenário tão singelo
Mucamas sinhás moças e liteiras
Velhos lampiões de gás
Relíquias do rio antigo
Do rio antigo
Que não volta mais. 1

Um sentimento de que mudanças estavam em curso, aparecem no conceito da cidade "que não volta mais", que mudou. Exaltava-se um Rio do passado, que já tinha ido embora há muito tempo ou que ainda era demolido a olhos vistos, sem poder fazer frente às aspirações de futuro para o novo Estado da federação. O discurso de futuro era predominante. O passado saudado na chave da nostalgia, aqui representado pela letra da música, era uma representação das perdas simbólicas da memória da cidade. Uma sensação de perda que permaneceria ainda por muitos anos, como aparecerá nos projetos da década de 1970 para o centro. Cabe perguntar se houve algum plano ou interesse de preservação da cidade, sobretudo na área de ocupação mais antiga, o seu centro. Haveria um lugar para políticas de preservação do patrimônio edificado ou algum sentimento de perda neste processo de transformação tão intensa?

2 O Iphan, os usos do passado e a transformação da área central nos anos 1960

A cidade do Rio de Janeiro esteve sempre próxima dos olhares da preservação e dos protagonistas do patrimônio nacional, já que, mesmo com a mudança da Capital, o órgão de preservação federal, então Sphan - Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, permaneceu no Rio sediado no Palácio Gustavo Capanema. Mas a sua área central despertou pouco interesse como conjunto urbano a ser protegido. Embora o Iphan tenha realizado diversas proteções legais no centro Rio de Janeiro desde o começo de seus trabalhos, elas foram majoritamente de edifícios isolados e representativos do período colonial.

Dispersas no tecido urbano do centro, as edificações estavam longe de configurarem o que poderia se chamar de uma área urbana. Logo em 1938, um ano depois da criação do Sphan, diversos "monumentos históricos e artísticos" são tombados. As igrejas predominam na listagem de cerca de 50 bens protegidos por lei entre 1938 e 1940. Mas constam, ainda, jardins históricos, como Passeio Público e os Jardins do Valongo, chafarizes, e edifícios de arquitetura civil, como a Antiga Alfândega, o Palácio do Itamaraty, a antiga Casa da Moeda e o conjunto do Arco do Telles. Na década de 1950 alguns outros bens culturais serão acrescidos da listagem, sendo as maiores novidades o Palácio Gustavo Capanema e a Estação de Hidroaviões, protegidos como monumentos da arquitetura moderna nacional (NASCIMENTO, 2013).

A conduta do patrimônio nacional para com o Rio de Janeiro condizia com a diretriz geral da instituição neste período em que foram realizados tombamentos de modo apenas pontual e favorecendo aspectos de monumentalidade e excepcionalidade, evitando-se os grandes centros urbanos, pois a proteção legal poderia interferir no desenvolvimento econômico ou mesmo na perspectiva de crescimento da cidade. Foram protegidas cidades homogêneas (pequenas e isoladas, distantes de grandes centros), entendidas como objetos artísticos prontos e fechados (SANT'ANNA, 2004). O Rio de Janeiro, apesar de contar com acervo histórico e artístico significativo, foi contemplado com tombamentos isolados e pontuais, muito distantes da ideia de conjunto urbano.

Desde os anos 1930 que o centro do Rio de Janeiro se verticalizava. E, não contando com manchas urbanas preservadas, será significativamente pressionado e alterado. O decreto-lei 25/37 assegurava a preservação dos monumentos selecionados e o restante do centro ia se modificando a olhos vistos. A pressão em favor da preservação do centro do Rio chegará ao Iphan de modo consistente nos anos 1960. E sinalizará pelo que será a tônica da década de 1960: o Brasil se urbanizava velozmente e era preciso novas práticas e posturas para pensar o patrimônio cultural. As verticalizações aconteciam em pontos específicos, sobretudo na Avenida Rio Branco, que já nos anos 1950 estava muito verticalizada. A novidade era que a pressão agora recaía na porção mais antiga remanescente do centro colonial: a Praça XV de Novembro, antigo Largo do Paço e centro de poder do período Imperial (COLCHETE FILHO, 2008; SISSON, 2008). O que aconteceu nesta localidade ajuda a entender os impasses de renovação da cidade e as suas articulações com a preservação da cidade.

Os principais edifícios da Praça foram protegidos pelo Iphan em 1938: o Arco do Teles, o Paço Imperial, o Chafariz do Mestre Valentim e as igrejas nos arredores (Igreja da Ordem Terceira de N. S. do Monte do Carmo, Igreja de N. S. da Lapa dos Mercadores, Igreja de Santa Cruz dos Militares, Igreja da Ordem Primeira de N. S. do Carmo). A verticalização e a pressão imobiliária sobre a Praça vinha da década de 1930, que neste período já contava com edifícios altos, antes mesmo do tombamento pelo Iphan.

A construção da Avenida Perimetral rompendo com a sua relação histórica com o mar foi o golpe mais duro na região. Ciente da construção do elevado, o Iphan envidou esforços para salvar outras obras na região que seriam afetadas pelo viaduto, como a Estação de Hidroaviões, recém-construída. Preocupado com a permanência da estação, o Iphan contribuiu, inclusive, para mudar o traçado do elevado, de modo que a Estação permanecesse. Mas para a praça em si, lugar histórico do início da cidade (na ausência do Morro do Castelo), o olhar foi pouco alterado e o elevado foi construído impactando de modo severo seu ambiente urbano.

A pequena importância dada à Praça não era estritamente um problema do patrimônio nestes anos 1950. Os planos de transformação da praça pela Prefeitura do Rio ao longo das décadas de 1930, 1940 e 1950 eram por sua modificação sistemática. Para a Praça XV, o primeiro projeto urbano que pudemos localizar é datado de 1938 (ano dos primeiros tombamentos do Iphan), onde se notam as transformações pretendidas (PAA n. 2949). O núcleo de construções remanescentes do período colonial (em torno da Rua da Travessa e do Ouvidor) seria inteiramente demolido para dar lugar a novos lotes maiores, prevendo-se edifícios altos. O projeto não foi realizado e, em 1947, novo projeto de alinhamento ficou pronto (Modificação parcial do PAA n. 2949).

Ele dá conta dos tensionamentos e acomodações entre preservação e renovação que marcaram as políticas urbanas no centro do Rio de Janeiro na segunda metade do século XX. Os bens culturais tombados pelo Iphan seriam salvos como pequenos testemunhos em meio a edifícios de até 30 pavimentos, gerados pelo remembramento dos lotes coloniais. O projeto urbano de 1947 só mantinha as igrejas tombadas. Os lotes voltados para a Rua Primeiro de Março e Rua do Mercado seriam remembrados de três a três para dar lugar a novos edifícios altos. O pequenos edifícios da Travessa do Comércio seriam demolidos para a construção de uma praça nos fundos dos lotes. A região de formação urbana mais precípua da cidade, de valor histórico central no século XIX, seria, portanto modificada inteiramente. 2

Fig. 1: Projeto Aprovado de Alinhamento n. 2949 de 1938 e Modificação parcial em 1947 para a Travessa do Comércio, Centro no Rio de Janeiro. Fonte: Secretaria Municipal de Urbanismo do Rio de Janeiro. Redesenhado em 2016 por Laís Nagano.

A mudança, no entanto, não se viabilizou, por razões que podemos apenas supor, como o custo e dificuldade de negociação dos lotes ou demolição das casas antigas. Mas a pressão imobiliária continuava. Em 1961 o edifício do Arco do Teles, embora poupado da demolição, sofreu uma intervenção grande. O interesse do proprietário, Raymundo de Castro Maia, um importante industrial e colecionador de obras de arte, baseado no Projeto de Alinhamento de 1947 solicitou uma solução que lhe garantisse maior "aproveitamento" do imóvel. Com isso, o patrimônio da negociação entrou novamente em cena. A solução encontrada foi manter o edifício antigo e construir por sobre ele um edifício envidraçado, embora o resultado final tivesse ficado substancialmente diferente. Parte do telhado seria mantida e o edifício novo sairia nos fundos do antigo. O arquiteto para o projeto foi Francisco Bolonha, ligado ao movimento moderno carioca e também autor das escolas da gestão Lacerda. 3

A onda de verticalização atingiu outros edifícios vizinhos a este conjunto. Também no começo da década de 1960, o Convento do Carmo, que havia servido de residência para a Família Imperial foi vendido ao Banco do Brasil para a construção de uma nova sede, prevendo-se a sua demolição. O pedido de tombamento foi levado ao Iphan, sob a alegação de que haviam ainda vestígios do século XVIII no Convento. O Iphan não havia tombado o convento junto com as demais edificações da praça em 1938 sob a justificativa de que estava muito desfigurado pelas obras da década de 1920 que lhe deram feições ecléticas. A proteção legal do edifício foi feita a partir da condição de que o proprietário, o Banco do Brasil, poderia construir um edifício novo nos fundos do terreno. Alguns anos depois, o banco desistiu do negócio e vendeu o prédio para uma universidade, que manteve a intenção de fazer uma nova construção. A torre da Cândido Mendes se viabilizou em meados da década de 1970, quando os temas do crescimento vertical e demolições no centro estavam ainda mais agudos.4

Curiosamente, em setembro de 1965, a poucas quadras da Praça XV, o governador Carlos Lacerda inaugurava o Museu da Imagem e do Som no antigo edifício que fazia parte da Exposição do Centenário da Independência do Brasil de 1922. Ele foi concebido com um moderno centro de memória da história e da cultura carioca. O Museu era uma celebração da história do Rio, com pioneiro acervo iconográfico e fonográfico. Foram reunidas no museu as imagens do fotógrafo da prefeitura Malta, gravações e depoimentos de história da música na cidade, numa organização expográfica bastante arrojada (MESQUITA, 2010). Muito embora a tônica do governo de Carlos Lacerda tenha sido a da transformação da cidade na chamada "superação de seus atrasos" com a modernidade como tônica, tem lugar no governo ações muito significativas que revelam a sensibilidade para com a história do Rio de Janeiro e a construção social de memória da cidade. A ideia de modernidade foi a tônica do governo lacerdista, mas a criação do Museu da Imagem e Som, do Museu do Primeiro Reinado e, sobretudo, as comemorações do IV Centenário da Cidade do Rio de Janeiro mostram o quanto celebrar o ser carioca e sua cidade estava em cena.

Muito significativo deste processo de construção da identidade carioca por meio de sua história, foi a criação em 1963 da Divisão do Patrimônio Histórico e Artístico da Guanabara (DPHA). Ela foi fundada com o objetivo de proteger por meio do tombamento os bens culturais do Estado. A Divisão existiu até a fusão em 1974, quando foi substituída pelo Inepac - Instituto Estadual do Patrimônio Cultural. O primeiro tombamento que a DPHA fez na área central revela o olhar para os vestígios da cidade que "não volta mais". A Ladeira da Misericórdia, junto à Praça XV, foi tombada em 1965, permanecendo às gerações futuras como testemunho, nos parece, não em razão do que havia sido, mas como representação do Rio que se perdera.

A justificativa para o "imprescindível tombamento" estava no fato que era o "único vestígio que resta da cidade erguida por Mem de Sá, em 1567 na colina do Castelo". O tombamento representava a "preservação de um elemento documental importante, para referência do sítio da antiga sede da cidade"5.A atuação no centro da cidade no que se refere à preservação era ainda pontual, e os tombamentos era acionados a partir da lógica da prova documental da história narrada. Neste caso, havia uma disputa em curso sobre a data de fundação da cidade e a quem homenagear como fundador. As preparações para as comemorações do IV Centenário haviam debatido extensamente qual seria o dia da fundação. O ano era 1565 e o mártir Estácio de Sá que expulsara os franceses (TURAZZI, 2014). Proteger a Ladeira da Misericórdia como representativa da cidade de Mem de Sá era uma tomada de posição do historiador Marcello de Ipanema, o primeiro Diretor-geral da Divisão do Patrimônio Histórico e Artístico da Guanabara.

O outro tombamento da DPHA em 1965 no centro da cidade envolveu-se com as disputas imobiliárias do centro, como o seriam diversos tombamentos do Rio a partir de então. Trata-se do Automóvel Club do Brasil, localizado à Avenida Passos, em frente ao Passeio Público. A sua preservação deu-se em meio às disputas imobiliárias e de projeto urbano para o centro. O pedido de preservação chegou por meio do Secretário de Estado de Educação e Cultura, Carlos Flexa Ribeiro, diante da ameaça de demolição para construção de novo edifício comercial. O Automóvel Club não anuiu com o tombamento e pediu sua impugnação, alegando haver prejuízos, pois o negócio com a construtora já estava acordado. O processo de tombamento teve continuidade, e o "indivíduo arquitetônico altamente representativo do estilo neoclássico e muito ligado à vida cultural da Guanabara" foi perpetuado às gerações futuras.6 O patrimônio histórico e artístico estará, a partir daqui e durante os anos 1970 e início dos 1980, cada vez mais entrelaçado à tentativa de contar a história urbana da cidade. Salvar um edifício, era como salvar algo da história do Rio.

O que se percebe é que nos anos 1960 a sensibilidade para com o passado existia, mas estava circunscrita ao campo da história e dos usos do passado, ainda longe das políticas de preservação urbana. A proteções legais eram pontuais e as políticas de tombamento eram gotas no oceano. A atuação continuava circunscrita ao patrimônio do monumento, associado ao quadro de memória do Iphan em que as práticas seletivas recaíam sobre o colonial, monumental e excepcional. Seria preciso esperar o Plano Diretor de 1978 para que a legislação municipal abrisse caminho para salvaguardar o que restava dos remanescentes históricos do Rio de Janeiro, na sua heterogeneidade como testemunho dos seus próprios processos históricos.

3 O planejamento encontra o patrimônio cultural na área central

ANa década de 1970 as pressões de demolição na cidade do Rio de Janeiro continuaram com força. O estoque urbano do centro era grande e mesmo com tantas perdas, os embates históricos sobre os permanência da materialidade do passado estiveram muito presentes. A Avenida Rio Branco, um símbolo da modernização nos primeiros anos do século XX, estava pouco a pouco sendo demolida. Grandes torres de escritórios em substituição aos edifícios ecléticos da era Pereira Passos serão erguidas com a autorização do Iphan, com pareceres e polêmicas acirradas entre personagens importantes do patrimônio nacional como Lucio Costa e Paulo Santos (GUIMARAENS, 2002; PESSOA, 1999).

A grande polêmica no que se refere à materialidade de edificações na cidade foi a demolição do Palácio Monroe, inicialmente sob a justificativa da passagem do metrô. Sede do Senado Nacional, havia se tornado “obsoleto” com a mudança da capital para Brasília. Em março de 1976 o Palácio Monroe foi posto abaixo após intensos debates na mídia, como mostra Fernando Atique (2017).

Tais transformações urbanas terão repercussão social colocando em evidência a relação entre a ditadura militar, o espaço urbano e as obras de infraestrutura urbana, tais como o metrô, de grande impacto na área central do Rio de Janeiro. O tema da preservação como identidade urbana e memória social emergirá no Rio nos anos 1970, face às já históricas demolições e transformações no espaço urbano desde o período anterior. As decisões políticas e institucionais do Iphan frente a tais fatos foram a da negociação das tensões e pressões do setor privado e público, o que claramente não atendeu às expectativas da sociedade que as percebeu como insuficientes para a memória urbana.

Foi nos anos 1970 e 1980 que se organizaram políticas de preservação urbana no Rio de Janeiro, sob muitos aspectos em reação à onda de renovação urbana e de demolições de edificações icônicas, principalmente na sua área central. Durante a ditadura civil-militar no Brasil, período em que grandes projetos urbanos são realizados em todo país, aproveitando os efeitos do chamado “milagre econômico”. Obras de infraestrutura, muitas de caráter rodoviarista aconteceram em todo o País, buscando “modernizar” os núcleos urbanos e compatibilizar os efeitos do enorme crescimento demográfico, que muda suas feições de um país rural para urbano.

O pouco que se sabe sobre a história da preservação no Brasil nesses anos, é que, frente à "modernização conservadora autoritária" do promovida pelo regime militar, às pressões do setor imobiliário e ao crescimento urbano vertiginoso, os técnicos do patrimônio nacional procuraram pensar e agir na escala urbana, com a realização de inúmeras obras de restauração, a elaboração por consultores da Unesco de planos diretores para cidades tombadas, a criação e fortalecimento dos órgãos locais preservação.

Conceitos como os de patrimônio ambiental urbano serão mobilizados no intuito de justificar proteções a certas práticas e modos de vida urbanos, ou a certas arquiteturas e espaços urbanos fora do cânone colonial e moderno. Os municípios e estados passaram a atuar dando respostas de acautelamento e proteção para além do tombamento e buscando usar instrumentos do planejamento urbano. Este será o caso do Rio de Janeiro, em que o planejamento urbano abrirá caminho para a preservação da cidade e dará respaldo técnico ao executivo para inéditos decretos de preservação do centro da cidade no final da década de 1970, culminando numa política de preservação pelo município (MOTTA, 2000).

m 1974, o Rio de Janeiro sofrerá nova transformação política e administrativa com a fusão. A fusão dos Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro tem longo alcance no debate político sobre a cidade. A decisão do presidente da República, embora feita de súbito, encontrava apoio de grupos que defendiam o ato desde os anos 1950. Para outros, ela será percebida como um golpe à autonomia política (FERREIRA; GRYNSPAN, 2000). O resultado foi a necessidade de nova configuração administrativa, cujas consequências para o planejamento urbano da cidade foram importantes. O novo município deveria elaborar um Plano Diretor para ordenar e organizar o território da cidade. Em julho de 1975, o Decreto-lei n. 168 criou o Sistema Municipal de Planejamento e Coordenação Geral com a diretiva de elaboração do Plano Urbanístico Básico da Cidade do Rio de Janeiro no prazo de dois anos. Após diversos planos urbanos realizados por consultores estrangeiros (Planos Agache e Doxiadis), este será feito por técnicos da própria prefeitura. O fato é exaltado pelo prefeito Marcos Tamoyo na apresentação do Plano Diretor:

A Secretaria Municipal de Planejamento, composta por profissionais do mais alto nível, experimentados conhecedores dos problemas do Rio, foi designada por mim para, diretamente, elaborar este Plano. Sem qualquer sentimento de xenofobia, mesmo porque a nossa capacidade de hoje decorre do muito que aprendemos com os Planos Agache e Doxiadis, não posso deixar de ressaltar que o presente trabalho foi feito por técnicos brasileiros (TAMOYO, 1977, p. V).

O Plano Urbanístico Básico, conhecido como PUB-Rio, é iniciado em 1976 e em 1977 fica pronto. Segundo depoimento do urbanista da prefeitura Armando Mendes, um dos coordenadores do Plano, ele foi realizado em tempo recorde. Não havia planejamento anterior à sua elaboração, de modo que os estudos e as propostas organizaram-se a partir do trabalho realizado e da experiência dos técnicos no trato com a cidade.7 Promulgado por decreto do prefeito em 1977, ela dava as diretrizes para a ordenação do território da cidade e indicava a necessidade de elaboração de estudos específicos que seriam os PEUs - Projetos de Estruturação Urbana.

A importância do plano para a preservação da cidade será grande. Ele será um ponto de inflexão na relação entre patrimônio e planejamento quando, finalmente, é criado um dispositivo para a preservação do centro do Rio de Janeiro. Até este momento na história da preservação brasileira as práticas seletivas eram atributo técnico dos arquitetos, circunscrito aos saberes do Iphan. Para o caso do Rio de Janeiro, as consequências, como já pudemos ver, foram graves, pois como conduta geral da instituição evitaram-se confrontos e polêmicas nas áreas urbanas das grandes cidades.

O olhar para o Centro, que era denominado Área Central e de Negócios (ACN), estava, como não seria diferente, relacionado ao olhar global ao município e seus problemas. A hipótese de desenvolvimento traçada para o Rio partia da compreensão (após extensos e detalhados estudos) de que alguns aspectos negativos deveriam ser corrigidos, dentre outros:

[...] a diminuição da qualidade de vida e da qualidade do ambiente urbano da cidade do Rio de Janeiro, pela constante reutilização, com intensidades cada vez maiores, dos terrenos dentro das áreas melhor providas de serviços, equipamentos e paisagens, com o sacrifício da beleza natural, das reservas florestais, dos monumentos históricos e arquitetônicos, e dos ambientes urbanos tradicionais (PREFEITURA, 1977, p. 230).

Constatava-se o interesse e a perda não exclusivamente de monumentos, mas de ambientes urbanos tradicionais. O conceito de patrimônio extrapolava a excepcionalidade e abarcava o contexto o urbano. Uma ampliação conceitual importante. Segundo o plano, a área central apresentava a excessiva concentração de negócios imobiliários e a especulação da terra diante de sua infraestrutura urbana, comercial e de transportes metropolitanos. O mapa da renda da terra na cidade não deixava dúvidas de que o centro era uma região de alto valor imobiliário no contexto da cidade. A hipótese de crescimento vinha seguida das proposições de planejamento para cada área da cidade. Para o centro indicava-se, dentre outras coisas, racionalizar o crescimento nos seus limites, estudar o remanejamento de áreas de estacionamentos, reestudar o uso residencial nas suas áreas periféricas. Mas algumas diretrizes viabilizaram, e de modo eficaz nos anos seguintes, a permanência dos chamados ambientes urbanos tradicionais. A saber:

- Propiciar condições, através da fixação de intensidades de edificações, para o fortalecimento das atividades financeiras, culturais, recreativas, administrativas e de serviços especializados.
- Otimizar o equipamento existente visando fortalecer as atividades de centro financeiro e cultural.
- Preservar determinados ambientes urbanos de valor cultural, arquitetônico e paisagístico (PUB-Rio, 1977, p. 245).

Estava posto que preservar ambientes de valor cultural e paisagístico era uma tarefa do planejamento urbano do Rio, compreendido na escala da cidade e não no foco do edifício de valor estético-estilístico. No que se refere à preservação, a Área 1 (Portuária, Centro, Rio Comprido e São Cristóvão) teria preservação ambiental de áreas com características culturais e históricas para a comunidade, o que era, também, uma novidade conceitual. Além da região central é mencionada a preservação paisagística da Área 2 (Botafogo, Copacabana, Lagoa, Tijuca e Vila Isabel), a preservação das áreas naturais da Área 5 (Bangu, Campo Grande e Santa Cruz) e a preservação ambiental e paisagística da Área 6 (Ilha do Governador, Paquetá e Santa Teresa) (PREFEITURA, 1977, p. 244-246). Depreende-se, portanto, que dentre as proposições de planejamento, a preservação ambiental e paisagística era que recebia destaque.

A ampliação do campo do patrimônio cultural que ocorreu desde a década de 1960 e com efeito partir dos anos 1970 e 1980, desde então colocou o patrimônio urbano na agenda da políticas públicas. A elaboração de novos discursos distantes do compromisso e representação da unidade nacional via edificações e a organização em favor de outros protagonistas e de suas materializações foram profusas, indo da diversidade cultural, do patrimônio ambiental, às comunidades. É no âmbito das múltiplas transformações de conteúdo e de forma de atuar, que as questões urbanas foram tornando-se centrais. Ao se valorar a arquitetura comum, do cotidiano, do simples, se valorizava a formas de viver, ou se defendia dada qualidade de vida.

O conceito de patrimônio neste período despe-se, pouco a pouco, do valor simbólico nacional, passando a servir de apoio à luta pela manutenção de um meio ambiente urbano menos adensado. As preocupações recaem sobre a manutenção da escala urbana e à ideia de ambiência. Abre-se a possibilidade de valoração dos sítios urbanos como documentos, isto é, em virtude do que representam como vestígios do processo de ocupação do território. Rompe-se com a perspectiva estritamente visual, fachadística ou das características estilísticas. O que importa são os significados contidos nas formas da materialidade da cidade, construídos pelas comunidades que nela habitam. As práticas buscaram se distanciar do tombamento de edifícios isolados para formas mais abrangentes de atuação, aproximando-se, por exemplo, do planejamento urbano, como foi o caso do Rio de Janeiro.

O PUB-Rio de 1977 é uma peça-chave deste processo, capaz de exemplificar como a ampliação dos conceitos de preservação se deu nestes anos.

A existência do plano diretor de 1977 com as condições de interesse de preservação do centro, a continuada pressão imobiliária na região e o interesse político em limitar em determinados pontos a especulação da terra abriu o caminho para uma nova fase da área central do Rio de Janeiro. Em 1978 três decretos municipais limitam a verticalização do centro, protegendo, sucessivamente, diversos lugares: a região dos Morros da Providência e Conceição, a Cinelândia, a Rua da Carioca e, finalmente, a Praça XV.8 Os decretos de preservação valoravam múltiplos aspectos das características da cidade: preservação ambiental, manutenção do comércio tradicional, usos culturais e arquitetura, todos devidamente fundamentados pelos conceitos indicados no plano diretor.

No caso da Praça XV, já tratado anteriormente, a pressão imobiliária no final da década de 1970 só aumentou, e incêndios começam a atingir alguns dos sobrados. Alarmado pela possibilidade de perda de todo o conjunto da Praça, não completamente protegido por lei, o Iphan inicia um estudo sobre o entorno das igrejas tombadas. Segundo Lia Motta9, autora do primeiro estudo do Iphan na região da Praça XV, neste momento de grande pressão imobiliária, a ação do instituto federal levou ao contato do presidente do Iphan Aluísio Magalhães com o prefeito Israel Klabin, que sancionou o decreto de proteção legal legitimado pelo Plano Diretor de 1977 que impedia a construção de edifícios altos na área. Os sobrados da Travessa do Comércio na Praça XV ficavam inteiramente protegidos, não se podendo demolir nenhum edifício ou construir nada que fosse mais alto que quatro metros, respeitando-se a ambiência dos sobrados.

A sucessão de decretos relativos à proteção ambiental do centro teria fim em 1979, mas por um bom motivo para os preservacionistas. O prefeito Israel Klabin criou um sistema de administração municipal por meio Câmaras Técnicas que tratariam de assuntos latentes e de interesse ao município. Em meio a este processo criou-se a Câmara Técnica do Corredor Cultural, no âmbito da Comissão do Plano da Cidade - COPLAN, com o objetivo de

[...] desenvolver e apresentar estudos relativos ao potencial das atividades culturais da área denominada "Corredor Cultural", estabelecida pelo Decreto 2216 de 20.7.1979, fornecendo subsídios para a formulação de projetos específicos que visem à preservação histórica, ambiental e cultural da área e manutenção de suas tradições, propondo eventos, novas atividades e providências administrativas que permitam a revitalização do Centro da Cidade no contexto da vida cultural do Município.10

A partir de então o projeto Corredor Cultural consolidará a proteção legal de uma grande área do centro do Rio de Janeiro. O projeto será inovador em muitos aspectos e desencadeará novas práticas de proteção ao ambiente construído, com inúmeros desdobramentos no período de redemocratização e ao longo de toda a década de 1980. A realização de eventos culturais diversos no espaço público e a criação de centros culturais e de artes será uma das iniciativas e frentes de trabalho importantes, como era a tônica do patrimônio cultural naqueles anos em diversas partes do mundo. Também foram feitas ações para a valorização do espaço público, renovando praças e largos do centro. A criação de subsídios e isenção fiscal para a renovação dos imóveis privados será uma das ações de maior alcance, cujos efeitos se sentirão com o passar dos anos. Através do trabalho cotidiano com os proprietários de imóveis na região do SAARA, feito pelo escritório técnico do Projeto Corredor Cultural, fará com que aos poucos sejam feitas reformas para a retirada de letreiros, placas e intervenções obstruidoras da fachada, valorizando as tipologias do século XIX.

No âmbito da administração pública municipal, o que se verá na década de 1970 é a ação de uma nova geração de urbanistas do Rio, envolvidos com projetos urbanos para a cidade no âmbito das instituições públicas. Eles a preservação como tema e a viabilizam por meio de instrumentos urbanos. Incorpora-se a demanda social, contemplando muito mais do que a proteção legal dos imóveis, mas um plano de ação para sua valorização como conjunto urbano constitutivo de sua formação histórica, de seus processos sociais e de sua ocupação no presente. As ações de preservação são um passo fundamental na construção da memória da cidade do Rio de Janeiro na sua historicidade. A consciência de um Rio de Janeiro do “passado” frente à nova cidade modernizada delineia-se como um tema para a cidade. Os projetos de preservação do patrimônio edificado se viabilizam também diante da nostalgia da perda como sentimento compartilhado. E serão os agentes das feições do Rio de Janeiro futuro.

Referências

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1 Samba enredo "Recordações do Rio Antigo", 1961. Composição: HélioTurco, Pelado e Cícero.

2 Projeto de Aprovado de Alinhamento n. 2949 de 1938; Modificação parcial do PAA n. 2949 em 1947. Secretaria Municipal de Urbanismo do Rio de Janeiro.

3 Iphan, Processo n. 0099-T-38 Arco do Teles e casas n. 32 e 34. Série Inventário e Série Obras. Arquivo Central do Iphan no Rio de Janeiro.

4 Iphan, Processo n. 0689-T-62, Antigo Convento do Carmo. Arquivo Central do Iphan no Rio de Janeiro.

5 DPHA, Processo n. 03/300 447/65, Tombamento da Ladeira da Misericórdia, no Largo da Misericórdia, II RA. Arquivo do Departamento de Pesquisa e Documentação do Inepac.

6 DPHA, Processo n. E-03/001.979/65, Tombamento do Automóvel Club do Brasil. Arquivo do Departamento de Pesquisa e Documentação do Inepac.

7 Armando Mendes, entrevista concedida em 9.12.2015.

8 Decreto n. 1707 de 17.7.1978 (Rua da Carioca); Decreto n. 2216 de 20.6.1979 (Travessa do Comércio); Decreto n. 1768 e n. 1769 de 15.9.1978 (Cinelândia).

9 Lia Motta, entrevista concedida em 26.9.2015.

10 Resolução n.195 de 28.9.1979 da Secretaria Municipal de Planejamento e Coordenação Geral.

Memory and urban policies in Rio de Janeiro (1960s and 1970s)

Flávia Brito do Nascimento

Flávia Brito do Nascimento is an architect and urban planner and Doctor in Architecture and Urbanism. Professor of the Faculty of Architecture and Urbanism of USP, Department of History of Architecture and Aesthetics of the Project. His research deals mainly with the themes of cultural heritage, preservation policies, urban patrimony, social housing, residential complexes and history of Rio de Janeiro.


How to quote this text: Nascimento, F. B., 2017. Memory and urban policies in Rio de Janeiro (1960s and 1970s). V!RUS, 15. [e-journal] [online] Available at: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus15/?sec=4&item=5&lang=en>. [Accessed: 26 April 2024].


Abstract

The discussion regarding the appreciation of the downtown area of ​​Rio de Janeiro as urban environmental heritage gained momentum in the 1970’s, motivated by the tension caused by successive losses of significant and culturally valuable landmarks, and by the change in the conceptual canons of preservation as well as actions by preservation agencies at the federal and municipal levels. As part of the debate proposed by the Dossier The Construction of Memory in V!RUS Magazine, this article aims to understand the trajectory of social mobilizations around urban memory in the old capital of the country after the creation of the new capital, Brasilia. We are interested in exploring how the pre-existing urban sites of Old Rio were transformed from obstacles – in the initial moments after the change of the capital – into representations of identity value, leading to innovative policies for the appreciation of memory. The article addresses how the city’s master plans and urban transformation projects were intermingled with a sense of loss and the social construction of a past identity in the city after the capital moved to Brasilia. We discuss how, in the mid-1970’s, the Basic Urban Plan – also called PUB-Rio - enabled the protagonism of urban preexistence and memory, making urban preservation policies in Rio de Janeiro possible. Thereafter, the relations between past and future in urban management practices emerged. This article discusses the uses of the past in the city of Rio de Janeiro involving urban projects and cultural heritage actions in the 1960’s and 1970’s.

Keywords: Rio de Janeiro, Urban memory, Urban heritage, Pre-existence


1 Introduction

The difficulty of conceiving a role for the city of Rio de Janeiro in the new national context after the capital’s move to Brasília had been discussed since the end of the 1950’s. According to Marly Motta (2000, p.13), the political moment encompassing the newly created Guanabara State until its incorporation to Rio de Janeiro State was highly volatile. In this paper we will address how the charged political atmosphere of the period involved disputes regarding the urban memory of Rio de Janeiro. The construction of memory, a theme of the V!RUS magazine Dossier, developed slowly in Rio de Janeiro post-Brasília and was characterized by many symbolic conflicts.

In the beginning of the 1960’s, Rio was treated as the capital of the future, whose natural beauty would be enhanced by Carlos Lacerda’s wide-ranging modernization program that – albeit ambiguously – took many actions aimed at the construction of the city’s memory, such as the foundation of the Museum of Image and Sound (with an audiovisual archive of the city), the creation of the Historical and Artistic Heritage Division of Guanabara and the numerous celebrations of the city’s Quadricentennial in 1964. After the 1970’s, the unease with the discourse of modernization, motivated, among other factors, by the loss of architectural landmarks, led to preservation policies for the city driven by the urban memory.

We refer to memory as a social construction, mobilized by social actors around the idealization of Rio Antigo (Old Rio) in the 1960’s, and later, in the 70’s, as an urban right to memory underscored by the policies of the Cultural Corridor. To understand the trajectory of this idea of preservation linked to the protection of memory, we will address Rio’s urban policies from the Lacerda Administration to the Basic Urbanistic Plan of 1977, which led the way for preservation policies.

Carlos Lacerda’s administration, the first elected governor following a difficult race with the competing candidate Sérgio Magalhães, had pledged to ensure the role of the city – now a State – in the political life of the nation. The governor’s political and administrative strategy was to organize the apparatus inherited from the Federal District giving it the flair of a State, which Lacerda called the “statification” of Guanabara. The nickname of Belacap (short for Beautiful Capital), as a counterpoint to Novacap (short for New Capital) coined for Brasília, was created to forge identity and self-esteem.

The physical attributes of Belacap, besides its natural beauty, would be guaranteed by Lacerda’s extensive construction plans. The modernization of the city’s infrastructure, among other things, went from ensuring the water supply (with the construction of the Guandu Pipeline), to the much questioned social housing program that had replaced the project implemented in the 1950’s by Carmen Portinho from the Department of Affordable Housing (DHP). Headed by Sandra Cavalcanti, starting in 1962, the program removed numerous slums from Rio’s South Zone and transferred the population to housing projects comprised of single-family homes in areas distant from the downtown. The school construction program was also one of the government’s centerpieces. Almost 200 schools were built during this period – many of them designed by Francisco Bolonha, formerly of DHP and an important architect belonging to the second generation of Modernists known as the Carioca School (Nascimento, 2008).

The 1960’s arrived with the state government’s discourse of renewal and its practice of replacments and demolitions. Renewing the city was part of the strategy for its appreciation. In the beginning of the 60’s, newspapers headlined the demolitions of the Praça XV Market, the Lloyd Building, the remains of Castelo Hill – all considered as urban blots. Some Central Avenue buildings were also torn down. Cleansing the city was a social and urban theme. (Tribuna da Imprensa, 1958/01/14, 1958/03/14).

Urbanism was, in effect, one of the great undertakings of the Lacerda Administration. The idea of Rio de Janeiro as an ungovernable city had taken root since the end of the 1950’s, before the transfer of the capital. The sensation had been one of collapse. The urbanistic projects were prioritized within the context of creating a positive image for Belacap, and consumed a significant part of the State’s revenues. Many of these projects, such as Flamengo Park and the Rebouças tunnel, had already been developed or discussed by the City Hall in the 1950’s, and were implemented with some changes by the new administration. Organizing traffic by eliminating trams and opening new bus lines, creating and expanding avenues throughout the city, building new tunnels, establishing new recreational areas – these were some of the targeted actions that became paradigms of the modern and up-to-date image of Rio (Perez, 2005, pp.72, 197-201).

In general, the urban intervention projects conducted in the years of the Lacerda government followed the model established since 1910, which involved developing targeted projects known as Alignment and Allotment Projects. These were done internally by City Hall, usually involving technical experts from the Transportation and Public Works or Urbanism sectors in order to effect urban changes in designated areas. The projects were approved by the City Hall and received numbers. The main proposals for urban transformation in the downtown area, such as Rio Branco and Diagonal Sul Avenues, the Perimetral Overpass and Presidente Vargas Avenue, for example, were undertaken as Approved Alignment Projects (PAA) or Approved Allotment Projects (PAL).

However, the need for a global urban planning emerged at the end of the Lacerda administration when the decision was made to enact a Master Plan for the city. The global plan that guided Rio until the 2000’s would be a gift to the city and a legacy of Lacerda’s period, helping to pave the way for his candidacy to the Presidency of Brazil. In order to elaborate the Master Plan, the Doxiadis Consulting firm, headquartered in Athens, Greece, was hired in 1964 to work with the assistance of the Cedug – or Executive Commission for the Urban Development of Guanabara, headed by the architect and urbanist Hélio Modesto, with several technical experts from Rio de Janeiro to help in collecting data.

The Greek architect Constantinos Doxiadis had been an international urban planning consultant since the 1940’s, responsible for plans in numerous cities around the world. As Vera Rezende explains, Doxiadis’ theory was organized around the concept of ekistics, which in simple terms means the science of human settlements by means of community networks. Humans should live in equilibrium with their habitat by observing their relation to nature, societies, structures and networks. The city wouldn’t simply expand, but grow within the landscape in a dynamic way, bringing to the expanded areas the necessary elements for human life (Rezende, 2015; Mello, 2012).

With regard to the downtown area, our interest here is the Doxiadis Plan, officially named the “Long-Term Urban Development Plan for the State of Guanabara”, which addressed the need for decentralization through the organization of community networks. This had been an emphasis of the Lacerda administration, with the creation of administrative areas and industrial zones in the West region as well as the transfer of slum populations to housing blocks away from downtown.

The objective was to decrease the concentration of housing and labor in the more upscale areas of town and relocate new services and functions to where was still a rural area of the city, according to 1937 zoning (Perez, 2005, pp.201-203). The plan highlighted the need for the city to organize itself in independent communities – self-sufficient and balanced among themselves, connected by expressways intersected by green areas. However, the downtown area would retain its centrality in the metropolitan region, with its role as the region’s gravitational core. In other words, the proposal was not to minimize the importance of the downtown area, but to render the rest of the city more balanced in relation to it (Mello, 2012, pp.43-55).

The value of land and the role of commerce had already been understood by Lacerda, when, at the beginning of his tenure, he had been pressured by downtown businessmen fearing the impact of the Diagonal North-South Avenue on their businesses. Organized around the SAARA – or Society of the Friends of Alfândega Street’s Adjacent Areas - these businessmen managed to revoke the 1963 urban plan and guarantee that the traditional commercial zone remained permanent. The allegation that the zone was among the most profitable in the city ended up convincing the governor to revoke the project and maintain commercial activities (Mello, 2012, pp.43-55).

The SAARA episode, which in a way guaranteed the permanence of important remnants of traditional Rio de Janeiro, shows how - in the beginning of the 1960’s- the pretension of modernity exemplified by the public works and urban transformation undertaken by Lacerda were linked pari i passu to the perception of loss. In fact, in February, 1961, the Samba School Estação Primeira de Mangueira was champion of the Carioca Carnival with the Samba theme "Recollections of Old Rio". The lyrics highlighted Rio de Janeiro as a "traditional city", celebrating the characteristics which were now gone, such as the Castelo Church, the gas lamps, the serestas and the general splendor, as well. As the lyrics go:

Rio cidade tradicional
Teu panorama é deslumbrante
É uma tela divinal
Rio de janeiro
Da Igreja do castelo
Das serestas ao luar
Que cenário tão singelo
Mucamas sinhás moças e liteiras
Velhos lampiões de gás
Relíquias do rio antigo
Do rio antigo
Que não volta mais.1

The sense that changes were underway is expressed in the concept of the city "that will return no more", that has been transformed. There was a celebration of the Rio of the past, that had disappeared a long time ago or was being torn down in full view, unable to be part of the aspirations for the new State of the federation. The discourse of the future was predominant. The past, celebrated through the key idea of nostalgia as expressed in the song’s lyrics, represented the symbolic loss of the city’s memory. This sensation of loss would endure for several years, and would be felt in the projects for downtown of the 1970’s. It is worth questioning whether there had been any plan or interest in preserving the city, especially its more traditional area, its downtown. Would there be a place for heritage preservation policies or any feeling of loss in such an intense transformation process?

2 Iphan, Uses of the Past, and the Transformation of Rio de Janeiro’s Downtown Area during the 1960s

Preservationists and protagonists of national heritage have always directed their attention towards the city of Rio de Janeiro, so much so that, even after the capital moved to Brasilia, the federal preservation agency, Sphan - or Service for the Protection of the National Historical and Artistic Heritage - remained in Rio, headquartered at the Gustavo Capanema Palace. Nonetheless, the downtown area had sparked little interest as an urban setting needing protection. Although Iphan, since the beginning, had carried out several legal protective actions for heritage buildings in the downtown area of Rio de Janeiro, these involved mainly isolated buildings representative of the colonial period.

Dispersed in the urban fabric of the city center, the buildings were far from configuring what could be called an urban setting. As early as 1938, a year after the creation of Iphan, several “historical and artistic monuments” were listed for protection. Churches predominated in the lists of 50 protected heritage sites between 1938 and 1940. But there were also historical gardens, such as the Passeio Público and Valongo Gardens, fountains, and civil architecture buildings like the Old Customs House, the Itamaraty Palace, the former National Mint, and the Arco do Teles complex. In the 1950s, some other cultural assets were added to the list. Among the greatest novelties were the Gustavo Capanema Palace and the Seaplane Station, protected as monuments of national modern architecture (Nascimento, 2013).

The management of national heritage, with regards to Rio de Janeiro, was subjected to Iphan’s general guidelines during the period, and listings were created in an isolated manner, favoring aspects of monumentality and exceptionality, and avoiding large urban centers for concern that legal protection could interfere in economic development and hinder the city’s growth. Homogeneous cities (small, isolated, and far from the big centers) were listed, being understood as artistic objects closed within themselves (Sant’Anna, 2004). Despite its significant historical and artistic collection of sites, Rio de Janeiro had only specific and isolated buildings that were state-protected, a situation that was very distinct from the notion of an urban complex.

Since the 1930s, Rio de Janeiro’s downtown area went through a verticalization process, and, if not for the preserved urban spots, it would have been significantly altered. The decree-law 25/37 ensured the preservation of selected monuments, while the remaining landscape continued changing dramatically. During the 1960s, Iphan was consistently under pressure to preserve Rio de Janeiro’s downtown due to rapid urbanization and the need for new practices and attitudes regarding cultural heritage in Brazil. In Rio, verticalization took place in specific areas. Already in the 1950s, the Rio Branco Avenue was fully verticalized. The new aspect of the preservation movement involved the pressure to preserve the oldest remaining portion of the colonial center: Praça 15 de Novembro Square, the former Largo do Paço and power center of the Imperial period (Colchete Filho, 2008; Sisson, 2008). What happened at this location helps to understand the impasses regarding the city’s urban renewal and its relation to preservation.

The main buildings of the Praça 15 Square were protected by Iphan in 1938. These included the Arco do Teles complex, the Imperial Palace, the Fountain by Master Valentim, and churches in the surrounding areas (Church of the Third Order of Our Lady of Mount Carmel, Church of Our Lady of Lapa of Merchants, Church of Santa Cruz of the Military, Church of the First Order of Our Lady of Carmel). The pressures of verticalization and new real estate on the Praça 15 square dated back to the 1930s. At that time, before being listed by Iphan, the square already had tall buildings. The construction of the Perímetro Avenue, breaking the area’s historic connection to the ocean, however, was the hardest blow. Iphan, aware of the construction of the overpass, made an effort to save other sites in the region that would be affected by the viaduct, such as the newly built Seaplane Station. Out of concern for keeping the Station in place, Iphan contributed to changing the design of the viaduct so as not to affect the building. As for the square itself, the historical place where the city began (in the absence of Castle Hill), little was altered and the viaduct was built, severely impacting the area’s urban environment.

The limited importance attributed to the square in the 1950s was not strictly a problem of heritage. The Rio Municipality had developed plans for the area’s transformation through the 1930s, 40s, and 50s aimed at systematic modification. The first urban project for Praça 15 square dates back to 1938 (the year of the first listing by Sphan), already proposing changes (PAA 2949). The remaining colonial architectural core (around Travessa and Ouvidor Streets) would be completely demolished, giving way to new, larger lots for future high-rise buildings. This project was not carried out and in 1947 a new project was developed (Partial modification of PAA No. 2949).

It takes into consideration the tensions between preservation and renewal that marked urban policies in Rio de Janeiro’s downtown in the second half of the twentieth century. The cultural assets listed by Iphan would be saved as small testimonial sites among high-rises of up to 30 floors made possible by the regrouping of colonial lots. The urban design of 1947 maintained only the listed churches. The lots facing the Primeiro de Março and Market Streets would be arranged in groups of three to make way for the new, tall buildings. The small buildings of the Travessa do Comércio would be demolished, enabling the construction of a square behind the lots. The region that marked the most important urban formation of the city, of central historical value in the nineteenth century, would therefore be entirely modified2.

Fig. 1: Approved Alignment Project n. 2949 from 1938 and partial modification plan of 1947 for the Travessa do Comércio, Downtown Rio de Janeiro. Source: Rio de Janeiro Municipal Department of Urbanism. Redesigned in 2016.

The changes, however, were not feasible for reasons we can only assume, such as the cost and difficulty of negotiating the lots or demolishing the old houses. But real estate pressure continued. In 1961 the Arco do Teles building, although spared from demolition, went through major intervention. The interest of the owner, Raymundo de Castro Maia, an important industrialist and art collector, required a solution that would guarantee him greater “use” of the property, based on the Alignment Project of 1947. As a result, trading equity had once again entered the picture. The solution was to maintain the old building and build a glazed building over it, although the final result would have been substantially different. Part of the roof would be maintained and the new building would emerge behind the old one. The architect for the project was Francisco Bologna, of Rio’s Modernist Movement, who had also designed Lacerda’s management schools3.

The wave of verticalization reached other buildings neighboring this set. Also in the early 1960’s, the Carmo Convent, which had served as a residence for the Imperial Family, was sold to Banco do Brasil for the construction of its new headquarters and was to be demolished. Iphan received a request to protect the Convent on the grounds that there were still traces of the eighteenth century in the building. Iphan had not listed the Convent along with the other buildings in the square in 1938, and justified its decision based on the building’s disfigurement caused by the construction works of the 1920s that gave it eclectic features. The legal protection of the building was effected on the condition that the owner, Banco do Brasil, could build a new building at the back of the lot. A few years later, the bank gave up the business and sold the building to a university, which maintained its intention for new construction. This building, Cândido Mendes tower, emerged in the mid-1970s, when the themes of vertical growth and downtown demolition were trending significantly4.

Curiously, in September 1965, a few blocks from Praça XV square, Governor Carlos Lacerda inaugurated the Museum of Image and Sound in the old building that was part of Brazil’s Centennial Exhibition of 1922. The Museum was designed with a modern center for memory of Carioca history and culture. It was a celebration of Rio history, with a pioneering iconographic and phonographic collection. Gathered in the Museum were the images of City Hall’s photographer, Malta, as well as recordings and testimonials on the history of music in the city, organized in a very bold exhibition (Mesquita, 2010). Although the main thrust of Carlos Lacerda’s administration had been the transformation of the city, the so-called “overcoming of its backwardness” with emphasis on modernity, his government took significant steps that revealed sensitivity to Rio de Janeiro’s history and the social construction of the city’s memory. The idea of modernity was the key point of Lacerda’s administration, but the creation of the Museum of Image and Sound, the Museum of the First Reign and, above all, the celebrations of the Quadricentennial of the City of Rio de Janeiro emphasized the degree to which celebrating the Carioca and his/her city was the trend.

The creation of the Guanabara Historical and Artistic Heritage Division (DPHA), in 1963, was very significant in this process of building the Carioca identity through its history. The Division was founded with the aim of protecting cultural assets of the State. It existed until a merger in 1974 replaced it with the Inepac - State Institute of Cultural Heritage. The first act of protection undertaken by the DPHA downtown underscores the care with the remains of the city that “will return no more”. The Ladeira da Misericórdia hill, next to Praça XV square, was registered in 1965, remaining as a testament to future generations, it seems, not because of what it had actually been, but as a representation of the Rio that had disappeared.

The protection of the building was justified by the fact that it was the “only remnant left of the city erected by Mem de Sa, in 1567 on Castle Hill.” The protection represented the “preservation of an important documentary element, for reference to the location of the original site of the city”5. The results downtown regarding preservation were still perfunctory, and acts of protection were designated according to documentary proof of historical narratives. In this case, there was an ongoing dispute about the date of foundation of the city and to whom the honor of the foundation would be bestowed. During the preparations for the celebrations of the Quadricentennial, the foundation date had been discussed at length and established. The year was 1565, and the martyr, Estácio de Sá, had expelled the French (Turazzi, 2014). Protecting the Ladeira da Misericórdia hill as a symbol of the city of Mem de Sá was a position taken by the historian Marcello de Ipanema, the first Director General of the Division of Historic and Artistic Heritage of Guanabara.

The other act of protection by DPHA in 1965, downtown, involved real estate disputes in the area, as would continuously be the case thereafter. The act related to the Automobile Club of Brazil, located on Passos Avenue, in front of the Public Drive. Its preservation took place amid the real estate and urban design disputes for the downtown. The request for preservation came through the Secretary of State for Education and Culture, Carlos Flexa Ribeiro, due to the threat of demolition to make way for the construction of a new commercial building. The Automobile Club did not consent to the protection and requested its impugnation, claiming damages, since the deal with the construction company had already been consolidated. The protection process continued, and the “architectonic site highly representative of the neoclassical style and closely linked to the cultural life of Guanabara” remained for future generations6. The historical and artistic heritage would become - as of this moment and in the following decades of the 1970’s and beginning of the 1980’s - more and more intertwined with the attempt to reveal the urban history of the city. Saving a building would be like salvaging something from the history of Rio. We can observe that this sensitivity to the past existed in the 1960s, but was limited to the field of history and its uses of the past, still far removed from the policies of urban preservation . Legal protections were perfunctory and protection policies were drops in the ocean. The actions remained limited to the heritage of the monument, associated with the Iphan memory frame in which selective practices encompassed the colonial, monumental and exceptional. It would be necessary to wait for the 1978 Master Plan that would enable municipal legislation to open the way to safeguard what remained of Rio de Janeiro’s historical remnants in their heterogeneity, as a testament to their own historical processes.

3 Urban Planning Meets Cultural Heritage in the Downtown Area

In the 1970s, demolition pressures on Rio de Janeiro’s downtown continued significantly. Urban real estate in the downtown area was still massive even with so many losses, and historical clashes over the permanence of the materiality of the past were very forceful. The Rio Branco Avenue, symbol of modernization in the early years of the twentieth century, was slowly being demolished. Large office towers replacing the eclectic buildings of the Pereira Passos era were being erected with the authorization of Iphan, not without opinions and heated controversy involving renowned proponents of national heritage such as Lucio Costa and Paulo Santos (Guimaraens, 2002; Pessoa, 1999).

 The greatest dispute about the materiality of the buildings in Rio was related to the demolition of the Monroe Palace, initially justified by the construction of the subway. As the former headquarters of the National Senate, the building had become “obsolete” when the capital moved to Brasília. In March of 1976, the Monroe Palace was torn down after intense debates in the media, as shown by Fernando Atique (2017).

These urban transformations would have social repercussions, shedding light on the relationship between the military dictatorship, urban space, and works of urban infrastructure, such as the subway, which had great impact on Rio’s downtown. The theme of preservation as urban identity and social memory emerged in the 1970s, in the face of historical demolitions and transformations in the urban space that had been occurring since previous periods. The political and institutional decisions by Iphan in light of these facts, focusing on mediating the tensions and pressures between the private and public sectors, clearly did not meet society’s expectations and was perceived as insufficient in preserving the city’s urban memory.

It was in the 1970s and 80s that urban preservation policies were established in Rio de Janeiro as a response, in many ways, to the wave of urban renewal and demolitions of iconic buildings, mainly downtown. During the civil-military dictatorship in Brazil, great urban projects were executed throughout the country, taking advantage of the effects of the so-called “economic miracle”. Works of infrastructure nationwide, like the construction of road networks, sought to “modernize” urban centers and accompany the effects of enormous population growth, changing the features of a country from rural to urban.

What little is known about the history of preservation in Brazil in those years is that - faced with the “conservative authoritarian modernization” promoted by the military regime, pressures of the real estate sector, and urban growth - national heritage technical experts tried to think and act on an urban scale, implementing numerous restoration works, developing master plans for listed cities provided by Unesco consultants, and creating and strengthening local preservation bodies.

Concepts such as urban environmental heritage were highlighted in order to justify protections to certain urban practices and ways of life, or certain architectures and urban spaces outside the colonial and modern canon. Municipalities and states began to act, responding with expressions of care and protection of their heritage, moving beyond the mere listing of sites for protection to seeking instruments of urban planning. This was the case of Rio de Janeiro, where urban planning gained traction, providing technical support for the executive to issue decrees on the preservation of downtown in the late 1970s culminating in a preservation policy adopted by the municipality (Motta, 2000).

In 1974, Rio de Janeiro went through a new political and administrative transformation with the merger of the states of Guanabara and Rio de Janeiro, which provoked extensive political debate regarding the city itself. The decision by the President of the Republic - although abrupt - was supported by groups that had defended this act since the 1950s. For others, the merger was perceived as a blow to political autonomy (Ferreira; Grynspan, 2000). It resulted in the need for a new administrative configuration, with important consequences for urban planning. The new municipality needed to draw up a Master Plan to organize the city’s territory. In July 1975, Decree-Law no. 168 created the Municipal System of Planning and General Coordination with the directive of developing the Basic Urban Plan of the City of Rio de Janeiro within two years.

After a review of several urban plans submitted by foreign consultants (Agache and Doxiadis Master Plans), this was the plan implemented by City Hall’s technical experts. This fact is celebrated by Mayor Marcos Tamoyo in his presentation of the Master Plan:

The Municipal Planning Department, made up of professionals at the highest level, experienced and knowledgeable of Rio’s problems, was appointed by me directly to develop this Plan. Without any feeling of xenophobia, and also because the skills we have today are the result of so much we have learned from the Agache and Doxiadis Plans, I cannot fail to point out that the present work was conducted by Brazilian technical experts (Tamoyo, 1977, p. V, our translation)

The Basic Urban Plan known as PUB-Rio began in 1976 and was concluded in 1977. According to the testimony of Armando Mendes, urban planner of the municipality and one of the coordinators of the Plan, it was prepared in record time. There was no planning prior to its preparation, so the studies and proposals were organized based on the work and experience of the technical experts in dealing with the city7. Promulgated by decree-law of the mayor in 1977, it set up the guidelines for the city’s urban planning and pointed to the need to conduct specific studies, which were called Projects of Urban Structuring - or PEUs in the Portuguese acronym.

The plan turned out to be very important for the preservation of the city. It was a turning point in the relation between heritage and planning when, finally, an instrument had been created for the preservation of Rio de Janeiro’s downtown. Until that moment, in the history of preservation in Brazil, architects in Iphan’s sphere of knowledge were in charge of implementing selective practices. In the case of Rio de Janeiro, the consequences were serious, as we have seen, because the general conduct of the institution was to avoid conflicts and controversies in urban areas of large cities.

An approach to the downtown area of Rio de Janeiro, named the Central and Business Area, was intrinsically connected - and it couldn’t be different - to the global view of the municipality and its problems. Rio de Janeiro’s development hypothesis was based on the understanding (obtained from extensive and detailed studies) that negative aspects should be corrected, among others:

[...] the decrease in the quality of life and of the urban environment in the city of Rio de Janeiro, due to constant reuse, with increasing intensity, of land located in the best areas, regarding services, equipment, and scenery, sacrificing natural beauty, forest reserves, historical and architectural monuments, and traditional urban environments (Prefeitura, 1977, p. 230, our translation).

We can note here the interest and the loss not only of monuments, but of traditional urban environments. The concept of heritage started to be understood beyond exceptionality: encompassing the urban context. It was an important broadening of the conceptual understanding. According to the plan, the downtown area was characterized by excessive concentration of real estate businesses and land speculation for its urban, commercial, and metropolitan transport infrastructures. The map of land rent left no doubt that, in the context of the city, the downtown area real estate value was high. The development hypothesis was elaborated through planning propositions for each area of the city. For downtown, the guideline was to rationalize growth within the limits of the area, to study the relocation of parking areas, and re-study residential use in peripheral areas, among others. Some of these guidelines enabled the permanence of the so-called traditional urban environments in an effective way in the following years. Namely:

- Provide conditions for the strengthening of financial, cultural, recreational, and administrative activities as well as specialized services, by means of establishing buildings intensities.
- Optimize the existing equipment to strengthen its role as financial and cultural center.
- Preserve certain urban environments of cultural, architectural, and landscape value (Prefeitura, 1977, p. 245, our translation).

It was explained that preserving environments of cultural and landscape value was a task for Rio de Janeiro’s urban planning, understood within the scale of the city, and not focused on building for aesthetic-stylistic value. In regard of preservation, Area 1 (Port, Downtown, Rio Comprido and São Cristóvão neighborhoods) would have areas listed for environmental preservation due to their cultural and historical characteristics impacting the community, also a conceptual novelty. In addition to downtown, Area 2 (Botafogo, Copacabana, Lagoa, Tijuca, and Vila Isabel) was referred for landscape preservation, Area 5, for its natural areas preservation (Bangu, Campo Grande, and Santa Cruz), and Area 6, for environmental and landscape preservation (Ilha do Governador, Paquetá, and Santa Teresa) (Prefeitura, 1977, pp. 244-246, our translation) It is therefore clear that among the planning propositions, environmental and landscape preservation was highlighted.

The expansion of the field of cultural heritage that occurred in the 1960s and more effectively in the 1970s and 80s has put urban heritage on the agenda of public policies. The creation of new discourses, away from the commitment and representation of national unity through buildings and towards organization in favor of other protagonists and their materializations, was profuse, going from cultural diversity and environmental heritage to communities. It was within the framework of multiple transformations of content and forms of operating that urban issues became central. When appreciating the common architecture, the everyday architecture, the simple architecture, ways of living were consequently being appreciated and quality of life was being advocated.

The concept of heritage in this period was gradually detached from its national symbolic value and started to support the struggle for a less densely-populated urban environment. The concerns were over keeping the urban scale and the atmosphere. It opened the possibility of appreciating urban sites as documents, that is, by virtue of what they represent as remnants of the process of territorial occupation. There was a break with the strictly visual, façade-focused, or stylistic outlook. What mattered were the meanings contained in the forms of the city’s materiality, built by the communities that inhabited it. There was a move away from listing isolated buildings towards a more comprehensive form of action, approaching the urban planning, as was the case in Rio de Janeiro.

The 1977 PUB-Rio was a key component in this process, capable of exemplifying how the expansion of preservation concepts occurred in those years.

The 1977 master plan with its interest in preserving downtown, the continued real estate pressure in the region, and the political interest in limiting land speculation in certain areas paved the way for a new phase in Rio de Janeiro’s downtown. In 1978, three municipal decrees limited the verticalization of the area and protected several places successively: Providência Hills and Conceição region, Cinelândia, Carioca Street, and finally, Praça XV square8. The preservation decrees valued multiple aspects of the city’s characteristics: environmental preservation, maintenance of traditional commerce, cultural uses and architecture - all duly based on concepts introduced in the master plan.

In the case of Praça XV square, as previously discussed, the real estate pressures in late 1970s only increased, and some of the two-story row houses begun to catch fire. Alarmed by the possibility of losing the whole Square complex - not yet completely protected by law - Iphan began a study on the surroundings of the listed churches. According to Lia Motta9, author of Iphan’s first study conducted in the region of Praça XV square, it was at this moment of great real estate pressure that employees of the federal institute urged their president, Aluísio Magalhães, to contact Mayor Israel Klabin; the Mayor then sanctioned the decree of legal protection legitimized by the 1977 Master Plan, which banned the construction of tall buildings in the area. The two-story row houses on the Travessa do Comércio, in Praça XV square, were completely protected as of that moment, and no building could be demolished, and nothing higher than four meters be constructed, in respect for the environment of the two-story row houses.

The succession of decrees concerning environmental protection of the downtown area would end in 1979, but for good reason for the preservationists. Mayor Israel Klabin created a system of municipal administration through Technical Chambers that would deal with latent issues of interest to the municipality. During this process, the Technical Chamber of the Cultural Corridor was created within the framework of the City Plan Commission (COPLAN), with the goal of

[...] developing and presenting studies on the potential of cultural activities in the area called “Cultural Corridor”, established by Decree 2216 of 7.20.1979, providing subsidies for the formulation of specific projects aimed at the historical, environmental, and cultural preservation of the area and the maintenance of its traditions, proposing events, new activities and administrative measures that allow the revitalization of the Center of the City in the context of the cultural life of the Municipality10 (our translation).

From then on the Cultural Corridor project consolidated the legal protection of a large area in Rio de Janeiro’s downtown. The project was innovative in many respects and triggered new protection practices for the constructed environment, with numerous developments during the re-democratization period and throughout the 1980s. The undertaking of diverse cultural events in public spaces and the creation of cultural and arts centers were some of the important initiatives and work fronts, since these activities were the focus of cultural heritage during those years in different parts of the world. There were also actions aimed at the appreciation of the public space, renovating squares and broad areas of downtown. The creation of subsidies and tax exemption for the renovation of private properties would be one of the most far-reaching actions with significant effects over the years. Through the daily work conducted by the technical office of the Cultural Corridor Project together with the property owners in the SAARA region, reforms were carried out to gradually remove signs, billboards, posters and other interferences obstructing the façades, thus uplifting the nineteenth century typologies.

Regarding the municipal public administration, the 1970s witnessed the action of a new generation of urbanists from Rio de Janeiro involved in urban projects for the city within the framework of public institutions. Their motto was preservation, making it viable means of urban instruments. Social demand was taken into consideration, involving much more than the legal protection of property, but as a plan of action for the appreciation of buildings as an urban set that includes historical formation, social processes, and present occupation. An awareness of a “past” Rio de Janeiro in face of the modernized new areas underscored the theme for the city. Preservation projects for the constructed heritage were made feasible when nostalgia over loss was experienced as a shared feeling. And these projects will shape the future characteristics of Rio de Janeiro.

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1 Samba theme "Recollections of Old Rio", 1961. Composition: Hélio Turco, Pelado and Cícero. Rio Traditional City, Your Landscape is Breathtaking, Your Canvas is Divine, Rio de Janeiro, Of Castelo Church, of Moonlight Serestas, Such a Simple Scene, Mucamas, Sinhás, Ladies, and Litters, Old Gas Lamps, Relics of Old Rio, Old Rio, that will return no more…

2 Approved Alignment Project n. 2949 of 1938; Partial Modification of PAA n. 2949 in 1947. Rio de Janeiro Municipal Department of Urbanism.

3 Iphan, Process n. 0099-T-38 Arco do Teles and houses n. 32 e 34. Inventory Series and Works Series. Iphan’s Central Archieve in Rio de Janeiro.

4 Iphan, Process n. 0689-T-62, Old Carmo Convent. Iphan’s Central Archive in Rio de Janeiro.

5 DPHA, Process n. 03/300 447/65, Protection of Ladeira da Misericórdia, in Largo da Misericórdia, II RA. Archive of the Research and Documentation Department of Inepac.

6 DPHA, Process n. E-03/001.979/65, Listing of Automóvel Club do Brasil. Archive of the Research and Documentation Department of Inepac.

7 Armando Mendes, interview given in 9.12.2015.

8 Decree n. 1707 of 7.17.1978 (Carioca Street); Decree n. 2216 of 6.20.1979 (Commerce Alley); Decree n. 1768 and n. 1769 of 9.15.1978 (Cinelândia).

9 Lia Motta, interview in 9.26.2015.

10 Resolution n.195 of 9.28.1979 from the Municipal Planning Department and General Coordination.