Vanguardas na América Latina: Manuel Bandeira no localismo universal

Brenda Leite

Brenda Regina Braz Leite possui bacharelado e licenciatura em História e é mestranda na área de Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo. Atualmente é pesquisadora do grupo Cultura, Arquitetura e Cidade na América Latina (CACAL) e desenvolve o projeto de pesquisa As representações de um provinciano moderno: urbanização e memória da cidade nas crônicas de Manuel Bandeira (1927-1937) junto à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), atuando na linha de pesquisa Memória, práticas e representações. breleite53@gmail.com http://lattes.cnpq.br/4397127154457595


Como citar esse texto: LEITE, B. R. B. Vanguardas na América Latina: Manuel Bandeira no localismo universal. V!RUS, São Carlos, n. 22, Semestre 1, julho, 2021. [online] Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus22/?sec=4&item=6&lang=pt>. Acesso em: 07 Out. 2024.

ARTIGO SUBMETIDO EM 7 DE MARÇO DE 2021


Resumo

Buscando pensar os movimentos de vanguarda em uma perspectiva continental, este artigo tem como objetivo analisar as especificidades do Movimento Moderno na América Latina, a partir da perspectiva do local e o do universal (CANDIDO, 2006), colocado como um fator de diferenciação em relação ao modernismo europeu. Tendo o continente como tema, mas focalizando o Brasil e em um autor específico, esse processo será analisado à luz das crônicas de Manuel Bandeira, escritas nas décadas de 1920 e 1930 e selecionadas para a obra Crônicas da província do Brasil, de 1937. Elas serão articuladas, simultaneamente, com a própria trajetória do autor e do moderno no Brasil e no continente. Os textos de Bandeira constituem uma fonte potente de análise e compreensão de um localismo universal latino-americano, permitindo-nos compreender aspectos desse movimento que não foi específico do Brasil, mas se estendeu pela América Latina, e como ele transpareceu em nossa linguagem, arquitetura, cidades e cultura. Tais reflexões evidenciam como esse caminho ainda está sendo trilhado, como cada vez mais barreiras geográficas, literárias e linguísticas estão sendo transpassadas, no que diz respeito à América Latina.

Palavras-chave: América Latina, Modernismo, Manuel Bandeira, Tradição, Vanguardas



1 Introdução: Modernismo, movimentos de vanguarda

[...] o modernismo é a nossa arte: é a única arte que responde à trama do nosso caos. (BRADBURY, MCFARLANE, 1989, p. 21)

Na Europa, entre os anos 1890-1930, o modernismo se constituiu como um movimento estético de vanguarda, de expressão do século XX, da sociedade e consciência moderna (BRADBURY, MCFARLANE, 1989). Como arte que representava uma sociedade nova, o modernismo propunha o rompimento e a independência em relação às propostas estéticas anteriores. Exigindo novos ambientes, a arte moderna atacava as velhas convenções, se opondo aos pressupostos estéticos existentes, ao mesmo tempo que exaltava o novo (BRADBURY, MCFARLANE, 1989). Cidades como Paris, Berlim, Viena, Praga, Londres e Moscou eram descritas como “cidades do modernismo" (BRADBURY, 1989, p. 76), isto é, capitais culturais que atraíam intelectuais e escritores de diferentes partes do mundo, criando uma atmosfera urbana de intercâmbio cultural e intelectual.

Em sua pluralidade, o modernismo se colocou como tendência internacional, de caráter cosmopolita e urbano, passando a ser uma arte das cidades. O artista precisava estar na cidade para se constituir como moderno; logo, a cidade se tornou objeto de interesse, um personagem, uma metáfora na obra dos escritores modernos, como Baudelaire, Dickens, Dostoiévski. A vivência no ambiente metropolitano era fundamental para ser moderno, se expressar e escrever como moderno (BRADBURY, 1989). Ao protagonizarem o trabalho do novo, se lançando à frente, esses movimentos de vanguarda buscaram uma arte crítica, liberta de condicionamentos, estimulando o exercício experimental da linguagem e a atualização do pensamento, rompendo com toda tradição que a precedera (BELLUZZO, 1990). Envolvendo todos esses fatores, a renovação promovida pelo modernismo não foi apenas estética, mas, sobretudo, cultural, indo além da arte e se materializando em novas formas de linguagem e expressão nos diversos campos da cultura: na literatura, na pintura, na escultura, na música, no teatro, na arquitetura e, por que não, nas cidades.

2 Vanguardas latino-americanas

Enquanto movimento internacional, o modernismo se expandiu para diversos países e continentes, inclusive na América Latina, entre as décadas de 1920 e 1930, onde encontrou sentidos diversos. Era necessária a ruptura com o passado e a história para a modernidade se implantar como discurso global e prática hegemônica da esfera literária e cultural (SARLO, 1990). Entretanto, no contato com as vanguardas europeias, os intelectuais latino-americanos se deram conta de como esse rompimento radical com o passado, promovido pela modernização das expressões artísticas e culturais, teria sentido apenas em países com forte tradição nacional enraizada (FONSECA, 1997). Países de formação recente, como os latino-americanos, ao aderirem ao novo, estariam descaracterizando as particularidades de sua própria produção artística, perdendo tanto seu caráter nacional, quanto seu valor universal (FONSECA, 1997).

Caminhando no sentido oposto da ruptura com as tradições locais e do internacionalismo, a tarefa dessas vanguardas foi a de construção de uma tradição e de uma identidade nacional: produzir — em associação com o Estado — modernidades nacionais, e nisso concerne seu sentido de novidade, de vanguarda (GORELIK, 2005). As vanguardas latino-americanas buscaram se alinhar com as europeias, inserindo-se nesse circuito internacional moderno, sem, entretanto, renunciarem àquilo que lhes era próprio: “as nossas deficiências, supostas ou reais, são reinterpretadas como superioridades.” (CANDIDO, 2006, p. 126). O movimento moderno se deu, assim, a partir da afirmação do local e do cosmopolita como vertentes do mesmo processo, uma dialética entre ambos inspirada no exemplo europeu (CANDIDO, 2006).

Essa visão de um localismo universal, defendida por Cândido, foi incorporada à perspectiva do crítico e escritor uruguaio Ángel Rama. Ao buscar uma integração cultural maior entre os países da América Latina, Rama percebeu um ritmo comum e dialético entre o processo de modernização e recuperação do tradicional, do primitivo e do regional na produção cultural latino-americana dos anos 1920. Essa tensão entre o moderno e a tradição seria superada por meio do processo de transculturação (AGUIAR, VASCONCELOS, 2001), uma transformação cultural pelo contato entre culturas diferentes. Buscando construir uma identidade, esses intelectuais olharam para o passado e escolheram nele elementos que constituíssem certa tradição nacional que fizesse sentido dentro de um quadro moderno internacional. Essa identidade era um projeto e não um retorno ao passado (MARTINS, 2010). Buscavam tornar conhecida uma América Latina produzida pelos próprios latino-americanos, e não mais aquela baseada em representações europeias, produzidas por europeus, onde seus pontos de vista e cultura prevaleciam (SCHWARTZ, 2008).

Houve dois campos onde esse movimento se deu com mais força: na literatura e na arquitetura. No que se refere à construção de uma língua nacional, a literatura desempenhou papel crucial nesse projeto. No Brasil, mas também na Argentina, no Peru, no México, em Cuba, por exemplo, buscava-se a renovação das linguagens existentes. Havia a necessidade de valorizar a língua falada em oposição à distância que a separava da escrita acadêmica: “Como falamos. Como somos” (ANDRADE, 2007, p. 1). O modernismo propunha um embate contra a estética acadêmica tradicional e mecanizada, de ideias convencionais e formas endurecidas de expressão.

O abandono das formas poéticas regulares, por exemplo, não alterou apenas os elementos formais dos poemas, mas também seu enredo e personagens. A ordem social conservadora e convencional foi ocupada pelo cotidiano e pelo popular. Com isso, aquilo que era desvalorizado pela predominância de uma cultura europeia, como o negro, o primitivo, o folclore, o popular, passa a nos afirmar culturalmente, acentuando uma esfera nacionalista com particularidades e especificidades (CANDIDO, 2006). Esse momento pode ser lido como um movimento de dobradiça (MANRIQUE, 1974), onde a arte olhava, ao mesmo tempo, para fora — a Europa — e para dentro — a si próprios. Era preciso olhar para a própria realidade para se definir frente ao outro.

Nesse contexto, não é possível deixar de fora os movimentos indigenistas, que ocorreram com mais intensidade onde a população indígena ainda era muito numerosa, como México, Bolívia e Peru. Esse movimento buscava integrar as populações indígenas aos planos de nação desses países, isto é, não podiam mais ser excluídos da cultura, da economia, e da sociedade, deveriam ocupar seu lugar de sujeitos da história. Diante da desigualdade e da opressão dos povos indígenas no Peru, nomes como o de Mariátegui — um dos principais intelectuais da vanguarda peruana — participaram deste despertar para a realidade opressiva desses povos e seu papel na história e cultura nacional. O índio passou a ser material de produção artística e cultural. A arte muralista de vanguarda no México também pode ser lida nesta chave. O índio tornou-se personagem dessas representações que retratavam o povo e a história mexicana, dialogando com o novo projeto de Estado do México pós-revolução. A arte, ao ser apresentada em espaços públicos, também se tornava pública, incorporando personagens outrora excluídos da história e cultura nacional.

O nacionalismo, o olhar para a própria realidade, estava em pauta nas diversas comemorações do centenário da independência dos países latino-americanos que ocorreram nas primeiras décadas do século XX. Com processos de independência muito diversos e diferentes do Brasil, a independência dos países hispano-americanos foi comemorada em meio a ações nacionalistas e críticas, que buscavam repensar a nação. Na Argentina, tais comemorações (1910) se deram em meio às discussões em torno da questão da nacionalidade, devido aos milhares de imigrantes que chegaram ao país no final do século XIX. Preocupados com a afirmação dos valores nacionais e suas tradições, a “Geração do Centenário1”, juntamente com o Estado, promoveram, em razão dessas comemorações, projetos de educação patriótica e afirmação da nacionalidade, da identidade, e de uma tradição argentina dita autêntica (NÉIA, 2018).

Na década de 1920, houve uma série de movimentos artísticos impulsionados por esse ambiente: México (Manifiesto del Sindicato de Artistas Revolucionários, 1922); Brasil (Semana de Arte Moderna, 1922); Argentina (Movimiento Martinfierrista, 1924); Chile (Grupo Montparnasse de Santiago, 1928); Cuba (movimento encabeçado por Victor Manuel, 1924). Dessa forma, a questão da identidade, das raízes nacionais, de repensar a cultura e a sociedade por si próprios e frente ao outro, já estava nas pautas desses países, sendo discutida, principalmente, pelos intelectuais que comporiam os movimentos de vanguarda nos anos 1920 no continente. Além da vanguarda brasileira, da qual Manuel Bandeira, Oswald e Mário de Andrade, Tarsila do Amaral entre outros, fizeram parte, tivemos César Vallejo e José Carlos Mariátegui no Peru; Leopoldo Marechal e Jorge Luis Borges na Argentina; Vicente Huidobro no Chile; Diogo Rivera e José Orozco no muralismo mexicano (SCHWARZ, 2008). Estes são alguns exemplos dentre um conjunto extenso. Todos esses intelectuais e artistas latino-americanos uniram o novo intelectual, despertado pelo modernismo, à construção de uma história nacional e à busca por suas identidades nacionais. Nacionalismo e cosmopolitismo caminhavam juntos (SCHWARTZ, 2008).

Mais do que um movimento estético, o modernismo se colocou como um movimento cultural, um movimento das ideias. Ao falar sobre o movimento no Brasil, Candido (2006) destacou como a literatura moderna trazia as melhores expressões do pensamento brasileiro da época, desempenhando um papel potente em sua expressão social. Daí advém seu caráter enquanto movimento cultural. Através dos novos recursos interpretativos e expressivos, a literatura cooperou com outros setores da vida intelectual. As revistas de vanguarda ilustram bem essa vanguarda em movimento2. Por meio delas, as propostas culturais eram percebidas com mais clareza, as ideias propagadas e as fronteiras superadas (MARQUES, 2013). Nas revistas, os autores eram mais radicais, ousados e combativos, em experimentações literárias e críticas. Mesmo publicadas em poucos exemplares, essas revistas tiveram um impacto considerável nas transformações culturais, principalmente por serem lidas por uma elite influente nas decisões políticas e culturais do período (SCHWARTZ, 2008)3

O intercâmbio entre esses intelectuais por meio das revistas era notável. Em Festa, publicada no Rio de Janeiro entre 1927/29 e 1934/35, havia edições com textos de autores hispano-americanos, como Oliverio Girondo, Juan Ramón Heredia, Vicente Huidobro, Pablo Neruda, entre outros (MARQUES, 2013). Klaxon, Proa e Martín Fierro também mantinham a rede internacional de intelectuais latino-americanos entre seus editores. Manuel Bandeira cooperava com essas revistas, ao mesmo tempo que lia o que as vanguardas ao redor do continente produziam. Embora não tenha viajado para outros países latino-americanos, Bandeira, juntamente com Mário de Andrade, foi um dos responsáveis pela integração da literatura hispano-americana no Brasil. Foi professor de literatura hispano-americana na Universidade Federal do Rio de Janeiro, de 1943 a 1956. Bandeira ainda publicou estudos como Literatura hispano-americana (1949) e Três conferências sobre cultura hispano-americana (1959) e, por uma editora mexicana, Panorama de la poesía brasileña, integrando e promovendo um intercâmbio entre as literaturas hispano, luso e franco-americanas no continente (SCHWARTZ, 1993).

Anos antes, em carta a Mário de Andrade, em maio de 1928, Bandeira escreveu:

Recebi o livro do Alberto Ramos e os seus artigos sobre literatura argentina. Conheço quase nada dela. [...] Girondo me parece muito superior, apesar do gosto esportivo pelas metáforas que tanto me enquizila. [...] De quem não li nada e preciso ler é o Borges. Já uma vez o Ronald me disse que era o mais forte de lá. [...](MORAES, 2000, p. 389)

Pelas obras tão completas e profundas das décadas de 1940-50 sobre literatura hispano-americana, e o pouco conhecimento sobre elas, no final dos anos 1920, é possível perceber como o autor se aproximou de outros escritores latino-americanos nos anos que se seguiram, e como o movimento moderno e os intercâmbios entre intelectuais de vanguarda que ele proporcionou podem ter contribuído neste processo.

A renovação dos meios de expressão artística e a ruptura com a linguagem tradicional — projeto estético —, despertou a consciência do país, o desejo por uma expressão artística nacional — projeto ideológico — indo além da literatura e atribuindo função social à arte (LAFETÁ, 2000). A década de 1920 marcou certo despertar para modernidade nos países latino-americanos, ao mesmo tempo em que abria seus olhos para a própria realidade social, o que se intensificou nos anos 1930 com a contribuição do Estado (MARTINS, 2010). No mesmo sentido da literatura, a arquitetura moderna na América Latina também se voltou para o passado, para o interior desses países, reivindicando o popular e o tradicional das províncias como forma da produção moderna, expressando uma estética nacional (GORELIK, 2005).

Modernistas e Estado se uniram neste projeto de construção da tradição e da cultura nacional. As vanguardas, enquanto intelectuais, legitimavam a voz do movimento, e o Estado legitimava uma história (BALLESTRIN, 2013). Olhar para a própria herança cultural levou esses artistas a explorar o interior dos países para descobri-los, em um momento em que afirmar a identidade latino-americana não era mais contraditório com a modernidade. A arte produzida aqui não era mais sinônimo de atraso quando comparada com a das metrópoles europeias (ARAVECCHIA-BOTAS, 2018). A própria expressão “América Latina” deixou de referir a tradição europeia e passou a significar toda uma identidade cultural, um território, uma tradição própria. Essa preocupação com a identidade nacional foi fundamental para demarcar uma arquitetura moderna no continente (ARELLANO, 2011), que irrompeu, na década de 1930, como um dos campos da atuação das vanguardas, atrelado ao Estado:

É uma simples evidência histórica que, desde os anos trinta, nos países latino-americanos em que surgiram alguma das principais expressões de modernismo arquitetônico — México e Brasil, especialmente, mas a seu modo também a Argentina —, boa parte das obras mais importantes foram auspiciadas, financiadas ou diretamente empreendidas pelo Estado.(GORELIK, 2005, p. 26).

Em termos de modernização das cidades, sob o signo do petróleo e da rodovia, o Estado argentino capitaneou, na década de 1930, um processo de modernização que o representasse, ampliando a infraestrutura viária do país. Com forte caráter simbólico, o Estado se colocou não apenas contra, mas mais moderno do que o sistema ferroviário de propriedade britânica que existia no país, atribuindo enorme sentido nacionalista ao projeto (GORELIK, 2005). Ao analisar a Buenos Aires desse período, Beatriz Sarlo (1990) observou como cidade e modernidade eram pressupostos, o tecido urbano era o cenário das mudanças, exibindo ostentações, brutalidades e contradições desse processo de modernização.

No México, após a Revolução Mexicana, em 1910, grupos de intelectuais radicais se autodeclararam na missão de construir um novo país. Seu nacionalismo visava a valorização da cultura mexicana na reconstrução de uma sociedade moderna através da ação do Estado. Arquitetos modernistas, como José Villagrán García, Juan O’Gorman e Juan Lagarreta, projetaram habitações populares, escolas e hospitais que representavam o Estado pós-revolucionário (GORELIK, 2005). Havia, assim, um ideal de cidade que representava a identidade nacional. Esse ideal não estava apenas na arquitetura moderna,— conforme os exemplos da Argentina e do México —, mas também naquela que a legitimava como continuidade: a arquitetura colonial. No Brasil, o colonial, principalmente o barroco, foi escolhido como nossa arquitetura tradicional. O local e o universal não ficaram restritos à literatura, mas também foram incorporados à arquitetura.

O que esse artigo pretende é pensar essa especificidade das vanguardas da América Latina entre o local e o universal, a partir de um autor em especial: Manuel Bandeira, e de suas crônicas selecionadas para o livro Crônicas da Província do Brasil4, de 1937. Bandeira apresenta crônicas que transitam entre esses dois campos de ação das vanguardas latino-americanas: a língua e a literatura; a arquitetura e a cidade. Isso nos permite compreender aspectos desse movimento que não é específico do Brasil, que se estendeu pela América Latina, estabelecendo um diálogo entre a obra do autor, o movimento moderno, e os discursos e ações do Estado nesse projeto de construção de uma tradição nacional. Produzidas nesse ambiente, as crônicas de Bandeira nos apresentam as aspirações e transformações do movimento moderno na cultura e nas cidades brasileiras, as formas de compreensão e interpretação do Brasil, a partir da escala cotidiana do cronista que vive nas cidades. Ao mesmo tempo, enquanto intelectual comprometido com o modernismo, ele dialoga com os intentos do movimento e do Estado na construção dessa tradição nacional. Transitando entre essas dimensões, os textos de Bandeira constituem fonte potente de análise e compreensão desse localismo universal latino-americano e sobre como ele transpareceu em nossa linguagem, arquitetura, cidades e cultura.

3 Tradição e modernidade, nacional e universal

Em se tratando de arquitetura, Lúcio Costa foi o grande representante brasileiro desse movimento que elegeu a tradição como base de criação da cultura moderna (WISNIK, 2007). O aumento do interesse pelas “coisas brasileiras”, não era apenas um projeto estético, mas um projeto de nação, o que resultou nesta nova correlação entre os intelectuais, a sociedade e o Estado (CANDIDO, 1984). A criação do SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), em 1937, pelo Ministério da Educação e Saúde (MES), comandado por Gustavo Capanema, pode ser analisada sob o viés dessa associação do Estado aos intentos modernos. O anteprojeto de criação do órgão foi escrito por Mário de Andrade e modificado por Rodrigo Melo Franco de Andrade — primeiro diretor do SPHAN — intelectuais ativos no movimento moderno. A sede do MES, no Rio de Janeiro, foi projetada por arquitetos liderados por Lucio Costa, como Affonso Eduardo Reidy e Oscar Niemeyer. O prédio do Ministério contava também com painéis pintados por Cândido Portinari, um dos maiores nomes da nossa pintura moderna. O edifício-sede do MES se tornou marco da arquitetura moderna brasileira, símbolo de um Estado moderno rumo ao progresso.

Esse movimento evidencia como o Estado tomou a decisão de eleger a arquitetura moderna como a arquitetura nacional, ao mesmo tempo que essa modernidade não rompia com a tradição – muito pelo contrário, era sua continuação. Diretor da Divisão de Estudos e Tombamentos do SPHAN, Lúcio Costa, com seu olhar de arquiteto moderno, contribuiu ativamente para a eleição da arquitetura popular colonial como nosso patrimônio nacional, em oposição à erudita, conectando a modernidade à tradição popular (WISNIK, 2007). Manuel Bandeira, amigo próximo de Mário de Andrade e Rodrigo Melo Franco de Andrade5, foi membro do Conselho Consultivo do SPHAN. Bandeira escreveu a crônica A Moderna Arquitetura Brasileira para o jornal pernambucano A Província, em 1930. A crônica foi reproduzida no livro Crônicas da Província do Brasil, de 1937, com o título Arquitetura brasileira. Nela, o autor defendeu a arquitetura moderna como aquela que simbolizava a tradição brasileira, em oposição à arquitetura neocolonial, vista pelo autor como mera cópia do passado:

É preciso repetir a essa gente as palavras de Lucio Costa, um dos poucos arquitetos novos que sentem o passado arquitetônico da nossa terra: a nossa arquitetura é robusta, forte, maciça; a nossa arquitetura é de linhas calmas, tranquilas; tudo nela é estável, severo, simples — nada pernóstico.É a esse caráter de simplicidade austera e robusta que devem visar os que pretendem retomar o fio da tradição brasileira na arquitetura. (BANDEIRA, 2006, p. 85)

A própria alteração do título de A Moderna Arquitetura Brasileira para Arquitetura brasileira pode simbolizar uma afirmação da arquitetura moderna como a verdadeira arquitetura nacional, anos antes da criação do SPHAN. As ações do Estado, a partir de 1937, no SPHAN foram resultado de um processo gestado e amadurecido pelos intelectuais modernos: era a teoria materializando-se em práticas na cidade.  

Na crônica De Vila Rica de Albuquerque a Ouro Preto dos estudantes6, Bandeira (2006, p. 13) escreveu: “Para nós brasileiros, o que tem força de nos comover são justamente esses sobradões pesados, essas frontarias barrocas, onde alguma coisa de nosso começou a se fixar.”. Essa crônica foi escrita depois da viagem de Bandeira a Ouro Preto. Nela, o que se destaca são as referências à arquitetura da cidade mineira ainda preservada: “Ouro Preto é a cidade que não mudou, e nisso reside seu incomparável encanto.” (BANDEIRA, 2006, p. 13). A arquitetura barroca, defendida como “coisa nossa”, cria um vínculo de identidade nacional entre presente e passado. Era a materialização do nosso passado, da nossa história. É essa paisagem, desconhecida por muitos, que os intelectuais de vanguarda elegeram como a verdadeira arquitetura histórica brasileira, aquela que seria divulgada internacionalmente como nossa.

O que Bandeira escreveu, em 1930, foi propagado por Lúcio Costa, pelo MES e pelos órgãos que dele derivaram, como o SPHAN, anos depois. Movidos pelas transformações estéticas das vanguardas, que incitaram a olhar para nosso passado e construir nossa tradição, esses intelectuais prepararam o que seria campo de ação deles e do Estado, na década seguinte. A criação do órgão de proteção do patrimônio é vista como uma estratégia do Estado de construção da nação através da invenção de um patrimônio nacional, a materialização da história pelo SPHAN (CHUVA, 2017). Assim, cidade e modernidade, enquanto pressupostos, não significam apenas a construção literal do novo, mas também do tradicional, do patrimônio nacional, que não deixava de ser uma novidade que se inseria na cidade.

Na crônica Bahia, publicada em abril de 1927, em O Jornal, do Rio de Janeiro, pouco tempo depois de ter estado em Salvador, em janeiro do mesmo ano, Bandeira escreveu:

Nunca vi cidade tão caracteristicamente brasileira como a “boa terra”. Boa terra! É isso mesmo. A gente mal pisou na cidade baixa e já se sente tão em casa como se ali fosse a grande sala de jantar do Brasil, recesso de intimidade familiar de solar antigo com jacarandás pesados e nobres. Ali a gente se sente mais brasileiro. Em mim confesso que, mais forte do que nunca, estremeceram aquelas fundas raízes raciais que nos prendem ao passado extinto, ao presente mais remoto. Raízes em profundidade e em superfície. (BANDEIRA, 2006, p. 33)

Para Bandeira, Salvador era um exemplo de cidade brasileira que abrigava nossas raízes e tradição, sentimento despertado pelo ambiente urbano. O autor fala de “raízes em profundidade e em superfície”. Essas raízes mais profundas nos remetem à história, a algo duradouro, que vem de um tempo que não é o presente, enquanto as raízes em superfície nos levam à cidade, ao ambiente urbano, àquilo que está na paisagem, no cotidiano da cidade, e que, igualmente, pertence à tradição. Durante sua estadia na cidade, Bandeira enviou uma carta a Mário de Andrade contando sobre a viagem:

Mário, estou apaixonadíssimo pela Bahia! É uma terra estupenda A CIDADE BRASILEIRA. Centenas centenas centenas de baitas sobradões de 4 andares e sotéia. Se eu pudesse levava um pra mim outro pra você. Solares de forte e sóbria linha senhoril com portas de pedra lavrada e brasonadas, batentes de madeira de lei com almofadões [...]. (MORAES, 2000, p. 332)

Aqui, fica evidente que, o que faz Bandeira ver Salvador como a cidade brasileira são os aspectos físicos e arquitetônicos da cidade. As casas velhas da Bahia são de arquitetura colonial, como as de Ouro Preto. Logo, a identidade de ser brasileiro estava associada a uma arquitetura e forma de cidade específicas. Bandeira completa:

O Largo do Pelourinho é a vista urbana que um brasileio pode mostrar a um francês sem ter nenhuma dor de corno pela perspectiva dos Campos Elíseos ou da Avenida da Ópera. Quanta casa velha bonita! (MORAES, 2000, p. 332)

O que nos era próprio — nossa história e raízes nacionais — não era inferior ao que existia na Europa. Portanto, ao mesmo tempo que o colonial era tomado como nossa arquitetura, ele era colocado ao lado daquilo que existia na Europa com o mesmo valor, não mais como inferior. O Brasil tinha agora uma arquitetura nacional histórica, e uma arquitetura moderna que lhe proporcionava continuidade.

Bandeira também encaminhou um cartão postal de Salvador com a imagem do Plano Inclinado Gonçalves Dias a Mário de Andrade, com a seguinte frase: “Não é quadro modernista, é a Bahia velha tão perto de nós.” (MORAES, 2000, p. 333). A frase revela a “cidade velha” como expressão do novo, do moderno. O tradicional e o moderno, o local e o universal, se uniam nesse discurso que expressava o pensamento de Bandeira naquele momento, para além das aspirações do projeto modernista. O que o moderno retratava era esse Brasil tradicional, de casas velhas, do passado colonial, que passou a ser observado e apropriado como nosso. O moderno era legitimado pela tradição que atribuía a ele uma carga histórica, construindo, assim, uma identidade nacional profunda. O novo se apoiava no velho, o moderno tinha a tradição em sua base, e a cidade era onde as vanguardas e o Estado produziam suas modernidades nacionais (GORELIK, 2005).

Ouro Preto, o centro de Salvador, e igrejas e espaços abordados nas crônicas de Bandeira foram tombados anos depois como patrimônio nacional brasileiro pelo SPHAN. Assim, em suas crônicas, Bandeira legitimava — antes mesmo dos tombamentos, e dez anos antes da fundação do SPHAN — a atribuição de valor histórico e nacional a essas construções pelos intelectuais envolvidos com as vanguardas modernas do país. Foi no Rio de Janeiro, Minas, Bahia e Pernambuco que se realizaram a maioria dos tombamentos do primeiro ano do SPHAN, privilegiando construções coloniais e religiosas. O patrimônio nacional foi representado através do colonial, consagrando esse período como o fundador da nacionalidade. Nosso patrimônio tinha, assim, uma feição construída pelo Estado e pelos intelectuais modernos por trás desse projeto (CHUVA, 2017):

O Estado se autoatribuiu o papel de agente de memória da nação, detentor da tutela do patrimônio histórico e artístico nacional — e também de sujeito da história. Foi sob essa ótica que se deu a escolha dos bens a serem conservados, aos quais se atribuiu paralelamente toda uma série de significados, num esforço de seleção daquilo que não deveria ser esquecido, daquilo que, para consolidação da nação, deveria permanecer na memória, materializando-se nos bens tombados. Tratava-se de encerrar escolhas de um passado que representasse toda a nação. (CHUVA, 2017, p. 176)

A cidade não era um reflexo desse processo de construção da nacionalidade e da modernidade, mas um de seus agentes por excelência (GORELIK, 2005). A arquitetura, por sua vez, tornou-se chave nos projetos de governo, representando a modernidade e a tradição nacional que a legitimava. A nossa modernidade exigia uma tradição nacional, e não o rompimento com ela, para então ser universal.

4 Considerações finais

O modernismo latino-americano foi plural. A busca pela tradição, o movimento entre o local e o universal, o nacional e o internacional, compuseram a especificidade do movimento moderno no continente. Dialogando com as transformações estéticas das vanguardas europeias, olhamos para nossa própria realidade e buscamos nos entender, nos definir segundo aquilo que nos era particular, e exportar essa produção nacional tradicional, consolidando-a simultaneamente como internacional e moderna. Através da análise de algumas crônicas de Manuel Bandeira e da sua própria trajetória no movimento moderno, em diálogo com o continente, foi possível perceber como esse esforço de construção de raízes nacionais e de inserção da América Latina no circuito cultural universal fazia parte do imaginário e das ideias dos intelectuais modernos. E foi, posteriormente, associado ao projeto de nação do Estado.

Era um momento de construção: de linguagens, de histórias nacionais, histórias de colonialidades, de cidades e estilos arquitetônicos, e de redes e intercâmbios dentro do próprio continente. Todas essas questões nos confrontam ainda hoje, incitando-nos a compreender mais das cidades, da sociedade e da cultura latino-americana que nos é própria, principalmente ao olharmos suas representações e como estas se configuram, entendendo seus agentes e processos. Fica em evidência como esse caminho ainda está sendo trilhado, como cada vez mais barreiras geográficas, literárias e linguísticas estão sendo transpassadas, no que diz respeito à América Latina, onde nós estamos.

Referências

AGUIAR, F.; VASCONCELOS, S. G. T. (Org.). Ángel Rama: Literatura e Cultura na América Latina. São Paulo: Edusp, 2001.

ANDRADE, O. Manifesto da poesia pau-brasil. Porto Alegre: UFRGS, 2007. Disponível em: https://www.ufrgs.br/cdrom/oandrade/oandrade.pdf. Acesso em: 17 fev. 2021.

ARAVECCHIA-BOTAS, N. A. O pensamento decolonial — caminhos para o ensino de arquitetura na América Latina. América. Revista da pós-graduação da Escola da Cidade, São Paulo, p. 76-81, dez. 2018. Disponível em: http://ojs.escoladacidade.org/index.php/america/article/view/48/39. Acesso em: 03 mai. 2021.

ARELLANO, A. América Latina, historiografía y arquitectura. In: ARELLANO, A. Trienal de Investigación FAU 2011. Facultad de Arquitectura y Urbanismo de la Universidad Central de Venezuela, Caracas, jun. 2011. Disponível em: https://www.fau.ucv.ve/trienal2011/cd/documentos/hp/HP-2.pdf. Acesso em: 03 mai. 2021

BANDEIRA, M. Crônicas da província do Brasil. 2. ed. São Paulo: Cosac Naify, 2006.

BALLESTRIN, L. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, Brasília, n. 11, p. 86-117, maio-ago. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-33522013000200004&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 03 maio 2021

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1 Grupo de intelectuais comprometidos com a afirmação das tradições autênticas do país, frente à “ameaça” do imigrante. Neste meio despontaram nomes como Ricardo Rojas, Leopoldo Lugones e Manuel Gálvez (NÉIA, 2018).

2 Optou-se, neste trabalho, por priorizar os artigos de jornais, isto é, as crônicas. Ainda que se reconheça o papel fundamental das revistas, elas abririam outro leque de reflexões, por isso não foram aprofundadas, mas citadas para ilustrar o intercâmbio entre as ideias e os intelectuais de vanguarda na América Latina.

3 Para citar algumas, tivemos, no Brasil, as revistas Klaxon, Festa, Antropofagia e Estética; Martín Fierro, Proa e Sur, na Argentina; Amauta, de Mariátegui, e a Labor, no Peru; La Pluma no Uruguai, Repertório Americano, na Costa Rica, e Contemporáneos, no México. É importante salientar a pluralidade de conteúdo e ideias dessas revistas, além das cidades em que foram publicadas.

4 Crônicas da Província do Brasil foi publicado em 1937 como uma homenagem da Editora Civilização Brasileira ao aniversário de 50 anos de Manuel Bandeira. O livro é uma coletânea de 47 crônicas escritas por Bandeira entre 1927 e 1936, para jornais e revistas que circularam nas cidades de Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte.

5 O livro Crônicas da Província do Brasil foi dedicado a Rodrigo Melo Franco de Andrade

6 A crônica, publicada pela primeira vez em 1929, em O Jornal, do Rio de Janeiro, é o primeiro texto de Crônicas da Província do Brasil.

Avant-garde in Latin America: Manuel Bandeira in the universal localism

Brenda Leite

Brenda Regina Braz Leite has a bachelor's degree and a license in History and is a Master's student in the area of Fundamentals of Architecture and Urbanism. She is currently a researcher at the Culture, Architecture, and City in Latin America (CACAL) group, developing the research project "The representations of a modern provincial: urbanization and memory of the city in the chronicles of Manuel Bandeira (1927-1937)" in the Postgraduate Program in Architecture and Urbanism at the Faculty of Architecture and Urbanism at the University of São Paulo, Brazil. breleite53@gmail.com http://lattes.cnpq.br/4397127154457595


How to quote this text: Leite, B. R. B., 2021. Avant-garde in Latin America: Manuel Bandeira in the universal localism. Translated from Portuguese by Fernanda Ranieri Silva. V!RUS, 22, July. [online] Available at: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus22/?sec=4&item=6&lang=en>. [Accessed: 07 October 2024].

ARTICLE SUBMITTED ON MARCH, 7, 2021


Abstract

Aiming to reflect on the avant-garde movements from a continental perspective, this paper analyzes the specificities of the Modern Movement in Latin America from a local and universal perspective (Candido, 2006), which is a differentiation factor in terms of European modernism. With the Latin American continent as a subject, but concentrating on a specific Brazilian author, we will analyze this process based on the Brazilian writer Manuel Bandeira’s chronicles. They were written along with the 1920s and 1930s and selected for the book Crônicas da Província do Brasil [Chronicles of the Province of Brazil, our translation], from 1937. We will articulate the chronicles with the author’s path and some modern movements, both in Brazil and on the continent. Bandeira’s texts are a powerful source of analysis and understanding of universal Latin American localism. They allow us to understand aspects of this movement, which was not specific to Brazil but spread throughout Latin America, and how it could reflect in our language, architecture, cities, and culture. Such reflections highlight how this path is still being taken, how geographic, literature, and language barriers are being overcome in Latin America.

Keywords: Latin America, Modernism, Manuel Bandeira, Traditions, Avant-garde



1 Modernism: avant-garde movements

This leads us toward another kind of account as to why Modernism is our art; it is the one art that responds to the scenario of our chaos. (Bradbury, McFarlane, 1986)

In Europe, between 1890-1930, modernism was established as an avant-garde movement, expressing the 20th century, society, and modern consciousness (Bradbury; McFarlane, 1986). As an art that represented a new society, modernism proposed a break, the independence from previous aesthetic proposals. Requiring new environments, modern art attacked the old conventions, opposing existing aesthetic assumptions, while exalting the new ones (Bradbury; McFarlane, 1986). Cities like Paris, Berlin, Vienna, Prague, London, and Moscow were described as “the cities of modernism” (Bradbury, 1986), as cultural capitals that attracted intellectuals and writers from different parts of the world, by creating an urban atmosphere of cultural and intellectual exchange.

In its plurality, modernism became an international trend with a cosmopolitan and urban character, an art of cities. The artist had to be in the city to be modern. Soon, the city turned into an object of interest, a character, a metaphor in the modern writer’s texts, such as Baudelaire, Dickens, and Dostoyevsky. Living in a metropolitan environment was essential to be modern, to express and write as a modern (Bradbury, 1986). By leading the working towards the new, launching themselves ahead, these avant-garde movements intended a critical art, free of conditioning, stimulating the experimental exercise of language and the updating of thought, breaking with all prior tradition (Belluzzo, 1990). Including all the factors, the renewal brought by modernism was not only aesthetic, but especially cultural, going beyond art and materializing new forms of language and expression in the various fields of culture – literature, painting, sculpture, music, theater, architecture, and cities.

2Latin American Avant-garde

As an international movement, modernism expanded to different countries and continents, including Latin America between the 1920s and 1930s, where it found different meanings. The rupture with the past and history was necessary for modernity to establish itself as global discourse and hegemonic practice in the literary and cultural sphere (Sarlo, 1990). However, in contact with the European avant-garde, the Latin American intellectuals realized how this radical break with the past, promoted by artistic and cultural expressions modernization, would only make sense in countries with a strong national tradition (Fonseca, 1997). Countries of recent formation, such as Latin Americans, when joining the new, would be mischaracterizing the particularities of their own artistic production, losing both national character and universal value (Fonseca, 1997).

Moving in the opposite direction of the rupture with traditions and internationalism, the task of these avant-gardes was to build a tradition and national identity: to produce national modernity — in association with the State — and this concerns their sense of new, of avant-garde (Gorelik, 2005). Latin American avant-garde tried to align themselves with the Europeans, inserting themselves in this modern international circuit without, however, renouncing their own: “our deficiencies, supposed or real, are reinterpreted as superiorities” (Candido, 2006, p. 126, free translation). The modern movement was based on the affirmation of the local and the cosmopolitan as strands of the same process, a dialectic between them, inspired by the European example (Candido, 2006).

This vision of universal localism, defended by Candido, was incorporated into the perspective of the Uruguayan critic and writer Ángel Rama. By seeking greater cultural integration between Latin American countries, Rama realized this common and dialectical rhythm between the process of modernization and recovery of the traditional, the primitive, and the regional in Latin American cultural production in the 1920s. This tension between modern and tradition would be overtaken through the transculturation process (Aguiar; Vasconcelos, 2001), a cultural transformation through the contact between different cultures. Seeking to build an identity, these intellectuals looked to the past and chose elements in it that constituted a certain national tradition that made sense within a modern international framework. This identity was a project and not a return to the past (Martins, 2010). They sought to make known a Latin America produced by Latin Americans themselves and no longer based on European representations, produced by Europeans, in which their points of view and culture prevailed (Schwartz, 2008).

There were two fields where this movement was stronger: literature and architecture. Regarding the construction of a national language, literature played a crucial role in this project. In Brazil, but also in Argentina, Peru, Mexico, Cuba, for example, the renovation of existing languages was sought. There was the necessity to value the spoken language in opposition to the distance that separated it from academic writing: “The way we speak. The way we are” (Andrade, 2007, free translation). Modernism proposed a confrontation between the traditional and mechanized academic aesthetic, of conventional ideas and hardened forms of expression.

The abandonment of regular poetic forms, for example, changed not only the formal elements of the poems but also their plot and characters. The conservative and conventional social order was occupied by everyday life and by the popular. With this, what was devalued by the predominance of European cultures, such as the black, the primitive, the folklore, the popular, comes to assert us culturally, accentuating a nationalist sphere with particularities and specificities (Candido, 2006). This moment can be read as a hinge movement (Manrique, 1974), where art looked, at the same time, outward — Europe — and inward — themselves. It was necessary to look at its own reality, to define oneself in front of the other.

In this context, it is not possible to leave out the indigenous movements, which occurred with more intensity where the indigenous population was still very numerous, such as Mexico, Bolivia, and Peru. This movement sought to integrate the indigenous populations into these countries’ plans for nationhood, that is, they could no longer be excluded from the culture, economy, and society, they must take their place as subjects of history. Faced with the inequality and oppression of the indigenous peoples in Peru, names like Mariátegui — one of the main intellectuals of the Peruvian avant-garde — participated in this awakening to the oppressive reality of these peoples and their role in history and national culture. The indigenous became material for artistic and cultural production. The avant-garde muralist art in Mexico can also be read in this key. The indigenous became a character in these representations that portrayed the Mexican people and history, dialoguing with the new State project of post-revolution Mexico. Art, when presented in public spaces, also became public, incorporating characters once excluded from national history and culture.

Nationalism, a look at its own reality, was on the agenda of the various celebrations of the centennial of the independence of Latin American countries that took place in the first decades of the 20th century. With truly diverse independence processes and differences from Brazil, the independence of Hispanic American countries was celebrated amidst nationalist and critical actions that sought to rethink the nation. In Argentina, such commemorations (1910), took place among discussions around the issue of nationality, due to the thousands of immigrants who arrived in the country at the end of the 19th century. Concerned with the affirmations of national values and its traditions, the “Generation of the Centennial”1, with the State, promoted, due to these celebrations, projects of patriotic education and affirmation of nationality, identity, and the “authentic” Argentine tradition (Néia, 2018).

In the 1920s, there was a series of artistic movements impelled by this environment: Mexico (Manifiesto del Sindicato de Artistas Revolucionários, 1922), Brazil (Semana de Arte Moderna, 1922), Argentina (Movimiento martinfierrista, 1924), Chile (Montparnasse group, from Santiago, 1928), and Cuba (movement headed by Victor Manuel, 1924). The question of identity, national roots, rethinking culture and society by themselves and others, was already on the agenda of these countries, being discussed by the intellectuals who composed the avant-garde movements in the 1920s on the continent. Besides the Brazilian avant-garde in which Manuel Bandeira, Oswald de Andrade, and Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, among others, took part, we had César Vallejo and José Carlos Mariátegui in Peru, Leopoldo Marechal and Jorge Luis Borges in Argentina, Vicente Huidobro in Chile, Diogo Rivera and José Orozco in Mexican muralism (Schwartz, 2008). These are some examples among an extensive group. These Latin American intellectuals and artists united the "new" intellectual awakened by modernism with the construction of national history and the search for their national identities. Nationalism and cosmopolitanism went together (Schwartz, 2008).

More than an aesthetic movement, modernism was consolidated as a cultural movement, a movement of ideas. When speaking about the movement in Brazil, Candido (2006) highlighted how modern literature brought the best expressions of Brazilian thought of the time, playing a powerful role in its social expression. From this comes its character as a cultural movement. Through its new interpretative and expressive resources, literature cooperated with other sectors of intellectual life. The avant-garde magazines illustrate well this avant-garde in movement2. Through them, cultural proposals were perceived more clearly, ideas were propagated, and boundaries were overcome (Marques, 2013). In the magazines, the authors were more radical, audacious, and combative in literary and critical experimentation. Even published in few copies, these magazines had a considerable impact on cultural transformations, mainly because they were read by an influential elite in political and cultural decisions of the period (Schwartz, 2008)3.

Years earlier, in a letter to Mário de Andrade, in May 1928, Bandeira wrote:

I got Alberto Ramos’ book and your articles about Argentinian literature. I know almost nothing about it. […] Girondo seems very superior to me, despite the sportive taste for metaphors that frame me so much. […] The one I have read nothing and need to read is Borges. Once Ronal told me he was the strongest there. […] (Moraes, 2000, p. 389, our translation).

From such complete and deep works from the 1940s and 1950s on Hispanic American literature, and the little knowledge about them in the late 1920s, it is possible to see how the author approached other Latin American writers in the following years, and how the modern movement, and the exchanges between avant-garde intellectuals it provides, may have contributed to this process.

The renewal of the means of artistic expression and the rupture with traditional language — aesthetic project —, awakened the country’s conscience, the desire for a national artistic expression — ideological project — going beyond literature and assigning a social function to art (Lafetá, 2000). The 1920s marked a certain “awakening to modernity” in Latin American countries while opening their eyes to their own social reality, which intensified in 1930, with the contribution of the State (Martins, 2010). In the same sense as literature, modern architecture in Latin America also turned to the past, to the interior of these countries, claiming the popular and the traditional of the provinces as a form of modern production, expressing a national aesthetic (Gorelik, 2005).

Modernists and the state were united in this project of building traditional and national culture. The vanguards, as intellectuals, legitimized the voice of the movement, and the state legitimized a history (Ballestrin, 2013). Looking at their own cultural heritage led these artists to explore the interior of the countries to discover them, at a time when affirming Latin American identity was no longer contradictory to modernity. The art produced here was no longer synonymous with backwardness when compared to that of European metropolises (Aravecchia, 2018). The very expression "Latin America" stopped referring to the European tradition and started to mean an entire cultural identity, a territory, its own tradition. This concern with national identity was fundamental to define modern architecture in the continent (Arellano, 2011), which erupted in the 1930s as one of the fields of action of the avant-garde, linked to the State:

It is simple historical evidence that, since the thirties, in the Latin American countries where some of the main expressions of architectural modernism emerged — Mexico and Brazil, especially, but in its own way also Argentina — a good part of the most important works were sponsored, financed, or directly undertaken by the State. (Gorelik, 2005, p. 26, our translation).

In terms of modernization of cities, under the sign of oil and the highway, the Argentine state in the 1930s led a modernization process that represented it, expanding the country's road infrastructure. With a strong symbolic character, the state placed itself not only against but more modern than the British-owned railway system that existed in the country, attributing enormous nationalist sense to the project (Gorelik, 2005). Analyzing the Buenos Aires of this period, Beatriz Sarlo (1990) observed how city and modernity were presupposed, the urban fabric was the scenario of changes, displaying ostentatious, brutalities, and contradictions of this modernization process.

In Mexico, after the Mexican Revolution in 1910, groups of radical intellectuals declared themselves on a mission to build a new country. Their nationalism aimed to enhance Mexican culture in the reconstruction of modern society through state action. Modernist architects such as José Villagrán García, Juan O'Gorman, and Juan Legarreta, designed popular housing, schools, and hospitals that represented this post-revolutionary state (Gorelik, 2005). There was, thus, an ideal of a city that represented national identity. This ideal was not only in the modern architecture, — as the examples of Argentina and Mexico — but also in the architecture that legitimized it as a continuation: the colonial architecture. In Brazil, the colonial, especially the baroque, was chosen as our traditional architecture. The local and the universal were not restricted to literature but were also incorporated into the architecture.

What this article intends to do is to think this specificity of the Latin American avant-garde between the local and the universal, based on a particular author: Manuel Bandeira, and his chronicles selected for the book Crônicas da Província do Brasil4 [Chronicles of the Province of Brazil (our translation)], 1937. Bandeira writes chronicles that move between these two fields of action of the Latin American avant-gards: language and literature; architecture and the city. This allows us to understand aspects of this movement that is not specific to Brazil, which spread throughout Latin America, establishing a dialogue between the author's book, the modern movement, and the discourses and actions of the State in this project of building a national tradition. Produced in this environment, Bandeira's chronicles present us with the aspirations and transformations of the modern movement in Brazilian culture and cities, the ways of understanding and interpreting Brazil from the everyday life scale, from the chronicler who lives in the cities. At the same time, as an intellectual committed to modernism, he dialogues with the intentions of the movement and the State in the construction of this national tradition. Moving between these dimensions, Bandeira's texts became a powerful source for analysis and understanding of this universal Latin American localism and how it transpired in our language, architecture, and cities, in our culture.

3 Tradition and modernity: national and universal

Regarding architecture, Lucio Costa was the main Brazilian architect who represented this movement that elected tradition as the base of the creation of modern culture (Wisnik, 2007). The growth of the interest for the “Brazilian things” was not only an aesthetic project but also a project of a nation. This brought a new correlation between intellectuals, society, and the State (Candido, 1984). The creation of SPHAN (National Historical and Artistic Heritage Service) in 1937, by the MES (Ministry of Education and Health), which was commanded by Gustavo Capanema, can be analyzed by looking at the association of Estate and the modern objectives. The draft of the organ’s creation was written by Mario de Andrade and modified by Rodrigo Melo Franco de Andrade — the first SPHAN director —, all intellectuals inside the modern movement. The MES’s headquarters, located in Rio de Janeiro, was designed by architects such as Affonso Eduardo Reidy and Oscar Niemeyer, who were led by Lucio Costa. The Ministry’s building had panels painted by Candido Portinari, one of the main artists of modern painting. It became a mark of Brazilian modern architecture, a symbol of a modern State toward progress.

This movement shows how the state made the decision to elect modern architecture as the national architecture, at the same time, that modernity has not broken with tradition instead was its continuation. As the Director of SPHAN’s Heritage and Studies Division, Lucio Costa, with a modern architect’s vision, actively contributed to the election of colonial popular architecture as our national heritage, in opposition to erudite, connecting modern and popular tradition (Wisnik, 2007). Manuel Bandeira, a close friend of Mário de Andrade and Rodrigo Melo Franco de Andrade5, was a member of the Advisory Council of SPHAN. Bandeira wrote the chronicle A Moderna Arquitetura Brasileira [The Modern Brazilian Architecture, our translation] for the Pernambuco's newspaper A Província, in 1930. The chronicle was reproduced in the book Crônicas da Província do Brasil, 1937, with the title Arquitetura Brasileira [Brazilian Architecture, our translation]. In this chronicle, the author defended modern architecture as the one which symbolized Brazilian tradition, in opposition to neocolonial architecture, seen by the author as a copy of the past:

It is necessary to repeat to these people Lucio Costa’s words, one of the few new architects who feel the architectural past of our land: our architecture is robust, strong, massive; our architecture has calm, tranquil lines; everything in it is stable, severe, simple — nothing pedantic. It is to this character of austere and robust simplicity that those who intend to resume the thread of Brazilian tradition in architecture should aim. (Bandeira, 2006, our translation)

The change of the title from A Moderna Arquitetura Brasileira to Arquitetura Brasileira may symbolize an affirmation of modern architecture as the true national architecture, years before SPHAN was created. The state’s actions after 1937 in SPHAN were the result of a process that was conceived and matured by modern intellectuals; it was theory materializing in practices in the city.

In the chronicle, De Vila Rica de Albuquerque à Ouro Preto dos estudantes6 [From Vila Rica of Albuquerque to the Ouro Preto of the students, our translation], Bandeira (2006, free translation) wrote: "For us, Brazilians, what has the power to move us are those heavy townhouses, those baroque frontages, where something that is ours has begun to take hold.” This chronicle was written after Bandeira's trip to Ouro Preto. In it, what stands out are the references to the architecture of Minas Gerais’s city still preserved: "Ouro Preto is the city that has not changed, and in this lies its charm." (Bandeira, 2006, our translation). The baroque architecture defended as "our thing", creates a link of national identity between present and past. It was the materialization of our past, of our history. It is this landscape, unknown by many, that the avant-garde intellectuals elected as the true historical Brazilian architecture, the one that would be internationally known as ours.

What Bandeira wrote in 1930, was propagated by Lucio Costa, by the MES, and by the organs that emerged from it, such as SPHAN, years later. Moved by the aesthetic transformations of the avant-garde, which encouraged us to look at our past and build our tradition, these intellectuals prepared what would be their field of action and from the State as well in the following decade. The creation of the heritage protection organ is seen as a state strategy for nation-building through the invention of national heritage, the materialization of history through SPHAN (Chuva, 2017). Thus, the city and modernity as assumptions, not only meant the literal construction of the new but also of the traditional, of the national heritage, which was still newness inserted in the city.

After being in Salvador, Bandeira wrote in the chronicle Bahia, published in April of 1927, in O Jornal, from Rio de Janeiro:

I have never seen a city so characteristically Brazilian as "good land". Good land! That's right. We barely set foot in the lower town and already feel so at home as if that was the great dining room of Brazil, the intimate family retreat of an old manor house with heavy and noble jacaranda trees. There we feel more Brazilian. I confess that stronger than ever, those deep racial roots that fasten us to the extinct past, to the most remote present, trembled. Roots in-depth and surface. (Bandeira, 2006, our translation)

For Bandeira, Salvador was an example of a Brazilian city, which sheltered our roots and tradition, a feeling aroused by the urban environment. The author talks about "roots in-depth and surface", these deeper roots take us to history, something longstanding, which comes from a time that is not the present; while the surface roots take us to the city, to the urban environment, to what is in the landscape, in the city's everyday life, and that also belongs to tradition. During his stay in the city, Bandeira sent a letter to Mário de Andrade talking about the trip:

Mario, I am in love with Bahia! It is a stupendous land: THE BRAZILIAN CITY. Hundreds and hundreds of beautiful townhouses made of 4 floors and terraces. If I could, I would take one for me and one for you. Houses with strong and sober manor lines, with doors of carved and emblazoned stone, hardwood doors with cushions [...]. (Moraes, 2000, our translation)

It is evident that what makes Bandeira see Salvador as "the Brazilian city" are the physical and architectural aspects of the city. The “old houses" of Bahia are made of colonial architecture, like those from Ouro Preto. The identity of being Brazilian was associated with a specific architecture and specific city form. Bandeira completed:

Pelourinho’s square is the urban view that a Brazilian can show a French without getting any ache from the perspective of the Champs Elysees or the Opera Avenue. What beautiful old houses! (Moraes, 2000, p. 332, our translation)

What was ours — our national history and roots — was not inferior to what existed in Europe. At the same time, in that the colonial was taken as our architecture, it was placed next to what existed in Europe with the same value, and no longer as inferior. Brazil now had a historical national architecture and a modern architecture that continued it.

Bandeira also sent a postcard from Salvador with the image of the Plano Inclinado Gonçalves Dias (Inclined Plan Gonçalves Dias, our translation) to Mário de Andrade with the following: "It is not a modernist painting, it is the old Bahia so close to us" (Moraes, 2000, p. 333, our translation). The phrase reveals the "old city" as an expression of the new, the modern. The traditional and the modern, the local and the universal, came together in this discourse that expressed Bandeira's thought at that moment, beyond the aspirations of the modernist project. What the modern pictured was this traditional Brazil, of old houses, colonial past, which came to be observed and appropriated as our own. The modern was legitimized by tradition, which attributed to it a historical charge, building a deep national identity. The new was supported by the old, the modern had in its base the tradition, and the city was where the avant-gardes and the State produced their national modernities (Gorelik, 2005).

Ouro Preto, the center of Salvador, and other churches and spaces discussed in Bandeira's chronicles were protected years later as Brazilian’s national heritage by SPHAN. In his chronicles, Bandeira legitimized — even before the legal protection, and ten years before the foundation of SPHAN — the attribution of historical and national value to these buildings by intellectuals involved with the modern avant-garde in the country. It was in Rio de Janeiro, Minas, Bahia, Pernambuco that most of the protections were made in SPHAN's first year, prioritizing colonial and religious buildings. The national heritage was represented through the colonial period, consecrating this period as the founder of the nationality. Our heritage had a shape constructed by the State and the modern intellectuals behind this project (Chuva, 2017):

The State assigned itself the role of memory agent of the nation, holder of the tutelage of the national historic and artistic heritage — and also as a part of history. It was under this view that the choice of the goods to be preserved took place, to which a whole series of meanings were attributed in an effort to select what should not be forgotten, what, for the consolidation of the nation, should remain in the memory, materializing in the protected goods. It was about ending choices of a past that represented the entire nation. (Chuva, 2017, p. 176, our translation)

The city was not a reflection of this process of building nationality and modernity, but an agent (GORELIK, 2005). Architecture became a key in governmental projects, representing modernity and national tradition that legitimized it. Our modernity required a national tradition — not a break with it — to be universal.

4 Final considerations

Latin American modernism was plural. The search for tradition, the movement between the local and the universal, the national and the international, built the specificity of the modern movement in the continent. Dialoguing with the aesthetic transformations of the European avant-gardes, we looked at our own reality and tried to understand ourselves, to define ourselves according to what was particular to us, and to export this traditional national production, consolidating it as international and modern. Through the analysis of some of Manuel Bandeira's chronicles and his own trajectory in the modern movement, in dialogue with the continent, it was possible to see how this effort to build national roots and insert Latin America into the universal cultural circuit, was part of the imaginary and ideas of modern intellectuals and was later associated with the State's project of nation.

It was a moment of construction: of languages, national histories, histories of colonialities, of cities and architectural styles, and exchanges between the continent itself. All these questions still confront us today, stimulating us to better understand the cities, the society, and our Latin American culture, especially when we look at its representations and how they are configured, understanding its agents and processes. It is evident how this path is still being followed, how barriers of geography, literature, and language are being crossed when regarding Latin America, where we are.

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1 A group of intellectuals committed to affirming the authentic traditions of the country, in the face of the immigrant "threat”. In this milieu emerged names like Ricardo Rojas, Leopoldo Lugones and Manuel Gálvez (Néia, 2008).

2 In this paper, we have chosen to prioritize newspaper articles, that is, the chronicles. Although the fundamental role of magazines is acknowledged, they would open another range of reflections, which is why they were not deeply studied, but rather cited to illustrate the exchange between avant-garde ideas and intellectuals in Latin America.

3 To name a few, we had in Brazil the magazines Klaxon, Festa, Antropofagia, and Estética; Martín Fierro, Proa, and Sur in Argentina; Amauta by Mariátegui, and Labor in Peru; La Pluma in Uruguay, Repertório Americano in Costa Rica, and Contemporáneos in Mexico. It is important to note the plurality of content and ideas of these magazines, as well as the cities in which they were published.

4 Crônicas da Província do Brasil, was published in 1937 as a tribute by Editora Civilização Brasileira to Manuel Bandeira’s 50th birthday. The book is a collection of 47 chronicles written by Bandeira between 1927 and 1936, for newspapers and magazines that circulated in the cities of Recife, Rio de Janeiro, São Paulo and Belo Horizonte.

5 Crônicas da província do Brasil was dedicated to Rodrigo Melo Franco de Andrade.

6 The chronicle, published for the first time in 1929, in O Jornal, from Rio de Janeiro, is the first text of the Crônicas da Província do Brasil