As polifonias que tecem a cidade

Jean-Paul Thibaud, Luciana Santos Roça

Jean-Paul Thibaud é sociólogo, Doutor em Urbanismo e Planejamento, diretor do Centre National de la Recherche Scientifique - CNRS, pesquisador do Cresson, da Unité Mixte de Recherche Ambiances Architectures Urbanités - UMR AAU, fundador da Réseau International Ambiances. Pesquisa ambiência, percepção cotidiana no meio urbano, aspectos sensórios das cidades e som.

Luciana Santos Roça é bacharel em Audiovisual, Mestre em Arquitetura e Urbanismo. Pesquisadora do Nomads.usp. Estuda intervenções sonoras em espaços públicos, procurando integrar os campos disciplinares de Estudos de Som e de Arquitetura.


Como citar esse texto: THIBAUD, J.-P.; ROÇA, L. S. As polifonias que tecem a cidade. Traduzido do inglês por Luciana Santos Roça. V!RUS, São Carlos, n. 14, 2017. Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus14/?sec=2&item=1&lang=pt>. Acesso em: 27 Abr. 2024.



Além dos diversos assuntos trazidos por essa 14a. edição da Revista V!RUS, as cidades também formam um tecido invisível. Esse tecido é o espaço sonoro que reflete culturas e modos de vida e, da mesma forma, nós e nossa sociedade como um todo o produz.

Nós tivemos grande prazer de conversar com Jean-Paul Thibaud, sociólogo e urbanista. Jean-Paul Thibaud fundou a Rede Internacional de Ambiances. Em sua pesquisa, ele desenvolve a ideia de ambiance em um contexto multidisciplinar, e ele é pesquisador no CRESSON, Centre de Recherche sur l’Espace Sonore et l’environnement urbain (Centro de Pesquisa de Espaço Sonoro e Ambiente Urbano) e professor da ENSAG, Ecole Nationale Superiéure D’Architecture de Grenoble, na França. O Cresson é marcado por sua pluralidade e diversidade e pesquisas, também conhecido por seus procedimentos metodológicos inovadores.

Quantas experiências formam a cidade? Há vozes, fontes sonoras, objetos dinâmicos e em movimento que tecem a cidade, fazem parte dela e determinam seu conteúdo. Mas como apreender esse tecido em atividades de pesquisa?

Poeticamente, podemos dizer que o espaço sonoro é tecido por vozes múltiplas. Essas vozes não dizem respeito somente à fala, apesar da linguagem revelar uma diversidade de culturas, elas também são vindas das nossas atividades diárias, vêm da música, tráfego, dos aparelhos sonoros. Assim como Thibaud (2017, p.226, tradução nossa) já disse, “nós estamos imersos em um mundo de som no qual nós temos parte e no qual todos contribuem em sua produção através de suas ações e atividades cotidianas”. O som também tem um grande papel sobre como agimos sobre as cidades e como nós a percebemos.

O próprio som, ao mesmo tempo, encobre e revela as experiências cotidianas. O espaço sonoro produz uma polifonia na qual pode ou não ser encoberta, pode ou não ser notada. Ele encobre várias relações quando escutar torna-se um ato habitual. Quando estamos imersos nele, é difícil revelar o que é mais profundo. Desfamiliarizar pode ser uma resposta para isso: através do estranhamento podemos nos perguntar o que está por baixo dos sons cotidianos que nos cercam.

Esses são alguns assuntos discutidos nesta entrevista. O olhar atento do pesquisador Jean-Paul Thibaud nos auxilia e nos guia em meio a essas vozes, mas não deixa de ter um olhar crítico sobre a privatização do espaço sonoro e da utilização do som como uma mercadoria.

Luciana Roça: Você observa quais contribuições que o som pode realizar em tecer pluralidade nas cidades?

Jean-Paul Thibaud: O som é interessante devido à possibilidade de demonstrar várias vozes juntas, como em uma experiência polifônica. Quando você ouve um espaço específico, você ouve diferentes fontes sonoras, diversas vozes vindas de pessoas diferentes, e esse espaço público é realmente composto por uma diversidade de atividades. Seria, ao mesmo tempo, uma tonalidade de uma toda situação, mas essa tonalidade afetiva seria composta de várias vozes diferentes que parecem unidas. Essa escuta polifônica traria o que é interessante no som.

Agora vamos pensar no inverso, pegando o exemplo de um shopping: você ouviria basicamente o mesmo tipo de som, contínuo como uma voz sozinha, a voz da música difusa em diferentes fontes. Essa paisagem sonora pode neutralizar, pois o fundo musical mascara as vozes das pessoas.

Em um espaço público vivo seria o oposto disso. Por exemplo, na França, nós temos os mercados locais de rua. Nesses mercados, você ouve vários sons diferentes de todos os lugares, sem ser contínuo, várias vozes uma atrás da outra. Tudo isso vai compor a paisagem sonora. Assim, nessa situação, você ouve uma composição de sons única. Não algo que é constantemente uma voz, mas uma pluralidade de vozes que são muito dinâmicas, conjuntas, que se misturam e compõem uma paisagem sonora viva.

Luciana Roça: O som é um elemento importante na experiência das cidades. Esse assunto parece estar sendo mais atendido em pesquisa do que antes, contudo, temos ainda muitos problemas metodológicos nessa área. Quais potenciais e obstáculos metodológicos você considera importantes?

Jean-Paul Thibaud: Um dos maiores problemas é que temos muitos estereótipos quando falamos de sons. Se usarmos metodologias clássicas de Ciências Sociais, logo no início nos confrontamos com várias pessoas basicamente falando de ruído, perturbação ou sobre paisagens sonoras que são boas e cheias de música. Então temos essas grandes categorias compactas que evitam que nos aprofundemos na experiência real das pessoas em relação ao som.

Então um dos problemas seria: como é possível encontrar diferentes formas, metodologias e protocolos para evitar chegar nesse grande estereótipo e nos aprofundarmos?

No CRESSON nós desenvolvemos diferentes metodologias. Uma delas, para citar um exemplo, é chamada de “Gravação da escuta”, que é basicamente uma forma de usar o som como um modo indireto para pedir às pessoas que falem de sua experiência. Então, nessa metodologia, nós vamos a campo, para um espaço público que estamos estudando, ouvimos o espaço, faz várias gravações em diferentes horários do dia ou dias da semana, fazemos observações e tomamos notas. Com esses materiais, nós vamos para o centro de pesquisa e trabalhamos nas trilhas específicas feitas com as gravações apropriadas. Então nós tocamos essas trilhas para outros habitantes, pessoas que vivem ali, pedindo comentários enquanto escutam essa trilha que fizemos. Portanto não fazemos perguntas diretas como “o que você ouve?” ou esse tipo de perguntas que fazemos quando entrevistamos as pessoas, mas o próprio som é uma forma de pedir às pessoas para que falem de suas experiências.

Outra metodologia seria caminhar como uma aproximação à experiência. Novamente, a ideia não é fazer perguntas diretas, e sim o ato de caminhar nas ruas. Nós vamos de um lugar ao outro, com diferentes paisagens sonoras e diferentes qualidades sonoras. Essa situação, esse contexto de caminhar em um contexto dinâmico ajudaria as pessoas a dizerem sobre sua própria experiência enquanto caminham. Então o som e o espaço, eles próprios, são os maiores ativadores das falas das pessoas.

Também utilizamos a própria gravação de áudio como um conjunto de dados. Há um tempo atrás, trabalhamos numa construção, estudando seus sons e a forma com que os trabalhadores usam o som para trabalhar junto. Resumidamente, fomos ao local, gravamos e as próprias gravações eram os dados. Ouvimos várias vezes e daí evoluímos para entender como o som era usado para os trabalhadores se comunicarem, para trabalharem juntos tinham que ter o mesmo tipo de ritmo, temporalidade ou manter o contato entre si, pois eles não se vêem. Então, basicamente, utilizamos o som como uma forma de documentar seu trabalho.

A literatura pode ser muito, muito útil. Na literatura, na maioria das vezes, há um certo modo de descrever experiências. Portanto, isso nos auxilia a descobrir uma forma sutil de experimentar o som. No CRESSON, conduzimos uma pesquisa sobre silêncio na cidade. Um dos conjuntos de dados era a literatura contemporânea do século 20. Tínhamos 20 ou 30 livros, romances e trechos de livros. Era possível encontrar um parágrafo ou um trecho curto que descrevia uma experiência específica de som e silêncio. Então usamos esse material para analisar e entender melhor as diferentes situações e contextos.

Geralmente, pode-se encontrar muita descrição sobre o que as pessoas ouvem. A ideia é que é possível encontrar modos indiretos para fazer as pessoas falarem de suas experiências ao invés do questionamento direto que conduz o que as pessoas supostamente deveriam falar.

Então eu diria que um dos maiores problemas é quando fazemos perguntas às pessoas muito diretamente. Nesse caso, elas simplesmente repetiriam a representação comum que temos sobre a paisagem sonora, como som ou música agradável, elas não iriam muito longe, muito profundamente depois disso. Então há uma necessidade real em inovar em termos de métodos.

Luciana Roça: Haveria algum modo de utilizar esses estereótipos contra eles próprios? Como uma resistência ou antítese?

Jean-Paul Thibaud: Como eu mencionei anteriormente, se realizar perguntas às pessoas de forma direta, elas têm a tendência de reproduzir um estereótipo. Uma forma de quebrar esse estereótipo é trabalhar no que chamamos de experimento de ruptura na Sociologia e na Etnometodologia. Isso vem de Garfinkel, um sociólogo americano. A ideia básica é desenvolver um tipo de protocolo que é o que acontece quando uma situação comum não acontece como se espera. Então o experimento rompe a lógica da situação comum ou o que acontece.

Uma vez estudei o uso de fones de ouvido em espaços públicos. Naquela época o uso do Walkman estava aumentando, nas décadas de 1980 e 1990. As pessoas não estavam acostumadas com essas práticas em espaços públicos. Como as pessoas reagem quando alguém não está ouvindo a mesma coisa, apesar delas estarem na mesma situação? Há um tipo de ruptura do cotidiano para entender melhor o que é subjacente de uma experiência comum que nós não percebemos porque estamos nela o tempo todo. Então este é outro tipo de metodologia na qual é possível projetar alguns protocolos que rompem com o comum para entender o que está por baixo.

De certo modo, isso pode ser observado nas artes também. Por exemplo, Viktor Chklovsky [1], um artista russo do início do século XX, que desenvolveu a ideia de estranhamento. A arte era uma forma de você se desfamiliarizar para entender a experiência mais aprofundadamente, ver o que nunca está à frente. Quando você se conscientiza, quando você provoca um estranhamento de sua experiência, isso pode lhe demostrar o que está na profundidade.

Luciana Roça: O som reflete ações e dinâmicas dos espaços urbanos e, consequentemente, modos de vida e culturas. Ambos, som e espaço, têm uma relação profunda que muitas vezes não é muito considerada na Arquitetura. Que limites você considera existentes na relação entre som e espaço na Arquitetura e Urbanismo?

Jean-Paul Thibaud: Novamente, o som é considerado na maioria das vezes para prevenir uma situação dramática, evitar a propagação de ruídos em aeroportos, estradas, etc.. Então é uma lógica preventiva ou para lidar com o som apenas depois. Depois da construção do projeto, percebe-se que alguns erros foram cometidos e os arquitetos têm que trabalhar com esses erros, para isolá-los.

Assim, eu diria, um dos maiores erros seria considerar impossível lidar com a questão sonora, da paisagem sonora, logo no início do planejamento, do projeto, e apenas trabalhar depois.

O segundo aspecto é que algumas ferramentas não são feitas para o som. Como maior parte dos arquitetos e urbanistas usam mapas, CAD, ferramentas muito visuais, também utilizadas por profissionais. Portanto nós temos que desenvolver algumas ferramentas mais sensíveis à temporalidade, ritmo, dinâmicas que não são incluídas em um mapa, por exemplo.

Essa é uma das dimensões do som. O som traz a dimensão temporal, mas realmente não temos algumas ferramentas muito operacionais que incluem ritmo, tempo, duração no projeto e no design. Então isso é também um desafio grande.

Tem tido alguns experimentos, algumas ideias para ir além com esses tipos de ferramenta. Você pode encontrar o Cartophonie no site do CRESSON. É uma ferramenta que reúne gravações de som, tentamos mostrar como espaço pode ser organizado, assim como o som de diferentes períodos e de diferentes temporalidades. É um tipo de mapa interativo, com diferentes níveis para lidar.

Essa poderia ser uma resposta. Uma segunda pode ser mais geral. No século XIX, ou mesmo no século XX, um dos maiores problemas eram a grande quantidade de ruído vindo da indústria, for exemplo. As indústrias são muito ruidosas. Então, um dos maiores problemas era reduzir o ruído e estar em um espaço, mais silencioso, mais quieto. Agora a questão é diferente.

A questão não é “temos muito ruído”, mas sim que “não temos muito silêncio”. As paisagens sonoras estão continuamente “ligadas”. Nós não temos a oportunidade verdadeira de ter determinados espaços silenciosos ou quietos. Sempre tem um som de fundo atrás da sua cabeça. Então a pergunta é como é possível construir alguns tipos de intervalos que, de certa forma, quebram esse ruído contínuo.

O antropólogo italiano Gillo Dorfles trouxe a ideia muito interessante chamada de o último dos intervalos. Ele argumenta que na nossa cultura estamos sempre na situação de ouvir sons, e é contínuo. E, claro, há o exemplo da música que está em todo lugar o tempo todo. Então nós precisamos de algumas pausas. É possível ter alguns sons discontnuos, que não sempre contínuos? Acho uma pergunta fascinante de ser levantada. Não em relação à intensidade, mas em termos de ritmo.

Luciana Roça: O som pode ser entendido como um dispositivo na partilha do sensível [2] no contexto das cidades?

Jean-Paul Thibaud: Sim, claro que é. Por exemplo, há muitos textos sobre a sociopolítica do som. Uma das maiores tendências, eu diria, é sobre os espaços públicos. Mais e mais os espaços públicos são privatizados, e são também privatizados através do som e pelo som.

Ao andar nas ruas escuta-se música ou diferentes propagandas e elas podem invadir outros lugares. Eu diria que isso é parte da partilha do sensível. É ainda possível ter um espaço sonoro público, comum? Ou o espaço sonoro foi completamente invadido por comerciais e commodities? Acho que o som pode ser estudado desse modo. Se eu for ao shopping, o que eu escuto? Claro que muitos estudos já foram feitos sobre o Muzak [3] e desse tipo de mecanismo, mas eu acredito que está ficando mais e mais sutil. Há muitas empresas trabalhando em entornos sonoros úteis para as pessoas ficarem mais tempo em locais de consumo, perder a noção de tempo e passar mais tempo nesses espaços de mercadorias. Então acho que há uma parte da partilha do sensível conduzida por empresas. Essa é uma ideia.

Outra ideia é a política do ruído nas cidades. Alguns sons podem ser feitos, outros não, alguns podem ser ouvidos, outros não deveriam ser ouvidos. Então há todo tipo de regulação sobre como o som público deveria ser ou não.

Um jovem pesquisador veio ao CRESSON e conduziu uma pesquisa sobre o som feito por pessoas em situação de rua. Ele percebeu que o som marca um território e também que o som deles é rejeitados pelos habitantes, não só porque eram sons específicos, mas porque eram sons vindos de sem-teto. De um modo, há outra lógica: o som em si não é o objeto de rejeição e conflito, mas porque é uma expressão da presença de pessoas indesejadas.

Em outra perspectiva, nossa cultura sonora é transformada pelas ferramentas que usamos. Vamos pegar o exemplo de equipamentos técnicos eletrônicos que usamos para ouvir música, como o mp3. O mp3 tem um espectro de frequência que é mais reduzido quando você compara com outros formatos. Então os hábitos de escuta estão ficam menos e menos sutis por nossa gama de percepção está menos e menos com nuances.

Também é parte de uma partilha do sensível no sentido de como nossas paisagens sonoras estão mais ricas ou mais pobres do que antes. E quem está no comando dessas paisagens sonoras cotidianas? E, eu diria, mais e mais empresas. Há uma economia da experiência. A experiência agora é uma mercadoria, capaz de fazer dinheiro, então dinheiro é feito da experiência. Nós fabricamos experiência, e som é parte dessa mercadoria.

Luciana Roça: Como podemos nos posicionar contra esse cenário de mercantilização do som?

Jean-Paul Thibaud: Romper o cotidiano é uma forma de entender melhor o que não escutamos ou vimos mais porque estamos imersos. Então arte pode ser um modo de parar um pouco o fluxo contínuo de som e da vida cotidiana, um modo de construir um mecanismo que vai englobar uma perspectiva diferente em relação ao som e em relação à paisagem sonora. E ao construir essas diferentes perspectivas nós seremos capazes de mostrar a paisagem sonora na ual estamos sempre imersos, estaremos atentos e teremos uma reflexão do que estamos sempre imersos. Então talvez a arte seja um dos maiores instrumentos, uma grande ferramenta para ter um entendimento crítico dessas questões.

Acho que esse é um grande trabalho para fazer uma resistência contra a mercantilização do som: romper com a experiência cotidiana para mostrar o que é mais profundo, para revelar algum modo de lidar com isso. Talvez seja por isso que falei sobre o Viktor Chklovsky antes. Penso que talvez é um dos primeiros artistas a trazer essa questão de desmontar o familiar para revelar o que está por trás.

Luciana Roça: Quais desafios você observa para esse campo interdisciplinar a respeito do som, sociologia e urbanismo?

Jean-Paul Thibaud: Para mim agora o desafio é intimamente relacionado com a resistência da arte. Seria: “Como é possível abordar o som e estudá-lo em seu nível mais mínimo, um tipo de nível molecular, infra nível de escuta?” Claro que parte da música do século XX se ocupou dessa questão. É possível ter um tipo de forma minimalista de escuta, compor e organizar som? Então eu acho que esse seria o maior desafio: é possível trabalhar com o infra sensível? Isso está na fronteira, no liimite do que é perceptível ou não, o que você pode ouvir ou não. Para mim, essa questão é muito importanto. É também importante porque pessoas que trabalham para companias trabalham com essa questão. Além disso, elas usam essa lógica para mercadorias, propaganda, etc, como uma economia da experiência. Elas trabalham nesse nível infra de percepção. Então acho que músicos e artistas têm o que nos ensinas para entendermos esse nível infra de percepção.

Outro desafio seria como lidar e organizar toda a diversidade de cultura sonora que temos no mundo, pois sempre estamos acostumados com sons do Ocidente, clássicos e padronizados, tanto que perdemos nossa habilidade para ouvir, escutar e apreciar todos os tipos diferentes de culturas sonoras. Então isso poderia ser também um outro desafio. Prestar atenção ao que as outras culturas têm para nos ensinar em termos de escuta. Perdemos nossa habilidade para realmente distinguir o nível experiencial. Isso é algo que devemos trabalhar.

[1] CHKLOVSKI, Viktor. A arte como processo. In: TODOROV, Tzvetan. Teoria da Literatura- I. Lisboa: Edições 70, 1999.

[2] “Denomino partilha do sensível o sistema de evidências sensíveis que revela, ao mesmo tempo, a existência de um comum e dos recortes que nele definem lugares e partes respectivas. Uma partilha do sensível fixa portanto, ao mesmo tempo, um comum partilhado e partes exclusivas. Essa repartição das partes e dos lugares se funda numa partilha de espaços, tempos e tipos de atividade que determina propriamente a maneira como um comum se presta à participação e como uns e outros tomam parte nessa partilha.” (RANCIÈRE, 2009, p.15)

RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível: estética e política. São Paulo: Editora 34, 2009.

[3] Muzak, originalmente, é uma empresa de “músicas de fundo” dos Estados Unidos, cujo auge foi durante as décadas de 1960 a 1980. Contudo, o nome da empresa é utilizado pelos Estudos do Som para designar músicas funcionais que agem sobre o controle e regulação de espaços públicos, locais de consumo e trabalho, principalmente.

THIBAUD, Jean-Paul. The Sonic Attunement of Social Life. GUILLEBAUD, Christine (Eds.). Toward an Anthropology of Ambient Sound. New York: Routledge, 2017.

The polyphonies which weave the city

Jean-Paul Thibaud, Luciana Santos Roça

Jean-Paul Thibaud is Sociologist, PhD in Urbanism and Planning, director of Centre National de la Recherche Scientifique - CNRS, researcher at Cresson, at Unité Mixte de Recherche Ambiances Architectures Urbanités - UMR AAU, founder of Réseau International Ambiances. He studies ambiance, everyday urban perception, sensory aspects of the cities and sound.

Luciana Santos Roça is a Bachelor of Arts in Audiovisual, Master in Architecture and Urbanism. She is a researcher at Nomads.usp. She studies sound interventions in public spaces, seeking to integrate the disciplinary fields of Sound Studies and Architecture.


How to quote this text: Thibaud, J.-P. and Roça, L. S. The polyphonies which weave the city. V!RUS, 14. [online] Available at: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus14/?sec=2&item=1&lang=en>. [Accessed: 27 April 2024].


Besides the several subjects brought by this 14th edition of V!RUS journal, the cities are also woven into an invisible fabric. This fabric is the sound environment. It reflects cultures and ways of living and the way we and our society as a whole produce it.

We had the great pleasure to have a conversation with Jean-Paul Thibaud, sociologist, and urbanist. Professor Jean-Paul Thibaud founded the International Ambiance Network. In his research work, he studies the idea of ambiance within a multidisciplinary background. He is a researcher at Cresson, the Centre de Recherche sur l’Espace Sonore et l’Environnement Urbain (Research Center on Sound Space and the Urban Environment), and Professor at the ENSAG, Ecole Nationale Supérieure D’Architecture de Grenoble, France. Cresson is distinguished by its plurality and diversity of research and is also well known for its innovative methodological tools.

How many kinds of experiences shape the city? Voices, sound sources, moving and dynamic objects weave the city, being a part of it and determining its content. But how to apprehend this fabric in research activities?

Poetically, we can say that sonic space is woven by multiple voices. They do not regard only to speech. Even though language reveals a diversity of cultures, such voices also come from our daily activities, from music, traffic, and sound devices. As Thibaud (2017, p. 226) once argued, “we are thus immersed in a world of sound of which we take part and which everyone contributes to, producing through their daily activities and actions”. Sound also plays a significant role in the way we act upon the cities and how we perceive it.

The sound itself covers and reveals, at the same time, everyday experiences. Sonic space produces a polyphony which may or may not be masked, may or may not be noticed. It covers a number of relations when listening becomes a habitual act. If we are immersed in it, it is hard to reveal what is beneath. To defamiliarize may be an answer for it: by estrangement, we may ask ourselves what is beneath the ordinary sounds that surround us.

These are some of the matters discussed in this interview. The attentive look of the researcher Jean-Paul Thibaud conducts us through these voices, proposing a critical perspective on the privatization of sound space and the use of sound as a commodity.

Luciana Roça: What contributions do you observe from sound to the weaving plurality in the cities?

Jean-Paul Thibaud: The sound is impressive due to the possibility of playing different voices together, as in a polyphonic experience. When you listen to a particular place, you hear different sources, diverse voices coming from different people, and such public space is really composed of a full diversity of activities. It would be a tonality of this whole situation, but this affective tonality would consist of a lot of different voices appearing together. This polyphonic way of listening would bring what is interesting in sound.

Let’s say the contrary, taking the example of a mall: you hear there virtually always the same kind of sound, continuous as a sole voice, the voice of the music diffused by different sources. This soundscape can neutralize, as the musical background masks the voices of people

A public place which is alive would be the opposite of this. For example, in France, we have local street markets. If you go to these markets, you hear a lot of different sounds coming from everywhere, a lot of different voices that are not continuous, one after another. All this composes the soundscape. Thus, in this situation, you listen to a unique composition of sounds. Not something that is one voice constantly, but a very dynamic plurality of voices, altogether, mixing and composing a very vivid soundscape.

Luciana Roça: Sound is an important element in the cities' experience. This matter seems nowadays to get more attention than before and, yet, many methodological problems persist in this research area. What methodological potentials and limits do you consider relevant?

Jean-Paul Thibaud: One of the main problems is that we have a lot of stereotypes when we speak about sounds. If we use classical Social Sciences methodologies, we are faced, in the very beginning, with many people talking about noise, annoyance or soundscapes which are good and full of music. So we have these great massive categories that prevent to go deeper into the real experience concerning sound.

Therefore, one problem would be: how is it possible to find different ways, methodologies, protocols to avoid this big stereotype and go deeper?

At CRESSON, we develop different methodologies. One of them, to mention an example, is called “Record of listening” which is essentially a way to use sound like an indirect way to ask people to talk about their experience. So, in this methodology, we go outdoor, into a public place we are studying, we listen to space, make a lot of recordings at different times of the day or the week, make observations and take notes. With these materials, we go back to the lab and work on specific soundtracks of the proper recordings. Then, we present the soundtracks to other inhabitants, people who live there, asking for their comments while listening to the soundtrack we produced. We do not ask for direct questions like “what do you hear” or the kind of things we ask when interrogating people, but we use the sound itself as a way to invite people to talk about their experiences.

Another methodology is walking as an approach to the experience. Here again, the idea is not to ask direct questions, but it is the act of walking in the streets. We go from a place to another, among different soundscapes and different sound qualities. This situation, this context of walking in such dynamic context would help people to tell their own experience while walking. So basically, the sound and space itself is the primary activator of people’s speech.

We also use audio recording as a set of data. A long time ago we used to work on a construction site, studying its sounds and the way the workers use sounds to work together. So we do not ask workers to comment their experience while working. To sum up, we went to the site, recorded it, and the recordings themselves were the data. We listened to them over and over, and then we evolved to understand how the sound was used by the workers to communicate with themselves, to work together. They use the same kind of rhythm, temporality, maintaining the contact with each other because they can not see each other. We thus used the sound as a way to document their work.

Literature can be very very helpful. In literature, most of the time, there is a particular way to describe experiences. It helps us, therefore, to find out in a very subtle way to experience sound. At CRESSON, we were conducting a research on the silence in the city. One of the data sets was the contemporary literature of the 20th century. We had twenty or thirty different books, novels, and pieces of literature. It has been possible to find a paragraph or a short piece that described a particular experience of sound or silence. Thus, we had some material that would represent a whole different set of situations related to silence in the city. We use this data to analyze or to understand the different circumstances and contexts better.

Usually, one can find plenty of description of what people hear. The idea is that it is possible to find indirect ways for people to talk about their experiences instead of direct questioning, which gives directions of what people are supposed to talk about.

So I would say that one of the biggest problems is to question people too directly. In this case, they only repeat the general representation we have about soundscape, like sound or beautiful music. They would not go too far, too deep after that. There is a real need to innovate concerning methods, indeed.

Luciana Roça: Would there be a way to use these stereotypes against themselves? As a resistance or an antithesis?

Jean-Paul Thibaud: As I mentioned before, when you ask people directly they tend to reproduce a stereotype. One way to break this stereotype is to work on what we call breaching experiment in Sociology or Ethnomethodology. This comes from Garfinkel, an American sociologist. The basic idea is to develop a kind of protocol which is what happens when an ordinary situation does not happen as it was supposed to. So it breaks the logic of the current situation or what happens.

I once studied the use of headphones in public places. At that time, the use of Walkman was increasing, in the 1980s or 1990s. People were not used at all about these practices in public spaces. So there were many different reactions. How do people react when someone else does not hear the same thing although they are in the same situation? There is a kind of disruption of the ordinary to better understand what underlies a common experience. We don’t realize it because we are on it continually. Therefore, this is another sort of methodology in which it is possible to design some protocols breaking the ordinary to understand what lies underneath.

In a certain way, we can observe that in the arts too. For example, we can mention Viktor Shklovsky [1], a Russian artist from the beginning of the 20th century, who worked on the idea of defamiliarization. Art as a way of defamiliarizing yourself, to better understand the background of the experience, what is never in the front. When you are aware of it, when you defamiliarize your experience, it can show you what is underneath.

Luciana Roça: Sound reflects actions and dynamics of urban spaces and, therefore, ways of living and cultures. Space and sound have both a profound interplay which is not often considered in Architecture. What limits do you estimate to exist in the sound-space relationship in Architecture and Urbanism?

Jean-Paul Thibaud: Once again, most of the time sound is taken into consideration to prevent some dramatic situation, to avoid the propagation of noise near airports, highways, etc.. This is a preventive logic or a way to deal with sound only afterward. Once the architectural project has been built, some mistakes are noticed, and architects have to work on them, to isolate them.

Still, I would say, one of the main mistakes is to consider impossible to deal with the sonic, the soundscape question, right in the beginning of the planning, of the design, and only work afterward.

The second topic is that some tools are not designed for sound. Because most of the time architects and urban planners use maps and CAD, which are very visual, usually employed also by professionals. Therefore we have to develop other tools capable of being more sensitive to temporality, rhythm, dynamics not included in a map, for example.

This is one of the dimensions of the sound. Sound brings the temporal dimension, but we truly miss some very operational tools that include rhythm, time, duration in the project and design. That is also a real challenge.

There have been some experiments, some ideas in order to go further in this kind of tools. You can find Cartophonie in CRESSON’s website. Using this tool with sound recordings, we try to show how can space be organized, and the sound of different times and different temporalities. It is a kind of interactive map, with various levels to deal.

This could be one answer. The second one may be more general. In the 19th or even 20th century, one of the problems was the high amount of noise coming from the industry, for example. Industries are very noisy. So, one of the greatest problems was to reduce noise and to be in a more calm space, quieter. Nowadays, the question is different.

The topic is not “we have too much noise”, but "we miss some silence". Our soundscapes are continually “on”. We don’t have the real opportunity to have some silence or quiet places. There is continually a kind of background noise behind your head. Then the question is how is it possible to build some intervals capable, in a way, of breaking this continuous noise.

The Italian anthropologist Gillo Dorfles brought a fascinating idea called the last of intervals. He argues that in our culture we always hear sounds, and this is continuous. And, of course, there is the example of music that is everywhere all the time, in every place. So we need some pauses. Is it possible to have some discontinuous sounds, that are not always continuous? I think it is a fascinating question to raise. Not only in a matter of level but regarding rhythm.

Luciana Roça: Can sound be approached as a dispositif for the "partage du sensible" [2] [distribution of the sensible] in the context of the cities?

Jean-Paul Thibaud: Yes, of course, it does. For example, there are many writings about sound sociopolitics. One of the main trends I would say now is about public spaces. More and more public spaces are privatized, and they are also privatized through and by sound.

If you walk in the streets, you hear music or different ads coming from the commercials, and they can invade other places. I would say that this is part of the "partage du sensible". Is it still possible to have a common public sound space? Or has sound space already been completely invaded by commercials and commodities? I think that sound can be studied in that way. For example, if I go to the mall, what do I hear? Of course, a lot of studies have been done about Muzak [3] and these kinds of dispositifs, but I think it is getting more and more subtle. Many companies are working on useful sound environments for making people to stay longer in commercial places, to lose the sense of time and spend more time in those commodity places. So I think that a part of the "partage du sensible" is guided by companies. This is one idea.

Another idea is the politics of noise in the cities. Some sound can be made, and some cannot; some can be heard, and some should not be heard. So there is all kind of regulations of how public sound should be and should not be.

A young researcher who came to CRESSON carried a research about the sound produced by homeless people in the streets. He realized that the sound marks a territory, and also that inhabitants reject their sound. Not only because it was a particular sound but because it came from homeless people. In a way, there is another logic: sound itself is not the object of rejection and conflict, but it is an expression of the presence of undesired people.

In another perspective, our sonic culture is also transformed by the tools we use. Let’s take the example of technical electronic devices we use to listen to music, like mp3. Mp3 has a frequency spectrum that is more reduced when you compare to other dispositive. So the habits of hearing are getting less subtle because our range of perception is less and less nuanced.

Therefore, this is also a "partage du sensible" in the sense of how our soundscapes are richer or poorer than before. And who is in charge in these ordinary soundscapes? I would say, more and more companies. There is an economy of experience. Experience now is a good, able to make money, so money is made from experience. We manufacture experience, and the sound is part of this commodity.

Luciana Roça: How could we stand against this scenario of the commodification of sound?

Jean-Paul Thibaud: Disrupting the Ordinary is a way to understand better what we don’t listen or see anymore because we are so immersed in it. So art could be a way just to stop a little bit the continuous flow of sound in everyday life, a way to build some dispositif which is going to englobe different perspective towards sound or soundscape. By creating these different points of view, we will be able to show the soundscape we are always immersed in; we will be aware and have a reflection of what we are always in. So maybe art is a major instrument, a major tool to allow some critical understanding of these questions.

I think that playing a resistance against the commodification of sound is a great work: breaking everyday experience in order to show what is underneath, to reveal some way to deal with it. This is why I was talking about Viktor Shklovsky before. I think maybe it is one of the first artists who brought this question about dismantling the familiar to reveal what is underneath.

Luciana Roça: What challenges do you perceive for this interdisciplinary field regarding sound, sociology, and urbanism?

Jean-Paul Thibaud: For me now the challenge is closely related to the resistance of art. It would be: "how is it possible to approach sound and to study it from its more minimum level, in a kind of molecular, infra level of listening?" Of course, a part of the 20th-century music works on this question. Is it possible to have a sort of minimalist way to listen, to compose, to organize sound? So I think this would be one of the primary challenges: is it possible to work in the infra sensible? It is just at the border, the limit of what is perceptible or not, of what you can listen or not. For me, this question is crucial. It is additionally important because people who work for companies also work on this question. Furthermore, they use this logic for commodities, advertising, etc., as an economy of experience. They work on these infra levels of perception. So I think that musicians and artists also have something to teach us to understand this infra level of perception.

Another one would be to work and organize all the diversity of sonic culture in the world, because we are so used to Western, classic, standardized sound that we lost our ability to hear, listen and appreciate all different kinds of sound cultures. Then this would be another challenge. We must pay attention to what other cultures have to teach us concerning listening. We lost our ability to distinguish the experiential level. That is something we must work on.

[1] Shklovsky, V., 2015. Art, as Device. Poetics Today, 36(3), 151-174.

[2] “I call the distribution of the sensible the system of self-evident facts of sense perception that simultaneously discloses the existence of something in common and the delimitations that define the respective parts and positions within it. A distribution of the sensible therefore establishes at one and the same time something common that is shared and exclusive parts. This apportionment of parts and positions is based on a distribution of spaces, times, and forms of activity that deter­mines the very manner in which something in common lends itself to participation and in what way various individuals have a part in this distribution.” (Rancière, 2004, p.12)

Rancière, J., 2004. The Politics of Aesthetics: The Distribution of the Sensible. Translated from French to English by Gabriel Rockhill. London: Continuum.

[3] Muzak, originally, is a company of “background music” from United States whose golden age was during the decades of 1960 to 1980. However, the name of the company is used by Sound Studies to designate functional music that acts on the regulation and control of public spaces, spaces for consumption and work, mainly.

Suggested bibliography

Thibaud, J.-P., 2017. The Sonic Attunement of Social Life. Guillebaud, C. (Ed.). Toward an Anthropology of Ambient Sound. New York: Routledge.