Como citar esse texto: DE PAULA, A.; ALVES, G. M. Cosmocria: interatividade e experiência em arquitetura. V!RUS, São Carlos, n. 14, 2017. [online] Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus14/?sec=7&item=1&lang=pt>. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Adalberto de Paula é arquiteto e urbanista, membro do grupo de pesquisa algo+ritmo, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul.

Gilfranco Medeiros Alves é arquiteto e urbanista, Doutor em Arquitetura e Urbanismo, professor do Curso de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, coordenador do grupo de pesquisa algo+ritmo. Estuda processos digitais de projeto, semiótica e comunicação em arquitetura, cibernética de segunda ordem, design paramétrico e fabricação digital.

Resumo

Este artigo deriva do trabalho de conclusão de curso “Cosmocria: interatividade e experiência na arquitetura” desenvolvido em 2016 no Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e que teve como princípio a Cibernética como fundamentação teórica para o desenvolvimento posterior do projeto arquitetônico. Baseado na investigação da influência dos meios de comunicação e dispositivos tecnológicos na sociedade contemporânea, a arquitetura interativa e a experiência humana nos espaços se conectam através do olhar sistêmico cibernético. Com o intuito de refletir a diversidade e a dinamicidade da sociedade contemporânea, a proposta do trabalho é um projeto arquitetônico apoiado na interatividade cibernética aliada à urbanidade do espaço público democrático dentro das redes híbridas que tecem a cidade. Enquanto o espaço interativo busca ambientes mais responsivos, sensoriais, adaptáveis e estimulantes, o espaço democrático almeja a diversidade de situações, interações, experiências e usos a partir da dimensão e participação humana nos espaços. Trata-se de um espaço sensível de caráter público que reflete as necessidades das pessoas através da interação. O caráter híbrido do projeto organiza os conceitos tanto na esfera física quanto na virtual de maneira conectada com as pessoas da cidade criando um espaço colaborativo que não incentiva o papel de um protagonista e a plateia, mas que, em um contexto de igualdade, todos possam ser protagonistas da sua própria experiência sensorial no espaço. Também cabe destacar que esse espaço colaborativo proposto pelo Cosmocria tem como objetivo fomentar a pesquisa, a cultura do “faça você mesmo” e o desenvolvimento tecnológico em Campo Grande, MS, Brasil.

Palavras-chave: Arquitetura interativa; Cibernética; Urbanidade; Espaço colaborativo

Introdução

A partir da segunda metade do século XX, quando a explosão populacional, a transição para o meio urbano, o deslanchar de tecnologias e o despertar para os problemas emergentes resultaram em um mundo globalizado, a sociedade e os modos de vida sofreram importantes transformações. As cidades, suportes de atividades sociais, culturais e econômicas contemporâneas, têm se desenvolvido descontroladamente ao longo desses anos simultaneamente com as reflexões sobre os problemas urbanos e a busca por estratégias que possam superá-los. Nesse cenário, a arquitetura se preocupa e traz consigo um grande potencial de mudanças que emergem do seu contexto, onde uma estratégia compromissada com o social, se direciona em manter espaços vivos, colaborativos e interativos. Há algumas décadas atrás, dispositivos tecnológicos digitais eram relativamente desconectados do espaço arquitetônico. Hoje existem várias experiências onde os mesmos são usados em diversas aplicações práticas da arquitetura, interferindo no design e na vivência do espaço (NOJIMOTO, 2009; CARNEIRO, 2014). Estes dispositivos - estáticos, dinâmicos ou puramente digitais - trazem para a arquitetura a habilidade de captar, guardar, processar e transmitir informação, dotando o objeto arquitetônico de ação, reação e interação.

A vivência diária com o mundo digital, apesar de recente, já é considerada irreversível na cultura das novas gerações. O ponto é como o mundo tecnológico afeta nossas vidas, pois através dos meios de comunicação, estamos em um cenário global em que o mundo inteiro é um acontecimento. O nosso espaço cultural e de lazer, uma vez visto como um mero abrigo de pessoas, está sendo transformado em um organismo vivo. A tecnologia, ao mudar nossa percepção do mundo ao nosso redor, consequentemente, também mudou o modo de ver as formas arquitetônicas, a estrutura, a performance e espaços que cada vez mais se encaminham para serem mais interativos e experienciais.

Através da Cibernética, é possível compreender como os diversos níveis de interatividade atuam na sociedade e nas camadas sistêmicas de redes físicas e virtuais do mundo. Uma vez que as pessoas são sistemas de aprendizagem que interagem com o mundo em diferentes níveis de feedback, tudo se conecta de alguma forma (BERTALANFFY, 2009; PASK, 2011). Assim como o corpo humano está constantemente em interação entre suas partes, da mesma forma um edifício deveria estar. Nesse sentido, a interatividade possibilita a conexão das partes e a criação da ideia de um organismo híbrido, onde o espaço pode ser também uma extensão fluida das pessoas (DUBBERLY; HAQUE; PANGARO, 2009).

O termo híbrido aqui empregado está alinhado com duas visões. A primeira, baseada em conceitos do livro Territórios Híbridos produzido pelo Nomads.usp (2013), que discute o hibridismo como um território constituído pelo conjunto de espaços físicos e seus usos, acrescido das ações, relações e interações possibilitadas pelo uso das tecnologias de informação e comunicação onde a experiência integrada é proporcionada pela articulação em rede, permitindo ampliar a dimensão local. A segunda, a partir do livro This is Hybrid (2011), de Aurora Per, Javier Mozas e Javier Arpa, os quais apresentam o hibridismo como a sobreposição diversificada de usos coexistindo em um mesmo edifício.

Richard Rogers (2001) defende a ideia de que, no futuro, os edifícios tenderão à desmaterialização através de estruturas indeterminadas, adaptáveis e flutuantes que respondam às mudanças diárias no ambiente e nos padrões de uso, de forma a contribuir para a continuidade espacial, misturando a rua, a praça e os próprios edifícios. Esses edifícios do futuro “serão menos como templos clássicos imutáveis do passado e mais como robôs orgânicos, pensantes e móveis” (ROGERS, 2001, p. 165). Nesse sentido, a proposta do Cosmocria visa o acesso e a integração social com a cidade onde todos, sem distinção, sejam acolhidos.

Tomando o projeto do Fun Palace do arquiteto inglês Cedric Price como referência, buscou-se projetar espaços de relevância para a população, de forma a incentivar novos usos que contribuam para a sua flexibilidade. A essência do Fun Palace não consistia em conceitos ligados ao estilo e função, mas sim na potencialização das relações pessoais através da interação. É objetivo, portanto, a criação de espaços nos quais sua organização instigue o participante a interferir ativamente ou desfrutar passivamente, dependendo das configurações e usos que o espaço pode sugerir. Quando a arquitetura abraça a incerteza e imprevisibilidade potencializadas pela tecnologia, os espaços assumem outras características desejáveis, como adaptar-se às necessidades das pessoas. Da mesma forma que o Fun Palace oferecia um universo interativo diferente de outros espaços da cidade, foi intenção do projeto criar um espaço tido como um cosmos de interações que se une ao espaço público urbano de modo a formar um ciclo de retroalimentação entre população e o conceito híbrido do edifício.

O conceito cosmocria

Dentro de infinitas possibilidades de design, os espaços do edifício Cosmocria devem interagir com as pessoas que os usam de forma a refletir suas necessidades. Essa interação entre pessoa e espaço acontece através de três frentes de tecnologia: sensores, realidade virtual e web aplicativos para celulares, tablets e computadores. Como fazem parte do conceito do edifício, a interação com esses dispositivos acrescenta aos espaços físicos camadas de redes que se sobrepõem possibilitando ao indivíduo ser o protagonista da sua experiência espacial. Além de as pessoas serem livres para configurarem o espaço através de um sistema em rede de sensores, do sistema de realidade virtual e do aplicativo Cosmocria, cria também, e a partir disso, um diálogo entre o edifício e seus usuários que abre portas para uma utilização mais democrática do espaço. Cada uma das três frentes de tecnologia possibilita diferentes maneiras de interação, mas quando se somam fazem parte de um sistema complexo mais amplo.

O edifício conta com a realidade virtual (VR) como um portal de acesso à realidade dos espaços não físicos. A VR funcionaria coexistindo com a realidade física dos espaços, mas dando acesso a outras camadas de informação e possibilidades de interação. Assim, o projeto usa essa tecnologia em três atividades: games, criação e comunicação. Os games em VR tem o objetivo de lazer e informação tanto para as pessoas que usam o edifício diariamente, como para as que o frequentam esporadicamente. É intenção criar acesso para a população que normalmente não tem condições de usufruir dessa tecnologia.

Quanto ao campo de criação, a VR está presente no projeto oferecendo a imersão como ferramenta na elaboração dos projetos desenvolvidos pelo espaço criativo. Além desses dispositivos que auxiliam nas escolhas, nos percursos, e nas trocas de informação, o edifício usa também a VR na criação de realidades digitais com objetivo de estimular a experiência humana individual e coletiva no espaço não físico. Assim, a ideia é unir a tecnologia de VR com o uso de neurossensores de forma que os óculos de VR possam ajudar a desenvolver inputs através de associações vindas diretamente dos neurotransmissores do cérebro de cada usuário. Dessa forma, criar-se-ia uma realidade não-física personalizada instantaneamente com base em estímulos cerebrais. O output fornecido a partir dos óculos, esse ambiente digital criado, seria moldado pela pessoa e para a pessoa. Como se trata de uma ideia conceitual, da mesma forma que um ambiente é criado baseado na leitura individual das sinapses cerebrais de uma única pessoa, as somas de várias leituras cerebrais poderiam criar uma experiência colaborativa e coletiva ao se mixar uma realidade sistêmica, sendo assim possível fazer emergir realidades inimagináveis. Esse espaço de VR pode ser entendido como outra dimensão dentro do edifício Cosmocria. Uma realidade paralela, uma espécie de cosmos criativo, disponível para a cidade acessar.

Uma vez entendido que celulares, tablets e computadores são tanto um nó de acesso à rede de informação, como um nó de conexão entre pessoas e sistemas, faz parte das estratégias de design do edifício a cooperação entre os espaços físicos e não-físicos existentes. Assim, propõe-se a criação de um web aplicativo como ferramenta de interação entre os espaços e pessoa. Esse aplicativo faria a mediação entre o edifício e seus usuários de forma a evidenciar os objetos e sistemas com os quais se pode interagir no instante de acordo com a localização de cada indivíduo dentro dos espaços. Com o uso do GPS de cada dispositivo, a proximidade ou não de um objeto é determinante para a interação através do aplicativo. O projeto entende que garantir o acesso à Internet é uma necessidade básica não apenas para possibilitar as interações dentro do edifício, mas também para democratizar o acesso irrestrito à informação pela sociedade contemporânea. Dessa forma, o edifício possui, em sua porção mais alta, uma antena de wifi para a cidade. O acesso à Internet possibilitado pela antena de wifi concretiza, em grande escala, o feedback loop com a própria cidade, relacionando a tudo o que acontece no edifício e potencializando o mediador dessa comunicação que seria o web app Cosmocria.

As funções do aplicativo visam a experiência sensorial do indivíduo dentro do edifício. Com ele, as pessoas podem se conectar às salas de imersão em VR, interagir com a iluminação tanto exterior da fachada quanto do interior dos espaços, controlar sons dos ambientes, projetar filmes e imagens na superfície do hall multimídia, sugerir vídeos a serem projetados no hall interativo e conferir a programação de atividades desenvolvidas no edifício. O aplicativo também mostraria um infográfico, apresentando o mapeamento de personalidade de acordo com as interações e escolhas feitas ao longo do tempo: o Cosmobrain.

Ao longo da vida o ser humano deixa memórias e marcas nos espaços e na história. Ao usar um edifício, nossas escolhas e atividades deixam rastros durante o tempo de permanência. Assim, o projeto busca também criar um banco de dados de leituras espaciais e individuais de cada pessoa. O registro dessas leituras aconteceria através de um mapeamento individual com base nas escolhas feitas pelo aplicativo, nas atividades desenvolvidas dentro do edifício apontadas pelo GPS e sensores, e no humor das pessoas indicado por EQ-Radio e os neurosensores ligados ao VR.

Dentro do aplicativo as pessoas teriam acesso ao infográfico de como o edifício as lê. Esse infográfico chamado Cosmobrain foi baseado no projeto esloveno Ples Možganov (Braindance) realizado pelo coletivo platFORME e pela BlackBox Company, que estabelece uma ponte entre a ciência e a arte. O projeto Braindance lida com a diferença na visualização da atividade cerebral em relação à afinação básica da música e a possibilidade de interpretação visual da escuta musical. O projeto mapeia de forma gráfica as reações das pessoas ao escutar certas camadas da música. Da mesma forma, o Cosmobrain mapearia a movimentação cerebral das pessoas criando um gráfico mutável diariamente. Assim, a união dessas leituras individuais formaria uma média de comportamento e humor: a personalidade Cosmocria.

O programa

Em um cenário além do território de Campo Grande, o Cosmocria visa atrair a população através do estímulo à inovação tecnológica, introduzindo a cultura colaborativa e de inovação no estado. Deseja-se também potencializar a interação, as redes e a transferência de conhecimentos e habilidades entre o Cosmocria e as pessoas da cidade. Cosmocria também se conecta a outros espaços no Brasil ou no mundo, de modo a acolher qualquer pessoa interessada, universidades, escolas e outros espaços da mesma natureza, como por exemplo, o Google Space. Essa conexão aberta pode acontecer através da plataforma digital, parcerias, visitas, palestras, programas de bolsa e mesmo por realidade virtual. Dessa forma, o Cosmocria pode ser caracterizado como um centro de inovação que abriga startups, incubadoras, aceleradoras, moradia temporária, coworking e Fab Lab, como também trata os espaços como responsivos à experiência.

De maneira simplificada, o programa trabalhado foi dividido em: [1.] espaço colaborativo, de caráter a criar relações de cooperação no desenvolvimento de ideias, e [2.] espaço interativo, para que possa melhor atender às necessidades das pessoas ao mesmo tempo que mantém o interesse pelo local, por meio de um edifício que interage com seus atores. A espacialização do programa na área de intervenção deu-se de modo a criar um feedback loop entre cidade e edifício. Todo o embasamento e setor de acesso são caracterizados pelos espaços pertencentes ao cosmos interativo, que abarca o caráter de urbanidade com a responsabilidade de manter o espaço público diversificado, democrático e, principalmente, vivo. O programa que toca o solo convida as pessoas a interagir e refletir sobre suas ações a fim de adaptar à suas necessidades. Com exceção do Fab Lab, que possui uma necessidade maior de visibilidade para atender a comunidade mais facilmente, todo o espaço colaborativo acontece de forma estratificada pela sobreposição de usos comuns. A intenção é que o edifício represente a população visitante de modo a contribuir para o desenvolvimento de ideias e, através da circularidade, exista a troca de informação e conhecimento. Assim, o programa trabalhado se expressa da maneira apresentada na Figura 3.

O projeto

O crescimento de Campo Grande rumo à periferia resulta em uma série de problemas urbanos, principalmente nos locais mais antigos, como o centro da cidade, que, com a especulação imobiliária, vai aos poucos sendo abandonado. A área de intervenção foi escolhida por apresentar o maior número de condicionantes favoráveis para a elaboração da proposta, como a boa dimensão territorial, localização com caráter de nó no tecido urbano, proximidade do Horto Florestal, possibilidade de implantação de espaço público atrator, conexão com a rede cicloviária da cidade, ligação direta com a região sul da cidade (mais populosa e carente), acessos variados e por ser um terreno em desnível, permitindo a visualização de diferentes perspectivas do projeto. Assim, o projeto seria uma espécie de hub de conexão entre pessoas e ideias que fluem pela cidade.

Quanto à ocupação espacial do edifício no terreno, o projeto tem como ponto de partida o traçado urbano local e as condições em que ele se encontra. Como a maior diagonal do terreno possui cerca de 186m, a primeira diretriz foi criar uma passagem para o pedestre dentro do terreno a partir do ponto médio dessa diagonal visando que a ocupação do edifício não obstrua a visibilidade para o Horto Florestal. Ao dividir o terreno com essa passagem cria-se duas áreas para a ocupação, uma na extremidade norte e outra no sul do terreno. Visando uma melhor interação com os acessos do entorno, a ampliação do viaduto garante também a comunicação por rampa para a esquina do Horto Florestal e, de modo complementar, foi proposta uma passarela que integra com a passarela existente do Horto Florestal. Assim, cria-se uma conexão direta entre o edifício e o parque, de maneira a incentivar seu uso e criar mais possibilidades de percursos.

Ao posicionar a torre ao norte do terreno, pela latitude em que Campo Grande se encontra, cria-se um espaço público ao sul mais sombreado durante o ano, uma vez que a sombra da torre avança sobre a praça. No que diz respeito a escolha da forma circular como seção da torre, por possuir um perímetro contínuo, a superfície de fachada é tratada como uma unidade e por isso apresenta um travamento estrutural natural sem pontos frágeis, diferentemente do que acontece com as quinas retangulares. A seção circular também auxilia na performance da passagem dos ventos por possuir menos superfície em contato com o ar.

Uma vez definidas as diretrizes de comunicação com o contexto, a evolução volumétrica do edifício se deu de forma a considerar aspectos legislativos, geográficos, técnicos e psicológicos, imaginando como uma pessoa poderia reagir à geometria de acordo com cada perspectiva que ela oferece. Assim, por estar mais próximos aos olhos da escala humana do espaço público, o volume horizontal sofre mais deformações na busca do deleite ao ser observado. A superfície topológica tem mais influência especulativa no imaginário humano do que uma simples superfície plana perpendicular ao solo. Em contrapartida, o volume vertical mantém a seção circular por toda a extensão da forma. As variações presentes na geometria da torre acontecem nos raios da seção circular que diminuem de acordo que se aproximam da antena de wifi, no topo do edifício e no leve deslocamento dos eixos dos círculos para o sul a fim de amenizar a exposição da fachada sul causada pela diminuição da seção da torre, como pode ser percebido na Figura 7. Durante o processo de concepção e desenvolvimento do projeto, a modelagem digital passou por diversas formas e linguagens, com a impressão 3D de vários protótipos até sua definição final.

O vão criado para a passagem de pedestre vai além dessa única atividade, pois a intenção é criar um ponto de encontro e um espaço de convívio aberto à diversidade emergente do espaço público democrático. Como todo o volume horizontal tem o caráter de equipamento público da cidade, os espaços interativos estão em constante mudança pois estão condicionados a atividades culturais e de lazer para o convite à população. Esse convite se estende também para pipoqueiros, food trucks, e feiras livres, que tanto contribuem para a urbanidade.

Com a intenção de criar flexibilidade nos espaços públicos, é implantado um desenho de mobiliário que se desloca sobre trilhos ao longo da praça. O trajeto percorrido segue o desenho do piso em quatro eixos, dois no sentido norte-sul e dois no sentido leste-oeste do terreno. A disposição dos mobiliários se adequam às necessidades das pessoas, variando o posicionamento para atender desde o isolamento, a reunião de amigos, ou a busca por sombreamento ao sentar. Esses mobiliários consistem em mesas com bancos acoplados, bancos sem encosto, banco com encosto e espreguiçadeira. Feitos de dois tipos de madeira, sua materialização é através da união intercalada das duas tonalidades de peças a partir do corte das chapas brutas pela máquina de CNC.

Todo o volume horizontal do cosmo interativo é composto por uma treliça espacial paramétrica autoportante que se dobra para tocar suas extremidades no solo. Esse método construtivo foi escolhido por apresentar grande eficiência estrutural através da distribuição em rede dos esforços, demandando menores espessuras das peças pelas cargas não serem descarregadas pontualmente, e também por possibilitar a confecção dessas peças e placas paramétricas através da fabricação digital. A dimensão da altura dessa treliça varia de 1m a 1,5m e entre sua trama passa a fiação elétrica e redes de lógica. Além da treliça espacial paramétrica, essa superfície possui diversos tipos de revestimentos. Tanto internamente quanto externamente existe a predominância da placa de titânio com uma camada de impermeabilização na face externa. No entanto existem módulos que são compostos por células fotovoltaicas com a intenção de gerar energia, por vidro a fim de formar janelas e por aço inoxidável a fim de criar uma superfície reflexiva. A criação de poucas aberturas e o controle de luz auxilia também as interfaces digitais espalhadas pelo hall interativo e pelo hall multimídia que necessitam de uma luz mais reduzida para melhor visualização.

A estrutura de pele autoportante da torre funciona distribuindo os esforços em rede apenas como forma de travamento da geometria, podendo ser vista como um grande pilar circular. Mesmo tendo o travamento da trama em rede, os esforços são descarregados para o solo de forma pontual. A trama hexagonal foi escolhida por existir em sua geometria linhas tanto diagonais como verticais e nenhuma horizontal para impedir a visibilidade. O material usado para estrutura da trama é o aço e para a vedação, o vidro e o titânio. Na base da torre a estrutura não possui nenhum fechamento possibilitando o trânsito de pessoas, mas à medida que a torre se eleva, a vedação passa a ser composta por vidro para levar a transparência e a iluminação natural para os espaços colaborativos. Quando a trama chega no nível dos pavimentos técnicos, a transparência dá lugar a opacidade do titânio evitando a exposição na fachada.

A pele do brise é parasita da trama da torre. Sua fixação acontece por um sistema de mão francesa que prende o cilindro responsável pelo movimento dos painéis. O módulo base desses painéis possui o triângulo como geometria base por permitir uma maior resolução na curvatura que acompanha a inclinação da trama da torre. O movimento deste módulo tem fixa uma das arestas do triângulo permitindo a outra extremidade uma abertura de até 90° em relação a fachada do edifício. Esse movimento do brise se dá em resposta ao movimento do sol de maneira a gerar mais sombra possível dentro do edifício. O movimento em um primeiro momento está condicionado ao sol, mas também pode ser reprogramado para responder a outros padrões, como também para responder à vontade individual de uma abertura. Essa fachada dinâmica ganha vida não apenas durante o dia com seu movimento, mas também durante a noite com iluminação própria. As superfícies dos painéis são compostas por sensor solar, células fotovoltaicas e células de LED.

A estrutura dos pavimentos do edifício segue independente das estruturas de vedação. Dentro das três peles que formam a estética do edifício, a estrutura dos pisos é tradicional. Para isso, os pavimentos do volume horizontal são lajes protendidas apoiadas em pilares circulares de concreto e os pavimentos da torre são também lajes protendidas, mas apoiadas na caixa estrutural de concreto maciço dos elevadores que possui 8,4 x 8,4m. A caixa de elevadores além de suportar o peso dos pisos, é a base para a antena de wifi que está alinhada no seu eixo. Quanto às lajes, dependendo do vão que a protensão tem que vencer, muda sua espessura, sendo assim o projeto apresenta várias seções de lajes, variando de 20 a 60 cm.

O hall interativo é o maior espaço do edifício e é oferecido como espaço público da cidade. Nesse espaço são distribuídos totens de 2,5 x 2,5 x 0,6 m que possuem uma face para que as pessoas possam interagir com uma interface digital e outra face que possibilita a ação de sentar, deitar e de contemplação como peça em si. Feito de acrílico preto, o totem pode um dia estar em pé ou em outro, deitado, ditando assim qual uso terá naquele dia. Além de mudar as faces em exposição, os totens são reconfiguráveis a todo momento por um robô Kuka sobre trilhos, guiado pela personalidade Cosmocria.

A cápsula de imersão possui o método construtivo semelhante ao da treliça espacial do volume horizontal, porém em uma escala menor. Nesse caso a treliça é atirantada por cabos de aço na cobertura do hall interativo e possui um formato ovóide com fechamento de vidro nas duas extremidades. A mesma geometria do exterior da cápsula é refletida em seu interior, pois a ideia é que a pessoa ao entrar, sinta a sensação de perder o nivelamento do piso, criando assim uma nova percepção espacial.

Também, ao topo da escada de acesso ao hall expositivo, foi implantado uma hiper superfície que interage com a presença das pessoas. Como um convite para as pessoas subirem, essa superfície interativa se materializa através de pistões cilíndricos com lâmpadas de LED em sua extremidade. Assim, a interação acontece em movimento, som e luz quando uma pessoa passa por ela ou diretamente pelo uso do aplicativo Cosmocria, colocando uma música ou desenhando com a luz.

Baseado no projeto conceitual da Google de Benghazi na China, com o intuito de dinamizar mais o ambiente de trabalho, é implantado ao projeto o conceito de estações de trabalho individuais que se deslocam sobre trilhos. Nesse caso, o isolamento do espaço de trabalho de concentração não se restringe a uma sala pequena pois o isolamento é feito elevando o trilho. Assim, a estação de trabalho parece que está flutuando no espaço, mantendo a permeabilidade visual do espaço.

Considerações finais

Ao longo do desenvolvimento do projeto, foram feitas várias reflexões visando estabelecer o que é a arquitetura interativa e além disso, propor estratégias para a elaboração do projeto através de alguns conceitos advindos da Cibernética. Assim, estudar e aplicar conceitos cibernéticos no campo da arquitetura, é, antes de tudo, estar aberto para entender o mundo em que vivemos a partir de outras ordens e perspectivas. Estas reflexões que se encaminharam, permitiram afirmar que a interatividade, em suas diversas manifestações, é uma característica fundamental dos espaços habitados pela sociedade contemporânea.

As tecnologias de comunicação estão transformando nossa economia, nossa forma de aprender, nossos métodos de trabalho, nossa capacidade de alterar ambientes e até mesmo nossas tarefas e prazeres cotidianos. Atualmente, faz parte do cotidiano as pessoas estarem conectadas aos seus celulares e dispositivos eletrônicos de forma a expandir o espaço em que se encontram. A presença física de uma pessoa está cada vez mais dissolvida no potencial dos meios de comunicações e nas manifestações de ubiquidade. Estamos conectados uns aos outros em uma camada de espaço além do plano físico e as transformações ocorridas na sociedade ao longo do tempo se mostram irreversíveis. Como as outras revoluções da humanidade que transformaram os modos de vidas, a revolução tecnológica e informacional se mostra cada vez mais influente. Temos, portanto, que adaptar os espaços para que se tornem cada vez mais flexíveis, de modo a permitir criar interações mais dinâmicas e possibilitar a colaboração das pessoas na concepção do ambiente em que estão habitando e experienciando. Os arquitetos têm de saber orquestrar a multidisciplinaridade que um projeto arquitetônico contemporâneo exige.

Acreditamos que a partir do potencial da mediação digital, a arquitetura deverá abarcar o pensamento de ação, reação e interação em cadeia, onde tudo está em constante relação de influência com outra ação, reação e interação. Partindo de uma visão sistêmica e cibernética, não se pode conceber um objeto isolado no espaço. Tudo se conecta em redes múltiplas, de maneira em que um acúmulo de uma simples ação no espaço pode gerar outras experiências e desdobramentos futuros maiores e mais ricos para a sociedade, atualizando o conceito de arquitetura e ampliando seus limites.

Referências

BERTALANFFY, L. Teoria Geral dos Sistemas: Fundamentos, desenvolvimento e aplicações. 4a ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2009

CARNEIRO, G. Arquitetura interativa: contextos, fundamentos e design. 2014. Tese (Doutorado em Design e Arquitetura) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.

DUBBERLY, H.; HAQUE, U.; PANGARO, P. What is interaction? Are there different types? São Francisco: Dubberly Design Office, 1 Jan. 2009. Disponível em: <http://www.dubberly.com/articles/what-is-interaction.html>. Acesso em: 29 Mai. 2016.

NOJIMOTO, C. Design para experiência: processos e sistemas digitais. 212f. 2009. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Escola de Engenharia, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2009.

NOMADS.USP (Org.) Territórios Híbridos: ações culturais, espaço público e meios digitais. São Carlos: IAUUSP, 2013.

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ROGERS, R. Cidades para um pequeno planeta. 1a ed. Barcelona: Editorial Gustavo Gili / Campás, 2001.